Os Estruturalistas e os Gerativistas



Os Estruturalistas e os Gerativistas:
Suas perspectivas de significado e contribuições para a Semântica

É possível discorrer acerca das especificidades dos Estruturalistas e dos Gerativistas no que diz respeito ao modo como cada um compreende significado e, consequentemente, quanto à maneira de conceber a Semântica, seja enquanto ciência indispensável à Linguística ou não.
No Estruturalismo ? abrangendo aqui tanto a corrente europeia, representada por Ferdinand de Saussure, quanto a norte-americana, cujas principais teorias estão estampadas em Leonard Bloomfield ? foram relativamente escassas as explorações mais sistemáticas do plano do significado. N?outros termos, os estruturalistas não se preocuparam em estudar afundo a sistematicidade e determinar com precisão um método de análise rigoroso da ciência que estuda a significação das formas linguísticas ? Semântica ?, visto que acreditavam que tal ciência não se constituía como o centro dos estudos linguísticos, mas sim era somente levada em conta na linguística como auxiliar heurístico (termo cunhado por Hockett ? linguista norte-americano).
Assim, pode-se perfeitamente perceber que os estruturalistas, até mesmo em razão de privilegiarem a estrutura, a forma, da língua, valorizavam muito mais as questões referentes ao plano da expressão (sintáticas, fonológicas, morfológicas, etc.) do que os aspectos da língua(gem) que dizem respeito aos estudos e análises semânticas, concebendo-os como periféricos, uma vez que em razão deles se prenderem diretamente ao mundo exterior à fala, pertencem a plano extralinguístico.
Conforme o lingüista norte-americano Harris (1961, apud Marques, 2003:48), nas palavras de Marques:

Em sua teoria, o significado é um elemento determinante das escolhas que fazemos ao falar, mas o significado é uma propriedade geral do comportamento humano. Como a estrutura da língua não é análoga à estrutura da experiência subjetiva do falante, o plano da forma da língua não é idêntico ao plano do significado. Não convém, por esse motivo, utilizar o significado na análise linguística, nem mesmo como auxiliar heurístico, como meio de determinar identidades e diferenças entre formas da língua.

Segundo a concepção de mecanicista Bloomfield, o significado de uma forma linguística pode ser definido como "a situação em que o falante a enuncia e a resposta que ela evoca no ouvinte" (apud Marques, 2003:46), atentando para a sequência causal situação do falante à fala à resposta do ouvinte. Saussure, por sua vez, defendia uma visão mentalista da língua ao afirmar que ela "é a expressão de ideias, sentimentos ou volições, através de imagens mentais ou conceitos" (MARQUES, 2003:47). Contudo, tanto na visão mecanicista de Bloomfield quanto na mentalista de Saussure, a Linguística se constituiu como ciência deixando à margem a Semântica, enquanto ciência responsável por estudar especificamente o significado das formas da língua.
Dessa maneira, para os estruturalistas, os estudos semânticos deveriam ser objeto de estudo de outras ciências diversas da Linguística, uma vez que a esta tais estudos caberiam somente de uma maneira periférica, não-central, apenas como um meio, um instrumento para melhor conhecimento de seus aspectos centrais. A nível exemplificativo, tem-se (MARQUES, 2003:48):

[...] pode-se usar o significado intuitivamente, para determinar se duas formas, constituídas, no todo ou em parte, por elementos fônicos ou segmentos mórficos diferentes, têm o mesmo significado ou têm significados diferentes, para os falantes da língua.

Os Gerativistas, por sua vez, apesar de possuírem visão semelhante a dos Estruturalistas, contribuíram para o desenvolvimento dos pressupostos e teorias formulados pelos estruturalistas, possibilitando, então, uma maior inserção da Semântica no plano dos estudos linguísticos enquanto aspecto central e não mais periférico.
Conforme a teoria gerativista de Noam Chomsky, que defende a existência de um número finito de regras universais e recursivas que dão ensejo a infinitas possibilidades de produzir sentenças bem formadas (gramaticais) e concebe um falante-ouvinte ideal dotado de competência e desempenho para construir tais enunciados,

Seria possível construir modelos de descrição gramatical e aferir-lhes a adequação explicativa, levando em conta o plano semântico apenas através da competência dos falantes, de sua capacidade intuitiva de determinar, além da gramaticalidade ou agramaticalidade de sentenças, a sua aceitabilidade e coerência. (MARQUES, 2003:52)

