A Formação Do Currículo E As Políticas Públicas




A construção do currículo no Brasil sofreu forte influência americana principalmente nos anos 60 e 70. A transferência de teorias curriculares estrangeiras para o Brasil ocorreu em dois grandes momentos. O primeiro perdurou até o inicio dos anos 80. Quando existiu a tentativa de adaptação instrumental do pensamento americano, só que houve uma resistência a esse modelo devido ás circunstâncias políticas, econômicas, culturais e educacionais do nosso país em contraste com o contexto internacional. Durante o segundo momento ocorreram significativas mudanças políticas e econômicas tanto no cenário nacional como no panorama internacional.

 Oscilou-se, então, entre a tentativa de rejeição para a simples da experiência americana e a adaptação critica dessa e outras experiências, na busca de um desenvolvimento mais independente no campo doCurrículo. Foi á segunda perspectiva que no final da década de 1980, acabou por torna-se hegemônica.

Uma pesquisa realizada por Moreira (1980), que analisou criticamente esse fenômeno e captou o inicio de uma importante transformação na teorização curricular no Brasil a luta por criar um campo mais autônomo, que não negasse a produção estrangeira, mas que a assimilasse criticamente, em uma adaptação que envolvesse a analise tanto da adequação à realidade brasileira como pressupostos ideológicos subjacentes. A conseqüência acabou sendo um campo que reflete contemporaneamente uma variada influência de autores e teorias de diferentes países.

Os principais autores do currículo no Brasil reconhecem essas influências, ressaltando, contudo, sua ambivalência. Por um lado enfatizam a importância de conhecer o que está sendo formulado em países nos quais se desenvolvem significativos estudos de questões curriculares. Por outro, sustentam que devemos ser mais críticos em relação a esse discurso e precisamos desenvolver analises mais adequadas ao contexto brasileiro. (Moreira,1996, p.12)

 Existem ainda outros fatores que precisam ser levados em conta em relação à questão da transferência educacional. Há que se registrar a presença do Banco Mundial na definição de nossas políticas educativas. Apesar da redução dos projetos internacionais, principalmente americanos, de “ajuda” à América Latina, após o fim da Guerra Fria, o impacto do Banco Mundial nas recentes políticas desses e de outros países não pode ser secundarizado. Os critérios para a concessão de empréstimos e as orientações gerais do banco exprimem a prevalência da lógica financeira sobre a lógica social, subordinado o setor da educação à racionalidade do universo econômico.

Vale destacar ainda os princípios da ideologia neoliberal, difundidos por grande parte do mundo e escolhidos e adaptados, no Brasil para compor o pano de fundo das políticas dos últimos governos.

Coerentes com as diretrizes do Banco Mundial, esses princípios também têm sido utilizados na educação, e norteiam uma série de medidas que em por objetivo tornar a educação mais competitiva, mais produtiva, mais sintonizada com as demandas das empresas e das indústrias.  Dentre elas mencionamos a adoção de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), proposto pelo Ministério de Educação e do Desporto e formulado por comissões que tiveram como consultor o psicólogo espanhol César Coll, adepto ao construtivismo e também consultor da reforma curricular espanhola. Segundo Silva (1996), suas idéias e seus livros, hoje bastante divulgados entre nós parecem estar afetando tanto a formulação das propostas curriculares como a teorização do currículo dada a sua afinidade com a onda construtivista que, de forma avassaladora, tem percorrido a educação brasileira e constituído um referencial privilegiado das analises psicológica contemporânea de currículo.

O currículo tem um papel fundamental na transformação do sistema educacional assim como, ele indica que tipo de homem irá compor a sociedade daqui a 15 anos, serão críticos ou não e que tipo de valores terão força. A comparação de recentes reformas realizadas nos Estados Unidos, na Grã-Bretanha, no Brasil e na Argentina evidência aspectos comuns, que podem ser vistos, portanto, como tendências internacionais em cujo âmbito elas se situam. São elas: a) adoção de um modelo centralizado de currículo coexistente com processos de desregulação de outros aspectos de educação; b) recurso a equipes de notáveis para a definição do conhecimento oficial; c) elaboração de propostas detalhadas, extensas e complexas; d) associação do currículo com o sistema nacional de avaliação.

 Esta análise serve como ponto de partida para contextualização do cenário educacional no Brasil e para entender o quanto, a educação está presa e entrelaçada a questões culturais, políticas e econômicas e destacar ainda a pouca autonomia educacional do Brasil.

