Os estilos de época na Era Medieval



Os estilos de época na Era Medieval

Em 1500, quando os portugueses tomaram posse das terras brasileiras, Portugal vivia um grande período de viagens e conquistas marítimas; juntamente com os portugueses veio à língua portuguesa, por meio da qual foi escrito os primeiros textos em nosso país. Estes textos, inicialmente foram as cartas de navegantes e mais tarde, o Teatro de Catequese de José de Anchieta, os quais foram fortemente marcados pelos modelos culturais e literários de Portugal, no século XV. Portanto, as origens da literatura brasileira situam-se na Baixa Idade Média portuguesa, sendo que as primeiras manifestações ocorreram durante o período colonial (de 1500 a 1822). Por esta razão, convém conhecer os momentos mais significativos da literatura portuguesa até o século XVI.
Os primeiros registros da literatura portuguesa datam do século XII, os textos forma escritos em galego-português, em virtude da integração cultural e linguística que existia entre Portugal e Galícia (hoje Espanha). Esses primeiros escritos constituem a primeira época medieval, conhecida como Trovadorismo.

Trovadorismo

O Trovadorismo se estende do século XII ao início do século XV, este período reflete uma sociedade feudal organizada a partir de relações de vassalagem, uma extrema religiosidade onde prevalece o pensamento de que Deus é o centro de tudo (teocentrismo) e das lutas da Reconquista (forças cristãs tentavam retomar o território tomado pelos árabes).
Todos os textos poéticos desta primeira época medieval eram acompanhados por música, normalmente cantadas em coro, daí serem chamados de cantigas. Isso ocasionou o aparecimento de uma verdadeira hierarquia de artistas, assim classificados:

? Trovador: era o poeta, quase sempre um nobre, que compunha sem preocupações financeiras;
? Jogral, segrel ou menestrel: era um homem de condição social inferior, que exercia a função de entreter a nobreza, de castelo em castelo, alguns desses artistas chegavam a compor;
? Soldadeira ou jogralesa: moça que dançava, cantava e tocava castanholas ou pandeiro.

Com o passar do tempo e dependendo da região, essas denominações caíram em desuso.
Quanto ao tipo de cantigas, se reconhecem dois grandes grupos: as cantigas líricas, que subdividem em cantigas de amor e cantigas de amigo e as cantigas satíricas, que se subdividem em cantigas de escárnio e cantigas de maldizer.

? Cantigas de amor: o falante declara seu amor por uma dama da corte;
? Cantigas de amigo: expressão do sentimento popular, caracterizando o sentimento feminino.

Nota-se que a principal distinção entre a cantiga de amor e a cantiga de amigo está na voz do eu-lírico (se a voz é de um homem ou de uma mulher).
Já as cantigas sátiras dirigiam seu foco para as relações sociais: costumes, notadamente o clero e dos vilões (camponeses livres); a covardia, a decadência da nobreza que perdia espaço para a burguesia etc.

? Cantigas de escárnio: eram sátiras indiretas, exploravam palavras ambíguas, expressões irônicas;
? Cantigas de maldizer: eram sátiras diretas, com citação nominal da pessoa ironizada e temas que abordavam o adultério e os amores interesseiros ou ilícitos.

Leia um exemplo das cantigas de amor:
"E que queria eu melhor
De ser seu vassalo
E ela minha senhor?"

Observe como um trovador escreveu à sua "senhor" como se fosse um vassalo feudal dirigindo-se a seu suserano, mostrando com a mulher é vista de modo idealizado e a ela é dedicado um amor sublimado, expressando um forte lirismo. O ambiente é a corte e a mulher uma nobre.
A cantiga abaixo é uma cantiga de amigo:

"En gran coita, senhor,
que peior qe mort?é,
vivo, per bõa fé,
e polo vosso amor
esta coita sofr?eu
por ós, senhor, que eu
vi pelo meu gran mal"

Esta cantiga reflete o patriarcalismo, agora é a mulher quem sofre por se ver separada do amigo (namorado ou amante), pois este foi à caça ou ao "fossado" (lutar na Guerra Santa) e vive angustiada por não saber se ele voltará ou se a trocará por outra; o ambiente é a zona rural e a mulher é uma camponesa.

Humanismo

O Humanismo se estende do inicio do século XV ao inicio do século XVI, quando Portugal passa a cultivar os modelos renascentistas, marcando a transição para o Renascimento e a ruptura dos modelos medievais.
Uma de suas principais características é a gradual substituição do teocentrismo pelo antropocentrismo. A Revolução de Avis resultando na aliança entre o rei e a nascente burguesia resulta numa ordem social a partir de 1415. Assim surge a historiografia portuguesa desenvolvendo um teatro de caráter popular, a poesia ganha novas características, sendo um momento fértil para as artes.
A literatura desse período registra a consolidação da prosa historiográfica e do teatro. A poesia afasta-se do acompanhamento musical e enriquece-se no ponto de vista formal.

? Poesia palaciana: apresenta maior elaboração do que as cantigas. Verifica-se o uso de redondilhas (nome dado aos versos de cinco ou sete sílabas), ambiguidades (é um vício de linguagem, que possibilita dois sentidos), aliterações (figura de linguagem que consiste em repetir sons consonantais idênticos ou semelhantes em um verso ou uma frase) e figuras de linguagem. No plano amoroso pode apresentar tanto sensualidade como intimidade em relação à mulher amada, como também uma visão idealizada e platônica da mulher.

Cantiga, partindo-se


Senhora, partem tam tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.

Partem tam tristes os tristes,
tam fora d?esperar bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.


(In: Rodrigues Lapa. As melhores poesias do Cancioneiro de Resende. Lisboa, 1939. P. 17.).
? Prosa historiográfica: são crônicas históricas voltadas para os acontecimentos de Portugal. O principal cronista foi Fernão Lopes, que conciliou técnicas narrativas com certa imparcialidade no tratamento de fatos históricos. Enfocando não apenas a vida dos nobres, mas o conjunto da sociedade, atribuindo ao povo importância no processo de mudanças politicas do país.
? Teatro: Com Gil Vicente teve início em Portugal o teatro leigo, não religioso, praticado fora da igreja, o que o diferencia em relação à primeira época medieval, representando um decisivo processo de laicização da cultura portuguesa. Diante do antropocentrismo, surgiu uma diversidade de classes e grupos sociais (fidalgo, rei, papa, clérigo, burguês, comerciante, médico incompetente, mulher adúltera, velho devasso, juiz desonesto etc.). Gil Vicente teve para si uma missão moralizante e reformadora, visando atingir as pessoas inescrupulosas e não as instituições. Seu objetivo era demonstrar como o ser humano, independente da classe social, raça, cor, sexo ou religião, era mentiroso, orgulhoso, falso, egoísta e frágil diante dos apelos da carne e do dinheiro. Da vasta produção de Gil
Vicente, destacam-se, entre outras, as obras Auto da barcas (Auto da barca do inferno, Auto do purgatório e Auto da barca da glória), O velho Horta, Auto da Índia e Farsa de Inês Pereira.



Referências:

CEREJA, Willian Roberto; MAGALHÃES, Thereza Cochar. Português: Linguagens. 5. ed. São Paulo: Atual, 2005. 1 v.

NICOLA, José de. Português: ensino médio. 1. ed. São Paulo: Scipione, 2005. 1 v.

ABAURRE, Maria Luiza; PONTARA, Marcela Nogueira; FADEL, Tatiana. Português: Língua, literatura e produção de texto. 1. ed. São Paulo: Moderna, 2005. 1 v.



Autor: Simone Luiza Guimarães Reis


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