O Real Versus O Virtual



O real versus o virtual

Por Rodrigo Capella*

Os números são divergentes: para algumas entidades, o Brasil possue 1.700 livrarias; para outras, 2.600. Mas, o fato é que, em um país com 180 milhões de habitantes, o índice "livraria por habitante" é realmente insignificante. E ainda tem mais: as lojas estão espalhadas por apenas 10% dos municípios brasileiros. A população, que já não se sente motiviada para comprar livros, vê esse fato como uma barreira e opta por acessar a Internet para ler de tudo, menos livro. O bate-papo é, sem dúvida, o destino preferido, mas, para a sorte da literatura, um nova tendência vem surgindo: nos grupos acadêmicos e literários, comenta-se sobre a utilização do ensino à distância como forma de se incentivar e, até certo ponto, propagar o gosto pela literatura brasileira. Os defensores desse tipo de ferramenta argumentam que, ao utilizar a Internet e participar de cursos via web, os alunos seriam motivados a pesquisar sobre as diversas tendências da escrita e, com isso, passariam a consumir mais livros.


Na outra frente, os opositores acreditam que a busca por novas obras só ocorre quando o estudante recebe estímulo dos professores, muitas vezes especializados em determinados assuntos de nossa literatura. Eu acrescentaria mais alguns argumentos: assistir um curso de literatura pela Internet é como acompanhar uma partida de futebol pela televisão. Não tem a menor graça. Diminui-se a emoção de ver o time entrar em campo, deixa-se de comer hot dog com queijo e mais: o gol perde grande parte de sua característica, sentido e cor.


A literatura, assim como o esporte mais popular do Brasil, é feita de momentos. O lance é único, o gesto merece ser contemplado por minutos e o drible precisa ser eternizado com uma fotografia marcante. Todos esses sentimentos, infelizmente, não podem ser captados em uma aula pela Internet. Vamos a um exemplo: quando meu professor de literatura do ginásio recitava Drummond de Andrade, eu percebia emoção em seus olhos. Se esse mesmo profissional lesse o mesmo poema em uma aula virtual, eu, rapidamente, sentiria uma perda de credibilidade e sustância. O ao vivo é sempre melhor! Nesse debate presencial versus virtual, outros argumentos também precisam ser destacados. Em uma aula cara-a-cara, os alunos podem, por exemplo, tirar dúvidas, apontar questionamento e, até mesmo, apresentar composições próprias, dos mais diversos estilos literários. Além disso, o professor direciona as explanações de acordo com as necessidades dos estudantes. Esses motivos tornam, portanto, o ensino à distância, até o presente momento, uma ferramenta desnecessária para a nossa literatura. Precisamos, então, valorizar as aulas presenciais, ensinando os alunos a respeitarem os professores, investindo no conhecimento intelectual desses profissionais e, principalmente, possibilitando o surgimento de centros de pesquisa literários. Difundir a literatura é investir em educação, conhecimento e cultura.

E o governo e a iniciativa privada parecem que acordaram e estão, ao menos, tentando fazer algo. Pode-se dizer que a educação brasileira, que andava na beira do abismo, agora tem, então, chances de se recuperar e de impulsionar um aumento dos livros lidos. Algumas iniciativas de organizações privadas vem sendo colocadas em prática e o governo, sempre omisso a quaisquer programas promissores, nos apresentou, não faz muito tempo, algo bem desenhado: o Plano de Desenvolvimento da Educação. No papel, essa ação reservava R$ 1 bilhão para investimentos nos municípios com piores indicadores organizacionais, além de uma premiação para as escolas públicas que melhorarem os seus índices educacionais. Esse Plano estabelecia também algumas mudanças nas universidades federais, com o intuito de aumentar a quantidade de vagas oferecidas.

Quando apresentaram o plano, disseram assim:: "vejo o início do novo século da educação no Brasil. Um século capaz de assegurar a primazia do talento sobre a origem social". Lindas palavras, ótimas medidas. No papel e na prosa, na vida real e virtual, nas escolas e na Internet, estamos orgulhosos e até contentes. Mas, nas ações. Bem... Só nos resta torcer e de mãos dadas por mudanças, realmente, significativas e eficazes. Que venham logo e rápido!

(*) Rodrigo Capella é escritor e poeta. Autor de vários livros, entre eles "Rir ou chorar" e "Transroca, o navio proibido", que está sendo adaptado para o cinema pelo diretor Ricardo Zimmer. Informações: www.rodrigocapella.com.br


Autor: Rodrigo Capella


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