JOÃO MANOEL



JOÃO MANOEL


João Manoel era uma pessoa de muito prestígio em nossa família. Minha mãe costumava dizer que não havia pessoa mais bondosa que ele e, que se havia um paraíso, ele sem dúvida, estava destinado a ir para ele. Ele era bondoso mesmo!Quando nos visitava ele sempre nos dava dinheiro!Ele parecia velho e frágil (ele era idoso), mas possuía uma vitalidade fora do comum. Meus irmãos e eu sempre íamos à casa de João Manoel. Localizada em uma rua do Morro da Liberdade próximo ao Igarapé do Quarenta.Sempre o visitava com meus irmãos e depois sozinho. E ia ao igarapé com meus irmãos e com e com meus primos. Era uma diversão. Muito observador, ficávamos fascinados com todos aqueles filhotes de peixes__ Que meus primos insistiam em por em uma garrafinha, coisa de criança. __ O barulho da correnteza, o som da água, o cheiro de água (ela cheira!), a vegetação, a sensação de vida, mas tudo isso passou. Este igarapé virou esgoto a céu aberto* em uma tentativa de não poluir e contaminar os lençóis freáticos. A casa de dele era muito simples: quarto, sala e cozinha. Não havia luz elétrica e a filha de João Manoel cozinhava em um fogareiro, velho conhecido do homem amazônico. A casa de madeira era coberta por palha: Era assim que simplesmente nós chamávamos. Meu pai levava um dia inteiro para trocar a palha velha por uma nova. João Manoel só lhe dizia. __É... fico bom.
João Manoel era misterioso. Ele andava de Manaus de um extremo ao outro sempre a pé ou andando!Era o início dos anos setenta do século XX.
Certa vez cheguei a casa dele e lá estava ele à sombra do imenso abieiro que dominava o quintal, cortando lenha como grande facilidade!Ele me olhou e disse. __Tem banana.
Ele poderia ter me pedido para cortar a lenha pra ele
Quando ficávamos na casa dele Hedite, a filha dele cozinhava para nós. Mingau de arroz, de banana. Ela usava muito a palavra "rapaz", como por exemplo__ Não sei rapaz. __ Era muito calma. O ambiente todo era calmo. Os vizinhos dos lados eram calmos. O vizinho dos fundos Não! Eles jogavam lixo em uma privada velha do quinta de João Manoel. Eles eram deformados e por que era um tipo de papões anões. Não era estranho que papões morassem ali. Particularmente não sentia medos deles. João Manoel era capaz de tolerá-los.
Sempre que passávamos o dia lá, à mulher dele me chamava. __Menino! Vem cá menino! Deixa eu te ver. __Ela era contadora de histórias, o que foi bom para nós.
Eu tinha muito medo dela que perdi mais tarde. Meus irmãos me empurravam para ela que me segurava e dizia o quanto eu estava crescendo. O quarto dela era cheio de remédios e caixas de remédios pela parede. Sempre trazia algumas embalagens de caixas que colecionava. João Manoel era mesmo muito corajoso. Dizem que ele fora aconselhado a não casar com ela. Por quê? O gênio do cão!Isso foi boato. Ela era muito palpiteira. Pessoas e mais pessoas vivem de fofocas, e intrigas em nosso mundo. Perto deles ela era um anjo. Dar palpites é natural.
Um dia meu pai disse que João Manoel compra madeira e trocara as tábuas da cozinha. Eu tinha que ver isso!E vi. Que trabalho cansativo!

Minha mãe contou-nos que nós tínhamos um cachorro chamado "neve" que eles

*Todas as pessoas com mais de trinta anos de Manaus possuem uma história de algum igarapé ou mais, que frequentaram e que foi contaminado, poluído e suas águas tornaram-se impróprias para o consumo. Ou simplesmente foram aterrados!

o perderam e, que João Manoel em suas incansáveis andanças por este mundo, o encontrara e o trouxera de volta.
João Manoel estava sentado em um banquinho fumando seu cachimbo à sombra do abieiro de seu quintal. Olhos serenos quase fechados. Subitamente! Um clarão seguido de um tremor ensurdecedor! Era um raio e seu trovão. João Manoel nem piscou. Os papões do fundo quintal pulavam por cima da casa deles e caiam trêmulos. João Manoel olhou para cima e disse-me __Vai chover!Vamo entra menino. Hedite fez bolo de chuva.
Nós entramos e começou a chover. Ela não era muito boa como cozinheira, como minha mãe, mas os bolos de chuvas estavam molhados, e saborosos. A mulher dele gritou. __ Trás um pra mim!Menino!
__Menino você tem mesmo medo de raio e do trovão?
__Tenho muito medo vô!__Disse eu e ele me contou um segredo que demorei a compreender.
__Pois escute,__Disse ele acendendo seu cachimbo.__O Senhor deus enviou seu arauto a Terra. Quando ele chega, é sempre cercado de muita luz, e sons ensurdecedores! É o arauto do Altíssimo!E ele chega!Seu brilho ilumina a noite e os seres vivos por dentro e por fora! Sua luz terrível também é vista de dia. Ele bate na Terra com seu báculo provocando os sons que vosmicê teme!E ele diz "Despertem! Despertem para conhecer a luz!". O arauto de deus; é o raio e o trovão.


Tão forte ele era que quando chegou à notícia que fora atropelado por uma motocicleta*, nos surpreendeu a todos, era o ano de 1973. João Manoel não morreu imediatamente, ainda sobreviveu por dias em um hospital. Meu pai dizia que ele chateava as enfermeiras quando tomava sopa. Pois, cuspia alguns restos de verdura. Mas ele morreu naquele hospital.
Depois da sua morte sua pequena família foi trazida para morar em uma casinha construída por meu pai.
Fui a casa dele meses após o acontecido. Constatei que a casa parecia levemente inclinada e faltavam tabuas. Mas o que me impressionou é que a casa de João Manoel estava morta!Não sabia que casas morriam.
***Ele tinha mais de oitenta anos!Se sua alma não foi levada pelos anjos para o paraíso celestial, com certeza o foi para o coração do céu onde brilhava sua estrela.
João Manoel era meu avô paterno. É curioso que na mesma rua, moravam minha vó materna, algumas tias e primos e o tio Neuto. Este foi por assim dizer, o tio das nossas vidas. Os filhos deles foram nossos primos mais próximos com o os quais compartilhamos alegrias e tristezas, porque a grande dor de sua vida, meu tio guardou só para si.





*Estamos na primeira década do século XXI, com uma Manaus com um trânsito caótico e uma estatística de "atropelamento? ou acidentes com motocicletas por ouros veículos maior, do que o atropelamento de pessoas por motocicletas.Então como é possível, que João Manoel, tenha sido atropelado por uma motocicleta em 1973? Em uma Manaus com um trânsito leve, com poucos veículos, e bastantes carroças puxados por cavalos ainda?João Manoel era meio surdo e o motociclista buzinou para alerta-lo e para que ele saísse do "meio", mas ele era "meio" surdo e não ouviu.E o motociclista entre a opção de desviar ou o atropela-lo, o atropelou. Terá sido genética esta opção?Não.Ser atropelado por bicicletas era mais comum.



Autor: Roberlane Monteiro Oliveira


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