GUARDA COMPARTILHADA:



GUARDA COMPARTILHADA:
A manutenção do vínculo afetivo nas relações parentais pós dissolução conjugal

Autores: Gheysiane Souza e Ítalo Reis Brown



SUMÁRIO: Introdução; 1 Breves considerações acerca da guarda; 2 Tipos de guarda; 3 Do compartilhamento da guarda; Conclusão; Referências.



RESUMO
Discorrer-se-á sobre o instituto da guarda. Expor-se-á as modalidades de guarda. Explanar-se-á a guarda compartilhada. Distinguir-se-á guarda compartilhada de guarda alternada. Dissertar-se-á acerca do compartilhamento da guarda em casos de litígio parental.

Palavras-Chave: Filhos, pais, dissolução conjugal, guarda, afeto.

INTRODUÇÃO
Malgrado a indubitável importância do ambiente familiar enquanto possibilitador do sadio desenvolvimento moral e psicológico da criança e do adolescente, por muito tempo perdurou a errônea vinculação da dissolução parental à dissolução conjugal.
Tal associação dava-se, em grande parte, pela própria estrutura histórico-social-familiar por muito vigente, a qual delegava ao pai o sustento material do lar e à mãe a "guarda" (educação e cuidados) da prole.
Nesse desiderato, quando das separações conjugais, a guarda era quase que exclusivamente, salvo exceções legais ? aplicadas em nível de "sanção" às mães "indignas", concedida à mãe, outorgando-se aos pais o mero direito à visita.
Hodiernamente, face aos aplausíveis avanços legais, as responsabilidades ? dever de cuidar, educar, gerir, alimentar, enfim, assistir moral, financeira e educacionalmente ? para com os filhos, pós rompimento dos laços afetivos conjugais, é assegurado a ambos os genitores, em acordo às necessidades e interesses do menor. Trata-se da instituição da guarda compartilhada.
O que se pretende com tal "mecanismo" é assegurar ao menor o direito de convivência com os pais, posto que o afeto parental ? amor entre pais e filhos ? não se dissolve quando do fim do relacionamento conjugal dos genitores.
O presente artigo tratará, de forma sucinta, sem quaisquer pretensões de esgotamento do tema ou aprofundamento das discussões a ele inerentes, do compartilhamento de guarda, buscando demonstrar sua utilidade e adentrando em questões pertinentes ao à guarda compartilhada.
Visando possibilitar o melhor entendimento da matéria, inicialmente far-se-á uma breve explanação do instituto da guarda, diferenciando as formas de sua implementação.

1 BREVES CONSIDERAÇÃOES ACERCA DA GUARDA
"Falar em guarda de filhos pressupõe a separação dos pais". É o que nos ensina Maria Berenice Dias.
Havendo união conjugal e dela decorrente o nascimento de filhos, estes estarão sujeitos à proteção integral de ambos os genitores. Fala-se, nesse caso, em "guarda" conjunta implícita. No entanto, caso venha a o ocorrer a dissolução do vínculo conjugal, passar-se-á à individualização da guarda.
Nesse sentido são as lições de Paulo Lobo apud Dias: "A guarda dos filhos é, implicitamente, conjunta apenas se individualizando quando ocorre a separação de fato dos pais".
Guarda consiste no dever do genitor em provir o desenvolvimento da criança e do adolescente, assistindo-lhes material, moral e educacionalmente, conferindo ao seu detentor o direito de se opor contra quaisquer, se em defesa dos interesses do menor.
Dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 33, in verbis: "A guarda obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à criança e ao adoelescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais".
Buscando conceituar guarda, preleciona Maria Manoela Rocha de Albuquerque Quintas: "Guarda nos traz a idéia de proteger, manter seguro, entre seus sinônimos encontra-se vigilância, cuidado, defesa e criação. Portanto, através da guarda, compete aos pais vigiar, defender, cuidar, proteger e dirigir a vida de seus filhos."
A fim de elucidar o conceito, diz, sucintamente, Sérgio G. Pereira apud Maria Lúcia Luz Leiria: "é a situação do detentor da responsabilidade sobre o sustento e a manutenção do menor".

