Relativização Da Coisa Julga Na Investigação De Paternidade



1. INTRODUÇÃO

Tema dos mais relevantes que tem sido objeto de debates no meio jurídico é o que trata das hipóteses de relativização da coisa julgada nas ações de investigação de paternidade. Falar em relativização da coisa julgada nos dias de hoje significa desmistificar um instituto que desde a sua criação até bem pouco tempo foi visto como algo absolutamente imutável. Não se pode mais ter aquela noção de antes que afirmava que a coisa julgada transformava o branco em preto ou o redondo em quadrado; por outro lado, não se pode defender uma banalização do instituto, mas apenas uma reformulação condizente com o ideal que se tem atualmente sobre a busca da efetividade do processo, sobretudo em matéria de família.

Antes do advento do exame de DNA, o juiz, ao julgar as causas, valia-se das provas das quais dispunha, provas essas, muitas vezes insuficientes para se chegar a uma certeza inequívoca sobre a real paternidade. Eram realizados exames de sangue e produzidos outros meios de provas a fim de se chegar a uma conclusão sobre o final da demanda, quase sempre por presunção.

O ponto nevrálgico é investigar se há ou não a possibilidade de revolver processos findos antes do advento do DNA, período em que não era possível conhecer a verdade real dos fatos em face da "insuficiência" de provas trazidas aos autos do processo. Ao se optar pela admissão da revisão processual, restará mitigada a coisa julgada, trazendo o problema da relativização da segurança jurídica que sempre foi vista como imutável. Por outro lado, se a opção for pela não possibilidade da mitigação da coisa julgada, haverá afronta à dignidade da pessoa humana, ou seja, tanto o suposto pai quanto a criança (e nesse caso a afronta será vista como maior, pois conforme o caso, ofenderá a dignidade da pessoa em condição peculiar de desenvolvimento), sofrerão um abalo em sua dignidade.

Certo, porém, é que tais deficiências no âmbito processualnão podem prejudicar as partes, as quais zelam pela justiça, nem tampouco a sociedade que prima pela máxima segurança possível. Dentro deste contexto, lançamos o motivo do presente trabalho: discutir a questão da possibilidade de relativizar a segurança jurídica, petrificada constitucionalmente, para que em detrimento desta seja possível a aplicação da justiça ao caso concreto. O fato é que a relativização da coisa julgada não pode ser buscada aleatoriamente, em qualquer caso, mas deve observar critérios bastantespara que não haja uma banalização do instituto, gerando ainda mais injustiças e insegurança.

Durante a explanação do presente trabalho, iremos discutir o direito de família frente à Constituição Federal de 1988, a dignidade da pessoa humana, sua origem e desenvolvimento, o princípio da dignidade da pessoa humana na Constituição Brasileira de 1988 bem como frente aos princípios da igualdade e proporcionalidade, a investigação da paternidade, onde abordaremos em pequena dimensão o exame de DNA e sua evolução perante o direito, bem como observaremos uma tese envolvendo um processo negatório de paternidade.

A coisa julgada será mais amplamente discutida, momento em que serão discutidos os seus limites, a coisa julgada formal e material, a coisa julgada nas relações continuativas.

Por fim, abordaremos a relativização da coisa julgada, ocasião em que observaremos a coisa julgada e a investigação de paternidade, bem como as teses conservadoras, moderna e intermediária.


2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo Geral

A sociedade anseia por mudanças. O direito de família encontra-se em constantes transformações, sendo prestigiado pela Constituição Federal de 1988.

Deste modo o que se pretende é pesquisar e analisar a relativização da coisa julgada face à evolução social e científica, pois o Judiciário não pode agir indiferentemente a tal realidade, devendo-se amoldar-se a tais modificações.

2.2. Objetivos Específicos

O presente trabalho terá como objetivo apontar aspectos pertinentes à matéria pautada, trazendo à lume a problemática restrita ao aspecto da possibilidade de se admitir a relativização da res iudicata naquelas demandas de improcedência de investigação de paternidade que transitaram em julgado antes do advento do importante "exame de DNA".

