Os Analogistas e os Anomalistas



Os Analogistas e os Anomalistas:
Diferenças e suas contribuições para a Lingüística/Semântica

Os Analogistas e os Anomalistas dizem respeito a duas correntes básicas de procedimentos acerca do estudo da linguagem que, por sua vez, decorreram do antigo e filosófico debate que traçavam os naturalistas e os convencionalistas ? os primeiros exímios defensores de que a relação nome-coisa é totalmente direta e natural e aqueles com a crença de que a relação nome-coisa é indireta e arbitrária; convencional.
Basicamente, os analogistas, como o próprio nome sugere, enfatizavam "as regularidades nas formas linguísticas, tanto no plano de variações do corpo fônico quanto do significado" (MARQUES, 2003:26). Em virtude dessa perspectiva analogista, os conhecimentos gramaticais se ampliaram, uma vez que se aprofundavam seus métodos e "padrões de regularidade quanto aos modos de significar e quanto às modificações formais das palavras" (MARQUES, 2003:30) eram estabelecidos.
Em contrapartida, os anomalistas ressaltavam "as diferenças, peculiaridades e discrepâncias de formas da língua, tomando como ponto de referência modelos ou paradigmas" (MARQUES, 2003:26) na medida em que se estabeleciam, fossem tanto em termos referenciais quanto flexionais. Assim sendo, os conhecimentos gramaticais evoluíram, uma vez que os anomalistas enfatizavam "os ilogismos, no plano do significado, e as irregularidades formais, no plano das flexões das palavras" (MARQUES, 2003:30).
Dessa forma, é possível afirmar que analogistas e anomalistas possuíam, como aspectos distintivos, não somente a questão dos diferentes procedimentos de estudo/ análise da linguagem, mas também ? e até mesmo em virtude deles decorrerem das visões convencionalista e naturalista da linguagem ? discorriam de modo diverso acerca da relação entre as palavras e as coisas a que se referiam; isto é, os anomalistas, enquanto uma espécie de adaptação dos naturalistas, acreditavam que os nomes das coisas eram motivados em virtude da "natureza subjacente, original da língua(gem)" (WEEDWOOD, 2002:38) e de sua relação totalmente direta com a coisa que nomeia. Os analogistas seriam, então, decorrentes dos convencionalistas, uma vez que consideravam que o sistema por meio do qual as palavras nomeavam as coisas do mundo era arbitrário, resultado de convenção ? analogistas, pois, corresponde às próprias analogias que eram feitas com palavras que nomeavam elementos de significação parecida com outros; por ex.: cabelo e seus derivados, cabeleireiro, cabeludo, cabeleira, cabelão, etc. ? embora cada palavra tenha a sua conotação específica, elas possuem um ponto em comum, isto é, pelo da cabeça, e foram estabelecidas conforme a palavra primeira, cabelo. Os anomalistas, de modo contrário, não raciocinariam dessa maneira, visto que cada palavra responsável por nomear um referente do mundo corresponde a uma forma anômala, ou seja, sem relação nenhuma com outras existentes porque ela tem relação direta e natural com coisa específica para qual dá um nome; por ex.: não é porque existe a palavra papel que o nome de um lugar que venda papel terá alguma relação essa palavra, pois a palavra que nomeará o local que vende papel possui relação direta com essa significação específica; no caso, eles não "aceitariam" que o local que venda papel devesse se chamar papelaria.
O filósofo-historiador-antiquário Marcos Terêncio Varrão (116 ? 27 d.C.), em seu livro De língua latina, postula que "uma coisa é dizer que é possível encontrar analogias em palavras, e outra coisa é dizer que devemos segui-las (IX, 4)" (apud WEEDWOOD, 2002:38). Complementando o pensar de Varrão, Weedwood (2002:38), com suas próprias palavras, afirma que: "Seu conselho é pragmático: os neologismos devem ser guiados pela analogia, mas se uma forma anômala já estiver bem estabelecida, deve-se permitir que permaneça".
As implicações dos analogistas e dos anomalistas, contudo, não terminaram nessas considerações acerca da arbitrariedade ou não da linguagem, visto que elas apenas serviram como importantes dados para aqueles que, no século XIX, procuraram formular, de modo preciso, "leis relativas aos princípios segundo os quais se estabelecem regularidades nas alterações e correspondências fonéticas" (MARQUES, 2003:31): os neogramáticos.
É possível afirmar que os neogramáticos uniram tanto os procedimentos dos analogistas quanto aqueles dos anomalistas, pois ao mesmo tempo em que buscavam estabelecer leis referentes às mudanças fonéticas com base na regularidade dessas alterações, eles também buscavam apresentar os motivos que justificavam "a existência de exceções e anomalias, em relação às ?leis? gerais propostas" (MARQUES, 2003:32), constituindo grande avanço nos estudos lingüísticos, haja vista que, anteriormente, tais casos de exceções e irregularidades eram simplesmente desprezados e não analisados, pois eram entendidos como fortuitos e casuais.
Conforme estabelece Coutinho (2005:134) em uma citação de seu livro, "A originalidade profunda, diz Dauzat, da escola alemã dos neogramáticos foi dar à lei lingüística um valor preciso e científico que a assimilou, a partir de então, às leis estabelecidas pelas outras ciências da natureza".


REFERÊNCIAS:

COUTINHO, Ismael de Lima. Pontos de gramática histórica. Rio de Janeiro: Ao livro técnico, 2005.

MARQUES, Maria Helena Duarte. Iniciação à semântica. 6ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editorial, 2003.

WEEDWOOD, Barbara. História concisa da lingüística. Tradução de Marcos Bagno. São Paulo: Parábola Editorial, 2002.
Autor: Camila Da Fonsêca Aranha


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