HISTÓRIA E MEMÓRIA



HISTÓRIA E MEMÓRIA
Micheline Odorizzi Paschoa
Profº Diego Finder Machado
Pós-Graduação AUPEX - História Cultural - Trabalho da disciplina História e Literatura.
30/10/2009


A história e a memória confundem-se por vezes, sendo muitas vezes quase indissociáveis, pois ambas tem como objetivo primordial relembrar fatos e acontecimentos do passado, apesar de ambas utilizarem modos diferentes de expor este mesmo passado. O historiador tem a preocupação com a junção de fatos oficiais e documentos fragmentados, que organizados passam a enredar a história pela narrativa do historiador dando-lhe os contornos necessários.
A memória difere da história, pois o personagem é o foco principal, é ele que dá voz a própria história, pois vivenciou os acontecimentos como personagem principal. "A história oral é aceita pela disciplina acadêmica, que há mutias décadas, considera totalmente legitimas as fontes testemunhais orais (e por instantes, dá impressão de julgá-las mais "reveladoras")." (SARLO, p.12)
A história de acordo com Sarlo, é a reconstrução do passado organizado pela narrativa, persegue, escraviza e liberta, segue princípios metodológicos e a formulas explicativas por vezes incompreensíveis. As décadas de história formal banalizada no simbologismo exacerbado, a qual Nietzsche chamou de "história dos antiquários". Principalmente com advento do positivismo a preservação do heroísmo reservou o contexto da história acadêmica.
A forma com a história organizava-se ocultava a história da vida, de lembrança da maior parte da população relegada à margem da sociedade. O distanciamento se evidencia nas regras e métodos, a preocupação excessiva com a comprovação das fontes enquanto a memória transita no cotidiano das pessoas nas vivencias e na construção de sua própria história, ou seja, a história ideológica voltada aos relatos vivenciados pelos agentes e sujeitos da própria história, isto ocorreu há apenas algumas décadas, quando historiadores refutaram ao simbologismo e voltaram seus interesses aos sujeitos invisíveis da sociedade. A principio de acordo com Sarlo (2007), a história ganhou nesta trajetória contornos romantescos, aos poucos foi ganhando a espaço acadêmico o que propiciou um reordenamento metodológico. A história oral se tornou objeto de conservação da lembrança e reparação da identidade.
Porem os conflitos entre história e memória tem se evidenciado a partir de então, se estabelecendo a partir de que a narrativa oficial não se complementa com a oralidade. Não deveria existir distanciamento entre as palavras em pauta, porém às vezes tem-se a sensação que estão em vias contrárias. Para História factual-oficial delineada pela elite (vencedor) não acredita na história oral, verbalizada por meio de uma pessoa anônima. Pois geralmente de que classe social a história omite dos seus escritos. O relato dos anônimos, o cotidiano daqueles (as) que não é mencionado nos livros didáticos. Pensamos que o receio da história em dar credibilidade à memória e pelo fato dessa informação ser oriunda oralidade, e por sua vez a memória desconfie da história em virtude do sectismo em dar o real valor aos sentimentos da lembrança de forma significativa.
Cabe mencionar que essa duas vertentes na verdade é uma só, pois o objetivo maior e dar visão aquelas verdades que estavam adormecidas e são despertadas pelo resgate da memória. Grande parte dos trabalhos em comunidades quilombolas, para garantir o direito à terra aos descendentes desses núcleos de resistência, se dá pela via de entrevistas. Com intuito de resgatar a história daquele segmento da população, que poderá se perder no tempo caso não seja realizado o vivamento da memória.
Um exemplo que se encaixa nesta questão, é sobre a guerra de Tróia. Durante um bom tempo esse acontecimento era concebido como uma lenda, que resistiu ao tempo pela oralidade na contação de história, em algumas comunidades indígenas a oralidade é a forma de repassar a cultura daquela etnia. Antes da escrita os valores e costumes eram repassados aos demais membros da comunidade pela verbalização. Até mesmo quando realizamos a linha da divisão da história para nossos alunos, o marco da história se dá com o surgimento da escrita.
Acreditamos que atualmente esse distanciamento está cada vez menos importante, pois por meio de trabalhos acadêmicos visualizamos a importância da história oral. A memória é uma ferramenta há mais no estudo da história, ou seja, temos um arsenal de possibilidades. Não podemos enaltecer uma em detrimento de outra
Os conflitos entre história e memória ultrapassam de acordo com a visão critica estabelecida por Huyssen é pelo fato da história ter enredado pela comercialização de fatos passando a ser utilizado o imaginário como fonte principal no relembrar dos fatos, o que incutem na venda da história da memória inventada (que não corresponde à realidade do fato). "Em suma a memória se tornou uma obsessão cultural de proporções monumentais em todos os pontos do Planeta" (HUYSSEN, p.16), ou seja, a fabricação da história vendável ao comércio da memória. A memória imaginada e inventada compõe muitas vezes o comércio cinematográfico, que vende como verdade algo que não faz parte da realidade, o que põe em risco o uso da memória com complemento da história. Mesmo diante dos riscos da memória inventada, a memória certamente é o ícone que vem a complementar a história, dando-lhes infinitas possibilidades de recordar o passado que mais se aproxime da realidade, deve-se, no entanto cuidado com os excessos imaginativos.

REFERÊNCIAS

HUYSSEN, Andréas. Seduzidos pela Memória: arquitetura, monumentos, mídia. Trad. de Sérgio Alcides. Rio de Janeiro: Aeroplano. 2000.

SARLO, Beatriz. Tempo Passado: cultura da memória guinada subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras; Belo Horizonte: UFMG, 2007.


3.1 DOCUMENTOS CONSULTADOS

BURKE, Peter. Variedades da História Cultural. São Paulo- Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

MENEZES, Ulpiano Bezerra de. A Crise da Memória, História e documentos reflexões para um tempo de transformações. In: SILVA, Zélia Lopes (org.). Arquivos, patrimônio e memória: trajetórias e perspectivas. São Paulo: UNESP, 1999.


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