2 TIPOS DE GUARDA
Muitas são as classificações doutrinárias concernentes às modalidades de guarda. Inicialmente, cabe distinguir guarda jurídica de guarda física.
Segundo Maria Quintas, a guarda jurídica é aquela deferida por Lei como elemento do poder familiar, referindo-se à responsabilidade dos pais de gerir o futuro dos filhos; e a guarda física, a presença do menor na mesma residência dos pais. Elucida a autora que tais conceitos não se confundem, sendo possível ao genitor ter a posse jurídica, ainda que não detenha a física.
Dentre as classificações utilizadas quando do estudo da guarda encontra-se aquela baseada na diferenciação desse instituto em decorrência da detenção do poder-dever dos sobre o menor por um dos ou por ambos os genitores, quais sejam: guarda comum; guarda unilateral ou exclusiva; guarda alternada; e guarda compartilhada.
Guarda comum é que se dá no curso da união conjugal, sendo atribuídos a ambos os genitores, reciprocamente, os deveres e direitos para com o filho menor.
Guarda unilateral é aquela atribuída a apenas um dos genitores ou alguém que o substitua , ficando assegurado ao não guardião o direito de vistas ao menor. No atual ordenamento civil pátrio, em decorrência da alteração trazida pela Lei n° 11.698/2008, esse tipo de implementação da guarda é excepcional, sendo preterida pela modalidade compartilhada.
Nesse diapasão, preleciona Maria Berenice Dias: "A lei prevê a possibilidade de guarda unilateral, mas francamente dá preferência à guarda compartilhada."
São hipóteses de atribuição dessa modalidade de guarda: consenso de ambos os pais no sentido de que apenas um deles detenha guarda do menor, sendo assegurado ao outro genitor o direito de visita e fiscalização da manutenção e educação do menor (art. 1583, §3°, CC/02), e, ainda, o dever de supervisionar os interesses do filho (art. 1589, CC/02); e, quando o menor é legalmente reconhecido por apenas um dos pais.
Quando da atribuição da guarda unilateral (unipessoal ou exclusiva) serão observados critérios concernentes ao melhor interesse do menor, devendo ser a custódia conferida ao genitor cujas condições de exercê-la mostrem-se melhor adequadas, além de critérios objetivos, determinados pelo art. 1583, § 3°, CC/02, a saber: aquele que tenha melhor idoneidade de propiciar ao menor afeto nas relações com o genitor e o grupo familiar; saúde e segurança; e educação.
Diz-se guarda alternada aquela na qual "cada genitor exerce, alternativamente, a guarda do filho, com todos os atributos que lhe são próprios".
Já guarda compartilhada é aquela conferida a ambos os genitores conjuntamente, embora já dissolvida a união conjugal. É esta a modalidade prevalecente na legislação civil atual, pós reforma instituída pela alhures citada Lei n° 11.698/2008, art. 1583, §1°: "responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns."
Também pertinente é a classificação aferida em decorrência da situação que enseja a constância da guarda, aqui têm as possibilidades de guarda originária, derivada ou de fato. Originária é aquela onde o pode-dever de plena convivência dos genitores com seus filhos decorre do poder próprio familiar; será derivada quando provir de indicação legal; e de fato quando a guarda do menor tiver sido tomada sem qualquer amparo legal ou judicial, caso este em que, embora não haja qualquer direito de autoridade pelo "guardião" sobre o "guardado", observar-se-á todas as obrigações inerentes à guarda desmembrada, como assistência e educação.
Fala-se, ainda, em guarda provisória e definitiva: a primeira configura medida provisória, como o próprio nome já sugere, visando apenas sanar uma questão temporária, surgindo normalmente durante os processos de separação ou de divórcio; enquanto a segunda é a que decorre da homologação ou decretação da dissolução conjugal.

3 DO COMPARTILHAMENTO DA GUARDA
A Lei n° 11.698/2008 veio legalizar a já consubstanciada, jurisprudencial e doutrinariamente, guarda compartilhada.
Reza o artigo 1583, § 1°, CC, redação dada pela referida lei:
Art. 1583. A guarda será unilateral ou compartilhada.§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
Guarda compartilhada é, como alhures conceituado, a situação jurídica em que o dever-poder sobre os filhos matem-se inalterado mesmo após a dissolução da sociedade conjugal.
Liane Maria Busnello Thomé assim conceitua o instuto:
A guarda compartilhada é uma modalidade de guarda jurídica atribuída a ambos os genitores e busca atenuar o impacto negativo da separação dos pais no relacionamento com seus filhos.

