O Brasil e o Conselho de Segurança da ONU



Muito se tem dito a respeito de o Brasil, como potência emergente, almejar uma posição permanente no Conselho de Segurança da ONU, pois sua composição é obsoleta por refletir a ordem mundial surgida logo após a 2ª Guerra Mundial.

O Brasil tem feito amplo esforço diplomático ao redor do planeta a fim de convencer os mais diversos governos a apoiar sua candidatura, tentando, a todo custo, futuramente garantir, na Assembléia-Geral da ONU, o número mínimo de votos a fim de validar tal pretensão.

Ocorre que, para que o Conselho seja reformado com a admissão de novos membros permanentes, seus governos devem divulgar em que direção irão gerir a responsabilidade daí decorrente - afinal, trata-se do uso do poder de veto no órgão jurídico condutor da segurança mundial - e com que meios irão administrar as conseqüências de tão delicada escolha.

Apesar disso, o Governo Brasileiro ainda não divulgou que benefício concreto a entrada no Conselho poderá trazer ao país. Talvez porque, a priori, não haja mesmo nenhum. E, pior que não haver qualquer benefício, são os malefícios que poderá acarretar.

Inicialmente, trata-se de algo que irá afetar nossa tradição diplomática de neutralidade, mudando drasticamente nossas relações com o resto do mundo, pois o uso do poder de veto, ou sua negação - caracterizada, inclusive, pela abstenção - é absolutamente incompatível com qualquer forma de neutralidade. O Brasil, inevitavelmente e como qualquer outro país com assento permanente, tenderia a favorecer um dos lados na votação de qualquer resolução, criando animosidades que se traduziriam em sanções econômicas por parte das grandes potências - especialmente na questão dos subsídios, em um momento no qual não se vislumbra uma saída eficaz e de curto prazo para a nova depressão econômica mundial - ou, caso vote em conformidade com suas diretrizes, em ataques terroristas ao território brasileiro. Em outras palavras, teríamos que fazer a cruel opção entre manter a paz exterior ou prosperar no ambiente da interdependência econômica global - algo que qualquer país minimamente maduro deseja.

A possibilidade de ocorrerem atentados terroristas no Brasil é a mais assustadora, já que atualmente a grande ameaça à segurança internacional não é representada pelas grandes potências - já que todas são aliadas - mas por grupos fundamentalistas, como a Al-Qaeda, que, contrariamente ao que vem sendo divulgado, não lutam apenas contra os Estados Unidos e seus mais próximos aliados da OTAN:sua luta é contra o Ocidente, entendido não só como um conceito geográfico, mas como o sistema de valores que, capitaneados pela democracia laica, surgiu neste Hemisfério. O Brasil, sendo Ocidente no duplo sentido, ficaria vulnerável em todas as frentes.

A Al-Qaeda, e outros similares, possuem células terroristas em dezenas de países, desde os de teocracia islâmica até os que são seus meros simpatizantes. Portanto, futura e eventual resolução autorizando ofensiva militar de potências ocidentais no território de qualquer desses Estados, a fim de neutralizar tais células, com o apoio explícito (no caso de voto favorável) ou implícito (no caso de abstenção, caracterizada pela ausência de voto favorável e pela presença do não-veto) do Brasil, certamente nos colocaria em grande e desnecessário perigo, que, se concretizado, faria com que ficássemos impossibilitados de ter qualquer reação externa: afinal, não sendo um ataque de outro Estado Nacional formalmente constituído, com suas forças armadas regulares, e sim, como já dito, de grupos dentre muitos radicados em dezenas de Estados, estaria inviabilizada uma declaração formal de guerra - o máximo a ser feito seria a investigação policial interna para prender e julgar os executores como criminosos comuns.

Por outro lado, mesmo que viesse a ser provado o apoio material e/ou logístico de determinado país ou grupos de países à ação terrorista, tornando possível uma ou mais declarações formais de guerra, nossas Forças Armadas, apesar de bem treinadas e determinadas, não teriam como se manter em estado de beligerância por longos períodos, dada a ausência de armamento tecnologicamente apropriado, fundamental para a sobrevida das tropas.

Como o custo político, para qualquer governo, de uma não-reação minimamente proporcional e eficaz seria fatal, seríamos obrigados a pedir auxílio militar às grandes potências, que o condicionariam a nosso apoio permanente nas resoluções no Conselho de Segurança - o que daria legalidade às suas ações externas, por mais absurdas e arbitrárias que viessem a ser. Seríamos lançados em uma constante espiral simbiótica de dependência-violência que nos obrigaria a, como na Guerra Fria, pender para apenas um lado do conflito. Nossa ideologização forçada nas relações internacionais estaria formada, não mais nos permitindo o retorno à boa e velha condição de neutralidade e nos mantendo em permanente estado de tensão bélica.

A absurda pretensão do Governo Brasileiro é uma faca de dois gumes. Não satisfeito em fazer vigorar, no plano interno, atos executivos inúteis e desconexos da realidade, quer transplantá-los para a política internacional, e de um modo que pode determinar o encerramento do único serviço público mantido incólume por décadas: a manutenção constante da paz exterior.

Leôncio de Aguiar Vasconcellos Filho
Autor: Leôncio de Aguiar Vasconcellos Filho


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