REFORMAS EDUCACIONAIS E A PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PAULO: PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES.



Conhecendo a proposta

 

            A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, lançou no ano de 2008 uma proposta curricular para ser implementada de forma imediata em todas as escolas da rede pública do Estado de São Paulo.  O projeto, que segundo a Secretária da Educação do Estado de São Paulo Professora Maria Helena Guimarães Castro é ousado e inovador, está apoiado na utilização de vários materiais pedagógicos (SEE/SP, 2008).

            Estes materiais (apostilas no formato cartilha, jornal e DVDs) foram enviados à todas as escolas da rede (Equipe Gestora  Diretor, Vice-Diretor e Coordenador Pedagógico -, professores e alunos) com orientações específicas sobre sua utilização na unidade escolar (SEE/SP, 2008).

            A Coordenadora Geral do Projeto Maria Inês Fini, afirmou na apresentação da Revista do Professor  que foi distribuída em todas as escolas da rede pública estadual, independente da escola ser da zona rural ou urbana - que compreende que professores e alunos são únicos e que o material disponibilizado servirá de referência para as práticas em sala de aula (SEE/SP, 2008).

            O primeiro material elaborado por uma equipe técnica da SEE/SP e distribuído em todas as escolas da rede pública estadual de São Paulo foi o Jornal do Aluno  no formato de um Jornal e entregue a todos os alunos (os professores também receberam um exemplar de acordo com a disciplina/série que ele ministra aulas)  e a Revista do Professor  entregue a todos os professores. De acordo com orientações da Secretaria de Estado da Educação, este material, indicado para ser utilizado nos primeiros 40 dias letivos do ano de 2008 (entre os dias 18 de fevereiro e 30 de março de 2008), objetivou subsidiar tanto professores quanto alunos na realização das atividades em sala de aula durante o denominado período de recuperação intensiva e privilegiou a leitura, a produção de textos e a matemática (SEE/SP, 2008).

            O Jornal do Aluno foi organizado por áreas facilitando a compreensão do leitor e a Revista do Professor subsidiou a aplicação das atividades propostas no referido Jornal.  O material foi dividido em fundamental e médio, por disciplina/série e apresentava em seu teor o número específico de aulas necessárias para a aplicação de cada conteúdo pré-determinado e trouxe de forma detalhada possibilidades de aplicação e de avaliação das atividades propostas para o aluno portador do Jornal (SEE/SP, 2008).

            A Revista do Professor apresenta também:

[...] as habilidades que foram previstas para recuperar/consolidar; o modo de o professor se preparar para aplicar a aula; os recursos necessários; o modo de direcionar e motivar os alunos; o tempo previsto; o modo de organizar a classe para as tarefas; o modo de avaliar e corrigir os produtos da atividade (SEE/SP, 2008, p. 13).

            Além da Revista do Professor e do Jornal do Aluno, os professores e equipe gestora receberam também orientações por meio de vídeos tutoriais que apresentaram os princípios da organização do material (SEE/SP, 2008).

            Segundo informações constantes na Revista do professor, As habilidades de leitura e produção de textos serão privilegiadas nas disciplinas Língua Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna, Arte, Educação Física, História e Filosofia e não exclui o desenvolvimento de outras habilidades (SEE/SP, 2008, p. 15).

 

A Proposta Curricular

 

            Depois de enviar o material do período de recuperação intensiva  Jornal do Aluno, Revista do Professor e Vídeos Tutoriais  a Secretaria de Estado da Educação envia um novo material indicando os conteúdos a serem trabalhados pelo professor no ano letivo de 2008, informando que o período inicial do ano letivo  período entre os dias 18 de fevereiro de 30 de março -, foi apenas um período de recuperação e que o trabalho com os conteúdos do primeiro bimestre se iniciaram com a chegada deste novo material também em formato de cartilha, denominado Cadernos do Professor. 

O material que apresenta os Cadernos do Professor é uma outra cartilha confeccionada sob a coordenação de Maria Inês Fini, denominada Proposta Curricular do Estado de São Paulo  disciplina especificada  Ensino Fundamental Ciclo II e Ensino Médio.

