A Respeito Do Aborto



Questões que envolvem as pessoas em elos sentimentais nunca são fáceis de discutir. Ao falar do tema proposto, o aborto, temos que conseguir enxergar que as diversas opiniões a respeito de tal atitude são tomadas na maioria das vezes com base no senso e opinião comum. Foucault já dizia que qualquer assunto relacionado à sexualidade, incluindo a gravidez, tem fortes tendências de ser debatido com base no pensamento cristão. A Igreja Católica quando teve a oportunidade de alavancar suas influências, modificou totalmente o pensamento humano. A Igreja nesta época pega para si o papel de destruidora das opiniões, crenças e virtudes que faziam parte do paganismo anterior a ela. Ao destruir toda uma cultura a Igreja implanta na sociedade novos valores, valores tais que serviriam aos interesses da comentada instituição e, é claro, valores estes que servem como base para formação de opiniões no mundo moderno e contemporâneo.

Ao debatermos a questão do aborto nos deparamos com dois grandes problemas: um sentimental e outro por falta de ceticismo.

Na maioria das vezes que ouvimos uma opinião contrária a liberação do aborto, ouvimos, e muito, dizer do direito à vida. Ótimo, mas vamos um pouco além desta idéia simplista de direito à vida. Ao declararmos este direito entramos automaticamente em uma forte questão filosófica: O que é a vida? O que é viver? Qual a importância da vida sem viver? Além disso, vemos certa contradição e uma discriminação a este direito. A pessoa que defende o direito à vida vai privilegiar algumas situações como:

-Este direito é válido para os seres humanos: tendo em vista que das pessoas que afirmam o direito à vida biológica todas já tiraram alguma vida, seja de um inseto, uma bactéria ou uma planta, fica de fato incoerente a afirmação delas. Portanto concluímos, sem muito esforço, que o direito é válido para seres humanos, pois, somos seres mais evoluídos e superiores aos outros seres vivos. Mesmo assim, sou obrigado a mostrar que ao tentar corrigir os problemas da sua posição, o anti-abortista recorre ao conceito de ser humano, mas assim encaramos uma outra questão que seria o que é o ser humano senão uma construção moral e social? Pois bem, o feto (pasmem anti-abortistas) não é nada mais nada menos do que um amontoado de células cancerosas humanas consideradas como um ser vivo, mas nunca um ser humano.

-Este direito é válido para os seres humanos moralmente aceitos pela sociedade: vendo que mais da metade da população brasileira apóia a pena de morte, tomamos conhecimento de que aí se encontra uma enorme contradição, se a maioria das pessoas defendem o direito a vida por que essa maioria é a mesma que quer matar certas pessoas?

É muito interessante e importante termos ao menos um pouco de ceticismo quando se trata de formar opinião. É de praxe da grande maioria da população mundial adotar para si as constatações massistas, recebem as coisas todas mastigadas e deixam de lado alguns questionamentos e métodos que poderiam ajudar a ter uma opinião mais forte. Ao dizer que necessitamos ser céticos eu quero dizer para o caro receptor que ele comece a questionar certas coisas. No nosso caso, do aborto, poderia ser visto de outra forma se as pessoas se perguntassem: Porque eu penso assim? A minha opinião é mesmo própria ou foi formada por um outro alguém? O que me fez pensar assim, quais são minhas influências? Eu de fato acredito no que eu penso pensar?

Uma outra questão relativamente importante é observarmos os parâmetros sociais e vermos que a questão do aborto geralmente é repudiada por fatores sentimentais ligados ao meio social. Quase todas as mulheres quando engravidam criam com o ser que está dentro de seu útero uma forte ligação afetiva. Essa afetividade vem de sua formação moral que se desenvolveu a partir de seus contatos sociais, além é claro, que pelos mesmos motivos da futura mãe, todas as pessoas que a circundam exigem desta mulher este sentimento afetivo. Portanto é fácil de compreender o porque de tantas pessoas serem contra o aborto.

Porém devemos analisar certos fatores. A quem defende o direito a vida eu diria e indagaria que a vida só importa mesmo quando for social, contudo, enquanto a vida se limitar à vida biológica ela não tem valor. Seguindo a mesma linha de pensamento de alguns filósofos tais como John Locke e Jean-Jacque Rousseau que declaram os Direitos inalienáveis do homem, dentre os quais o direito à vida, temos que interpreta-los de maneira correta. Quando estes filósofos dizem que todo homem tem direito à vida, à igualdade e à liberdade, eles incluem como homem todas as pessoas que estão no convívio social. Portanto um feto não é incluído nos direitos inalienáveis, pois ele não pode ser considerado como um ser social e muito menos moral.

Dentre tudo eu me pergunto: ao defender o aborto eu me insiro em um problema moral? Eu firo os direitos inalienáveis do homem? Para ambas perguntas a mesma reposta: não. A moral como sendo uma certa forma individual de pensar e refletir me dá a liberdade de ver que o aborto não é algo "desumano", é simplesmente uma forma de não colocar no mundo um ser indesejável ou um ser que não deva estar aqui, ou seja, é simplesmente uma questão de sensatez.


Autor: Raffael Cantú


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