Algumas Palavras Sobre A Revista Arraia



Algumas palavras sobre a revista Arraia


Por Ivaldo Ribeiro Filho



Quando em 2000 entrávamos no novo milênio, a revista ArraiaPajéurbe, chamada carinhosamente de Arraia, nascia. A primeira impressão que tive ao ver aquele número, foi: que diabo é isso? E dei sorriso. Aquela forma de peixe rompia dicotomias. Seus três lados, quando fechada, esqueciam e ainda esquecem qualquer oposição redutora, qualquer lógica clássica. Nela, convivem tanto o cult como o kitsch, e ainda o popular, o regional e o fantástico. Não existe um só caminho, e se existir é o da arte.

A diversidade, multiplicidade encanta. Poeta como Guido Bilharinho ao lado do Mário Gomes. Guido, grande poeta culto, com opiniões formadas (não disse congeladas) e embasamento para aquilo que acredita. Mário Gomes, o perambulador das nossas ruas, da Praça do Ferreira, no centro da cidade, da vida atribulada, mas cheia de humor. Arraia é polifonia.

Arraia não tem identidade. Tem várias identidades, e não somente gráficas. Cada página comparada à outra, representa a diferença, os pontos de vista. Cada página é uma mônada. E qual revista cearense democratizou tanto o acesso das minorias? Arraia é mutação constante, fruto de prolongado trabalho de Carlos Emílio Correa Lima, Cláudio Portella e Adriano do Vale.

Gosto do caos construtor ali dentro. Da balbúrdia. Do acaso de um conto atravessando cada página da revista no rodapé. Do acaso vindo, surpresa, trazendo o novo. Do eterno retorno do diferente. Paixão louca. Porque nem os editores da Arraia são editores normais, nem a revista. Ninguém quer mais a normalidade.

Nela, o humor, rompe a tristeza da razão. Lingüiças penduradas na capa do terceiro número: simples banalidade. Banalidade é algo muito importante: um mictório revolucionou a arte. Cores berrantes, até então nunca postas em revista de literatura. Agora já copiadas, mas não tão bem. As revistas eram um preto e branco, eram um verde-musgo, um amarelo. Já Arraia, é excesso, carnavalização.

Me lembro do conto de Nilto Maciel dividido em quatro polígonos irregulares. Não tinha começo, meio, fim: não-linearidade. Cada um que jogasse seu jogo. De dois contos, de autores diferentes entrelaçados. Linha de um, linha de outro. Os autores ficaram felizes. Resultado: amizade maior. Que o diga Marcelo Mirisola.

Penso que nela cabe qualquer coisa, nada é impossível. Revista difícil, como poema neobarroco. É poema neobarroco. E é melhor a complexidade ao demasiadamente fácil. O desvio à reta. Penso que a Democracia também seja bastante difícil. Manter uma Democracia precisa da participação ativa de todos nós. Penso que manter revista democrática como ArraiaPajéurbe, que dá voz a todos, seja difícil da mesma maneira. Sempre houve e sempre haverá a tentativa de solapar a diversidade. De dizer isso é que é o bom, o certo, a poesia brasileira está uma pasmaceira. Um nada. Como houvesse apenas um caminho, quando, para cada problema, existem pelo menos oito.



Pessoas param para olhar o objeto estranho. Põem olhos. Reviram-no com as mãos. Dão risada de alegria e choque, se encantam. Pessoas se encantam. Folheiam, lêem e dizem: isso é loucura! Como pode objeto tão comum distorcer a visão do cotidiano das pessoas. Ninguém olha para ela e fica imune. A intensidade bate no peito. Não há aquele olhar cartesiano de causas, gélido a ponto de dizer: é, bem bolado... Não! A revista provoca espanto, ninguém permanece indiferente, coisa hoje tão comum, com esses laxismos. Há deslocamento, porque as pessoas saem de seu lugar. A paixão assalta e elas se entregam. Vem o brilho nos olhos. E se depois disso, alguns não a compreendem, é porque não é preciso compreender, só gostar. É porque têm de voltar para a dureza de todo dia. Dizer isso ou aquilo não deve, como fosse perda de tempo, porque não proporciona dinheiro. Porque a revista é louca, e se é louca, para que serve? Para nada.

Bem, é isso mesmo: Arraia é revista sem finalidade.


Autor: Ivaldo Ribeiro Filho


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