A ciência está em franca evolução, fato esse que faz com que o direito, que é ciência dinâmica, sofra alterações diversas, uma vez que possui relações multidisciplinares, por exemplo, com a biologia, a medicina, a física, a química, dentre outras. Daí, frente à dinamização do direito, alguns assuntos não podem passar desapercebidos às novas tendências, sob pena de se consagrar a injustiça.

No ano de 1980houve um grande avanço científico no tocante a forma de se provar a paternidade. Surgiu o exame pericial de DNA, um laudo técnico que trouxe uma probabilidade quase absoluta de certeza.Ora, o legislador não pode prever todos os avanços científicos quando do processo de elaboração das leis, fato esse que faz com que ocorra muitas vezes "desencontro" entre a letra da lei e o avanço tecnológico.

Dentro deste contexto a precisão e confiabilidades quase absolutas dos resultados dos exames de DNA, que não pode ser sacralizado, mas nem por isso negado sua importância, servirá de rota a permitir a mitigação da coisa julgada, na pesquisa da verdade real, servindo de arrimo para descoberta da verdade biológica na investigação de paternidade.

3. JUSTIFICATIVA

Em razão do desenvolvimento da ciência que permite que se possa saber, com certeza quase absoluta, a existência biológica do vínculo de filiação, é uma questão que tem atormentado os operadores do direito.

A presente pesquisa aborda o significado da Coisa Julgada, ao qual o sistema jurídico protege de forma absoluta.

A Coisa Julgada é uma garantia Constitucional, uma vez que põe fim a um litígio, pois do contrário se eternizaria, transformando a sociedade em um caos.

A sentença é a lei que foi aplicada no caso concreto, e determina que as questões decididas se tornem imutáveis e criem direitos e deveres jurídicos para quem foi atingido por ela.

Durante muito tempo acreditou-se que a sentença, depois de atingida pela Coisa Julgada, representava a verdadeira vontade da lei, através da decisão do juiz ou da absoluta certeza sobre os fatos decididos, justificando a imutabilidade de sua decisão final.

Mas, com a evolução da sociedade, e da ciência genética, principalmente no que diz respeito a investigação de paternidade, fez surgir o questionamento sobre o fato de que a Coisa Julgada pode não retratar uma verdade real, sendo portanto, uma imutabilidade com finalidade evitar que se eternize os conflitos.

A Coisa Julgada começou a ser vista como uma conveniência, para que as relações jurídicas que fossem atingidas pelo efeito da sentença se recobrissem de segurança, buscando assim a paz na convivência social, mas não mais como algo inatingível.

Mas, essa busca cega pela segurança jurídica não pode desprezaroutros valores também protegidos pela Lei Maior, como a justiça e a dignidade humana.

Por isso, tem se verificado a necessidade de buscar uma forma de adaptar o instituto da Coisa Julgada à realidade do sistema jurídico, através dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, em busca de uma relativização da Coisa Julgada Material.

Muito se tem questionado sobre a necessidade de prevalecera coisa julgada em detrimento do que é justo pois as garantias constitucionais devem conviver em harmonia, e se torna importante analisar para se chegar a um tratamento diferenciado à imutabilidade da coisa julgada, com o objetivo de afastar absurdos como a impossibilidade da Lei permitir que, depois do advento da evolução genética, não se possa corrigir erros passados e dar ao indivíduo o direito de conhecer sua origem, afrontando assim o princípio da dignidade humana, não pretendendo com isso, que a imutabilidade da sentença se tornasse regra geral.

O presente estudo é para demonstrar a necessidade de reexaminar a matéria que foi proferida em uma decisão judicial com o objetivo de garantir que a decisão e os meios que se usou foram corretos e garantem uma decisão justa,e também questionar a imutabilidade da Coisa Julgada, em relação aos novos métodos que a ciência apresenta.

