DITADURA MUSICAL



  *Marinho do Nordeste (Idemar Marinho) Emissoras de rádio e televisão brasileiras, que se afirmam ter um compromisso definido dentro da soberania nacional, assimilam, importam e divulgam a cultura musical. No meio dessa grade aviltante para quem quer desfrutar da boa música, permite-se a introdução de alguns programas que, de ordinário, só podem tocar ícones da música nacional, com ênfase para aqueles que têm sua obra estribada nos umbrais da alma estrangeira. Nunca se procurou, até aqui, cobrar a carga horária das rádios e instituições oficiais sustentadas pelo suor do trabalhador. Quanto de produto nacional está veiculando? Pergunta que tende a ficar no ar durante, ainda, muito tempo, até que se dê a devida importância ao nosso povo. Não se trata de favor ou acordo de cavalheiros coagidos pela hegemonia da imprensa submissa, dependente e carente de um sistema engordado e mantido por ela própria. Numa época em que o mundo começa a redescobrir a linguagem brasileira, críticos e comunicadores respeitados pelo público, decerto porque, sutilmente, podem manipulá-lo como desejam, omitindo-lhe o que gostaria de ouvir, expressam a ignorância de afirmar que nossa música vai muito bem obrigado! Tudo continua sendo levado a público em tabletes de conteúdo e dimensões adrede, cuidadosamente, muito bem empacotados e amarrados, para que o ouvinte não questione, não pergunte e nem reclame de nada. Não incomode! E tem sempre um bom consumidor desses produtos porque, como se sabe o espectador brasileiro também é bonzinho! A extinção maquiavélica dos programas ao vivo, tanto no rádio quanto na TV; as longas e autênticas edições enfileirando artistas que se destacavam pelo talento e não pela cotação de suas bolsas de valores; a massiva repetição e endeusamento de nomes e mitos que fizeram e fazem a história da música internacional; a petulância de órgãos governamentais promovendo festivais que financiam a banda podre da música estrangeira; crianças aprendendo em casa e na escola a superestimar a música alienígena, alimentando descrédito ao autor brasileiro; a discriminante e mentirosa justificativa de que a partitura tomjobiniana é superior aos rapps, forrapps e funks fielmente sonorizados nos centros e periferias de toda a nação; a vergonhosa distorção das leis de incentivo à cultura; o desconhecimento científico de que não houve outra safra de artistas genuinamente brasileiros no decorrer dos últimos 50 anos, até numa roupa nova de modelagem psicofísica que pudessem fazer por merecer a mínima atenção dos especialistas; o monopólio dos espaços jornalísticos por aqueles que detêm o poder econômico, tudo isso nos dá uma pálida idéia de como anda o Brasil na preservação de sua identidade cultural. Uma orquestra de câmera não é melhor nem pior que o improvisado ré bemol de João do Pife. Não é a melodia ou a tessitura de uma obra que vai determinar o seu valor real. É o que a obra estará trazendo em termos de construção humana, questionando seus atavismos perniciosos e receios de expansão e compreensão do complexo universo em que vivemos, prisma de relevante teor, reputado de secundária e, mais, nula importância.Chega-se a afirmar, com certa razão, que não existem mais músicos e compositores brasileiros. Mas nós estamos aqui trabalhando em nossos cortiços. Quem conhece o interior sabe que é só aparente o caráter subliminar das abelhas. Quando se olha para as caatingas ou para um cortiço na mata atlântica, não se tem a menor noção de quantas abelhas ali se criam e se movimentam, nem qual o volume de mel dentro de cada oco de pau. Enxerga-se tão-somente a paisagem ou, quando muito, uma oropa aqui e outra ali. E quando se extrai o mel, o inseto é obrigado a abandonar o local. Quem ainda não conhece a ciência das abelhas, imagina que elas nunca mais retornarão ao cortiço, ou que. para onde migraram. não mais fabricarão o doce mel, por desalojadas que parecem estar. Acredita-se que, dispersas, as abelhas vão vagar para sempre sem rumo. Mas isto não ocorre. As abelhas permanecerão vivas e prósperas. Juntam-se, de novo, umas às outras e recomeçam a tarefa ainda com mais vigor. No próximo inverno haverá mel de correição!Parecem compreender a lei de solidariedade! Mas o que ocorre com as abelhas não se verifica com os artistas. Divididos em classes e castas, cada um ostentando seu supremacismo tolo, evitam-se. Não se tocam. Estão todos ali no mesmo avião. Porém mal se percebem. A menos que& Desconhecem-se. E mesmo assim, há milênios, ufanam-se da desarmonia! Do ódio, do medo e da violência& Tudo fazem, mas em proveito próprio. Estão encarcerados em cápsulas como se fossem objetos dentro de uma sacola de aço. Assim somos nós. Mais de 20 milhões. Músicos. Roteiristas. Diretores. Brasileiros. De renome. Corda e focinheira  ainda  dos norte-américo-japoneses-holandeses& Ó, Pátrias amadas idolatradas! Brasil. Cantarolando, assando e comendo e pensando exatamente como eles querem. Como os grandes ditadores da música assim o desejam.  