MOVIMENTO LEI E ORDEM E A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS





UNIDADE DE ENSINO SUPERIOR DOM BOSCO
CURSO DE DIREITO



PEDRO IVO FONTENELLE CABRAL












MOVIMENTO LEI E ORDEM
E A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS


Trabalho do tipo artigo científico, apresentado à disciplina Direito Penal Especial III do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco, para obtenção de nota

Professor:










São Luis
2008


1. INTRODUÇÃO
A questão do aumento da violência urbana no Brasil desafia o Estado brasileiro e a sociedade, despertando questionamentos sobre a política criminal adotada no país.
Em função da grande repulsa social causada por crimes bárbaros que abalaram o país, como os assassinatos da atriz Daniela Perez, do menino João Hélio e, mais recentemente, da menina Isabella Nardoni, há um clamor popular por punições mais severas aos culpados.
Nesse momento, surgem as mais diversas propostas no sentido de combater a criminalidade, como a de reduzir a maioridade penal e a aplicação de penas perpétuas ou de morte, e a experiência de outros países talvez possa também ser utilizada no Brasil com essa finalidade.
O movimento Lei e Ordem (Law and Order), por exemplo, que surgiu nos Estados Unidos na década de 70, propondo um Direito Penal Máximo para combater a violência, parece estar influenciando nossa legislação penal, tomando-se como exemplo, a Lei dos crimes hediondos (Lei n. 8.072/90).
A referida norma, baseada no art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal de 1988, foi promulgada, com o objetivo de aplicar maior repressão aos crimes considerados gravíssimos.
Este trabalho analisa a relação entre a Lei dos crimes hediondos e o movimento Lei e Ordem.
2. O MOVIMENTO "LEI E ORDEM"
Cezar Roberto Bitencourt afirma que "as relações humanas são contaminadas pela violência, necessitando de normas que a regulem".
O movimento ideológico norte-americano "Law and order" é uma pressão no sentido de reformar o sistema penal, visando transformar a realidade da violência urbana daquele país.
Propõe reação legal, judicial e policial do Estado mais severa contra as condutas criminosas, incluindo a adoção de regime carcerário mais rígido e concluindo que a pena deve ser proporcional à gravidade do crime, utiliza a máxima "direitos humanos para humanos direitos".
Na busca de uma resposta mais proporcional ao delito praticado, assemelha-se, afirmam alguns, àquela estabelecida no Código de Hamurábi (Olho por olho, dente por dente), embora de forma mais moderna, com condenações perpétuas e até mesmo sentenças de morte.
Tendo como objetivo a redução dos índices de violência, influenciou o sistema norte-americano, no qual a política "Tolerância Zero", adotada em Nova Iorque a partir de 1993, pode ser citada como um dos maiores exemplos.
O movimento se expandiu e chegou ao Brasil e a Lei de Crimes Hediondos é um exemplo dessa política punitiva, pois propõe mudanças na legislação para aplicação de punições mais severas do que as demais aos crimes considerados mais violentos.
No entanto, há quem ache que o movimento "Lei e Ordem" é uma simples exacerbação de uma lógica perversa que existe antes dele: a lógica anti-povo presente no Sistema Penal.
Mas na verdade, a discussão sobre esse movimento está longe de ter fim, pois, como citado anteriormente, há quem diga ser justa a pena conforme o crime cometido, e há quem discorde.
Dentre os que criticam o movimento, Lílian Cláudia Cardozo o compara a uma "Máscara de Ferro" do sistema penal, afirma que:
"A Política Criminal, vista por este prisma, "é a maneira com que se organizam as respostas penais repressivas no controle dos atos perturbadores da ordem social, basicamente o crime". Uma visão míope da realidade, na qual o discurso jurídico-penal, ao defender as ultrapassadas ideologias de segurança, deixa de lado a inadequação do sistema de justiça criminal em relação as suas funções declaradas e evita confrontar a crise. Já para Heleno Fragoso, a Política Criminal é "a atividade que tem por fim a pesquisa dos meios mais adequados para o controle da criminalidade, valendo-se dos resultados que proporciona a Criminologia, inclusive através da análise e crítica do sistema punitivo vigente".