A pesquisa não pretende abordar todos os assuntos relacionados à Coisa Julgada, mas fazer uma análise sobre esse instituto, que não podemais ser tido como absoluto, em se tratando da paternidade, quando se tem meios de prová-la contrário.
O tema da pesquisa é de suma importância para a sociedade, para demonstrar quetanto nos tribunais como nas modernas doutrinas vem surgindoa necessidade de se questionar a imutabilidade das sentenças transitadas em julgado, através da relativização da Coisa Julgada, principalmente no que tange à investigação de paternidade.

A pesquisa não tem a intenção de retirar a autoridade da coisa julgada nem ir contra o que a Constituição Nacional lhe assegura, mas discutir sobre a harmonia entre a coisa julgada, sua imutabilidade e o princípio da dignidade do ser humano, traduzido no direito de saber seu verdadeiro pai.

Pretende também demonstra que a exigência da segurança, que a coisa Julgada proporciona, não pode ser maior do que a de justiça das decisões, pois a própria Constituição não tolera que injustiças e litígios sejam eternizados,

Portanto, justifica-se a pesquisa, no que tange à investigação de paternidade, para que seja um alerta para a necessidade de se reexaminar o instituto da Coisa Julgada para garantia da prestação jurisdicional, e sugerindo a relativização da Coisa Julgada.

4. ESTADO DA ARTE

O estudo da coisa julgada permite a obtenção de uma resposta de como se comportará o instituto nas ações de investigação de filiação. Também é preciso ter em mente que a Constituição Federal ampliou os direitos da personalidade e a ciência contribuiu com significativos avanços tecnológicos de pesquisa genética, como bem explicou o Professor Cândido Rangel Dinamarco:

Aqui tem pertinência o reclamo, já feito por estudiosos do tema, à razoabilidade interpretativa como indispensável critério a preponderar quando tais valorações são feitas nos pronunciamentos judiciais: o logos de lo razonable, da notória e prestigiosa obra de Recaséns Siches, quer que se repudiem absurdos em eternizar injustiças para evitar a eternização de incertezas. O jurista jamais conseguiria convecer o homem da rua, por exemplo, de que o não-pai deva figurar como pai no registro civil, só porque ao tempo da ação de investigação de paternidade que lhe foi movida, inexistiam os testes imunológicos de hoje e o juiz decidiu com base na prova testemunhal. Nem o contrário: não convenceríamos o homem da rua de que o filho deva ficar privado de ter um pai, porque ao tempo da ação movida inexistiam aquelas provas e a demanda foi julgada improcedente, passando inexoravelmente em julgado.

Homem da rua é o homem simples, ingênuo e destituído de conhecimento jurídicos, mas capaz de distinguir entre o bem e o mal, o sensato e o insensato, o justo e o injusto, segundo a imagem criada por Piero Calamandrei (l´uomo della strada). (DINAMARCO, 2001, p. 67).

Então, com o advento das modernas técnicas que determinam os vínculos biológicos, são construídas teses para definir como será valorada a coisa julgada nas ações de investigação de paternidade.

A tese conservadora prega a formação da coisa julgada material nas ações de investigação de paternidade, sendo impossível a desconstituição do que foi decidido anteriormente, por outra ação de conhecimento agora com o exame de DNA como mostra as jurisprudências:

STJ - Ação de negativa de paternidade. Exame pelo DNA posterior ao processo de investigação de paternidade. Coisa julgada.

1. Seria terrificante para o exercício da jurisdição que fosse abandonada a regra absoluta da coisa julgada que confere ao processo judicial força para garantir a convivência social, dirimindo os conflitos existentes. Se, fora dos casos nos quais a própria lei retira a força da coisa julgada, pudesse o magistrado abrir as comportas dos feitos já julgados para rever as decisões não haveria como vencer o caos social que se instalaria. A regra do art. 468 do Código de Processo Civil é libertadora. Ela assegura o exercício da jurisdição insuscetível de modificação. E a sabedoria do Código é revelada pelas amplas possibilidades recursais e, até mesmo, pela abertura da via rescisória naqueles casos precisos que estão elencados no art. 485.

2. Assim, a existência de um exame pelo DNA posterior ao feito já julgado, com decisão transitada em julgado, reconhecendo a paternidade, não tem o condão de reabrir a questão com uma declaratória para negar a paternidade, sendo certo que o julgado está coberto pela certeza jurídica conferida pela coisa julgada.