Por que será que nossas emissoras continuam priorizando a péssima música estrangeira? Vergonha num país como o Brasil, nossas artes, nossas raízes arrancadas e jogadas ao esgoto, local onde deveriam estar toda a mentira que nos contam e cantam esses perigosos traficantes da cultura. O grande equívoco do difusor musical é impor ao artista nato a condição de patrocinador. Ora, aqueles que vivemos a música somos humildes trabalhadores braçais que mal sustentam a família. Seus filhos não frequentam escolas caras, nunca chegarão a uma faculdade. Andam a pé e de estômagos vazios. Não sabem se expressar como os executivos. Não têm a sutileza nem a diplomacia dos empresários. Nunca serão vistos em eventos sociais e recepções de celebridades. Como será a qualidade, o exterior de seus discos? Será, naturalmente, precário. Toda essa massa está irremediavelmente fora do contexto musical. Sem levar em conta estas limitações tão claras, o comunicador inconsequente exige desses artistas um absurdo e volumoso quite de produtos musicais como garantia de atenção. A primeira condição é que essas músicas não sejam produzidas em casa com os meios ao alcance, ainda que digitalizados por profissional competente. E notificam: para gáudio do ouvinte, essa classe de artistas desapareceu para sempre! Mantém-se, assim, uma política de exclusão falsamente defendida pela questão da qualidade. Cria-se uma contracultura igualmente nociva, perniciosa. Insurgem-se, aqui e ali, apadrinhados pelos contraventores da mídia, belicosos e perigosos capatazes da música. Com raríssimas exceções são os ex-carpinteiros, ex-boiadeiros, ex-brasileiros que, por abuso de poder econômico, inconscientemente, passam a humilhar seus mesmos pares e manipular o mercado. Nada contra os heróicos filhos de Francisco que são, como outros poucos, resposta concreta do que somos capazes. O compromisso do rádio brasileiro hoje, como tão bem exemplifica a Rádio Grande Rio de Petrolina, devia ser o de desmantelar e não paramentar os cartéis musicais que afrontam e utilizam o próprio poder constituído para aviltar a memória brasileira. Os romanos, quando, em praça pública, viram os gregos manifestando as artes cênicas, questionando a política e a aristocracia, cuidaram logo de transformá-los em propagandistas do império. Assim, somos os Caetanos, os Ramalhos, os Amados, muitos, entretanto, padecendo sono e menosprezo à porta das grandes empresas de comunicação. Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro, para citar apenas estes dois nomes grandiosos, por um bom período, foram induzidos a fazer uso constante de indumentárias e expressões da cultura americana para sobreviver como artistas brasileiros. Reza a cartilha da crítica imparcial que somente muito depois combateram o processo de degradação da nossa música. À época, instintivamente, os meninos do Brasil adotávamos determinadas formas de comportamento do povo americano porque nossos pais, nossos professores, nossos meios de comunicação já eram orientados ou forçados a isso. Não apenas porque éramos um país essencialmente simples. Fosse à praia ou no sertão, sentíamo-nos bem no fulgor do trópico usando as roupas grossas porque, na expressão nordestina, as famosas camisas de banlon eram lindas e confortáveis. Ainda hoje sentimo-nos muito confortáveis vestindo a calças jeans, os sapatos italianos! Até dizemos que eles são marcas nacionais! Nunca procuramos saber sua origem nem os critérios pelos quais chegaram ao nosso vestuário. Dizem que não é esta ingênua passividade que vai determinar o grau de aculturação das massas. Mas sabemos que isso acontece de maneira organizada, por ideologia orquestrada, com métodos políticos e econômicos que atingem seus objetivos de cima para baixo. A sertaneja que dá ao filho o sugestivo nome de Wesley o faz com um profundo sentimento de americanismo, sim. O modo é que é subjetivo, espontâneo. Não se trata, entretanto, de gesto antinacionalista porque não houve a intenção.  Incentivaram-nos a tirar um presidente da República porque diziam que ele estava acabando com o país. Entraram no palácio dizendo que iriam moralizar a cultura e as artes. Onde a ética? Agora não conseguimos mais tirar nem um secretário de prefeito que zomba da nossa inteligência. Este sistema cultural que avilta o sentimento brasileiro precisa ser mais discutido em público. Lembramos aqui a divinização de Licurgo, o magnânimo legislador grego. Tudo que de Licurgo viesse era bom, inclusive as leis que sancionavam o genocídio e as guerras espartanas. Ai de quem as contradissesse. Licurgo era um grande legislador! Mas ninguém lembra, sequer de soslaio, que Esparta passou para a história como o berço do crime e da crueldade, consequências que vão influenciar o mundo moderno.Todo déspota necessita de portões e muralhas por dois motivos principais. Primeiro para que seus cúmplices não o deixem a sós e segundo para que a plebe não o incomode.  O músico, o artista de menor poder aquisitivo é discriminado e rejeitado como se fosse marginal malfeitor. Quem não sonha não realiza o impossível. Mas nem como fabricador de sonhos é visto este cidadão brasileiro. Façam algo! Não nos peçam projetos. Somos páginas vivas.
Autor: Marinho Do Nordeste


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