O ovo da serpente e o mercado da dança do ventre



Há cerca de oito anos (3-3-2002), durante o Primeiro Simpósio de Dança do Ventre em São Paulo, foi publicado o Código de Ética da Dança do Ventre, sob a iniciativa de Shalimar Mattar, editora do jornal Oriente, Encanto e Magia, com a colaboração de várias pessoas envolvidas com a dança do ventre (professoras, bailarinas e estudantes). O código objetiva organizar e valorizar o segmento envolvido com a dança do ventre no Brasil.

Achei a iniciativa louvável e, claro, participei com sugestões e observações (sou a participante nº 239!), entretanto, após todo esse tempo, gostaria de ressaltar que não tem havido aplicação prática desse código de orientação por parte dos indivíduos que atuam na dança do ventre especificamente em Brasília, cidade onde moro.

Com a crise mundial, nesses últimos meses, observou-se uma queda expressiva no mercado da dança do ventre relativo a shows e ao ensino. É claro que esse mercado não está isolado dos outros mercados. Sejam eles relativos à dança, ou não. Diante dessa constatação, é óbvio que a dança do ventre iria ser atingida. Quando é necessário fazer-se corte no orçamento para equilibrar as contas, as pessoas o fazem nas áreas que julgam supérfluas. Desse modo, as danças, os hobbies e os cursos que não estejam ligados ao aperfeiçoamento profissional são logo retirados da lista. Com medo da seriedade da crise, as pessoas ou estão sendo mais criteriosas ao gastar, ou efetivamente não estão consumindo como antes.

Isso é um fato e é perfeitamente natural!

Entretanto o que preocupa são as seguintes constatações:

 prática de concorrência desleal e até predatória; propagação de inverdades e até mesmo mentiras sobre a dança   do ventre e todo o universo que a envolve; orientação equivocada sobre postura em vários lugares, sejam   eventos, encontros etc.; incentivo ao imediatismo para o aprendizado em sala de aula.

Pude verificar que tem-se alastrado no ramo da dança do ventre, desde longa data, uma prática condenável em qualquer ramo comercial: o dumping.

O estabelecimento por academias e estúdios de preços inferiores aos praticados pelo mercado para pagamento de mensalidades é inaceitável! Tal hábito atinge diretamente os recebimentos dos professores, que têm se mostrado enormemente desmotivados, pois afeta a capacidade de investir na reciclagem e na busca de atualização de conteúdos para o ensino.

A situação com relação aos shows e aos cachês pagos beira o escândalo! Os preços praticados pelas bailarinas de dança do ventre desvalorizam a categoria, além de ser uma atitude execrável a concorrência desleal e antiética ao oferecer-se um show abaixo do que está estabelecido por uma profissional que por ventura esteja se apresentando num determinado local. Deve-se ter cuidado com essas armadilhas! Os comerciantes e contratantes particulares querem acima de tudo reduzir seus custos e a atitude ética é o que menos importa para eles.

Outro ponto é a propagação de inverdades sobre as bases da dança do ventre, que vão desde as informações a respeito da origem e da história, as habilidades necessárias para a prática e o tempo que se leva para aprender a dança do ventre, até as orientações sobre como se comportar em sala de aula, shows ou encontros. É preocupante o imediatismo presente em sala de aula para o aprendizado da dança.

Estamos diante de um impasse! Temos que reavaliar totalmente nossa postura tendo em vista essas constatações. Nós, como profissionais, é que devemos primar por uma conduta adequada diante de nossos pares, pois são eles que nos apoiam (ou isolam) no meio da dança do ventre.

Devemos ter o pé no chão! Quem consome dança do ventre é quem faz e produz dança do ventre (professora, aluna, bailarina e empreendedor). Ao se tentar boicotar um ou outro produtor de dança do ventre, o que se atinge é o mercado potencial que consumirá dança do ventre. No melhor estilo do adágio popular: atira-se no que se vê, mas acerta-se no que não foi visto. Na área de dança árabe, essa mira não tem sido positiva. Concretamente esse boicote é um tiro no pé (ou seria na cabeça!), pois atinge também quem boicota. É uma questão de lógica! Tudo está interligado.

A concomitância de eventos no nosso meio (workshops, shows e espetáculos) tem demonstrado a postura de impedir que as alunas conheçam outros estilos e outras escolas. As pessoas são livres e têm também o pensamento livre e agem livremente. E quem se deixa aprisionar por qualquer não pode isso, não pode aquilo demonstra que estará mesmo à mercê da vontade dos outros.

Essas ações gerarão reflexos incontestáveis da inexorável gestação de um ovo de serpente.

O que pode produzir um ovo de serpente de positivo? Através de sua membrana transparente pode-se acompanhar o desenvolvimento do monstro que está sendo gerado. Ao chocá-lo, somente sairá de lá uma serpente pronta para realizar sua missão maléfica de destruição. Uma vez que algumas serpentes produzem veneno que, além de trazer risco de morte, possue propriedade necrosante, destruidora.

O ovo de serpente que está sendo chocado no meio da dança do ventre corroerá (se é que já não correu!) por dentro nossos valores, nossas crenças. Se chocado, por sua natureza, se tornará nocivo. Assim, faz-se necessário destrui-lo, enquanto está na casca, da mesma forma como o fez Brutus, na peça Júlio César, de William Shakespeare ao justificar a necessidade de que o monarca Júlio César deveria ser morto e depois matá-lo nas escadas do Senado romano.


Autor: Luzimar Paiva


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