3.Recurso especial conhecido e provido.

(STJ, 3ª Turma, DJ de 29.06.1998, p. 160)

TJMG – Investigação de paternidade – Realização de exame de DNA – Ofensa à coisa julgada.

A propositura de segunda ação de investigação de paternidade, com identidade de partes, de fatos e fundamentos com a primeira, fundada na realização de exame de DNA não realizado na lide anterior, ofende a coisa julgada. A imprescritibilidade do direito ao estado de filiação não se confunde com a coisa julgada, sob risco de comprometer as relações sociais, com a perpetuação do litígio. (TJMG, 3ª Câmara Cível, 05.04.2002)

De acordo com o referido entendimento, trazemos as palavras de José Carlos Barbosa Moreira:

De acordo:"O domínio da técnica jurídica é predicado de que jamais se poderá prescindir num juiz; está longe, contudo, de ser bastante. Preparação adequada teria de incluir certa familiaridade com outros ramos do conhecimento humano, como a sociologia e a ciência política. As escolas de magistratura podem e devem tentar suprir lacunas e abrir novas perspectivas. Precisamos de juízes compenetrados da relevância social de sua tarefa e das repercussões que o respectivo desempenho produz no tecido da sociedade. Em época de crises reiteradas e de transformações profundas, como esta em que vivemos, o juiz vê-se convocado a dar mais que o mero cumprimento pontual de uma rotina burocrática. Por difícil que lhe seja, com a carga de trabalho que o oprime, corresponder a esse chamamento, não há como exonerá-lo de uma responsabilidade que a ninguém mais poderia atribuir. Pois a verdade é que sem a sua colaboração, por melhores leis que tenhamos, jamais lograremos construir um processo socialmente efetivo." (MOREIRA,2002, p.190).

 

Em resumo, segundo a corrente conservadora, a coisa julgada torna-se insuscetível de modificação, devido à estabilidade jurídica gerada pela sua existência. Entretanto, o juiz, na aplicação da lei ao caso concreto, deve adequá-la às novas exigências sociais, buscando em outras esferas do saber formas de atenuar o desequilíbrio entre as partes. Para tanto, não será necessário fragilizar a estrutura da coisa julgada e, sim uma forma diferenciada e inovadora em contemplá-la.

Com o intuito de dar plena efetividade ao direito de filiação em face da coisa julgada e de todos os avanços científicos em torno da determinação da paternidade biológica, estão sendo construídas teses modernas.

 Por isso, doutrinadores como o Professor Cândido Rangel Dinamarco (DINAMARCO, 2001, p. 39/40) lecionam que, em conflito de interesses, com a autoridade do trânsito em julgado de um lado, e do outro, direitos inerentes à natureza humana e protegidos constitucionalmente, a coisa julgada deva ser relativizada, pois, do contrário, poderia estar privando alguém do pai ou dando por genitor quem na realidade não o é.        

     Assim, como o estado de filiação trata-se de direito indisponível, conforme os preceitos constitucionais e infraconstitucionais, sustenta-se, que deva ser mitigado o instituto da coisa julgada, sob pena de negar ao ser humano a busca da verdadeira origem, seu vínculo biológico, pois o nome transforma o individuo em algo mais no grupo social e contribui para identificar o seu caráter.

Os avanços na área da genética, que entre outros benefícios, trouxe o exame de DNA, que manifesta certeza acerca da paternidade quase absoluta, são uma realidade que não pode ser subtraída das partes que, no processo anterior, não tiveram a possibilidade de realizá-los. Para afirmar esta tese, eis a lição do Professor Cândido Rangel Dinamarco:

Um óbvio predicado essencial à tutela jurisdicional, que a doutrina moderna alcandora e realça, é o da justiça das decisões. Essa preocupação não é apenas minha: a doutrina e os tribunais começam a despertar para a necessidade de repensar a garantia constitucional e o instituto técnico-processual da coisa julgada, na consciência de que não é legítimo eternizar injustiças a pretexto de evitar a eternização de incertezas.

