A Maldição da Lenda - Silêncio Na Quadrilha, Mas a Placa do Caminhão Faz o Sargento Voar







CAPÍTULO DEZESSETE
Silêncio Na Quadrilha,
Mas a Placa do Caminhão Faz o Sargento Voar

O tilintar foi interrompido por uma mão masculina.
_ Pronto?!...
_ O moleque descobriu! Espera eu ligar! Não faz besteira! ? A voz do Pato soava inconfundível. O homem desligou e disse, ao interfone:
_ Entornou o caldo!...
A resposta veio lacônica:
_ Tá!...
* * * * *
_ "... após o sinal, diga o seu nome e a cidade de onde está falando..."
_ Trânsito interrompido nas estradas!... Passagens bloqueadas!...
_ Previsão?...
_ Aguarde!... Algum carro?...
_ Dois caminhões!...
_ Faça voltar!...
_ E, a madeira?...
_ Desligo!...
* * * * *
_ "... declarou que veio a Serra Dourada atraído por uma nota de jornal, que falava da "Lenda". Indigenista convicto, decidiu visitar a cidade e conhecer os seus costumes. Travou conhecimento com o prefeito em exercício, o candidato eleito, o Dr. Lourinaldo e outras personalidades de destaque público ou social."
"Perguntado sobre os antecedentes, declarou que é divorciado, pai de duas filhas e um filho, residentes no Rio de Janeiro. É dono de uma firma construtora, em sociedade com o filho que a gerencia."
"Perguntado quais as ligações que tem com o Centro de Pesquisas Aeroespaciais, respondeu que tem alguns conhecidos, mas que jamais se envolveu com qualquer tipo de pesquisa do gênero."
"Perguntado se tem alguma ligação com exploração de minério, respondeu que o curso de Engenharia exige que o estudante se aprofunde na Geologia, mas que nunca se dedicou economicamente ao garimpo de qualquer tipo."
"Perguntado se nas escavações realizadas nos trabalhos da barragem do Córrego do Ouro notou sinais de algum minério de valor comercial, respondeu que o solo apresenta certo teor de radioatividade e que pesquisas mais sérias poderão revelar alguma jazida nas profundezas do córrego ou de outro local qualquer."
"Perguntado por que deixou a empresa com o filho para trabalhar como Secretário de Obras em uma prefeitura do interior, respondeu que ele é um ótimo administrador e por ter descoberto que em Serra Dourada se planejavam construir obras de utilidade pública, pelo nível tecnológico e preservação ambiental, respeitando as tradições ecológicas, por ser um indigenista convicto, necessariamente, teria que ser um bom ecologista."
"Perguntado se tem conhecimento de qualquer ato ou propósito de qualquer tipo desonesto nas instalações sob sua responsabilidade, respondeu que, a não ser o atentado sofrido pelo delegado Alberto e o soldado Falcão, nas imediações da barragem do Córrego do Ouro, desde que assumiu a Secretaria, nada de anormal tem ocorrido, ao menos que seja do seu conhecimento, assumindo pessoalmente a responsabilidade por tudo que seja da sua alçada. Acentuou que muito se admira da pergunta elaborada, não atinando com o alcance dos objetivos, já que tem controlado pessoalmente todo o material colocado, toda mão-de-obra empregada e todo pessoal que ali tem trabalhado."
"Advertido de que poderá ser convidado a prestar esclarecimentos, prontificou-se, e declarou que se é para o bom andamento da Justiça, tudo fará para ajudar nos trabalhos de investigação policial que ora se processa."
* * * * *
Os policiais retornaram do encontro com os índios e cruzaram com o Dr. Charles à entrada da delegacia. Informaram que Alberto era aguardado às quinze horas, desde que comparecesse absolutamente só e se comprometesse a responder algumas perguntas antes de fazer as suas. Além disso, teria de comprometer-se em silenciar o que visse ou ouvisse na conversa. Alberto meditou um pouco e pediu para chamarem o sargento. Conferiu a hora e ao notar que se aproximavam do meio-dia, ligou para Agnelo e orientou que não fosse para casa sem escolta e que dissesse o mesmo para o prefeito. Omitiu o telefonema que dera de manhã, para não alarmar o pai, mas disse que acreditava estarem chegando ao final das investigações, pois só os desesperados apelam para a força bruta. Se a quadrilha estava usando, era porque ele estava bem mais perto do que parecia.