O Currículo e a globalização
  A globalização iniciada nos anos 90 vem configurando o panorama das políticas públicas em educação e, particularmente, em currículo. A reconfiguração do mundo global não significa a homogeneização das políticas em nível mundial.

Segundo Ball (1998), o processo de elaboração de políticas educacionais não é harmonioso, embora siga uma lógica predominante de mercado. As arquiteturas políticas, assim como as infra-estruturas e ideologias regionais, reconfiguram as idéias globais recebidas pelos diferentes países. As políticas globais passam a ser “uma mistura de lógicas globais, distantes e locais”

 Na medida em que se vinculam políticas educacionais e interesses econômicos globais passa-se a pensar em uma política educacional baseada na lógica do mercado e voltado para ele.. A globalização da economia sugere novas formas de produção e substituindo essas linhas de produção a mundo estaria exigindo uma nova configuração do conhecimento. A idéia da utilidade do conhecimento embora destacada como fundamental nos diversos discursos sobre políticas educacionais tende a não se transformar em realidade, certamente isso não ocorre por acaso, por incompetência ou pelas amarras das disciplinas, mas porque o conhecimento constitui um poderoso elemento de diferenciação social, portanto, essa fragmentação proposta é proposital, assim como seguir a tendência de preparar o homem para o mercado globalizado.

As políticas educacionais e as reformas curriculares deveriam centrar suas preocupações na disseminação do conhecimento e não na manutenção do poder.  Em busca de qualidade É cada vez mais categórico o discurso que afirma a urgência das reformais educacionais visando a melhoria da qualidade de educação ministradas pelo sistema de ensino, principalmente no relacionamento a educação básica.

A principal preocupação das reformas educativas inspiradas no modelo proposto pelo Banco Mundial é a melhoria da qualidade da educação. Nesse modelo, a qualidade da educação e concebida como resultado de diferentes variáveis que intervêm na educação escolar. Essa relação à escola fundamental são nove os fatores considerados determinantes na aprendizagem, de acordo com estudos e pesquisas analisadas e promovidas pelo banco.

 São de ordem  de prioridade: bibliotecas, tempo de instrução, dever de casa, livros didáticos, conhecimentos do professor, experiências do professor, laboratórios, salário do professor e número de alunos por turma. O banco prioriza, em suas recomendações e conclusões, investimentos nos seguintes aspectos: aumente do tempo de instrução, por meio da ampliação do ano escolar; ´porém desde de 1996 que a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) definia na Lei 5692/96 em seu artigo 19 a obrigatoriedade de ingresso de criança de 6 anos no ensino fundamental  acrescentando, portanto, um ano de escolaridade; da  flexibilidade e da adequação de horário; reforço do dever de casa, oferta de livros didáticos, considerados expressão operativa do currículo e elementos e compensadores de baixos níveis de formação decentes; melhoria dos conhecimentos dos professores, privilegiando-se a formação continuada em detrimento da formação inicial e estimulando-se os sistemas de educação à distância.

Contudo, desestimula-se o investimento nos seguintes aspectos: laboratórios, salários dos professores e quantidade de alunos por turma. A hierarquia de investimento proposto pelo Banco Mundial evidência, mais uma vez, a lógica que orienta sua política, fundamentalmente econômica.

O modelo educativo que nos propõe o Banco Mundial é um modelo essencialmente escolar com duas grandes ausências: os professores e a pedagogia. Um modelo escolar configurado em torno de variáveis e observáveis e quantificáveis, e que não comporta os aspectos especificamente qualitativos, ou seja, aqueles que não podem ser medidos, mas que constituem a essência da educação. (Torres, 1996, p.139)

Chama-se bastante atenção a pouca sensibilidade das propostas do banco Mundial à valorização econômica do professor. Conhecedor dos baixos salários dos docentes, principalmente na educação básica, chama a atenção que se apresente uma proposta completa de reforma sem considerar como central o protagonismo dos educadores e sem privilegiar medidas orientadas para reforçar seu status econômico.

Outro aspecto fortemente enfatizado pelo Banco Mundial com vistas à melhoria da qualidade da educação é a construção de sistemas educativos mais efetivos relaciona-se aos sistemas nacionais de avaliação. É necessário prestar mais atenção aos resultados do sistema, e nesse sentido, o sistema de avaliação da qualidade das escolas e os mecanismos de monitoramento e difusão constituem ferramentas fundamentais.