Com preocupações dessa ordem é que, em seguidas manifestações como magistrado e como conferencista, o Ministro José Delgado defende uma "conceituação da coisa julgada em face dos princípios da moralidade pública e da segurança jurídica," fórmula essa que em si é uma proposta de visão equilibrada do instituto, inerente ao binômio justiça-segurança. Do mesmo modo, também Humberto Theodoro Júnior postula esse equilíbrio, em parecer onde enfrenta o tema do erro material arredio à autoridade do julgado. E conhece-se também a posição assumida pelo procurador de justiça Hugo Nigro Mazzilli "ao defender a necessidade de mitigar a coisa julgada". Esses e outros pensamentos, aos quais associo uma interessantíssima narrativa de Eduardo Couture e importantes precedentes do Supremo Tribunal Federal e do direito norte-americano, abrem caminho para a tese relativizadora dos rigores da auctoritas rei judicatae e autorizam as reflexões que a seguir virão, todas elas apoiadas na idéia de que "levou-se muito longe a noção de res judicata, chegando-se ao absurdo de querê-lo capaz de criar uma outra realidade, fazer de albo nigrum e mudar falsum in verum" (Pontes de Miranda)

De minha parte, pus em destaque a necessidade de produzir resultados justos, quando há mais de dez anos disse: "em paralelismo com o bem-comum como síntese dos objetivos do Estado contemporâneo, figura o valor justiça como objetivo-síntese da jurisdição no plano social". Essas palavras estão em minha tese acadêmica escrita no ano de 1986, incluídas em um capítulo denominado Justiça nas Decisões. Em outro tópico da obra, disse também que "eliminar conflitos mediante critérios justos" é o mais nobre dos objetivos de todo sistema processual. São essas as premissas, de resto já referidas logo ao início, sobre as quais cuido de assentar a proposta de um correto e razoável dimensionamento do poder imunizador da coisa julgada, relativizando o significado dessa garantia constitucional e harmonizando-o naquele equílibrio sistemático de que falo". (DINAMARCO, 2001, p. 39/40)

Ainda como crítica, há autores que sustentam que a relativização da coisa julgada no ordenamento jurídico somente será aceita se consagrada em lei, pois ao garantir um valor, outros, como a garantia e a certeza, estariam violados.

Eis a razão pela qual alguns Tribunais não admitem a nova propositura de uma ação investigatória com base em novas provas:

Investigação de Paternidade. Renovação da Ação. Impossibilidade. Coisa Julgada. Existindo decisão definitiva de improcedência de anterior ação de investigação de paternidade, esta sacralizada a coisa julgada (art. 5º,inc. XXXV, CF/88), não podendo nova ação ser proposta apenas porque viável, agora, realização de exame pelo método do DNA. Sentença que julgou extinta a ação mantida. Apelação desprovida, por maioria, vencido o relator. (Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. 8ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 70003605425. Relator: Rui Portanova. Data do julgamento: 07.03.2002.)

Investigação de Paternidade- Realização de Exame de DNA - Ofensa à coisa julgada. A propositura de segunda ação de investigação de paternidade, com identidade de partes, de fatos e fundamentos com a primeira, fundada na realização de Exame de DNA não realizado na lide anterior, ofende a coisa julgada. A imprescritibilidade do direito ao estado de filiação não se confunde com a coisa julgada, sob risco de comprometer as relações sociais, com a perpetuação do litígio. (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. 3ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento n.º 000.260.075-7/00. Relator: Aloysio Nogueira. Data do julgamento: 05.09.2002)

Apresenta a mesma crítica o Desembargador Humberto Theodoro Júnior, sustentando que a flexibilização da coisa julgada está sujeita à autorização legislativa, excluída a possibilidade de o julgador flexibilizar de ofício a coisa julgada:

"Acontece que esse tipo de subtração da sentença à autoridade de coisa julgada, no todo ou em parte, somente pode provir da lei e não da vontade criativa do intérprete ou do juiz. E não há regra alguma, no direito positivo pátrio, que exclua a sentença da ação de investigação de paternidade do regime geral da res iudicata". (THEODORO JÚNIOR, 1999, p. 22).