            O texto de Apresentação da Cartilha vem assinado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro, que justifica a necessidade de uma Proposta Curricular com a seguinte frase: A criação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), que deu autonomia às escolas para que definissem seus próprios projetos pedagógicos, foi um passo importante.  Ao longo do tempo, porém, essa tática descentralizada mostrou-se ineficiente. (SEE/SP, 2008a, s/p.).

            Por conta desta ineficiência, a Secretária da Educação do Estado de São Paulo salienta que se faz necessária uma [...] ação integrada e articulada [...], que também subsidie os profissionais da rede.  Finalizando o texto de apresentação, afirma: Mais do que simples orientação, o que propomos, com a elaboração da Proposta Curricular e de todo o material que a integra, é que nossa ação tenha um foco definido. (SEE/SP, 2008a, s/p.).

            A Proposta Curricular foi dividida em áreas, a saber: Ciências da Natureza e suas Tecnologias,  Biologia, Química e Física  Matemática e Ciências Humanas e suas Tecnologias  História, Geografia, Filosofia, Sociologia e Psicologia  e Linguagens, Códigos e suas Tecnologias  Língua Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna, Arte e Educação Física.

            A apresentação da Proposta Curricular do Estado de São Paulo está dividida em dois tópicos: Uma educação à altura dos desafios contemporâneos e Princípios para um currículo comprometido com o seu tempo.  Este segundo tópico apresenta os seguintes itens: I) Uma escola que também aprende; II) O currículo como espaço de cultura; III) As competências como referência; IV) Prioridade para a competência da leitura e da escrita; V) Articulação das competências para aprender e VI) Articulação com o mundo do trabalho.  Assegura ainda que esta iniciativa procura [...] garantir a todos uma base comum de conhecimentos e competências, para que nossas escolas funcionem de fato como uma rede [...] priorizando a competência de leitura e escrita (SEE/SP, 2008a).

            Ainda nesta apresentação, são citados outros materiais que darão suporte à Proposta Curricular, como por exemplo, as Orientações para a Gestão do Currículo na Escola dirigido à equipe gestora, e os Cadernos do Professor (SEE/SP, 2008a).

            O texto de apresentação afirma que a sociedade do século XXI

[...] é cada vez mais caracterizada pelo uso intensivo do conhecimento, seja pra trabalhar, conviver ou exercer a cidadania, seja para cuidar do ambiente em que se vive.  Essa sociedade, produto da revolução tecnológica que se acelerou na segunda metade do século passado e dos processos políticos que redesenharam as relações mundiais, já está gerando um novo tipo de desigualdade, ou exclusão, ligada ao uso das tecnologias de comunicação que hoje mediam o acesso ao conhecimento e aos bens culturais (SEE/SP, 2008a, p. 9).

            Afirma também que por conta do maior número de pessoas portadoras de um diploma de nível superior, este deixou de ser um diferencial, sendo então, mais relevantes as características cognitivas e afetivas e as competências apreendidas na vida escolar.  Neste sentido, a qualidade da educação oferecida nas escolas públicas para as camadas mais pobres da população é fundamental para a inserção do indivíduo no mundo de [...] modo produtivo e solidário. (SEE/SP, 2008a, p. 10).

            Adverte que [...] não há liberdade sem possibilidade de escolhas [...], portanto é necessário que os alunos tenham [...] acesso a um amplo conhecimento dado por uma educação geral, articuladora, que transite entre o local e o mundial [...] (SEE/SP, 2008a, p. 11).

            A Proposta Curricular ora discutida apresenta como princípios centrais: [...] a escola que aprende, o currículo como espaço de cultura, as competências como eixo de aprendizagem, a prioridade da competência de leitura e de escrita, a articulação das competências para aprender e a contextualização no mundo do trabalho, (SEE/SP, 2008a, p. 11).

            Tendo um currículo que promove a aprendizagem de competências e habilidades, a atuação do professor, os conteúdos propostos, as metodologias e a aprendizagem dos alunos compõem um sistema comprometido com a formação de crianças e jovens em adultos aptos a exercer suas responsabilidades  trabalhar, constituir uma família e ser autônomo  e com condições de atuar na sociedade de forma produtiva (SEE/SP, 2008a).