Selecionou um número no catálogo e discou:
_ Alo?! Dona Sônia?! É o Alberto! Sim senhora, tudo bem! Escuta, dona Sônia, estou fazendo um levantamento com o sargento Argolo e sinto ter de incomodar, mas gostaria de saber se a senhora pode me autorizar a fazer uma vistoria nas coisas do meu amigo Euclides. Se não me conformei antes, quanto mais agora, que estou no lugar dele!...
_ ...
_ Eu sei, dona Sônia, mas alguém precisa fazer alguma coisa. Se estou aqui, então sou eu que devo continuar o que ele começou... ? Calou-se ao perceber que ela soluçava. Ensaiou algo, mas concluiu que, apesar da delicadeza, tinha conseguido mexer em feridas muito profundas. Balbuciou alguma coisa, mas ouviu-a falar e calou-se.
_ Desculpe, Alberto, mas ainda não me acostumei com a ausência dele. Era amigo de todo mundo, e brincalhão, você sabe!... Ainda vai levar muito tempo, até que eu aceite esta perda tão brutal!... Por favor, Alberto, se você descobrir quem nos arrancou o meu Euclides, só Deus vai poder lhe recompensar, mas não vá se arriscar, meu filho, pois não quero que lhe aconteça o mesmo!...
_ Não se preocupe, dona Sônia, - respondeu, emocionado. ? Não estou dando nem um passo sozinho. Estou trabalhando de parceria com o sargento Argolo e todos os outros. Eles são muito bons militares!...
_ Isso me tranqüiliza um pouco. O que posso fazer pra ajudar?...
_ Se for possível, eu queria que a senhora mostrasse as coisas dele. Pode ser que no material eleitoral ou da delegacia a gente encontre alguma pista que ajude a descobrir o motivo do atentado. ? Concluiu, arrancando outro soluço da pobre senhora. Acertou para ir logo que fosse possível, e desligou. Voltou-se para o sargento, que ouvia, e explicou:
_ É a viúva do Euclides! Pedi a ela pra a gente olhar as coisas que ele deixou. Pode ser que a gente ache alguma coisa de interessante pra as investigações! Quem Sabe?!...
_ Ótima idéia! Não é possível que ele tenha descoberto alguma coisa que lhe custou a vida, e não tenha deixado nada registrado! Se bem que na minha frente está um que sabe quem é o chefe e não diz a ninguém!... ? Com o olhar interrogativo de Alberto, sorriu:
_ Não se preocupe! Só falei por brincadeira!...
_ Opa!... Pensei que ia ter de refazer a programação! Chamei pra a gente conversar sobre a visita na aldeia. Não sei como lidar nesses casos de entendimentos formais, muito menos com um tradicionalismo milenar como é o dos índios. Se eles vêem mantendo esse sigilo todo, é porque, na verdade, há alguma coisa de absolutamente significativo por trás disso. Veja que não são todos que sabem do segredo, mas apenas os descendentes do cacique Jutorib, o que traz a alegria, como costumam tratá-lo. O que o senhor tem a me dizer?... Se ao menos eles aceitassem a sua ida, e não a minha!...
_ Nem pense nisso!... Quando um índio mete uma idéia na cabeça, não há ninguém pra modificar!... Ainda mais que é decisão do conselho, e são muitos!...
_ Então vamos ao que devo perguntar, pra não falar besteira!...
_ Acho que você não precisa de sugestões. Mas se pede, acho que o melhor a fazer é ficar calado e seguir o curso indicado por eles mesmos. Quem sabe, não lhe dão as dicas, sem precisar perguntar? O que acho mesmo, é que em momento algum, você deve faltar com a verdade. Se eles têm um segredo secular que pode ser a causa de tudo, então conhecem a verdade bem mais que nós!...
Preso à justa reflexão e atento aos mínimos detalhes da conversa, Alberto meditou por alguns instantes e comentou:
_ É verdade, o senhor tem razão. Não vou me esquecer do conselho. Quer almoçar conosco? Pode surgir alguma idéia que nos oriente!...
_ Ora, filar uma bóia de vez em quando, com essa inflação, não faz mal a ninguém. Além disso, preciso sugar algumas informações, e ninguém melhor do que o dono!...
_ Pode ter certeza de que não vou esconder nada, a não ser o nome daquele safado, porque não quero dar a impressão de estar conduzindo raciocínios. Além disso, só liguei pra ele porque eu queria sentir a reação dele. Foi bem melhor do que eu esperava!...
_ A fungueira?!...
_ Sim! A fungueira! ? Respondeu, misterioso.
