ELE GANHOU O MAIOR BÔNUS DA HISTÓRIA
27 DE FEVEREIRO DE 2008
Dono de um desconhecido fundo de hedge, John Paulson apostou na falência das hipotecas americanas e embolsou 3,5 bilhões de doláres
Giuliana Napolitano
UMA IRONIA CERCA O ESTUPENDO desempenho em 2007 de John Paulson, da gestora de recursos Paulson & Co. de Nova York. Por anos, gestores de fundos de hedge como ele foram apontados como os vilões do sistema financeiro. Não faltaram previsões apocalípticas sobre as crises que inevitavelmente provocariam. A má fama de Paulson e seus colegas, é bom que se diga, não era de todo infundada. Por definição, os fundos de hedge — aqueles que investem em juros, moedas, ações, opções e contratos futuros — andam no fio da navalha, com grande apetite para o risco e sempre em busca dos maiores retornos possíveis. A crise do setor imobiliário americano chegou com força em 2007, espalhou-se pelo sistema financeiro e — surpresa! — Paulson e os demais gestores não tinham culpa no cartório. Os malvados da hora são alguns dos mais tradicionais bancos dos Estados Unidos, que não param de anunciar prejuízos pelos excessos cometidos com empréstimos imobiliários de alto risco. Um levantamento feito pela agência de notícias Bloomberg com grandes fundos de hedge mostra que mais de uma dezena teve rentabilidade superior a 20% em 2007, ano em que o principal índice da bolsa de Nova York subiu apenas 3,5%. O maior destaque entre os fundos foi, sem dúvida, o Credit Opportunities, da gestora de Paulson. Rendeu 590% entre janeiro e dezembro, o melhor desempenho de que se tem notícia nesse setor. O ganho líquido foi de 15 bilhões de dólares, repartido entre os felizardos cotistas e os poucos profissionais da gestora, A maior fatia coube ao próprio Paulson (que não tem nenhum parentesco com o secretário do Tesouro americano, Henry Paulson). Estima-se que tenha embolsado cerca de 3,5 bilhões de dólares em bônus, a maior quantia já paga a um executivo de Wall Street num único ano.
A estratégia de Paulson— ex-diretor do banco Bear Stearns, de 51 anos — foi apostar na falência do segmento de subprime. Ele começou a fazer isso em 2005, enquanto essa fatia do mercado americano ainda era lucrativa. Seu plano era aplicar em opções de venda no mercado futuro de ativos ligados a imóveis para se proteger da desvalorização de papéis atrelados a esse setor. Até o começo de 2007, essas operações davam prejuízo. O que permitiu a Paulson insistir por tanto tempo numa estratégia que não era lucrativa foi o fato de as perdas serem relativamente pequenas. "Como poucos gestores apostavam contra o segmento de subprime, quase não havia demanda por esse tipo de proteção no mercado futuro e, por isso, seu preço era baixo", diz Ken Heinz, presidente da consultoria Hedge Fund Research, uma das principais empresas de pesquisa sobre fundos de hed ge, com sede em Chicago. "Olhando friamente pela ótica do risco versus retorno, ele fez o certo." Ou seja, se a crise do subprime não viesse, Paulson perderia dinheiro, mas não seria uma tragédia; alternativamente, ganharia o suficiente para sustentar algumas gerações da família.
Paulson foi quem melhor explorou essa oportunidade do mercado. Além do Credit Opportunities, mais três fundos sob sua administração renderam acima de 50% em 2007 — resultados vistosos o suficiente para que ele convencesse Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve, a ser conselheiro de sua empresa. Mas outros gestores também se deram bem. Estima-se que os lucros dos fundos de hedge obtidos no ano passado apenas com operações relacionadas ao mercado imobiliário tenham somado 25 bilhões de dólares. Além de colocar esses fundos no radar dos investidores — como Paulson, a maioria dos ganhadores era praticamente desconhecida até então —, os retornos elevados produziram um fato inusitado. Com dinheiro em caixa, os outrora vilões passaram a injetar capital em algumas das maiores instituições financeiras americanas, que estavam na corda bamba em razão da crise. A gestora TPG-Axon Capital, de Nova York, integrou o grupo de investidores que colocou mais de 6 bilhões de dólares no banco Merrill Lynch, em janeiro. O Citadel Investment Group, de Chicago, despejou quase 3 bilhões na corretora E*Trade, terceira maior dos Estados Unidos, que esteve à beira da falência no fim de 2007. "Eles ajudaram a amenizar os efeitos da crise", diz Fernando Lovisotto, sócio da consultoria financeira RiskOffice*.
O fato de que haveria alguma correção no mercado imobiliário americano não era novidade desde 2006. Diversos economistas alertavam para isso. "Mas só se falava dos impactos dessa correção para a economia dos Estados Unidos. Só uma minoria conseguiu relacionar isso ao mercado financeiro”, diz o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, sócio da gestora de recursos Quest Investimentos, de São Paulo. Por que essa minoria era composta, principalmente, de fundos de hedge? E por que eles ganharam tanto dinheiro enquanto bancos e seguradoras tiveram prejuízo de quase 200 bilhões de dólares em 2007? Uma primeira resposta diz respeito ao tamanho relativamente modesto dos fundos, que administram uma fração do patrimônio gerido por bancos e seguradoras. "Isso torna essas carteiras mais flexíveis, o que permite mudar as operações mais rapidamente e, com isso, evitar perdas'", diz Ken Heinz, da Hedge Fund Research. Outra razão é o fato de um número crescente de fundos aplicar parcelas importantes de suas carteiras em ações e títulos de empresas e governos de países emergentes, que têm resistido à crise, garantindo bons retornos. Existe ainda uma terceira explicação, que não chega a ser unânime entre os analistas: a maioria dos gestores de fundos de hedge aplica parte do próprio capital nas carteiras que administram. "Eles também perdem quando o fundo tem prejuízo. É diferente do modelo da maioria dos bancos, em que os gestores participam apenas dos ganhos, recebendo bônus por resultado", diz Marcelo Villela de Araújo, sócio-diretor da Quest Investimentos. Para alguns especialistas, essa diferença de tratamento levou os profissionais dos fundos de hedge a agir mais rápido para proteger seu patrimônio.
Resultados tão acima da média — e inesperados — costumam vir acompanhados de um perigo: o de sugerir uma imagem de infalibilidade. Não é esse o caso dos fundos de hedge. Apesar de nenhuma grande gestora ter quebrado até agora, algumas tiveram desempenhos negativos — em certos casos, as perdas passaram de 30%. “Além disso, pode haver prejuízos desconhecidos, porque, pela regra americana, esses fundos não são obrigados a divulgar seus números, como fazem os bancos e as seguradoras", diz Araújo. Outro problema é o fato de que ainda não se conhece toda a extensão dos problemas do mercado imobiliário americano. "Os fundos de hedge têm investimentos pesados nesse setor e nada impede que eles sejam afetados de forma mais grave no futuro", diz Lovisotto, da RiskOffice. A fama e o bônus de Paulson estão garantidos. Mas o que se viu em 2007 foi o primeiro capítulo de uma história que, segundo a maioria dos especialistas, ainda está longe de terminar.
*Um dos diretores da Risk Office é Marcelo Rabbat, que também é sócio da PR&A Consultoria, especializado em riscos de mercado e crédito e fundos hedge.
Autor: Assessoria de Imprensa Web
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