Além disso, alegam os opositores a esse movimento, que o direito penal estaria passando de ultima ratio do direito para a prima ratio, tentando manter uma materialização da justiça, além do uso excessivo do direito penal, contrapondo-se assim ao princípio da intervenção mínima.
Em sua obra "Dos delitos e das Penas", Beccaria afirma que:
"Fazemos parte de uma sociedade capitalista, extremamente influenciada pelos ideais neoliberais, onde predomina a supervalorização da propriedade, as classes dominadas carecem de representação política e a justiça não é uma questão de maiorias, mas de interesses. Em países como o nosso, surgem leis que, não são mais do que privilégios, um tributo que todos pagam para o conforto de alguns" (BECCARIA, 2000).
Ainda de acordo com essa idéia, Damásio de Jesus afirma estar havendo um movimento "neocriminalizador" que visa dividir a sociedade em dois grupos: os homens bons, merecedores da dignidade humana e da proteção legal; e aqueles que não merecem nenhum dos dois.
Em oposição a esses críticos e a favor do Movimento da lei e ordem, há quem concorde com medidas mais rígidas, tendo em vista que uma maximização das penas intimidaria ações criminosas, principalmente contra aquelas consideradas mais graves, e de certa forma mais reprimidas pela sociedade.
Com um maior rigor na penalização, existiria uma espécie de "amedrontamento" dos criminosos, que sofreriam mais por suas condutas, sendo que este maior vigor nas sanções acarretaria uma garantia da paz social.
3. A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS
Dispõe o art. 5º, incido XLIII, da Constituição Federal:
"a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;"
Baseada no artigo acima e com bases doutrinárias similares às que justificam o movimento "Lei e Ordem", surge no Brasil a Lei dos crimes hediondos, promulgada após um caso que gerou enorme comoção nacional (o homicídio da atriz Daniella Pérez).
A referida norma estabelece, por exemplo, no art. 2º, que os autores de crimes hediondos não serão beneficiados com a concessão de certos benefícios previstos na legislação penal para os demais criminosos (anistia, graça, indulto, fiança, início do cumprimento da pena em regime fechado e aumento do tempo de cumprimento da pena para progressão de regime etc.).
Os crimes que poderiam ser punidos dessa forma são aqueles classificados como horríveis por alguns doutrinadores, em uma escala de leves, médios, graves e horríveis.
Sendo estes últimos geralmente causadores de grande comoção na sociedade inteira e causadora de revolta, e sentimentos que alimentam mais ainda esse tipo de movimento.
Com isso, a todos os crimes citados no referido artigo da CF foram atribuídas penas mais severa pela lei supracitada, que além da definição dessa espécie de crime, define várias providências penais e processuais penais, bem como as referentes às execuções das penas entre outras coisas.
Além dessa lei, alguns outros dispositivos, acrescentam algumas condutas ao rol de crimes hediondos, como o tráfico ilícito de entorpecentes, algumas espécies de homicídio e outros crimes também foram assim caracterizados como os crimes hediondos.
Além dos citados no artigo, vale lembrar ser caracterizado como crime hediondo a venda de drogas ilícitas a menores, prevista no art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Podemos notar um clamor por uma justiça maior que aquela proporcionada pelo atual Sistema Penal brasileiro nos crimes comuns, mas, apesar da discussão sobre a efetividade do aumento do rigor penal, sabemos que a realidade no Brasil é que as penas aplicadas pelo Código Penal não são eficientes na realização de qualquer dos seus objetivos (preventivo, repressivo ou ressocializante).
Além disso, há um ponto em que todos concordam: para que o Estado possa reprimir com maior severidade as condutas criminosas, é imprescindível a melhoria da estrutura carcerária brasileira, pois, embora hediondo o crime, não podem ser desrespeitados direitos mínimos inerentes à pessoa humana do criminoso.
