O HOMEM COMO SER NO MUNDO
Compreender o homem como ser-ao-mundo, é adentrar na lógica existencial do próprio Dasein. Ora, entendemos o Dasein como o ser-aí, eis o fundamento existencial heideggeriano do ser. O "aí" constituinte diz respeito ao lugar onde acontece o velamento e o desvelamento, o lugar no qual se tem a questão da verdade. Deste modo, a "aí" pode ser compreendido como o mundo, estrutura unitária existencial, o horizonte a partir do qual o ser-aí transcende. A partir disso é compreensível a relação intrínseca entre o homem e o mundo.
O homem só se compreende como tal mediante sua relação com o mundo. Para Heidegger, o Daisen (homem) é um ser-ao-mundo. Para compreender melhor esse "ser-ao-mundo", é necessário antes averiguar o porque que o homem não é ser do mundo nem ser no mundo. Ser-ao-mundo é expressão um tanto forçada, mas deve ser mantida porque diz o significado que ele surpreende no Dasein em relação ao mundo. Se fosse ser no mundo, o homem estaria contido nele, como elemento dentro de outro. Neste caso, o homem e mundo já teriam, cada qual, constituição independente. Ora, para o nosso autor é a relação que constitui tanto o homem quanto o mundo. Ser-ao-mundo indica inerência,, relação constitutiva, a própria situação ontológica do homem.
De acordo com Arduini (1989),
Ser-ao-mundo é ser relacionado com os entes, é habitar o mundo, é estar em casa, é viver em ambiente familiar. O homem é sempre ser-ao-mundo, mesmo que não saiba disso. Não está fora do mundo. Faz parte do sistema das relações constitutivas da mundaneidade. O homem e o mundo se inter-envolvem. Não há o homem sem o mundo, e nem mundo sem o homem. A estrutura daquilo ao qual se liga o Dasein constitui a mundaneidade do mundo, e o ser do homem só se revela sob a forma de mundaneidade.
Deste modo, o homem se encontra inserido numa realidade da qual ele também a constitui. Dito de outro modo, a realidade homem e mundo só existem num envolvimento recíproco, eles coexistem entre si. O ser-com-o-outro é forma de ser-ao-mundo. O homem é sempre, e já, ser-com-o-outro. Não há possibilidade de ser sem o outro.
Na vida do indivíduo o passo para uma participação da dialética da sociedade é a interiorização. Interiorizar é apreender a realidade dotada de sentido; é compreender, aceitar, assumir, identificar-se, participar.
A realidade da vida cotidiana é partilhada com outros. Vivemos em constante contato com os outros homens, na comunicação e na interação. O outro é um mediador, que me permite descobrir a mim mesmo como sou constitutivamente. O homem é um ser que implica o ser do outro em seu ser.
O eu se torna ele mesmo através de um tu. Há um recíproco apelar e responder. O eu e o tu se atingem no seu em si, há um encontro no sentido forte do termo. É a partir desse encontro que constituímos o mundo enquanto comunidade.
A característica básica da comunidade é visar o ser-em-si, na dupla forma: as pessoas visam o ser-em-si uma da outra e visam em comum na realidade em si. Trata-se de aceitar as pessoas na sua totalidade e com elas, em comum, relacionar-se com a mesma realidade. A comunidade se torna tanto mais profunda quanto mais abrangente é o domínio das coisas possuídas em comum.
A realidade existencial do homem e do mundo se dá no encontro do homem com os outros, e deste com o próprio mundo. O mundo do Dasein é um mundo comum. Essa relação não é adquirida ou adicionada, é primária e original, pertencente à constituição do Dasein, ou seja, do homem.
O homem se caracteriza pela compreensão do ser. É o próprio Dasein, enquanto ser-ao-mundo, que conhece. A compreensão é acessível ao homem por causa de sua conatural contenação mundana. A compreensão não é conceito intelectual ou resultado lógico, mas fenômeno ontológico. É a manifestação visceral da articulação do ser-ao-mundo.
O Dasein compreende o ser no seu ser finito e o ser compreende o Dasein, o finito, assim, ele mesmo se temporaliza, se finitiza. O aí do ser-aí é o lugar de revelação do ser e também, o lugar de compreensão do homem, ou seja, é o homem o aí do ser, é nele que a questão do ser encontra o seu campo de manifestação, o espaço ontológico.
É a partir da compreensão que emerge o projeto que destina o homem a seu ser, e, por isso, à mundaneidade. Nascido da compreensão, o projeto lança o homem a converter possibilidades em acontecimentos. Pois o homem é o acontecer, é o andamento histórico que se destina na liberdade. Para Arduini, "a compreensão gera a possibilidade do sentido de ser não pode, em geral, ser colocada se não houver a compreensão do ser. O sentido contém e sistematiza em forma coerente, o que pode ser revelado pela compreensão do ser."
Quando o ser-ao-mundo chega à expressão compreensiva organicamente, temos o sentido. E isto é possível porque o homem é ente que pode ou não alcançar o sentido, que pode perceber o sentido e o absurdo. O homem que comparece como abertura à compreensão, é capaz de pôr o ser a descoberto e de revelar o significado do mundo.
Para Heidegger só o homem é portador de sentido. Somente o Dasein tem sentido, e o tem à medida que a revelação do ser-ao-mundo venha planificar, se na descoberta dos entes que podem oferecer-se a ele. Portanto, essa relação existente pode ou não alcançar seu desvelamento de compreensão existencial, já que para tanto é preciso antes que o homem alcance tal finalidade, afinal, é ele quem delega sentido para si e para o mundo.
Referência:
SALES. Marcela Barbosa Leite. Heidegger e a "desconstrução" do princípio de fundamento em o Sobre a essência do fundamento. In: Studium: Revista de Filosofia, Ano 5. nº 10. Ano 2002.
¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬ARDUINI. Juvenal. Destinação Antropológica. São Paulo: Paulinas, 1989.
Autor: Eudes Henrique Da Silva
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