Seja corajoso. Encare você mesmo.



Seja corajoso. Encare a si mesmo.

Fiz algo bem estranho. Enquanto lia o mais recente livro de um prezado amigo, me deixei levar até à última página. Nunca fizera isto antes não importando quantos livros tenha já lido. Afinal sou dos que preferem esperar pelo grand finale mesmo sabendo que o mordomo pode ser o assassino.

Mas foi assim. Por acidente ou por acaso. Ou foi por obra do Acaso. Mas foi assim. E a última frase falava de covardia, de falta de coragem. E aquilo mexeu comigo.

Ficou na minha cabeça. Coragem e a falta de coragem. Ficou a falta que faz... a falta de gente cheia de coragem. A falta que corajosos fazem. A falta sentida que corajosos fazem quando não fazem. Faça fazem. Nada fazem.

Enchi-me então de coragem para fazer e resoluto resolvi, apelar à sua coragem. A ser corajoso. Encher-se de coragem. Meter as caras. A ir fundo. E a fazer.

Para começar que seja corajoso e encare a si mesmo. Como diria Lao-Tsé não seja forte dominando o outro, seja poderoso dominando a si mesmo. Ouça Sócrates (ou seria o Shank?) e conheça a si mesmo.

Nenhum inimigo, nem um desafio é maior a nós mesmos do que encontrarmos realmente com o real de nós mesmos. Com aquele a quem fala o travesseiro na noite mal dormida. A face interrogadora no espelho do banheiro. A imagem nas vitrines nos vendo passar. A chapa de raio-x da nossa alma. A tomografia computadorizada, colorida, ou nem tanto, do nosso viver, do nosso ser, ou não, se for essa questão.

Aquele a quem ninguém vê e a quem, nem nós mesmos, queremos enxergar.

O habitante perdido nas zonas sombrias de nossa alma. Dos quartos escuros do nosso ser. Das sete gavetas trancadas à sete chaves a todo custo trancadas, nessas mesma gavetas. E dos sonhos idealistas reduzidos a bobagens de quando eu era mais jovem. Desejos ocultados pela névoa cinzenta da realidade.

Ser corajoso é enfrentar a adversidade da vida, mas é primeiro enfrentar a adversidade do eu.

E nesta vida de corre e corre, de se ficar o bicho pega e se correr ele vem atrás. De bicho que tem celular, e-mail, GPS, e ainda vai nos chipar, encontrar eu mesmo é difícil, tão difícil quando desagradável, mas tão necessário quando difícil, e tão desagradável quando a necessidade de fazer.

O lugar não importa. Desde que tenha porta aconselha o sábio. Pois é só na intimidade e na segurança da solidão quando dá pra falar comigo mesmo sem ter a conversa interrompida.

Sugiro que vá, vá para um lugar com porta, se feche lá e seja lá que lugar com porta seja, em cima da montanha, na praça, dentro do carro, dentro do quarto do hotel, no aeroporto, no avião ou no elevador, eleve-se para de dentro de si mesmo, se a depressão tá brava.

Ou, desça da montanha do sucesso se ele já te chegou à cabeça. Volte cá prá baixo, desça do Olimpo da hipocrisia e sente-se consigo mesmo. E sinta. Entretenha-se consigo mesmo. E entreteça uma teia de relacionamento íntimo com a intimidade do seu ser. Tome um chopp contigo – e por vocês - e não veja o tempo passar.

Mas, não enrola não, pois esse tempo sem ver passar vai passar e logo-logo a realidade vai te chamar para longe de você mesmo.

Vá lá seja sincero, abra-se e abrace-se, seja carinhoso, disposto a abraçar.

Mas também seja frio e cortante. Como a lâmina de um bisturi que rasga a carne, perfura as entranhas e futuca onde mais dói.

Seja corajoso. Vá fundo. Não tema a dor, não poupe força. Vá fundo. Vá até lá. Até encontrar onde você se perdeu de si mesmo. E deixou, você mesmo, sozinho.
Autor: Eduardo Cupaiolo


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