            Este currículo amparado no conceito de competências propõe que a escola e os professores indiquem claramente o que o aluno vai aprender, o que é indispensável que este aluno aprenda, garantindo desta forma a todos [...] igualdade de oportunidades, diversidade de tratamento e unidade de resultados.  Quando os pontos de partida são diferentes, é preciso tratar diferentemente os desiguais para garantir a todos uma base comum. (SEE/SP, 2008a, p. 15).

            Justificando a ênfase na centralidade da linguagem nos processos de desenvolvimento, a Proposta Curricular propõe que o adolescente aprenda pouco a pouco, a enfrentar as conseqüências das próprias ações, [...] a propor e alterar contratos, a respeitar e criticar normas, a formular seu próprio projeto de vida e a tecer seus sonhos de transformação do mundo. E é responsabilidade de todos os professores esta aprendizagem (SEE/SP, 2008a, p. 17-8).

            Lembrando sempre que a quantidade e a qualidade do conhecimento devem ser [...] determinadas por sua relevância para a vida de hoje e do futuro, além dos limites da escola. Portanto, mais que os conteúdos isolados, as competências são guias eficazes para educar para a vida. (SEE/SP, 2008a, p. 18).

            A Proposta Curricular faz menção também à necessidade da articulação da educação com o mundo do trabalho, reforçando a necessidade da alfabetização tecnológica básica, no sentido de preparar os alunos para a inserção num mundo em que a tecnologia está cada vez mais presente na vida das pessoas e também da compreensão dos fundamentos científicos e tecnológicos da produção de bens e serviços necessários à vida (SEE/SP, 2008a).

            Segundo a Proposta Curricular, o trabalho passa por transformações profundas e afirma que:

[...] À medida que a tecnologia vai substituindo os trabalhadores por autômatos na linha de montagem e nas tarefas de rotina, as competências para trabalhar em ilhas de produção, associar concepção e execução, resolver problemas e tomar decisões tornam-se mais importantes do que conhecimentos e habilidades voltados para postos específicos de trabalho. (SEE/SP, 2008a, p. 24).

            Dando continuidade à política educacional delineada no ano de 2008 por meio de um novo modelo de proposta curricular  neste ano de 2009, a proposta se torna definitivamente currículo  além do material disponibilizado aos professores  Caderno do Professor por disciplina, série e bimestre  a SEE/SP envia também às escolas o Caderno do Aluno, também divididos por disciplina/série/bimestre.

            O Caderno do aluno possui a mesma disposição de textos, figuras e gráficos semelhantes com a do professor, porém, com espaços para responderem no mesmo caderno, dicas de pesquisas filmes, livros e sites. Além disso, com a intenção de complementar o trabalho na sala de aula e contribuir para a formação do aluno, este caderno oferece as Lições de casa. De acordo com introdução dada no Caderno do aluno é por meio de estudos e da realização das tarefas que você poderá conquistar a autonomia para aprender sempre (SEE/SP, 2009).

Neste sentido, cabe ao professor a tarefa de orientar os estudos, esclarecer dúvidas, retomar conteúdos e fazer revisões, enquanto que o aluno, por meio do seu Caderno deverá:

Ler ou reler textos indicados pelo professor; fazer e refazer exercícios para compreender melhor um conteúdo; realizar pesquisas para ampliar ou aprofundar conhecimentos sobre um assunto; e refletir sobre um tema ou assunto de uma disciplina. (SEE/SP, 2009)

            Portanto, de acordo com a Proposta Curricular implementada no ano de 2008 pela SEE/SP e configurada como currículo oficial no ano de 2009, além da ênfase na centralidade da linguagem nos processos de desenvolvimento dos alunos, amparada em habilidades e competências, os conteúdos propostos devem estar articulados com a repetição de tarefas e com o mundo do trabalho. 

 

A questão das reformas educacionais e da autonomia

 

            Depois de fazer uma apanhado geral sobre os materiais da Proposta Curricular do Governo do Estado de São Paulo  agora já denominado currículo  especificamente, especificamente, passamos a expor algumas discussões dando ênfase na relação entre as reformas educacionais da década de 90 do Século passado com o fim da autonomia do professor.

