O Menino Mudo, E A Flauta Mágica



Era uma vez um menino, que não sabia falar.Ele gaguejava alguns sons esquisitos, mas só conseguia usar um apito para se comunicar.
A mãe Adélia desesperada, e chorosa já havia levado o filho, para todos os padres, benzedeiras, e santas milagreiras, mas o pobre nada fazia, apenas olhava profundamente com seus olhos de mar e , começava a chorar.
A mãe desorientada, colocava o pequeno de castigo.Não deixava que brincasse, e escondia seu apito.
Um dia, enquanto varria a calçada:Gilmar correu até a mercearia, e no alto de seus cinco anos pediu com gestos, e sinais uma flauta vermelha, que comprou com as moedas, que guardava na merendeira.
Ao anoitecer a mãe de Gilberto ouviu uma melodia muito bonita, doce, suave que parecia um cântico dos anjos do céu.
Apavorada viu que a linda música vinha do quarto de Gilberto.Correu até lá abrindo a porta com destreza para que a criança não a visse; e ficou maravilhada com a canção que o menino tocava.
-Será mágica essa pequena flauta?Ou, será Gilberto o criador de tanta beleza?

Quando disse essas palavras, o menino olhou-a com ternura, e tocou para ela com candura.
Dona Adélia chorou, e intimamente agradeceu ao bom Deus, por lhe dar um filho com tanto talento, mas esbraveja de raiva por ter descoberto depois de tanto tempo. Afinal, este pequeno prodígio poderia ajudar com as despesas da casa, e pagar os estudos da enteada. Ela, já pensava no sorriso dos vizinhos, e na expressão das amigas invejosas. Gravou um fita cassete, e tirou uma foto, enviando no mesmo envelope a façanha do menino flautista, que nunca havia proferido uma palavra, nem quando tomava injeção , ou levava palmada.
Adélia entusiasmada recebeu a resposta da correspondência enviada: do programa Saul Gil, pediram que ligasse depois que o pequeno soubesse tocar piano, Livio Santos apenas mandou uma carnê do baú, e um jogo de lençóis térmicos, já o Lulu Liberado, queria o menino no domingo engraçado .
Gilberto contrariado, não quis vestir a camisa azul de seu time, e lamentou quando a mãe jogou sua flauta vermelha de plástico no lixo depois de ter comprado um instrumento mais moderno, e bonito.
A pobre criança tentou explicar através de mímicas, gestos, que só sabia tocar bonito sozinho em seu quarto, com a flauta vermelha; sem isso a coisa ia ficar feia.
A mãe não lhe deu ouvidos, apenas calculava na ponta do lápis, os lucros, e os louros do filho.
No grande dia, em frente a TV no programa de Lulu Liberado, dona Adélia estava mais animada que o filho Gilberto, que a cada minuto mais mudo ficava.
O apresentador falou do menino de cinco anos, que nunca havia falada na vida, mas que tocava sua flauta mágica, e a todos encantava. A platéia aclamou o menino, e recebeu balas, e brindes pelas palmas e gritos.
A mãe de Gilberto disse, que o filho tocava flauta, com a mesma destreza que o pianista J. S. Bach tocava o Concerto de Brandemburgo n.º 3, Concerto de Brandemburgo n.º 6 , Concerto n.º 1 em Dó menor , enfim o Concerto n.º 20 para piano, e Concerto para violino n.° 3, bla´, blá, blá até que enfim chamaram o menino, que veio arrastado, com cara de choro, dedinhos vermelhos, e nariz inchado.
-E, agora para vocês o menino mudo, e sua flauta mágica..
O menino assombrado, pela quantidade de pessoas e câmeras, que o vigiava, começou a chorar sem vergonha, ou medo.
Aquelas pessoas não sabiam, que para ouvir sua música, teriam que deixar fluir a voz do coração; e de nada adiantava escutar olhos de condor, e ouvidos de mercador.
Ele sabia que ninguém iria entender suas canções, ou achar graça na pequena flauta de plástico, e seus dedos tortos.Pois, todos, somente iriam aplaudir o desespero da mãe, e a criança assustada, acuada ,com uma flauta nas mãos .
Gilberto até que tentou tocar aquela flauta desafinada, que a mãe comprou no 1,99, mas não funcionou: ele sabia, que o único instrumento, que sabia tocar era aquele de plástico com o adesivo do pateta, que por desdém Dona Adélia havia jogado na lata do lixo ,enquanto o filho dormia.
Lulu Liberado viu que o menino estava trancado, e chamou os comerciais.Deu de brinde um colchão e um aparelho de TV para Dona Adélia, e um envelope com as passagens de ônibus, para que voltassem para sua terra.
Dona Adélia chorava de nervosa, e de desespero, mas estava feliz pois, ao menos voltava para casa com os brindes, e o cabelo penteado, pelo cabeleireiro das estrelas:Zé do Bêlo.
Dois dias depois o bairro inteiro soube da aparição de Gilberto no canal FPP TV.E, correram na casa de Adélia ,para saber o que fez o menino trancar na hora de tocar para Lulu e sua platéia *preparada.
A mãe envergonhada disse que o filho estava muito choroso, e que toda aquela gente da platéia o haviam deixado mais nervoso.Mas, que ela já havia recebido um telefonema do Claudião da TV Bobo, e que só estava no aguardo para que a costureira Marlene terminasse seu vestido novo.
Gilberto escutava a tudo, assustado jamais poderia tocar em público, pois sua música só fluía, quando estava só.Era na solidão do seu quarto, que o menino tocava para os anjos. Eram só eles que podiam vê-lo tocando; os outros relés mortais somente, podiam ouvir o encantamento da sua flauta mágica .
A mãe continuou insistindo em levá-lo para outros canais de TV, e mesmo tendo conseguido recuperar a velha flauta vermelha no lixão municipal; mesmo assim, Gilberto continuava triste, sem querer comer, ou tocar.
Com o tempo o pobrezinho foi definhando, tal qual o ipê do jardim, e a mãe atrapalhada, não notou, estava muito ocupada dando entrevistas e marcando shows.
Até que um dia depois de uma semana badalada, advinda do programa de Andréa Boba Braga, viu o filho branco, caído na sala.O menino, já fraco, e imaculado pela palidez, havia abandonado a flauta, e a vida de astro por um mês.
Fez um pedido aos anjos, para que viessem buscá-lo até dia de seu aniversário.
A mãe incrédula chamou a vizinhança, e ligou para todos jornais para que sua morte fosse divulgada no programa Pânico, e na imprensa.
Autor: angelica rizzi


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