Política e Copa do Mundo



Poderíamos fazer um texto enaltecendo o futebol. Meio prosa meio verso, uns versos proseados. E com isso teríamos elementos suficientes e bastante para um texto laudatório aos avanços do Brasil na copa do mundo. Nesta e nas outras já passadas.
Esse texto poderia, inclusive, ter um titulo patriótico: Meu país. Algo assim:

Meu País
Meu país tem colorido, de beleza sem igual. Fevereiro é alegria, é escola, é carnaval. E o tempo vai passando, repicando o berimbau. Pelos campos, nas peladas, tem grito no futebol, pois a garotada faceira enfrenta a tarde de sol e se atira contra a bola, rolando fazendo gol.
Meu país tem cinco taças e a sexta logo vem. Somos penta, ninguém tasca e não tem pra mais ninguém. Pode via a Argentina, Itália e França também, que nosso esquadrão de ouro, canarinhos, disse alguém, levantará o caneco: chupa o dedo neném.
Meu país tem futebol e a torcida grita gol. Num só brado que se ergue debaixo do céu azul: Queremos trazer o hexa, não fica nada barato, mas é a disputa que conta, no país, de ponta a ponta neste grande campeonato.
Meu país, minha cidade, se veste de verde amarelo. Pelas ruas, bairros e praças, fica tudo muito belo. Criança, jovem e adulto, torcendo pelo que vem. E neste mundo, uma bola, numa passada de letra, seis estrelas, mais ninguém.
Em meu país, em cada beco ou várzea, há um campo de talento. Enquanto alguns se divertem outros já dão show no vento. Se tem um que pedala, outro é bamba no chapéu, e a bola entre as canelas balança a rede no talento.
Meu país em dois mil e catorze sediará a copa. Mas agora o que conta é que não daremos sopa. No talento e na raça levantaremos a taça, num gesto já bem treinado. Repetido cinco vezes e a sexta já esperada, será feita lá na África onde começou a jornada.

Mas esse texto patriótico defronta-se com um problema. Nosso país tem outro tema: eleições. É hora de votar. É hora de desconfiar...
E esse é o problema. Somos quase duzentos milhões de brasileiros. E durante quase um mês nossas conversas, de norte a sul e de leste a oeste, mantém um tema comum: o Brasil na copa. E o Brasil na copa faz parar o Brasil. No dia que tem jogo da seleção não adianta querer ou necessitar deste ou daquele serviço: tem que esperar o apito final.
Pior é que antes e depois do jogo são quase duzentos milhões de brasileiros, dando palpite, criticando, esbravejando, apontando falhas e soluções: tira este bota aquele. Esta dupla rende mais... aquele nem devia ser convocado. Se tivesse convocado fulano formaria um ataque mortal junto com sicrano... isso só par falar sobre a escalação. As discussões táticas são ainda mais calorosas. E para tudo temos uma solução; para tudo temos uma análise crítica...
E não nos damos conta que estamos falando de algo que foge, completamente ao nosso alcance. Falamos de algo que apenas interessa àqueles que são os patrocinadores. Fazemos torcida como se dela dependesse o resultado do jogo. Não nos damos conta de que, se nenhum brasileiro assistisse ao jogo, o resultado não será alterado. O resultado não depende da torcida, mas dos que estão em campo e dos que fazem as armações...
Enfim, passamos um mês discutindo futebol como se isso fosse tudo, e deixamos de discutir tudo que realmente interessa que são os rumos de nosso país. E aqui sim, acabamos dizendo uns para os outros e para nós mesmos: não adianta. Não depende de nós.
O ridículo da coisa é que sobre aquilo que não depende de nós, damos nossos palpites e nos empolgamos e esbravejamos e queremos soluções. Mas para aquilo que depende de nós, para aquilo que interfere em nossas vidas, dizemos que se trata de coisa suja, de coisa sobre a qual não gostamos de falar, nem de nos envolver.
Isso é o que há décadas vem ocorrendo em nosso país. Discutimos futebol e nos recusamos discutir política. Temos soluções miraculosas para a seleção (e para os times dos quais somos torcedores), mas permanecemos incapazes de dar nossas opiniões, ou de interferir numa contenda política.
É verdade que os candidatos nos são enfiados goela abaixo. E nem que tenhamos náuseas não temos condições de vomitá-los. Mas isso só acontece porque temos voz para o futebol, e não nos preocupamos com a política. Mas se é verdade que tivemos que engolir o Zagalo, pois se trata de algo que foge de nossa alçada, não é verdade que temos que nos intoxicar com os vermes que nos atiram na cara. Futebol pode ser coisa boa, interessante, vibrante... mas não depende de nós; mas os rumos políticos de nossa cidade, do estado e do país, isto é de nossa responsabilidade.
Para este aspecto deveríamos voltar nossas atenções, nossas irritações, nossas criticas e soluções; este é o campo para o qual devemos olhar, analisar e apontar as falhas e propor soluções. É deste campo que virão aqueles que aumentam os impostos, assaltam nosso bolso, nos negam saúde, educação e segurança de qualidade para encher cuecas e meias e malas com nosso dinheiro. E isso só acontece porque preferimos discutir futebol em lugar da política.
Neri de Paula Carneiro ? Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador.
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Autor: Neri P. Carneiro


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