            Nesta discussão sobre as reformas educacionais brasileira, é importante ressaltar as discussões ocorridas anteriormente por organismos internacionais.  Uma delas é a elaboração da Declaração da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em 1990 em Jomtien, Tailândia.  Esta Conferência, patrocinada pelo Banco Mundial e outras agências internacionais traz algumas discussões que nos remete à Proposta Curricular elaborada pela SEE/SP, implementada no ano de 2008 nas escolas da rede pública do Estado de São Paulo, da mesma forma que a elaboração do Relatório Delors também contempla estas discussões.

            A referida Declaração trata da satisfação das necessidades básicas de aprendizagem e afirma que todos os indivíduos devem ter condições de aprender a ler, escrever, expressar-se oralmente, calcular e resolver problemas, de modo que possam sobreviver, desenvolver suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade e continuar aprendendo (BRASIL, 2006)

            Também trata da necessidade da concentração de todos os esforços na aprendizagem dos educandos, munidos de conhecimentos úteis, habilidades de raciocínio, aptidões e valores e afirma que a educação básica deve ser universalizada, sem que se perca a qualidade além de se tomar medidas efetivas para reduzir as desigualdades e que esta se torne equitativa (BRASIL, 2006).

            Já o Relatório Delors, - Relatório para a UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura - da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI trata desse aprendizado útil onde a [...] educação deve transmitir de fato, de forma maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber evolutivos, adaptados à civilização cognitiva (DELORS, 1998, p. 89).

            Outro órgão internacional que vem discutindo e intervindo na educação nacional é o Banco Mundial, que sistematicamente apresenta pacotes de medidas organizadas por economistas dentro da lógica e da análise econômica, com o intuito de melhorar o acesso, promover a equidade e garantir a qualidade dos sistemas escolares por meio de reformas educacionais que em última instância devem possibilitar aos educandos as habilidades requeridas pelo mundo do trabalho.  Para Torres (1998, p. 134-5) na concepção do Banco Mundial a qualidade educativa está pautada no investimento em três itens:

(a) Aumentar o tempo de instrução, através da prolongação do ano escolar, da flexibilização e adequação dos horários, e da atribuição de tarefas de casa; (b) proporcionar livros didáticos, vistos como a expressão operativa do currículo e contando em eles como compensadores dos baixos níveis de formação docente. Recomenda aos países que deixem a produção e distribuição dos livros didáticos em mãos do setor privado, que capacitem os professores na sua utilização, além de elaborar guias didáticos para estes últimos e (c) melhorar o conhecimento dos professores (privilegiando a capacitação em serviço sobre a formação inicial e estimulando modalidades á distância.

            Segundo Torres (1998), o Banco Mundial recomenda que a elaboração do currículo seja feita de forma restrita pelo poder central e também define a educação como um campo sem especificidade ou discussão pedagógica, [...] no qual confluem e interatuam insumos ao invés de pessoas, resultados ao invés de processos, quantidades ao invés de qualidades (TORRES, 1998, p. 141).  E diz ainda que para os técnicos do Banco Mundial o currículo é basicamente conteúdos.  Este currículo define as matérias a serem ensinadas apresentando um guia geral sobre os objetivos a serem alcançados, estratégias, métodos, materiais de ensino, critérios e métodos de avaliação.

            Com relação às reformas educacionais ocorridas nos anos noventa do Século passado, Neves (2000) diz que a indissociabilidade entre a economia e a política se refletiu na política educacional com a elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos que vislumbrava elevar o nível mínimo de escolaridade dos brasileiros e a melhoria da qualidade de ensino.

            Para Oliveira (2004) as reformas educacionais propostas nos anos 90 do Século passado, o eixo principal da educação passa a ser a equidade social, contando com o apoio da comunidade escolar e tendo como objetivo principal formar indivíduos para a empregabilidade trazendo mudanças significativas para os trabalhadores docentes, principalmente questões relacionadas à flexibilização, desvalorização, desqualificação e precarização do trabalho docente, provocando uma reestruturação do trabalho pedagógico.