Tal instrumento tem possibilitado a continuidade da relação afetiva havida entre pais e filhos, outrora prejudicada quando da dissolução da união conjugal, fosse por "incompatibilidade" entre os genitores, que por algumas vezes preteriam o interesse do menor ? direito de convivência com ambos os genitores ? em favor de seus ressentimentos; fosse por desinteresse do próprio genitor não guardião em dar continuidade à relação familiar.
Hodiernamente, o compartilhamento da guarda é a preferência legal, aplicando-se a modalidade de guarda unilateral somente em casos excepcionais, subsidiariamente, sendo inadmitida a instituição da guarda compartilhada somente quando ambos os pais se manifestarem, expressamente, pela guarda unilateral. Nesse caso o juiz não poderá impor o compartilhamento.
Indubitável é a importância dessa modalidade de guarda para o pleno desenvolvimento psíquico do menos, não raro abalado pela separação de seus pais.
Sobre o modelo em epígrafe, posiciona-se Maria Berenice Dias:
O novo modelo de co-responsabilidadeé o ideal, um avanço, pois favorece o desenvolvimento das crianças com menos traumas e ônus, propiciando a continuidade da relação dos filhos com seus genitores e retirando da guarda a idéia da posse.

Maria Antonieta Pisano Motta apud Dias, no mesmo sentido:
..a guarda compartilhada deve ser tomada, antes de tudo, como uma postura, como reflexo de uma mentalidade, segundo a qual pai e mãe são igualmente importantes para os filhos de qualquer idade e, portanto, essas relações devem ser preservadas para a garantia de que o adequado desenvolvimento fisiopsíquico das crianças ou adolescentes envolvidas venha a ocorrer.

Faz-se ainda mister mencionar acerca do compartilhamento da guarda que essa não impede a fixação de alimentos, posto que nem sempre os genitores podem provir as necessidades financeiras do menor a contento e a guarda nem sempre é exercida com alternância de lares, ao contrário, quase sempre o menor permanece na residência de um só dos genitores.
Imprescindível é, nesse diapasão, distinguir guarda compartilhada de guarda alternada: na primeira detêm os genitores somente a guarda jurídica do menor, indiferente é pós o local onde esse venha a residir, se na residência do pai ou da mãe; já na segunda, em períodos alternados, sejam esses quinzenais, mensais ou mesmos semestrais, conforme acordado, o detentor da posse o será nas modalidades física e jurídica, devendo o menor residir no mesmo local do guardião.
Importante ainda, citar, que, por longo período, muito se discutiu a cerca da impossibilidade do compartilhamento da guarda em casos de dissolução litigiosa do vínculo conjugal. Tal posicionamento, embora ainda vigente em algumas discussões doutrinárias, perdeu forças, já que atualmente, o art.1584, I e II, fruto da alteração legal conferida pela Lei n° 11.698/2008, prevê, expressamente, a possibilidade de imposição de guarda compartilhada pelo juiz.

CONCLUSÃO
A Lei n° 11.698/2008 veio consubstanciar o, já consolidado em diversos países e já faticamente adotado na prática dos Varas Juizados de Família do Brasil, instituto da guarda compartilhada.
Tal iniciativa legal é merecedora de aplausos, posto que possibilitadora da continuidade dos laços afetivos decorrentes das relações familiares, antes rompidos quando da separação conjugal dos genitores.
Através dessa modalidade de guarda, aos menores será efetivado o direito de pleno convívio mútuo com os pais, indubitavelmente imprescindível para o desenvolvimento psíquico das crianças e adolescentes. Assim como, também, garantir-se-á aos genitores, o direito-dever de educação dos filhos e participação efetiva, pós dissolução conjugal, em suas vidas.


REFERÊNCIA
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5° Ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

FILHO, Waldyr Grisard. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 4ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

LEIRIA, Maria Lúcia Luz. Guarda Compartilhada: a difícil passagem da teoria à prática. 2009. In: Internet.. Disponível em: http://www.trf4.jus.br/trf4/upload/arquivos/emagis_publicacoes/emagis_guarda_compartilhada_a_dificil_passagem_da_teoria_a_pratica.pdf. Acesso em: 16.05.09

QUINTAS, Maria Manoela Rocha de Albuquerque. Guarda Compartilhada: de acordo com a lei nº. 11.698\08. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

Autor: Gheysiane Da Silva Souza


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