Um paralelo entre a leitura, a mídia e a biblioteca.



*Teresa Raquel Vanalli
Bibliotecária do Serviço de Biblioteca da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNESP ? Campus de Presidente Prudente.


Porque não existe um marketing eficiente divulgado pela mídia capaz de estimular a leitura e formar leitores de fato? Porque a mídia não colabora para que isso aconteça?
E a biblioteca? Porque não consegue cumprir com eficiência seu papel de inclusão social? Essas e outras questões farão parte desta reflexão e darão o tom do conteúdo a ser desenvolvido.
"À margem da sociedade, estão os que não lêem, porque não têm acesso ao pensamento livre, crítico e transformador". Reflexões nesse sentido são importantes, principalmente no que diz respeito à construção de uma sociedade mais humanizada.
[...] Antes de mais nada, necessário se faz pensar que o acesso ao conhecimento tem que ser tratado como um direito inalienável de todos os cidadãos. Mas esse acesso tem que ser entendido para além da perspectiva de se consumir informações produzidas externamente, em geral a partir de uma produção fechada e elitista. Precisamos, ao mesmo tempo, estimular a produção de culturas e conhecimentos locais, pensadas aqui no seu plural pleno. (PRETTO, 2010)
Nessa perspectiva devemos pensar quais seriam as formas de estímulos mais eficientes na produção de cultura e conhecimento e de quem seria a responsabilidade de torná-los possível.
[...] A comunicação deveria ser o componente fundamental na construção da cidadania, mas infelizmente sabemos que os interesses legítimos da sociedade não estão sendo levados em conta. A maioria (80%) da população brasileira tem na televisão sua única fonte de informação. Além disso, a população não sabe que a radiodifusão é operada como concessão pública. No cinema, 90% das telas brasileiras são ocupadas pelo cinema americano. Com relação à internet, o acesso da população ainda não ultrapassa 20%. (FERREIRA, 2009)
Fica complicado falar em inclusão, em cidadania quando na verdade, sabemos que a massificação é uma constante tendência da mídia e que, cada vez mais, aumenta a distância entre o povo e a leitura, o conhecimento, a reflexão, e o pensamento crítico. Todos estes elementos seriam a forma mais segura para se transformar a sociedade, tornando-a mais humanizada, mais justa e democrática.
A mídia seleciona o que pautar, pensando se aquilo vai ou não vender. Essa é a sua tarefa e seu objetivo. Não há como esperarmos comprometimento das grandes emissoras no sentido de qualidade educacional ou campanhas de estímulo a leitura, ou ainda programas voltados a esse tema. Seus interesses estão inteiramente voltados ao que dá lucro, ao que é vendável. Assim sendo, é muito difícil para qualquer projeto na área educativa ou de leitura concorrer com o que é veiculado na grande mídia, pois todos os dias a programação que invade as nossas casas são carregadas de estímulos ao consumo desenfreado, criando necessidades que acabamos acreditando que são reais. Sem contar que quando as emissoras investem em projetos mais sérios e com conteúdos mais interessantes, são veiculados em horários que dificilmente um trabalhador que acorda cedo todos os dias poderá ter acesso.
Apesar do acesso à informação ser hoje mais amplo e em questão de segundos podermos saber de fatos do mundo inteiro e podermos também nos comunicar com quem quer que seja e onde quer que esteja, ainda assim, não temos efetivamente o conhecimento garantido. No entanto, [...] "precisamos analisar criteriosamente qual o valor das informações que estão sendo veiculadas e a quem interessa a mera divulgação de fatos. Isso contribui para que sejamos uma sociedade meramente factual, sem senso crítico, analítico e seletivo". (FRAGOSO, 2004). A possibilidade de acesso universal à informação não é garantia de que teremos uma sociedade melhor. Em que medida a biblioteca deve interferir nesse processo? A biblioteca, vista como um centro dinâmico de armazenamento, divulgação e porque não até de produção do