            Oliveira (2004) esclarece ainda que com as determinações da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em 1990 em Jomtien na Tailândia, onde os países presentes se comprometeram em implementar uma reforma educacional que viabilizasse a expansão da educação básica buscando a redução das desigualdades sociais.

            Neste sentido, as reformas educacionais ocorridas no Brasil nos anos 90 do Século passado assumiram um duplo enfoque: Por um lado tem-se uma educação dirigida à formação para o trabalho e por outro lado a gestão da pobreza.  Desta forma, afirma Oliveira (2004, p. 1131) [...] tais reformas serão marcadas pela padronização e massificação de certos processos administrativos e pedagógicos, sob o argumento da organização sistêmica, da garantia da suposta universalidade [...].

            Hypolito (1991, p. 4) afirma que na década de noventa do Século passado a escola brasileira passou por várias modificações em termos de estrutura e de organização e cita que:

[...] a escola transitou de um modelo tradicional, que se caracterizava pela autonomia do professor em relação ao ensino e à organização escolar e por processos burocráticos praticamente inexistentes, para um modelo técnico-burocrático, caracterizado pela redução da autonomia do professor em relação ao ensino e à organização da escola [...].

            Enguita (1993, p. 283), alerta para a utilização da escola como disseminador da lógica do capital a partir do momento em que os governos utilizam materiais padronizados que [...] geralmente contém declarações de objetivos, todo o conteúdo e material curricular necessário, especificações prévias das ações a serem desenvolvidas pelos professores e as respostas apropriadas por parte dos estudantes e teste de diagnóstico e de resultado coordenados com o sistema.

            O mesmo autor afirma ainda que tais pacotes didáticos permitem às empresas que os produzem intervir diretamente no conteúdo a ser ensinado e

[...] submetem os professores a funções de mera execução, arrancando-lhes a capacidade de conceber o currículo ou a pedagogia; tornam mais difícil em geral para o pessoal docente o controle formal e informal sobre as decisões didáticas; eliminam a necessidade de uma coordenação ativa entre os professores, pois esta já vem pronta de fora; fazem com que os professores se vejam divorciados de seus colegas e de seu material de trabalho; reduzem o conhecimento a uma série de habilidades acumuláveis e calculáveis [...] (ENGUITA, 1993, p. 283).

            Corroborando esta afirmação de Enguita (1993, p. 283), Hypólito (1991, p. 17) relata que o [...] o processo de dominação e controle sobre o trabalho dos educadores não se dá somente no que se refere ao conteúdo do ensino, mas também sobre a forma de transmissão desse conteúdo.  E segue dizendo que os pacotes pedagógicos adotados com conhecimentos compilados para a orientação do trabalho em sala de aula é fundamental para a expropriação do saber do educador.

            Aliada á questão da perda de autonomia dos professores na implementação de seu trabalho, temos outra discussão apresentada por Jáen (1991) que trata da teoria da proletarização aplicada aos docentes, caracterizada pela degradação das condições de trabalho. 

            Estas condições de trabalho estão relacionadas segundo Jáen (1991, p. 75) [...] à expropriação dos conhecimentos necessários para a produção [...] excluídos da concepção do processo produtivo e do próprio trabalho [...] e dependentes, por tudo isso, em grau crescente do controle e das decisões do capital [...].

            De acordo com os autores citados anteriormente, há uma interferência dos organismos internacionais na elaboração da política educacional proposta a partir da reforma educacional dos anos 90 do Século passado com a adoção de pacotes pedagógicos que trazem para o centro da discussão a aprendizagem e não o ensino, bem como um processo de dominação e controle sobre o trabalho dos educadores.

 

Conclusões parciais

 

            Primeiramente gostaria de salientar que a Proposta Curricular apresentada pela Secretaria de Estado da Educação de São Paulo em 2008 e posta como currículo oficial no ano de 2009, não deve ser encarada como uma Proposta e sim como um pacote educacional.  Esta afirmação advém do fato de não ter havido efetivamente discussões com o corpo docente das unidades escolares sobre a referida proposta.  Sua implementação veio de forma autoritária, não dando em nenhum momento chance do professor  na ponta do processo educativo  ler, discutir, concordar ou discordar da proposta.