Articulada às reformas curriculares está segundo Gentili (1996), a dinâmica operantemente paradoxal das lógicas de descentralização-centralizadora e centralização-descentralizada. A primeira promove uma dinâmica orientada para a municipalização do ensino, de forma a evitar a interferência “perniciosa” do centralismo governamental, ao passo que a segunda centraliza certas funções que não são transferidas para os níveis estaduais e municipais nem para as escolas: os sistemas nacionais e as estratégicas de formação de professores permanecem centralizadas em nível nacional. Para o autor, “centralização e descentralização”, são duas faces de uma mesma moeda: a dinâmica autoritária que caracteriza as reformas educacionais implementadas pelos governos neoliberais .(p.27)

 O atual discurso  sobre as reformas é muito encantador e de fato ganha adeptos. Ele tem ainda o forte apoio dos meios de comunicação, penetra o senso comum e o imaginário social. Não definimos as nossas políticas educacionais e não podemos construir um quadro de qualidade porque dependemos totalmente de um financiamento e a eles estamos subordinados.

Daí a necessidade de termos um olhar especial na construção de uma nova estrutura e organização do currículo, diante do ensino fundamental de nove anos, de forma que respeite o aluno na sua totalidade. É Althusser que pela primeira vez caracteriza a escola como “aparelho ideológico do estado” (AIE). Localizado no ponto de intersecção da infra-estrutura e dos aparelhos repressivos e ideológicos do estado, e a escola preenche a função básica de reprodução das relações matérias e sociais de produção.

Ela assegura que se reproduza à força do trabalho transmitindo as qualificações necessárias para o mundo neoliberal. A reprodução da força do trabalho exige não somente uma reprodução de sua qualificação, mas ao mesmo tempo uma reprodução de uma submissão às regras da ordem estabelecida.

A escola contribui, pois, de duas formas para o processo de reprodução da formação social do atual cenário globalizado: por um lado reproduzindo as forças produtivas, por outro, as relações de produção existentes. O peso da escola não pode, portanto, ser sobreestimado, ela não seria nem a causa da falta de consciência nem o único fator que a perpetua.

Sendo a sociedade política o lugar do direito e da vigilância instrumentalizada, será ela a encarregada de formular a legislação educacional, de impô-la e fiscaliza-la. Ao fazê-lo, ela absorve a concepção de mundo da classe dominante, interpreta e a traduz para uma linguagem adequada. Toda classe hegemônica procura concretizar sua concepção de mundo na forma do senso comum, ou seja, fazer com que a classe subalterna interiorize os valores e as normas que asseguram o esquema de dominação por elas implantado.

Por isso, a política educacional se manifesta, direta ou indiretamente, também na infra-estrutura. A atuação é direta quando visa transformar a escola nos centros de qualificação da força do trabalho. Com isso o estado procura ativar suas forças produtivas em nome de um projeto de desenvolvimento social global.

A visão da escola ou do sistema educacional como mecanismo de dominação só aparece em todas as suas dimensões quando demonstrada sua vinculação dialética com a política educacional. O Estado só é autor e a causa central do funcionamento do moderno sistema de educação, seu papel é o de mediador da classe dominante, ele procura atender às demandas do mercado, hoje, globalizado onde a qualidade do conhecimento ficou esquecida diante da necessidade do capitalismo.

As políticas educacionais devem ser elaboradas por pessoas que moram no nosso país, conhecem a nossa realidade e fazem parte desse contexto. Essa não pode ser uma relação vertical posto que, as pessoas que estão do lado de cima da pirâmide não conhecem de perto a realidade educacional ou pelo menos não tenta reconhecê-la, portanto, a. participação democrática das pessoas que vivem essa realidade no dia-a-dia certamente trariam grandes contribuições para a formação e sistematização de políticas educacionais que pretendessem de fato mudar a nossa realidade.

Referências Bibliográficas

ALTHUSSER,L.P. Aparelhos ideológicos de Estado. 7ª ed. ª ed. Rio de Janeiro. Graal,1998

 GENTILI, P. Neoliberalismo e Educação: Manual do usuário. Brasília, CNTE, 1996

 MOREIRA, A.F.B. Currículos e programas no Brasil. Campinas: Papirus, 1990.

SILVA, T.T. Identidades terminais. As transformações na política da pedagogia e na pedagogia da política. Petrópolis: Vozes, 1996.

TORRES, R.M. “Melhorar a qualidade de educação básica? As estratégias do Banco Mundial”. São Paulo: Cortez1996.
Autor: valentina Jesus


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