conhecimento, deveria desempenhar mais intensamente esse papel. As possibilidades de envolvimento com a leitura a ser realizada nesse ambiente é infinita. Segundo Fragoso e Duarte (2004) esse espaço concentra os conhecimentos registrados numa série de suportes leitores impressos no papel ou vistos na tela de um computador. Também abriga pessoas que buscam integração, usufruindo de suas possibilidades. As palavras, então, são conhecidas, pesquisadas e intercambiadas e as mudanças residem na força e na capacidade de conscientização exercida por elas. O crescimento dos acervos e a penetração da leitura nas comunidades da aldeia global provêm, sem dúvida, da biblioteca. Hoje, mais do que nunca, se reconhece que essa instituição exerce um papel vital na educação e na formação das pessoas. Daí, a necessidade de conhecê-la melhor. Para que isto aconteça, é absolutamente necessário que suas portas estejam abertas para todos os possíveis leitores. E mais que isso, que sua estrutura esteja preparada para receber esses usuários em potencial, os quais poderão vir a ser futuros leitores, sujeitos plenos do processo transformador da sociedade e aí sim, verdadeiros cidadãos.
Nesse sentido, os projetos governamentais deveriam caminhar intensamente mobilizados não só para a criação, mas também para o estabelecimento e funcionamento pleno das bibliotecas sem se limitar somente à sua estrutura física para fazer de conta que existem. Essa dificuldade é decorrente da falta de visão do país sobre a importância da biblioteca. Existe um estudo que mostra que o Brasil precisa construir 25 bibliotecas por dia durante dez anos para que se tenha pelo menos uma em cada escola. Segundo Cieglinski (2010) o déficit de bibliotecas no ensino fundamental é de 93 mil. Desse total, 89,7 mil são escolas públicas e 3,9 mil, estabelecimentos privados de ensino. O que vemos acontecer geralmente, são leis e decretos de criação destes espaços, mas sem nenhuma estrutura para o seu funcionamento. Recentemente o governo instituiu uma lei que toda escola pública deve ter uma biblioteca. Essa medida, embora tardia, é muito bem- vinda, mas não podemos pensar que uma biblioteca vai desempenhar seu verdadeiro papel sem a estrutura mínima para isso. Como conceber uma biblioteca sem uma política de formação de acervo, sem equipamentos de informática e principalmente, sem o bibliotecário que é o profissional capacitado para estar à frente de sua administração e organização, garantindo que ela funcione plenamente? A legislação estabelece que as bibliotecas devem ser administradas pelos bibliotecários, mas, segundo levantamento, hoje há um total de 21,6 mil profissionais habilitados, enquanto o país conta com aproximadamente 200 mil escolas de educação básica, portanto será muito difícil para as escolas adequar-se a essa medida até o prazo limite que é 2020. A lei por si só não faz nada e o governo, pelo visto, não tem nenhum programa para implantação e estruturação dessas bibliotecas, portanto, mais uma vez caberá à sociedade se envolver nesse projeto.

REFERÊNCIAS

CIEGLINSKI, Amanda. Ausências de bibliotecas no Brasil mostra o desleixo e o descaso de estados e municípios com a educação. Educação Política: mídia, economia e cultura. 2010. Disponível em: http://glaucocortez.com/2010/06/02/ausencia-de-bibliotecas-no-brasil-mostra-o-desleixo-e-o-descaso-de-estados-e-municipios-com-a-educacao/> Acesso em: 15 ago. 2010.

FERREIRA, Taís. Mídia e democracia: educar para a leitura crítica da mídia. Feitos & Desfeitas. 2009. Disponível em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=567FDS007> Acesso em: 15 ago. 2010.

FRAGOSO, Graça Maria; DUARTE, Rogério. Livro, leitura, biblioteca...uma história sem fim. Revista ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina. v. 8/9, p. 169 , 2003/2004.

PRETTO, Nelson. Faltam meios de divulgar produção acadêmica do Brasil. Terra Magazine, Salvador, 2010. Disponível em: Acesso em: 15 ago, 2010.
Autor: Teresa Raquel Vanalli


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