Percebe-se, neste momento, que o gerativismo vislumbrou a possibilidade de inserir os estudos do significado dentro da estrutura da língua, isto é, dentro da Linguística propriamente dita, diferentemente do tratamento que foi dado pelos estruturalistas quanto a essa questão.
Ademais, segundo nos relata Marques (2003:52), na evolução do pensamento gerativista, a Semântica, embora não receba tratamento prioritário, passou a ter papel destacado na formulação da teoria, sendo esta alvo de sucessivas alterações, a fim de estabelecer-se em consonância com os fenômenos do significado, impondo "modificações na concepção e organização do componente sintático e aperfeiçoamentos no semântico, com alterações nos constituintes dicionário e regras de projeção" (MARQUES, 2003:53).
Os linguistas Katz e Fodor foram os primeiros a tentar integrar formalmente a Semântica na teoria linguística, em 1963. Dentre os principais pontos de seu pensamento, eles afirmavam que a competência do falante ? explanada por Chomsky ? deve pressupor somente o domínio de regras gramaticais para a produção de enunciados de uma língua, mas também regras semânticas, "relativas aos aspectos dessa competência que não se incluem no âmbito da gramática" (MARQUES, 2003:52). A Semântica, assim, teria uma função interpretativa, ou seja, uma função de descrever a língua não apenas segundo o foco gramatical, mas também semântico, sob a perspectiva significativa.
Em suma, Marques (2003:52) afirma que:

Assim o chamado limite inferior da teoria semântica seria a informação gramatical, contida nas regras de base, e o chamado limite superior restringiria a semântica à interpretação de sintagmas e sentenças em isolamento, fora de seus possíveis contextos linguísticos e não-linguísticos.

Cabe ressaltar que Katz e Fodor defendiam e justificavam uma teoria semântica restritiva à interpretação de sentenças isoladas (que, posteriormente, passou a ser substituída por uma teoria linguística gerativa de base semântica) em virtude dos "falantes atribuírem a sentenças contextualizadas uma das interpretações que ela pode ter em isolamentos" (MARQUES, 2003:53).
Os gerativistas, desse modo, contribuíram bastante para a consolidação da Semântica enquanto um sub-ramo da Linguística, uma vez que, com a evolução de sua teoria, passou-se a distinguir uma semântica linguística e uma semântica que incorpora fatores não-linguísticos (fatores pragmáticos que possibilitam aos falantes interpretarem enunciados discursivos), assim como uma competência gramatical e uma competência pragmática/comunicativa do falante ? esta última responsável por contemplar aspectos que caracterizam o uso adequado e coerente da língua e as finalidades comunicativas com as quais os indivíduos a utilizam, "em enunciados circunstancialmente condicionados e contextualizados em sequências discursivas" (MARQUES, 2003:54), principalmente para tratar do significado no discurso e/ou em textos.
Desenvolvidas as explanações necessárias, pode-se inferir que tanto estruturalistas quanto gerativistas passaram por impasses para o tratamento semântico da linguagem em virtude deste se constituir como um resultado da visão da língua, que, para ambos, é um sistema abstrato e homogêneo de relações ou regras invariantes. Contudo, ficou claro que enquanto os estruturalistas deixaram, quase que de forma absoluta, à margem dos estudos linguísticos os estudos semânticos, os gerativistas, diferentemente, buscaram maneiras de inseri-los na Lingüístico, adequando suas teorias a essa possibilidade de análise e estudo do significado da língua.

REFERÊNCIA:

MARQUES, Maria Helena Duarte. Iniciação à semântica. 6ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editorial, 2003.
Autor: Camila Da Fonsêca Aranha


Artigos Relacionados


O Ensino De Semântica E Pragmática: Interfaces

Língua Natural, Preconceitos E Cultura

Morfologia E Sintaxe

Os Analogistas E Os Anomalistas

O Ensino Da Gramática Normativa Da Língua Portuguesa Nas Universidades

Um Estudo LÉxico - SemÂntico Do I Canto De Os LusÍadas

Gramaticidade, Agramaticidade, Anomalia E ContradiÇÃo: Elementos Produtivos Para O Estudo Da SemÂntica Formal