Geração sem noção ou falta de limite



Falta limite. Não há outra explicação.
Tenho uma filha de 14 anos. Isso por si só já explica a fase. Nem precisa dizer mais nada: mudança de humor em questão de minutos no mesmo dia, bufos (já cheguei a pensar que sofre de asma), impaciência extrema, nada está bom, minha mãe não sabe de nada, meu pai é um chato. O que a difere de outros adolescentes nesta fase? Neste quesito absolutamente nada. Já pensei que inclusive isto deve ser uma matéria que se ensina na escola, pois TODOS são iguais e tem até as mesmas expressões com os olhinhos revirando o tempo todo e a quantidade de suspiros.
Por mais que em alguns momentos isso seja cansativo, e é, faz parte do crescimento, em maior ou menor grau, também já passamos por isso, mas com uma tolerância bem menor dos nossos pais. Chega até ser divertido, quando não estamos tão cansados física e emocionalmente.
O que me preocupada é a total falta de limite desta nova geração. Não quero fazer nenhuma apologia ao meu tempo, que era diferente, que eu fazia assim ou assado, que se eu respondesse assim para meus pais, o barraco estava armado.
Posso me considerar uma pessoa relativamente antenada. Trabalho com a Internet, uso Facebook, tenho um blog (veja só), uso o celular, não em toda sua potencialidade, mas ouso até a passar e-mail.
Acredito que não dá para criar um filho ou filha de formas diferentes. Não no mundo de hoje isso é hipocrisia. Mesmo no passado já não concordava com isso. Homem e mulher devem ser educados para serem gente, de preferência, gente do bem, cidadãos.
O que eu tenho visto e tenho me assustado muito com esta geração é que a maioria desconhece a palavra e o significado de LIMITE. O pior é que os próprios pais desconhecem a importância de mostrar a "carteirinha de pais" e aplicar limites. Ninguém mais sabe dizer não. É mais fácil dizer sim. Não se vê caretas, respostas malcriadas, pentelhação. Vamos dizer sim e seguir em frente. A vida vai acabar ensinando o dito cujo. Enquanto a vida não ensina, eles saem por ai perturbando a existência alheia e detonando por onde passam.
É uma geração descompromissada e que vive numa "bolha". Nos colégios de elite, em quase todos, os alunos pensam somente no próprio umbigo, valorizam camisetas de marca (quem não usa é "zoado"), celulares de última geração, viagem fantásticas, a próxima balada. Eles não têm noção do que é a vida de verdade, quanto custa pagar esta escola, o inglês, o jazz, a balada, as roupas, a internet, a conta do celular.
Não têm noção que fazem parte de uma minoria. A vida para eles é isso. E, nós, os pais, temos uma grande parcela de responsabilidade. Quantos dos nossos filhos andam de ônibus pela cidade? Quantos já fizeram algum trabalho voluntário? Quantos já colaboraram trabalhando por algo remunerado? Quantos sabem qual é orçamento mensal da casa? Quantos sabem o valor da mensalidade da escola e o que isso representa no orçamento? Quantos ajudam a tirar a mesa, a lavar a louca, a jogar a roupa suja no cesto, a fazer o jantar, a limpar a casa quando a empregada falta, a arrumar sua própria cama? Nós estamos criando seres que acreditam em fadas. A fada da louça, a fada da máquina de lavar roupa, a fada do banheiro limpo. Acredito que muitos destes adolescentes, tão maduros para beber e "ficar", acreditam nestas fadas. Se não acreditam, como explicam uma roupa limpa e passada no armário, um jantar gostoso e quentinho à mesa, uma casa cheirosa e arrumada. É obra do Divino?
A maioria dos jovens que estuda (quando estuda) em colégio público, enfrenta uma viagem para ir e para voltar da escola para casa e vice-versa, quando tem material a maior parte pertenceu a alguém, não tem um caderno para cada matéria, não tem internet em casa, não tem balada e muitos já trabalham para colaborar com os gastos em casa.
Escuto, às vezes, de alguém indignado (na maior parte pessoas que tem seus filhos nestes colégios) que um office boy gasta seu salário para comprar um tênis de marca. Um absurdo, como pode? Ora, ele também quer fazer parte da "bolha", porque o meu filho pode e ele não?
Mudei minha filha de escola, após 10 anos, por acreditar que eu estava falando um idioma e o colégio outro. Eu falava zandoriano, eles entendiam sei lá o que. Definitivamente, não dava mais jogo. Como você vai colocar alguma coisa no cérebro desta criatura se as duas referências que ela tem não se entendem.
Bebida alcoólica - isso é uma epidemia. Assusta-me e muito esta garotada de 14 anos dando PT. Eles levam a bebida na bolsa para casa de amiga, além do perigo de beber é uma baita falta de educação. Você leva comida numa festa? Você leva bebida numa festa? Levar um vinho para o anfitrião num jantar, tudo bem, é simpático. Levar vodca, escondida na bolsa, para dar PT na casa dos outros, é o fim da picada.
A turma toda acha que os pais são obrigados a sair a qualquer hora do dia ou da noite ou até da madrugada, para buscá-las seja onde for. Não aceitam combinar um horário. Ainda fazem o infeliz esperar na porta da balada.
Esta garotada olha um papel no chão e não pega para jogar no lixo. Não é problema deles.
Deixam as roupas sujas pelo chão, porque a empregada é paga para isso.
Levantam da mesa e não retiram a louça, mesmo na casa dos amigos (coisa que nem por sonho se fazia). Eu brigava para tirar a mesa na minha casa, mas na casa dos outros eu era uma a pessoa mais educada do Universo - safada.
Nesta escola que minha filha estudava não tinha um aluno negro.
Deficiente físico nem pensar. Além das escadas que impossibilitam o acesso para qualquer um que não tenha pleno controle das pernas, apesar de ter 5000 alunos. Estranho, não? Ouvi de pais que tem filhos com alguma deficiência que a própria escola não incentiva matriculá-los na instituição, pois a criança enfrentaria problemas de adaptação. É razoável, pois criança é maldosa, toca no ponto fraco do outro, inventa apelidos na hora. Sabe com quem seria o problema? Com os pais dos outros alunos que não aceitam diferenças. Não aceitam diferenças raciais, culturais e físicas.
Como queremos que nossos filhos, aqueles que vão nos governar em poucos anos, que deveriam combater a injustiça social sejam criados desta forma. Esta geração não tem comprometimento e não consigo imaginar como vão enfrentar o mercado de trabalho.
Quem tem problema, os adolescentes ou os pais?
Educar dá um trabalho do cão. Eu não mato um leão por dia. Extermino um zoológico inteiro. É desgastante, cansativo, um porre. Significa muitas vezes mostrar a carteirinha de mãe e dizer um redondo NÃO. O mundo pode ter mudado, ficado mais moderno, as coisas acontecem mais cedo do que na "minha época", mas educação não muda. Os valores principais não mudam.
Estamos criando uma geração SEM NOÇÃO, criada por pais SEM NOÇÃO. E isso é muito mais perigoso do que se imagina.
Educar não é coisa do passado. Não sai de moda.
Vale a pena ouvir o filho, conhecer seus amigos, aplicar limites, dizer não. Somos responsáveis por estes seres. Não expelimos do útero apenas. Somos pais, a melhor e a pior tarefa do mundo.

Marot Gandolfi
Autor: Marot Gandolfi


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