            O currículo escolar de São Paulo, como pode ser verificado, atende inteiramente ás determinações dos organismos internacionais, particularmente do Banco Mundial, a partir do momento que: Para cumprir com o conteúdo proposto pela SEE/SP é necessário que os alunos façam uma série de trabalhos escolares em suas casas, já que este conteúdo não terá condições de ser ensinado em sala de aula por falta de tempo hábil; A produção dos livros didáticos  conforme recomenda o Banco Mundial  está nas mãos das grandes editoras; Os professores recebem regularmente capacitações  seja por meio de orientações técnicas ou por meio de vídeo conferências  para a utilização do material didático elaborado e entregue a todos os professores de acordo com a disciplina/série/bimestre.

            Além disso, com a distribuição destes materiais  Jornal do Aluno, Revista do Professor, Proposta Curricular, Caderno do Professor e Caderno do Aluno  os professores ficam responsáveis meramente pela reprodução dos conteúdos propostos  conteúdos estes que são pensados a partir da lógica do capital  sem efetivamente conceber seu material de trabalho, reduzindo seus conhecimentos a habilidades acumuláveis e calculáveis.

            Os materiais distribuídos pela SEE/SP, também atendendo às definições da reforma educacional dos anos 90 do Século passado defendem uma educação dirigida para o mundo do trabalho, pela massificação do conhecimento útil e pela equidade e não igualdade de condições, defendendo uma suposta universalidade, que de fato não ocorre a partir do momento em que se trata de forma igual os desiguais.

            Pelo acima exposto, é possível considerar que o currículo organizado e implementado pela SEE/SP está intrinsecamente ligada às políticas educacionais definidas pelo Banco Mundial e outras agências internacionais no sentido de educar para o mundo do trabalho, ensinando aos alunos conhecimentos úteis para o mercado, para o capital.  Neste processo, os professores são obrigados a aceitar um pacote pedagógico sem nenhuma discussão prévia, perdendo sua autonomia com relação à seleção dos conteúdos e a execução de seu trabalho.

 

Referências Bibliográficas

BRASIL. UNESCO Brasil. Declaração Conferência Mundial sobre Educação para Todos. Disponível em: _pdf/decjomtien>. Acesso em: 19 ago. 2006.

DELORS, Jaques. Educação. Um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 1998.

ENGUITA, Mariano Fernandez. Trabalho, escola e ideologia: Marx e a crítica da educação. Porto Alegre: Artes Médicas Sul. 1993.

HYPOLITO, Alvaro Moreira. Processo de trabalho na escola: Algumas categorias para análise.  Teoria & Educação, n. 4, Porto Alegre, RS: Pannonica Editora Ltda. 1991. p. 3-21.

JÁEN, Maria Jiménez. Os docentes e a racionalização do trabalho em educação: Elementos para uma crítica da teoria da proletarização dos docentes. Teoria & Educação.  N. 4, Porto Alegre, RS: Pannonica Editora Ltda. 1991. p.74-91.

OLIVEIRA, Dalila Andrade.  A reestruturação do trabalho docente: precarização e flexibilização.  Educação & Sociedade, Campinas, v. 25, n 89, p. 1127-1144, Set./Dez. 2004.

NEVES, Lúcia Maria Wanderley. Determinantes das mudanças no conteúdo das propostas educacionais no Brasil dos anos 90: Período Itamar Franco. In: ______. (Org.). Educação e Política no limiar do Século XXI. Campinas, SP: Autores Associados, 2000. p. 5-58.

SEE/SP. Secretaria de Estado da Educação de São Paulo. Edição Especial da Proposta Curricular. Revista do Professor. São Paulo: IMESP. 2008.

TORRES, Rosa Maria. Melhorar a qualidade da educação básica? As estratégias do Banco Mundial. In: TOMMASI, Livia de; WARDE, Mirian Jorge; HADDAD, Sérgio (Orgs.) O Banco Mundial e as políticas educacionais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1998. p. 125-186.

 


Autor: Marcilene Moura


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