Além disso, há um risco, inerente a toda atividade humana, de erro nas decisões judiciais, que nem sempre atingem uma verdade científica, podendo ensejar graves injustiças.
Nesse ponto, cabe também mencionar que, nesse novo tratamento dado pela lei, residem dois pontos particularmente polêmicos: vedação à concessão de liberdade provisória e a alteração de requisitos para a progressão de regime.
Sobre a vedação à concessão de liberdade provisória, estaria ultrapassando os poderes dados pela CF a uma lei ordinária, pois contraria a presunção de inocência, estabelecida pela própria Constituição, ao dispor, no art. 5º, inciso LVII: "Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
No que tange à progressão de regime, estaria havendo um retrocesso na ciência penal e social das penas, por negar o benefício independentemente do comportamento do condenado durante o cumprimento da pena.
Sobre o tratamento dado aos criminosos pela lei de Crimes Hediondos, afirma o Prof. Ney Moura Teles :
A privação da liberdade não intimida e, o que é mais grave, não só não recupera o condenado, com também o transforma negativamente. Não podia ser diferente, pois não se ensina a viver em liberdade, respeitando os valores sociais, suprimindo a liberdade do educando.
É como desejar ensinar um bebê a caminhar, atando-lhe as pernas. Ele jamais vai conseguir.
O caminho é o da limitação, cada vez maior, da presença do Direito Penal na vida das pessoas. Somente quando a lesão ao bem jurídico mais importante for muito grave é que o Direito Penal deve ser chamado.
Ou seja, na opinião do Prof. supracitado, não devem haver essas penas privativas de liberdade, mas sim uma verdadeira ressocialização de criminosos, que é o real objetivo principal da pena, principalmente a privativa de liberdade, que, ao contrário de ressocializar, piora a convivência do indivíduo com a sociedade que o rodeia.
Confirmando isso, vemos os fatos do dia-a-dia que provam que a criminalidade e a prática desse tipo de crime não diminuiu e somente aumentam na sociedade, pois as reais causas destas condutas, são os problemas sociais que atingem a grande maioria da população.
4. CONCLUSÃO
O aumento da violência assusta a sociedade, que procura alternativas urgentes e eficazes para enfrentá-la.
Embora algumas estatísticas demonstrem que leis mais severas não estão sendo eficientes para reduzir os índices de criminalidade, a verdade é que medidas urgentes precisam ser adotadas com essa finalidade e as demais soluções parecem apresentar resultados mais demorados.
O combate ao aumento da violência vivenciada nas ruas e estampada à população através da mídia, exige do Estado maior atuação, porém não apenas para dar uma satisfação à opinião pública, mas para tratar a criminalidade como uma questão social séria.
Porém, a evolução da sociedade moderna não permite uma regressão no que se refere ao tratamento dado à pessoa humana, no reconhecimento à sua dignidade (inclusive à do criminoso).
Logo devem ser buscadas soluções e o sistema penal brasileiro ainda precisa evoluir para alcançar maior efetividade no tratamento da criminalidade e a aplicação de leis mais severas talvez seja realmente necessária, porém não podemos desconhecer que não são suficientes para resolver o problema, que precisa ser tratado na sua principal origem: os graves problemas sociais existentes no país.








BIBLIOGRAFIA
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal:Parte Geral. 8 ed. São Paulo: Saraiva. vol. 01, 2003. p. 02)
TELES, Ney Moura. Direito Penal, vol. I, 2ª ed., Ed., Atlas : São Paulo, 1997, pg.39.
Site http://www.advogado.adv.br/artigos/2000/art11.htm. Acesso em 23/05/2008.
Site http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10574. Acesso em 25/05/2008.
Site http://www.praetorium.com.br/?section=artigos&id=87. Acesso em 18/05/2008.
Site http://www.anovademocracia.com.br/index.php/Do-garantismo-ao-Movimento-Lei-e-Ordem.html. Acesso em 26/05/2008.
Site http://www.fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista08/Discente/Nara.pdf. Acesso em 27/05/2008
Autor: Pedro Ivo Fontenelle Cabral


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