Respostas Do Tempo



"O homem, filho do tempo, reparte com o mesmo a sua ciência ou a sua ignorância; do presente sabe pouco, do passado menos e do futuro nada".

Pe. Antônio Vieira, História do Futuro.

Em O novo século: entrevista a Antonio Polito, o historiador britânico Eric J. Hobsbawm realiza prognósticos variados, baseando-se no conhecimento do passado. Essa empreitada de Hobsbawm trouxe uma outra significação para o ofício do historiador na medida em que ele arrisca análises das mais variadas de processos que ainda estão por vir. Analisar com sobriedade o tempo presente e desvelar os contornos de períodos vindouros, eis em suma o que este autor realiza, ao menos em parte. O historiador profissional impõe a si mesmo uma série de limitações, tais como evitar estudos sobre períodos assaz recentes, esquivar-se de fazer conjecturas a respeito do passado (uma história contrafactual) e antever o que está por vir, dentre outras. Em relação a esta última encontramos um interesse abundante e o que mais nos apetece é desnudar nas brumas do tempo o que outrora estivera coberto.

O rei Saul desterrara os adivinhos das terras de Israel e o mesmo, ao angustiar-se com o seu Deus subitamente emudecido, foi à cata de uma necromante a fim de saber prognósticos da boca do falecido Samuel (I Samuel 28, 7-25). Descobrira horrorizado o que o destino lhe reservara. "Amanhã estarás comigo", disse o profeta morto ao infeliz rei vivo.

Em A Cartomante, de Machado de Assis, o personagem Camilo, um descrente contumaz, consulta as cartas para saber do destino de sua aventura amorosa.

Hamlet descobre pela boca do pai morto a ambição e a concupiscência do tio vivo.

Poder-se-ia destacar aqui exemplos vários dessa ânsia, visto que é copioso o conjunto de fatos históricos e ocorrências literárias. Não poderia me furtar a relacionar tal interesse, digno do gênero humano, ao ofício do historiador, na medida em que este se dedica exclusivamente a extrair dentre a massa informe de documentos e outros materiais, uma resposta plausível para determinado evento, para determinado acontecimento. Essencialmente é isso o que ele faz. Como poderia ele voltar-se para o porvir, para tempos vindouros? Como discernir os contornos de uma realidade que está para chegar se nem ao menos damos conta do hoje, dos fatos correntes? Hobsbawm acredita que em parte podemos fazer isso. As respostas para tudo isso por vezes encontramos em historiadores que consideram cabível levarmos em conta o tempo futuro, pressupondo que a inevitabilidade deste exerce uma função relevante da qual não se escapa.

Vale ressaltar a advertência do próprio Hobsbawm de que, "na prática e por princípio, grande parte do futuro é inteiramente inacessível". Daí decorre o fato dos historiadores sempre ignorarem a atividade de se fazer prognósticos.

Pretendo tratar de outras questões concernentes a esse tema ainda em um outro artigo. O livro de Hobsbawm é uma ótima introdução para um questionamento que, ao que parece, está longe de ter um fim.


Autor: Horácio Silva


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