A Maldição da Lenda - Meu Deus, Não Quero Ser Assassino!...







CAPÍTULO VINTE E DOIS
Meu Deus, Não Quero Ser Assassino!...

Foi ver Maristela, mas não passou da porta, e prometeu vê-la após o jantar. Marcou com a escolta em sua casa às dezenove e trinta. Queria ver os feridos e se possível, interrogar o prisioneiro. Encontrou o pai e trocaram algumas palavras.
_ E aí, filho, como estão as coisas? Desde ontem que não conversamos!...
Percebeu que ele não tinha conhecimento da emboscada. Agradeceu mentalmente ao soldado por ter sido discreto e narrou o acontecido ao seu modo, omitindo o seu ato de bravura e colocando a narração na primeira pessoa do plural.
Angustiado, Agnelo tentou dizer alguma coisa, mas não teve palavras. Olhou-o demoradamente e colocando todo o sentimento de pai amoroso, disse:
_ Deus te abençoe, meu filho!... Tenha muito cuidado. Não vou conseguir viver sem sua mãe e sem você. É muito... ? Não pôde continuar e calou-se.
Emocionado com o sofrimento do pai, Alberto falou:
_ Obrigado, papai, mas está tudo sob controle! Estamos trabalhando em equipe e as pessoas que me preocupam são as que estão fora do nosso controle direto, que são alvos e não podemos estar em vários lugares ao mesmo tempo!...
Fugiu do interrogatório, indo para o banho. Correu ao quarto e conseguiu ao menos naquele instante quebrar a tensão, pedindo a Deus que não permitisse fatos semelhantes.
No hospital, falou com o Clemente. A bala havia atravessado o braço esquerdo. Os índios tinham feito um bom trabalho e ele já sentia considerável melhora. O prisioneiro, não teve a mesma sorte, pois apesar da cirurgia, encontrava-se em coma. Alberto baixou a cabeça e elevou em voz alta uma sentida prece:
_ Meu bom Deus, por favor, não me deixes levar esta morte na consciência. Se de tudo não me for possível estar isento, que seja feita a Vossa Santa Vontade. Mas se me for permitida a glória de ser atendido, que seja feita assim também a vossa Santa Vontade...
Finda a pequena oração, sentiu um leve toque e não precisou olhar para saber que era Maristela que conseguira convencê-lo a deixá-la participar de uma diligência. Levou-a consigo e iniciaram os planos. Fascinada, ela acompanhou com interesse o roteiro.
Alberto deduziu que não teriam contratempos à noite. Os bandidos haviam perdido o fator surpresa e sabiam que eles estavam organizados e enraivecidos por estar um colega no hospital. Fizeram distribuição para o rodízio noturno e o rapaz buscou na memória um ponto que se mostrava obscuro, mas não conseguia atinar com o que poderia ser.
_ O delegado interrogou o pistoleiro? ? Perguntou o cabo Magalhães.
_ Infelizmente, não, cabo! Ele está em coma. Deus Queira, tenha condições de falar. Só espero que não tenham a idéia de tirá-lo de circulação, como o Zé de Ticha, pra mais uma queima de arquivo. Pra evitar, temos de sacrificar mais dois soldados. Não precisam ficar acordados, mas atentos ao que ocorrer. Vou levar Maristela e cuidar, combinado?
_ Combinado!... Nossa parte está sob controle!...
_ Então, vou namorar um pouquinho, que ninguém é de ferro!... ? De mãos dadas, piscou para os colegas, que riram com gosto, fazendo Maristela ruborizar. Ali, ela não era a filha do prefeito, mas apenas a namorada do delegado.
Fora, ela o surpreendeu com a pergunta:
_ Alberto, eu posso parecer bobinha, burrinha, mimada, mas tenho meus momentos de reflexão e queria lhe perguntar uma coisa...
_ Diz!... Se eu puder responder...
_ Se aqueles homens estão no hospital, estão doentes. Se aquele requer muitos cuidados é porque é grave. Alberto, o que foi que aconteceu? Foi tiro?
Sem pensar, o rapaz sentiu que não poderia mentir e disse:
_ Nós fomos atacados e o Clemente foi atingido, mas está fora de perigo!...
_ E quem foi que atirou no outro? ? Perguntou, de súbito.
_ Mas o que interessa isso, Maristela? Por que quer saber?
_ Alguma coisa me diz que foi você quem atirou!... Logo você, que eu amei desde garotinho, pela ternura e carinho que tem dado!... ? Desabafou, com um soluço e duas grossas lágrimas escorrendo pelo rosto. O rapaz tentou consolar e abraçou-a, beijando ternamente, também com um nó apertando a garganta:
_ Calma, filhinha! É por pouco tempo e estarão todos atrás das grades!...
_ Mas você não entende que pouco me importa quem sejam ou o que querem? Você não entende que só me interessa que você fique longe disso tudo?
Ele notou a ponta de egoísmo possessivo e suavemente começou a explicar que não era só ele que estava à mercê da quadrilha. Que os seus pais e todos que se atravessassem no caminho poderiam sofrer o mesmo destino. Num gesto de desespero, a moça falou:
_ Mas você não entende? Eu não quero que nada de mal lhe aconteça!...
_ E o seu pai?... E o meu pai?... Você não se importa, Maristela?...
_ Eu me importo, sim, mas não é como perder você! Eu amo demais o meu pai, mas com você é diferente. Você entrou na minha vida de tal maneira que sinto como se fosse um pedaço de mim e eu um pedaço de você. É como se mamãe e papai fossem uma laranjeira e eu uma laranja amadurecendo, e você o dono dessa laranja. Sinto que chegou a hora de ser colhida, para com as minhas semen-tes perpetuar a espécie da que me gerou, entende?... ? Encostou a cabeça no peito do rapaz que beijou-lhe e afagou os cabelos.
Não se preocupe, querida! Prometo que, com fé em Deus, o seu sofrimento não vai durar muito, nem vai me acontecer nada. ? E, brincando: Nossas sementes produzirão as mais doces laranjas que o Brasil jamais conheceu.
A moça ergueu a cabeça, olhou-o ternamente e disse:
_ Você não tem jeito. Eu me acabando por você, e você, aí, brincando!...
Deixou Maristela em casa, voltou à delegacia, ligou para Agnelo informando que dormiria no serviço e foi para o hospital com os soldados que iriam vigiar o prisioneiro. Ouviram gritos lancinantes e a moça da recepção informou que minutos antes chegara ao Pronto Socorro um funcionário da ENGETEC com horríveis cólicas abdominais. Fora medicado, mas parecia que o estado ainda era grave. Alberto trocou impressões com o Dr. Odorico. Apesar de fortes, aos poucos, os gritos diminuíam de intensidade. O preso estava sob o efeito da anestesia e em coma. Alberto voltou para a delegacia, intrigado com algo que ele não atinava.






Autor: Raul Santos


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