 Por isso, não pode prevalecer a tese de que qualquer juiz ou Tribunal possa desrespeitar a coisa julgada a pretexto de injustiça ou erro. São oportunas as considerações do Prof. Goffredo Telles Júnior sobre o poder sem base na lei:

"O poder não fundado na lei, o poder discricionário. É, exatamente, o poder que odiamos, porque é o poder dos ditadores e dos tiranos. É o poder que odiamos, mesmo quando esse poder está nas mãos de juízes. Sim. é certo, situações de injustiça social existem, por toda parte, e não há dúvida que a justiça humana é imperfeita. Mas, ainda mais imperfeita se tornará, se ela for entregue ao arbítrio dos juízes". (TELLES JÚNIOR, 1999, p.161.)

Logo, a relativização da coisa julgada quando a sentença diz respeito aos vínculos biológicos deve ser evitada no ordenamento jurídico brasileiro para evitar incertezas nas decisões judiciais, e quem sabe até mesmo injustiças, pois ficaria ao livre arbítrio do juiz mitigar a coisa julgada sem respaldo legal, fato que, por si só, fere a tradição jurídica brasileira. Sem contar que o exame de DNA não apresenta a certeza absoluta, como também é sujeito a falhas técnicas e humanas e, de forma nenhuma, pode constituir-se argumento sustentável para afastar a eficácia da coisa julgada material.

Entretanto, no ordenamento positivo pátrio, devem ser buscados meios para manter a segurança e a paz social e ao mesmo tempo equilibrar valores tão caros ao ser humano, que são o direito de descobrir suas raízes e o desejo de vincular-se com quem lhe deu a vida. Daí surge a tese intermediária.

Por isso, é injusto que, diante de um conjunto probatório insuficiente, o filho fique privado de conhecer seus laços ancestrais, ao ser impedido de ajuizar uma nova ação e ao mesmo tempo ser condenado a não ter ad eternum sua verdadeira paternidade. Conforme a doutrina: "Falta ou Deficiência de Provas. Coisa julgada ocorre inexoravelmente no processo, tenham ou não sido produzidas provas. Não é possível a repropositura de ação, onde se deu a coisa julgada material, invocando-se falta, deficiência ou novas provas."(Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil em vigor, 2003, p 677)

Doutrinadores como a Desembargadora Maria Berenice Dias sustentam que nas ações investigatórias somente haverá a formação de coisa julgada material se houver o exaurimento de todos os meios de prova, respaldando-se na formação da coisa julgada formal.Eis a lição:

"A ausência de prova, que no juízo criminal enseja a absolvição, ainda que não tenha correspondência na esfera cível, não pode levar a um juízo de improcedência, mediante sentença definitiva, conforme preconiza Humberto Theodoro Júnior.

Há antecedentes legais. Na ação civil pública (art. 16 da Lei nº 7.347/85) e nas ações coletivas que trata o Código de Defesa do Consumidor (art. 103), está, de forma expressa, afastada a eficácia erga omnes quando a ação é julgada improcedente por ausência de prova, autorizando qualquer legitimado a intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

 Ainda que ditas disposições sejam tidas como verdadeiras excrescência ao princípio da estabilidade jurídica, não se pode deixar de invocar como precedentes a autorizarem o afastamento dos efeitos da coisa julgada quando a ação diz com o estado da pessoa. A omissão do próprio demandado ou do Estado em viabilizar a realização da prova não permite a formação de um juízo de convicção, a ser selado pelo manto da imutabilidade de identificar a existência ou concluir pela existência do direito invocado na inicial, omissão probatória, no entanto, que, não podendo ser imputada ao investigante, não pode apená-lo com uma sentença definitiva". (DIAS, 1999, p. 18).

