A Maldição da Lenda - Insolência e Temor, Mas Será Que o Chefe Vai Almoçar?







CAPÍTULO TRINTA E SETE
Insolência e Temor, Mas
Será Que o Chefe Vai Almoçar?

Acalmados os ânimos, foram tomar o depoimento do engenheiro para oficializar o pedido ao juiz. Alberto mandou buscar o motorista do caminhão para que pudessem vê-lo e dar as informações que o caso requeria. A não ser mais uma decepção para o empresário, nada acrescentou de útil. Seu desconhecimento quanto ao material era real, e acrescentou que se soubesse não teria se envolvido com material radioativo.
Trouxeram o atirador e seus olhos cruzaram com os de Alberto, fuzilando-o. O ódio que sentia por ter sido flagrado era visível. Desviou os olhos para o engenheiro e deixou transparecer claramente a expressão de desdém. Mudou para Sandrinha que sustentou o minucioso exame, quando ele falou pela primeira vez:
_ Olá, gatona, pensei que nunca mais ia te ver. Sabe que tu é muito da gostosa? ? A atitude debochada e irreverente fez o pai da moça dar um passo na sua direção, mas foi contido pela providencial interferência de Alberto. O marginal olhou o Dr. Carlos e falou:
_ Tá brabo, hein, coroa? Aproveita que eu tô aqui com essa pulseira e tira a forra. Pode não achar outra chancha!... Vai lá! Aproveita!... Tem coragem não?... Babaca!...
Para evitar problemas, foi recolhido e o outro apresentado. Além de ser língua solta, não tinha nada daquele e, muito pelo contrário, era um bebê chorão. Apareceu na porta e desatou num rosário de queixas, lamentos e agradecimentos que parecia nunca mais querer terminar, quase ajoelhando-se aos pés do empresário, esposa e filha, dizendo:
_ Dr. Carlos, dona Sandra, dona Sandrinha, graças a Deus, estão aqui!... Eu não agüentava mais com esses caras me apertando pra fazer o que eu não queria. Eu juro, Dr. Carlos, que eles estavam me obrigando a fazer o que eles mandavam, ou então eles me matavam. Agora eu sei que vou ficar livre, e vão ter que pagar o que me fizeram!...
_ Tudo bem, Marcelo, tudo bem!... Nós estamos aqui, mas começa a contar o que você sabe. Nós viemos foi pra isso. Agora, se acalma e conta do princípio, tá? ? Disse o engenheiro, paternalmente, e perguntou ao delegado: Já tomou o depoimento dele?
_ O que ele disse não dá pra prender nem um ladrão de galinhas. Disse um monte de bobagens que não se aproveita nada, apesar de ter sido flagrado entregando um rifle pra esse outro matar o do hospital... O operador da carregadeira!...
É, aquele sempre foi um mau caráter e até drogas eu acho que usa, mas como é bom profissional, achamos que nunca fosse se envolver nesse tipo de coisas. Como achar um que tenha estrela na testa? São os ossos do ofício de quem trabalha com gente. Alguns são meigos e educados como damas e outros porém, quando desvirtuam, são mais brutais que bestas selvagens. Mas vamos ao que interessa. O que fazemos agora?
_ O juiz e o prefeito. Estão pensando que aluguei o Dr. Carlos só para mim!...
_ Não é surpresa nenhuma. Ontem, alugado por um sargento, hoje por um delegado, amanhã pelo que vier. Vou entrar logo pra a polícia, assim fico alugado direto!...
Alberto olhou o relógio e perguntou:
_ A que horas foi o vôo daquele dia, sargento?
_ Vinte e duas horas!...
_ E teve tempo de arrumar?
_ Claro!...
¬_ Então, não precisa ir agora. O senhor só vai se movimentar amanhã cedo, não é?
_ É, sim!...
_ Então, vai almoçar conosco na casa do prefeito, OK?...
_ Tudo bem. E o que faço até lá?...
_ Procurar o cacique e perguntar quem era o índio que mais conversava com o Roberto. Sabendo quem é esse índio, já temos um passo dado pra a solução do segredo do cacique. Ainda não pudemos conversar, mas nesses dois dias muitas coisas aconteceram. Numa delas, eles me deram o cognome de Boitatá. Se o senhor quiser detalhes, conversa com os que estavam comigo, e eles contam as prisões. Pra facilitar, na Reserva, me chame de Boitatá, como se eu fosse um deles.
_ Está certo. Farei isso!...
_ Algum problema, sargento?...
_ Não. Por que?...
_ Estou notando o senhor muito lacônico...
_ Estou só coordenando as idéias. A missão vai depender de calma, perseverança e, quem sabe, coragem. Se o cara tem quadrilha organizada, até o avião decolar, vou precisar de muita proteção divina!...
_ Não discordo, e por isso é a pessoa indicada. Qualquer outro teria o dobro ou o triplo da dificuldade. O senhor teve a ajuda do Dr. Carlos. Mas não é hora de preocupar... Ainda faltam no mínimo vinte e duas horas pra enfrentar a fera. O melhor é conversar com o pessoal sobre as prisões. ? Disse, com uma certa dose de vaidade. Sabia o quanto sua atuação seria exaltada. ? Afinal, ninguém é de ferro e nem de gelo, para não querer um elogio de vez em quando. ? Pensou, com um sorriso maroto bailando nos lábios.