Na saída, decidiram que o melhor seria passar logo na casa da viúva. O telefonema lhes aguçara a curiosidade e queriam passar a limpo as suspeitas.
A gentil senhora os recebeu com visíveis mostras de haver chorado muito. Pediram desculpas pela grosseria, mas ela contestou, dizendo que ajudava por prazer. Havia mais de um ano não comia nem dormia direito, e aquele interesse acendia novas luzes.
Vistoriaram a pasta, excluindo os títulos de propriedade e outras coisas pessoais, como documentos e notas fiscais. Alberto sabia o que procurava e concentraram a atenção nos papéis que se referiam à campanha eleitoral, cujos conteúdos eram do conhecimento de Alberto que participara com o pai de muitos debates, embora na época, seus interesses maiores eram a guitarra, a namorada e os estudos. Quando pegou a agenda do amigo assassinado, sentiu uma espécie de arrepio, como se ele estivesse ali ao lado, querendo dizer alguma coisa, e passou a folhear sofregamente, como se soubesse o que procurava. O sargento e a viúva perceberam o estado de excitação do rapaz e passaram a olhá-lo com uma certa ansiedade, sem fazerem perguntas.
O rapaz verificava as datas, comparava os fatos, e nada encontrava de significativo para a investigação. Desiludido, já se preparava para fechar a agenda, quando um pedaço de papel dobrado lhe chamou a atenção. Abriu-o e leu a minúscula inscrição com a letra que tão bem conhecia: "caminhão VK-5802, Rio de Janeiro". Como se fosse o maior dos troféus, exibiu o papel ao casal que o olhava interrogativamente. Desconcertado com o erro de se haver excitado na presença da viúva, disse ao sargento:
_ Acho que o meu amigo descobriu o roubo desse caminhão! Vamos investigar, sargento? Dona Sônia, muito obrigado! A senhora ajudou muito!...
O sargento Argolo vacilou e perguntou:
_ Como pode ter certeza de que foi roubado?
_ Não sei, sargento! É apenas um palpite, mas quero investigar. O que ele estaria fazendo com a placa de um caminhão do Rio de Janeiro, na agenda, exatamente na página da última anotação?... Ainda não sei de nada, mas depois do almoço, creio que vamos ter muito serviço!... Dona Sônia, por favor, não comente com ninguém sobre este papel. Ele é a única pista que temos, e se for divulgada, talvez nunca mais encontremos outro ponto de partida. Podemos contar com a discrição da senhora?
_ Oh, meu filho, nem precisa recomendar! Mataram meu marido, e a vinda de vocês fez renascer uma nova esperança. Só peço que não escondam nada! Eu quero estar presente quando vocês colocarem as mãos naquele criminoso!...
_ Pobre coitada! ? pensou ? Se ela imaginasse que se trata de uma bem organizada quadrilha que não hesita em matar para alcançar os seus intentos criminosos! ? Alteou a voz e convidou o sargento a saírem, antes que outro deslize os denunciasse. Ele não estava disposto a colocar novo remendo. Despediram-se, e se afastaram, comentando o achado:
_ Você acha mesmo que ele foi morto porque descobriu esse roubo?
_ Não, sargento! Acho que ele descobriu esse caminhão pegando um carregamento de ouro, ou o que quer que seja, e também foi descoberto!... Ele ligou pro seu Afonso e disse que tinha algo de muito importante a contar. Quando ia pra Prefeitura, foi dado o alarme da sua morte, depois de ter passado o dia nervoso. Aliás, ele não foi descoberto. Acho que essa ligação foi que o denunciou!...
_ Então, se ele foi morto na praça e só o seu Afonso sabia que ele tinha um segredo, só pode ter sido ele quem atirou no Euclides?!...
_ Não, sargento!... Ele não é o assassino!... Depois que os outros dois morreram, ele foi pedir ajuda ao governador!... Mas não é por isso, nem por ser meu futuro sogro, que descarto essa possibilidade!...
_ Então, se não é ele, quem pode ser?...
_ Que tal verificarmos a origem do caminhão?...
_ Como?...
_ O senhor vai ao Rio de Janeiro!...
_ Mas, vou levar uma semana, ou mais?!...
_ De avião?...
_ Avião?... A passagem é muito cara!...
_ A gente dá um jeito!... Pronto pra viajar?...
_ Quando?...
_ Hoje!...
_ Se é assim, tudo bem!...
_ Ótimo!...




Autor: Raul Santos


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