Prá dizer que falei de Vandré



Edson Silva

Emoção súbita talvez seja a forma de definir o estado em que senti ao ver, dia 25 de setembro, na GloboNews, a entrevista feita pelo repórter Geneton Moraes Neto com o cantor e compositor Geraldo Vandré, que há 37 não falava com emissoras de TVs no Brasil. Além de ter todos os vinis de Vandré incansavelmente garimpados em sebos e de considerar "Prá não dizer que não falei de flores" ou "Caminhando" uma obra prima, tenho profunda admiração pelo artista, especialmente por sua coragem diante da Ditadura Militar, coragem que seu cantar não escondeu, mostrou escancaradamente.

Em 82, no Curso de Comunicação na PUC de Campinas, com especialização em Jornalismo a partir de 84, não tive dúvidas ao escolher Vandré para fazer um trabalho sobre Música de Protesto. Também cheguei trabalhar "virtualmente" com Vandré no Correio Popular, ele mandava de São Paulo a coluna, não recordo se semanal ou quinzenal, e jamais nos encontramos na redação, infelizmente. Mas voltando ao Vandré a TV, dia 25, minha expectativa não era de uma entrevista qualquer e Vandré mostrou que ainda é uma lenda.

Ele começa contundente criticando a massificação artística e afirma que a arte ( pelo menos a maioria que se vê principalmente em música da atualidade) é cultura inútil. E ri da própria sorte dizendo ser advogado e por isso consegue ser mais inútil que qualquer artista, sendo advogado num tempo sem lei e pergunta: "Quer coisa mais inútil que isso?" Não muito depois, Vandré volta dar mostras da alma revolucionária, dizendo que, antes de decidir se volta cantar canções populares no Brasil, terminará um estudo de piano (música erudita) para um poema sinfônico e acrescenta: "Não existe nada mais subversivo que um subdesenvolvido erudito"

Sobre divergências com tropicalistas, como Caetano e Gilberto Gil, Vandré dá resposta ácida e deixa claro seu ponto de vista. Ele disse que certa vez Gil falou que fazia qualquer coisa (no sentido musical), pois uma tem que dar certo. Ao repórter, Vandré é taxativo: "Eu não faço qualquer coisa". O jornalista insiste perguntado se Vandré mudou ou não de opinião sobre os tropicalistas e a resposta é: "Parece que eles continuam na mesma. É o que me parece. Eu estou distante de tudo ? não só do Tropicalismo como de tudo praticamente que se faz do Brasil".

Perguntado qual é o Brasil de Vandré, a resposta: "É o antes ? de 40 anos atrás. O país que o Brasil era quando fiz música para o Brasil não era este país de hoje. Não existia este processo de massificação." Segundo ele, "hoje o que existe é cultura de massa. Não é cultura artística brasileira. Se você considerar os outros autores, eles fazem coisas de vez em quando. Não têm uma carreira como tinham antigamente ? nem Chico Buarque nem Edu Lobo, ninguém. A carreira que eles têm hoje é muito segmentada".

Vandré disse como se sente no Brasil e negou participação em política. "Estou exilado até hoje. Ainda não voltei. Estou afastado das atividades que eu tinha até 1968 no Brasil. Não retornei. Nunca tive militância político-partidária. Nunca pertenci a nenhum partido. Nunca fui político profissional", resume enigmático.

Edson Silva, 48 anos, jornalista, nascido em Campinas e trabalha como assessor de imprensa em Sumaré.

Autor: Edson Terto Da Silva


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