Os outros se instalaram no carro da ENGETEC e ele pegou o fusca, enquanto o sargento pegava o chevete com os que tinham sido vítimas da emboscada.
A comitiva foi apresentada ao Dr. Gil e Alberto solicitou o Mandado. Aproveitou para convidar para o almoço, e foram convidar o padre.
Chegaram na sede do Municipal debaixo de enorme expectativa. A comitiva foi recebida com as melhores demonstrações de efusividade, seguindo para o gabinete a fim de trocarem impressões e traçarem planos. Alberto falou dos assassinatos, da placa do caminhão, da viagem do sargento e da viagem do engenheiro, dedicando especial atenção ao segredo do cacique Jutorib e do suposto modo como o Roberto poderia ter descoberto.
Curiosos com as informações, os três homens não deixaram de ficar impressionados com o que acabavam de ouvir. Durante todos aqueles anos, nem de leve suspeitaram, com exceção, naturalmente do Dr. Charles, que na mina estivera, de que ali debaixo dos seus pés havia uma centenária jazida de urânio e muito menos que extraterrestres houvessem garimpado séculos atrás com seus engenhos fantásticos, que supunham existir apenas na imaginação. As provas no entanto não podiam deixar a menor sombra de dúvida. O rapaz comunicou as suspeitas de haver o Roberto subornado o contador da Prefeitura com a fraude das Notas Fiscais para burlar o Tribunal de Contas, no que foi contestado por Agnelo e pelo sogro. Qualquer pedido de material deveria ser feito pelo Departamento de Compras, dependendo antes de solicitação de compras ou requisição, licitação e tomada de preços, no que o rapaz argumentou:
¬_ E foi por isto que solicitei a CPI. Se o material existe é porque foi comprado. Se foi comprado, foi solicitado. Se foi solicitado, alguém assinou a solicitação. Daí, ou o Claudino falsificou as assinaturas ou então há mais alguém por trás disso. Se há, quem poderá ser? O Dr. Charles que permanece no cargo? O Sr. Afonso que era o tesoureiro ou vamos ter de criar uma Comissão Auditora, já que a CPI não vai ser possível?...
_ Filho, ? lamentou Agnelo ? você não viu ontem à noite? Mas leva tempo!...
_ Eu sei, papai, e lamento, mas não temos um segundo a perder. Há um assassino solto entre nós que já matou três dos nossos melhores amigos e, podem crer, na primeira oportunidade vai querer levar mais um, quiçá apenas por vingança!...
Na crueza da realidade, entreolharam-se indecisos, e Agnelo tomou a palavra:
_ O meu filho tem razão. Eu vi as cascas do abacateiro arrancadas, no meu quintal, conseqüentes de um atentado que ele sofreu. Se não está morto agora, é que seus reflexos e raciocínio são de características acima do normal. ? E, concluiu: Graças a Deus!...
_ Ferreira!... Como fui me esquecer?... ? Questionou-se o engenheiro, contrariado.
_ Calma, Dr. Carlos, ele está no hospital e não é a mola mestra, e é nela que temos de chegar. Depois vem o resto. É como capturar a abelha rainha pra pegar as operárias. Vem tudo numa boa. A propósito, seu Afonso, pode incluir o Dr. Odorico e os Secretários de Administração e de Fazenda na lista? Sem eles, o quadro ficará incompleto!...
_ Não sei o que você está preparando, rapaz, mas se vem conduzindo este caso com tamanha segurança, não sou eu que vou me opor a este pedido. Sinta-se à vontade pra convidar quem você quiser!...
_ Obrigado! ? Discou o número do hospital e pediu: Aqui é Alberto. Por favor, o Dr. Odorico está?... Sim... Obrigado... Alo?!... Dr. Odorico?!... É o Alberto. Escuta, doutor, como foi a noite de ontem para hoje? Alguma chamada de alguém com princípio de enfarte?... Que pena!... Quer dizer que o senhor passou a noite na curiosidade de saber, não é? Escuta, Dr. Odorico, o seu Afonso vai dar um almoço pela chegada do Dr. Carlos Morales, da ENGETEC, com a família, e pergunta se o senhor dispõe de um tempo e dá o prazer de estar presente?... Quem sabe, Doutor?... Numa roda heterogênea de pessoas com os mais diversos pontos de vista, muita coisa pode acontecer!... Se o seu Afonso vai convidar, eu não sei, mas seria interessante que ele participasse, ainda mais com a belíssima voz de pato que tem. Vou perguntar ao seu Afonso se ele vai convidar... Está bem. Até logo mais, Doutor. ? Desligou e disse ao prefeito:
_ O Dr. Odorico disse que só irá se o senhor convidar o Pato!...
_ Mas, se eu não sei quem é ele, como vou convidar?...
_ E, se já convidou, sem saber?...
_ Se você sabe e não diz, como vou saber?...
