Enuma Elish, Atrahsis E O Gênesis: Perspectivas Míticas Diante Da Criação E Do Dilúvio



INTRODUÇÃO

Uma característica presente nos povos primitivos são os relatos de mitos. O mito busca ser uma narrativa tradicional que dá conta de explicações simbólicas aos homens. Pretendo neste breve texto mostrar uma pequena analise sobre o mito da criação. Foram escolhidos os mitos escritos na Babilônia. Há indícios que os textos de Gênesis que serão citados aqui foram escritos pelos judeus durante o exílio na Babilônia. Para melhor apresentar a análise irei citar algumas passagens das narrativas em questão. Ao longo da história da humanidade são relatados, narrados experiências de vida do povo ligado diretamente as esperanças e crenças submetendo o individual ao coletivo.

1.A CRIAÇÃO

Os babilônicos retratavam a criança do universo em um mito chamado Enuma Elish. O texto foi escrito em sete placas de argila, tento cerca de cento e cinqüenta linhas. Na região neobabilônica ele é sempre recitado pelo povo na festa do ano novo. No texto bíblico encontramos uma referência do profeta Isaias criticando a crença politeísta do império babilônico. O livro de Isaias foi escrito num período histórico onde o império já estava em decadência (século VII a.C.), mas o relato bíblico vai deixar bem claro as diferenças existentes entre as duas correntes.

Assim fala o Senhor, o rei de Israel, seu fiador é o Senhor Todo-Poderoso: eu sou o primeiro e o último, fora de mim não há outro Deus. Quem pode competir comigo? Apresente-se e proclame, demonstre-o e exponha a mim! Quem anunciou desde tempos remotos a porvir? Indiquem o que vai acontecer! Não vos mostrareis apavorados nem aturdidos! Acaso não anunciei de antemão e o dei a conhecer? E vós sois minhas testemunhas: há outro Deus, outra rocha fora de mim, que eu não conheça? (Isaías 44, 6-8)

 As duas narrativas começam descrevendo que no inicio havia apenas o caos aquoso. Há quem diga que os gregos beberam desta fonte ao afirmar que o inicio de tudo parte de uma harmonização do caos primordial.

A terra estava vazia e deserta, as trevas cobriam o oceano e um vento impetuoso soprava sobre as águas (Gênesis 1, 2)

 A história babilônica divergir-se-á da bíblica porque a questão bíblica parte do pressuposto da aliança entre Deus e o povo. O relato do Enuma Elish narrará a rivalidade existente entre os deuses. O conflito dar-se-á porque Apsu (deusa das águas doces) e Tiamet (deus da água salgada) não aceitam mais as idéia da primeira tríade dominadora (Anu, deus do céu, Elil deus do ar e Ea, deusa dos abismos). Estes eram deuses da ordem, contrário dos deuses aquosos que eram deuses que referenciavam o caos. Portanto para Apsu e Timate a "felicidade" deveria estar onde o caos reinar. Então Ea gerou Marduk, o "sábio mais sábio" entre os deus, que porá fim as desavenças entre os deuses da ordem e do caos. Marduk vencerá as armas mágicas de Tiamet. Assim que venceu o combate contra Apsu e Tiamet usou a metado dos cadáveres dos monstros mágicos desses deuses proporcionado a criação do firmamento e da terra.

E Deus disse: faça-se um firmamento entre as águas, separando uma das outras. E Deus fez o firmamento. Separou as águas que estavam debaixo do firmamento das águas que estavam por cima do firmamento. E assim fez (Gênesis 1, 6-8).

E no firmamento se estabeleceu então o domínio dos deuses da primeira tríade, que forma a cabeça do panteão babilônico. O Enuma Elish segue dizendo que Marduk propõe criar um ser que se chamará homem para dominar o espaço terreno, mas estará submetido a ele.

 Sangue com sangue, eu junto, sangue a osso, eu formo algo original cujo nome será homem. Os seres originais cuja feitura foi minha obra (Enuma Elish).

Então o Senhor Deus formou o homem do pó da terra, soprou-lhe nas narinas o sopro da vida e se tornou vivo (Gênesis 2,7).

 O ser criado pelos deuses, não foi criado por acaso. Ele deverá como agradecimento pela criação referenciar pela grande feito.

Que os homens e as mulheres sirvam os deuses na terra sem remissão (Enuma Elish).

