João Mulungu, O elemento da resistencia negra em Sergipe



Por Hédila Maria Alves dos Santos Santana
E-mail: [email protected]

O último e o mais sagaz líder dos quilombos de Sergipe D?EL Rey João Mulungu. Negro puro e forte nasceu e cresceu entre a Senzala e a casa grande do Engenho Flor da Roda em 1851 na vila de Laranjeiras, região do vale do Cotinguiba; escravo de propriedade de João Pinheiro de Fraga.
João Mulungu era um escravo de profissão, talvez tenha sido carpina ou pedreiro; andava viajando por toda província de Sergipe. Amplamente citado por diversos historiadores brasileiros como o mais importante defensor da causa negra, na luta contra a escravidão, ficou conhecido como o Zumbi sergipano.
Desde os anos 60 que João Mulungu interagia com os grupos revolucionários de Laranjeiras, na época conhecida como o berço das ideias progressistas e revolucionárias, local onde se difundiu pensamentos humanistas e ações libertárias dos negros sergipanos.
A morte de sua mãe foi muito cruel, sendo presenciada por ele. O mesmo viu sua genitora sendo chicoteada até a morte; sentindo em seu coração a dor de ver o sangue da sua mãe derramado pelo chão. A partir de então silenciou e jurou vingança; andou como um legítimo nômade guerreiro não só em Laranjeiras, mas, também em Capela, Rosário, Maruim, Siriri, Santo Amaro das Brotas entre outras vilas sergipana, sempre com o objetivo de vingar-se e libertar os escravos prisioneiros.
Sendo desta forma o escravo João Mulungu foi formando os quilombos predatórios ou de estrada que era o mais utilizado, pois servia como estratégia contra os batalhões da policia que viviam em constantes perseguições. Por onde este escravo passava recebia informações, João era esperto e ligeiro; muitas honras lavou com sangue em nome do seu povo, deu incentivos a vários levantes, colaborou com as fugas de milhares de escravos; contudo fortaleceu o contingente de negros em Sergipe. Valente, logo se tornou um líder, um heroi e chefe dos quilombolas sergipano.
Sua trajetória à frente da revolução negra e sua liderança, foi sempre contestada pelo sistema e pelo poder das autoridades que desejavam te-lo como um trofeu.
Por traição de um dos escravos da Flor da Roda, João Mulungu e seus companheiros foram capturados às 12 horas do dia 19 de janeiro de 1876 coincidentemente nas terras do Engenho em que nasceu. Foram duros embates entre a polícia, João e seus companheiros; houve muitas baixa e reforços policiais, sem munição e exausto o cerco foi se fechando e o heroi negro de Sergipe foi capturado sendo conduzido ao quartel de Divina Pastora sob a guarda de capitão da diligencia o Sr. João Batista da Rocha.
Com a captura de João Mulungu, o presidente da província João Ferreira de Araújo Pinho, deu início a uma manipulação em torno do mais resistente elemento negro. João Mulungu foi exposto na cadeia o povo via e nada dizia; uns aplaudiam e outros com medo corriam.
O negro João foi levado a julgamento, a ordem era de desmoralização pública do símbolo de luta pela liberdade. João preferiu a morte no patíbulo a ter que voltar a viver no cativeiro. A sentença foi proferida ? enforcamento em praça pública. Ninguém entendeu quando ele riu agradeceu e disse:
"Nunca tive a vida como
Contemplação de mim
Meu povo é minha vida
Ela se multiplica
Onde haja um negro
Aí eu estou..."

Sua prisão e morte foi uma vitoria nas mãos do governo que mostrava serviço, declarando a extinção dos quilombos de Sergipe; porém isso não aconteceu, houve mais manifestações em toda a província sergipana até maio de 1888.
Marco da resistência negra sergipana, que simbolizou as aspirações democráticas, independente de raça ou posição econômica. Heroi negro que cristalizou os anseios de liberdade do povo brasileiro e em especial dos sergipanos.
Lutou pela liberdade do seu povo e ficou conhecido e respeitado em Sergipe e no Brasil, assim como tantos outros que lutaram pela liberdade, a exemplo de: zumbi, Lucas Dantas, Chico Rey, Manoel Balaio e outros.
O poder Legislativo da cidade de Laranjeiras o reconheceu através do Decreto- Lei 407 de agosto de 1990. Sendo que na capital sergipana, foi através da Lei 1856 de 14 de julho de 1992 e finalmente o Legislativo Estadual com o Decreto- Lei 4.192 de 23 de dezembro de 1999, consagrando 19 de janeiro como o Dia Estadual da Luta da Comunidade Negra, em honra ao Heroi Negro de Sergipe.
Com o advento da escravatura em Sergipe, o negro João Mulungu, lutou bravamente contra a apartheid político, sócio-econômico e cultural, através de diversos agentes tradicionais o que marcou profundamente o povo sergipano.
O libertário negro sergipano, extraordinário pelo desempenho das suas proezas guerreiras; reconhecido 114 anos depois com os esforços dos seus descendentes da Casa de Cultura Afro Sergipana, pelos poderes públicos de Sergipe, como Heroi Negro Sergipano, o primeiro no Brasil a ser reconhecido pelo poder público.

Referência
BEZERRA, Felt. Etnias Sergipanas. Aracaju: Governo do estado de Sergipe,1984
D?ACELINO, Severo ? Panáfrica África Iya N?La ? Aracaju: MemoriAfro; 2002
FIGUEIREDO, Ariosvaldo. O Negro e a Violencia do Branco: O Negro em Sergipe. Rio de Janeiro: José Álvaro, 1977.
Autor: Hédila Maria Alves Dos Santos Santana


Artigos Relacionados


20 De Novembro- NÃo É Dia Dos Preetos!!

Movimento Negro Ressurge No Brasil

Pensamento Negro - Movimento Negro E Pensamento Afro

O Que Jesus Veio Fazer Na Terra?

Colonização De Sergipe

"consciência Branca"

A Vida Dr. Orlando Calazans Ribeiro, Dividida Em Fases Da HistÓria.