_ Quando o sargento voltar, saberemos quem é o cabra. Antes que me esqueça, vou convidar o Dr. Silvano. Vai ficar uma fera, se não for convidado!...
Fez a ligação e quando foi atendido, disse:
_ Alo, Marquinhos?! É o Alberto! Seu pai está? Chama aí, por favor?! Tenho um recado... Alo, Dr. Silvano?!... É o Alberto!... Dr. Silvano, o seu Afonso vai dar um almoço pela chegada do Dr. Carlos Morales, da ENGETEC, com a família, que chegaram ontem, à noite. Ele pede que o senhor compareça, pois tem assuntos a tratar. Podemos contar com sua presença?... Tudo bem, então, até lá, Doutor!...
Alberto desligou e defrontou-se com olhares hostis de pessoas que aguardavam o final da conversa, quando Sandrinha tomou a dianteira e perguntou com veemência:
_ Será que eu ouvi bem, quando o Sr. Prefeito disse que o senhor conhece o chefe da quadrilha? O que é isto? Está querendo nos fazer de bobos, ou fazer média?...
_ Não é nada disso, que eu não ligo pra essas coisas! Eu só juntei algumas peças e cheguei a uma conclusão, mas não tenho nenhuma prova. Já dei dois telefonemas para ele. No primeiro, desligou sem uma palavra e no segundo, ontem à noite, quando fui pegar o carro, ele tinha me armado uma emboscada de dentro da prefeitura, mas tive sorte de ver. Ocultei Maristela atrás de um canteiro e liguei pra a casa dele, mas ele não disse nada, a não ser me mandar pra o inferno e desligar!...
_ Mas, como é que ele estava na prefeitura e atendeu o telefone em casa?...
_ É que enquanto eu ia da praça pra a delegacia, ele ia da prefeitura pra casa. Sabia que eu ia ligar e tentou se antecipar, mas atrasou um pouco!...
_ E, quem foi que atendeu o telefone?...
_ Outra pessoa!... ? Respondeu, laconicamente.
_ Quem?... ? Insistiu a moça.
_ Direi mais cedo do que pensam. Ainda faltam dados!...
_ Quais são esse dados?...
_ O sargento foi colher e dirá no almoço!...
_ Delegado, estamos todos neste caso. ? Falou a moça irritada. ? Meu pai é suspeito de contrabando e eu, na qualidade de estudante de direito, exijo que tais dados me sejam revelados. Do contrário, serei obrigada a tomar providências!...
_ Se é assim, já que a senhorita insiste, vou dizer um deles, está bem?...
_ Pra começar, sim. Qual é ele?...
_ O fator surpresa!... ? Respondeu, cinicamente.
_ Voltamos ao ponto de partida!... Não me disse nada!...
_ Engana-se, senhorita. Disse mais do que podia. Eu achava que fôssemos chegar a este ponto, e me preparei pra ele. Agora, a senhorita deve ter percebido que não adianta insistir, pois vamos ficar andando em círculos e só perdendo um tempo muito útil!...
_ Posso ao menos saber quando?...
_ Sim! Ainda hoje, quando juntar as peças, OK?...
_ OK! Não tenho outra alternativa, não é?...
_ Receio que não!...
Sentindo-se derrotada, Sandrinha perguntou aos executivos:
_ Desisto. Posso ser útil em alguma outra coisa?...
Lisonjeados com a oferta, os homens sorriram e Agnelo falou:
_ A senhorita não devia ter se oferecido. Temos tanto serviço no levantamento das contas que não posso dispensar, a menos que seja brincadeira, é claro!...
_ Eu não aceitaria ver meu pai envolvido num problema tão sério e ficar de braços cruzados. Que filha seria eu e que futura advogada estaria sendo, se não me envolvesse até o limite máximo das minhas possibilidades?... ? Protestou, com ímpeto.
Impressionado, Agnelo disse:
_ Se é assim, quando a senhorita quiser, estou pronto!...
_ O que me interessava nesta sala era ouvir o nome do chefe da quadrilha. Como não foi possível, acho que de parceria com o senhor, posso chegar a certas conclusões, mesmo que haja alguém tentando me barrar os passos nessa busca!... ? Olhou fixamente para o delegado, que recebeu a crítica com um sorriso irônico e um rápido olhar a medir a estatura escultural da moça, que, de pés, estava pronta para entrar em ação. Vendo-a tão disposta, Agnelo não se fez de rogado e, à guisa de despedida, falou:
_ Estaremos em minha sala!...
Fecharam a porta e Alberto disse:
_ Se descobrirem alguma coisa, vai ser de grande utilidade. O homem é osso duro e tenho certeza de que mesmo depois de desmascarado, ainda tentará qualquer recurso pra mostrar sua inocência. Bem, creio que agora os senhores terão assuntos que não me dizem respeito. Vou pegar o Mandado e, quem sabe, fazer algumas coisinhas?!... ? Concluiu com um leve aceno e saiu acompanhado dos olhares curiosos dos que ficaram, com uma interrogação a bailar-lhes nas mentes: Que coisinhas seriam aquelas?... Mistério!..
Passou nas salas dos secretários e formulou os convites.





Autor: Raul Santos


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