O Jurista Belmiro Pedro Welter também sustenta a formação de coisa julgada apenas formal nas ações de investigação de paternidade quando insuficientes forem os meios de prova para formar a convicção do julgador. Vem a talho a lição:

"Somente haverá coisa julgada material, nas ações de investigação e contestação de paternidade, quando tiverem sido produzidas, inclusive de ofício e sempre que possível, todas as provas, documental, testemunhal, pericial, especialmente exame genético DNA, e depoimento pessoal". (WELTER, 2000, p. 113)

Então, para uma consciente e equilibrada análise de direitos fundamentais em conflito, no caso a coisa julgada e o direito à dignidade humana, exige-se a sensibilidade do julgador diante do caso concreto, já que o juiz, nos dias atuais, com significativos avanços científicos, é desafiado a adotar uma postura ativa e criativa na interpretação da lei e, se for necessário, adaptá-la aos valores e transformações da sociedade, e não desprezar ou tornar inválido um deles. Sobre o equilíbrio de valores basta a sensibilidade do julgador diante do caso concreto, eis a doutrina: "A existência do princípio da proporcionalidade no nosso sistema não depende, assim, de estar contido em uma formulação textual na constituição. Desde que seja possível hauri-lo de outros princípios constitucionais, estará caracterizado e, de resto, sua aplicação será obra dos Tribunais." (BARROS, 1996, p.87).

O juiz, como se sabe, não deve subserviência à lei, principalmente àquelas que se afiguram injustas, Se a justiça da lei é apenas duvidosa, o juiz pode, em regra, decidir segundo a lei, se, ao contrário, a injustiça da lei é manifesta, não pode cooperar em sua execução.

A segurança representada pela coisa julgada (art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal) e o direito à filiação e à paternidade responsável (art. 226 da Constituição Federal), intimamente ligados ao princípio da dignidade da pessoa humana, devem ser sopesados e, aplicando-se o princípio da proporcionalidade, impera que prevaleça o direito do filho em saber quem é seu ascendente.

Todavia, diante do exposto na tese intermediária ora estudada, deverá prevalecer o que???? Vê-se que caberá ao magistrado a imposição do que melhor atender aos litigantes e, poderá basear-se não somente na parte genética/biológica, mas também nos interesses sócio-afetivos da família.

Deverá, pois, observar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana juntamente com o Princípio da Solidariedade.

5. METODOLOGIA

O instrumento para o presente trabalho será uma vasta pesquisa bibliográfica, utilizando a opinião sobre o assunto abordado, dos autores citados. A leitura desses autores permitirá identificar o material para a realização da monografia.

Depois de feita a leitura da revisão bibliográfica, e de todo material pesquisado, nos possibilitará um posicionamento sobre o tema.

O levantamento das informações também passará pelas teses conservadora, moderna e intermediária, quais os aspectos de cada uma, buscando mostrar as várias correntes sobre a relativização da coisa julgada com o advento do teste de DNA principalmente no que tange a investigação de paternidade.

Serão utilizados entre artigos publicados no meio eletrônico, jurisprudências e julgados dos tribunais para que seja feita uma análise com as teorias explicitadas e se mostre viável a aplicação da relativização da coisa julgada.

6. CRONOGRAMA

Descrição/Mês

Ago/07

Set

Out

Nov

Dez

Jan/08

Fev

Mar

Abr

Mai

jun

Escolha do tema com o orientador

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Montagem do Projeto

 

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Levantamento Bibliográfico

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Estudo sobre o tema

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Entrega do projeto de pesquisa

 

 

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Elaboração da Monografia

 

 

 

 

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Revisão da Monografia

 

 

 

 

 

 

 

 

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Apresentação à Banca

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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 7. BIBLIOGRAFIA

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Tribunal de Justiça do Paraná. 5ª Câmara Cível.Agravo de instrumento n.º 00668711. Relator: Cunha Ribas. Data do julgamento: 01.12.1998.

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 8ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 70003605425. Relator: Rui Portanova. Data do julgamento: 07.03.2002; Apelação Cível nº 70002610012, 7ª Câmara Cível do TJRS, Soledade, Rel. Des. José Carlos Teixeira Giorgis. j. 12.09.2001.

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Autor: Jeanne D'Arc Maia de Resende e Alvarenga


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