 Ainda não havia nenhum arbusto do campo sobre a terra e a vegetação ainda não tinha brotado, porque o Senhor Deus ainda não fizera chover sobre a terra nem havia homem para cultivar o solo, extrair os mananciais da terra e irrigar a superfície do solo (Gênesis 2, 5-6).

 As duas histórias aqui fragmentadas mostram que a criação fora feita para prestar homenagem ao criador e cumprir uma missão que os deuses designaram. O homem é criado para suprir as necessidades dos deuses ou daqueles que em nome dos deuses os governa. AYMARD (1977) afirma que o governante babilônico necessita de inúmeros recursos para atingir seus objetivos e a obediência deve ser seguida a riscos para cimentar a coesão dos territórios e as práticas militares. As ações comandadas pelos governantes mostram a vontade dos deuses se concretizando.

 Dos povos que escrevem seus relatos sobre a criação há uma necessidade de passar ao descendente os problemas que por sua origem enfrentam na condição presente, e ainda por muitas vezes o sofrimento é justificado pela classe que está no poder. Na sua ação, o homem primitivo imita seus deuses nos ritos e atualiza as ações primordiais dos deuses, pois estão convencidos de que a semente não brotará da terra, a mulher não será fecundada e a árvore não dará fruto e o dia não passará à noite caso o homem separa-se dos deuses, segundo o relato do Enuma Elish.

 
2.O DILÚVIO

Mas o homem não levou a sério a idéia de submissão aos deuses ou ao Deus. Como a criação prometera ouve então a revolta dos criadores, ou do criador, contra a criatura. Diante da transgressão há a punição. O dilúvio fora a pena aplicada para exterminar as criaturas que não se submetera a vontade divina. O homem é livre para escolher, mas deve escolher aquilo que o levará a felicidade, porém a felicidade está apenas nos criadores ou no criador. O relato babilônico que narrará o dilúvio é chamado de Atrahsis.

A idéia da destruição da criatura não é exclusiva destes dois povos, mas estava presente em outras narrativas culminando sempre no cataclismo, tendo os mesmos aspectos físicos.

Dentro de sete dias vou fazer chover sobre a terra quarenta dias e quarenta noites. Exterminarei da face da terra todos os seres que criei (Gênesis 7,4).

 Segundo a tradição babilônica, Elil o deus que desencadeia o dilúvio, vem com toda ira cabível a um deus, para vingar o comportamento desobediente dos homens. Ea avisa a Um-nipipsht, mortal predileto desta deusa, para construir um barco e salvar sua família. Ea da a ele as medidas necessárias e que espécie de animais também deveria salvar.

Homem de Shurupak, escuta! Constrói um barco, abandona as tuas riquezas para salvar a vida. E, uma arca de dimensões bem calculadas, leva a semente de todas as espécies vivas (Atrahsis).

 Então Deus disse a Noé: "para mim, chegou o fim de todos os homens, porque a terra está cheia de corrupção e violência. Vou destruir os homens junto com a terra. Faça para você uma arca de madeira resinosa" (Gênesis 6. 13-14a).

 E através das lágrimas de Istar e da chuva bíblica desencadeia todo o processo de inundação. No mito babilônico há outro agravante, os deuses ao saberem que um mortal escapou, uma revolta ainda maior toma conta deles e acusam Ea de preveni-lo e este se defende:

Apenas o favoreci com um sonho. Quanto o resto é com ele... (Atrahsis).

 Em vários relatos o meio de comunicação do divino com o terreno é a presença de anjos ou mensageiros, ou ainda o próprio divino, como os deuses.

 Há diversas teorias que buscam sintetizar o misterioso do dilúvio: cheias do Eufrates e do Tigre, a formação do Mar Cáspio ou ainda, a menos provável fim do período glaciário. Apenas teorias, mas o importante neste breve relato foram as semelhanças encontradas nas entrelinhas destas duas narrativas.

 REFERÊNCIAS

AYMARD, André. O oriente e a Grécia Antiga. Rio de Janeiro: DIFEL, 1977.

 CORDENAU, Georges. A vida cotidiana na Babilônia e na Assíria. Lisboa: Editora Livros do Brasil, 1968.

 BÍBLIA Sagrada: Edição Pastoral. São Paulo: Paulus, 1999.


Autor: Albio Fabian Melchioretto


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