A Assistência da Enfermagem e o Respeito à Privacidade



A assistência de enfermagem tem como objetivo promover qualidade de vida e manter a integridade do ser, para isso, deve-se considerar suas crenças, suas histórias, suas limitações e seus temores.
O cuidado é uma atitude de carinho e dedicação incondicional, um sentimento humano para com o semelhante, realizado na dimensão existencial do ser onde a enfermagem valoriza a atenção individual e o respeito às necessidades do paciente.
A integralidade do cuidado inclui o respeito à dignidade humana, a privacidade do outro, o dever ético e moral.
O termo ética está relacionado aos padrões de conduta moral, expressos na conduta do comportamento em relação ao paciente, ou seja, a capacidade de discernimento entre o certo e o errado, significando o limite do modo de ser e agir.
A ruptura da homeostase representada pela experiência da doença, juntamente com a necessidade da internação, significa não só a perda do estado de saúde, mas a perda do controle de si, uma vez que a situação impõe-lhe à dependência.
O paciente precisa ser acolhido com o carinho da humanização, uma vez que nenhum paciente e nenhuma família está preparada para enfrentar a dura realidade da hospitalização, deste modo, tornar-se a permanência do paciente no hospital o menos traumática possível.

Lembrando que,
[...] o indivíduo traz consigo uma carga de valores morais e éticos que são apreendidos no decorrer de sua existência. Dentre estes valores, queremos destacar o direito e o dever ao resguardo da identidade e privacidade do indivíduo/cidadão, enquanto cliente e sujeito do processo de trabalho da enfermagem. (PUPULIM; SAWADA, 2002, p.1).

A internação, por exigir cuidados especializados e, muitas vezes, invasivos realizados normalmente pela equipe de enfermagem, é percebida como uma invasão de privacidade, principalmente quando o profissional esquece os preceitos básicos como identificar-se, explicar o procedimento a ser realizado e pedir licença para sua execução.
Segundo Pupulim e Sawada (2002, p. 2) o paciente pouco questiona essa invasão porque, na sua percepção, ela é necessária para sua recuperação, porém demonstra constrangimento, vergonha e embaraço que pode ser demonstrado através de gestos ou pela expressão facial.
Contudo, cabe à enfermagem preservar a privacidade do paciente através dos recursos disponíveis, utilizando, por exemplo, um biombo para realização de procedimentos, solicitando que os acompanhantes aguardem fora do quarto quando necessário, procurando expor o mínimo possível o corpo do paciente.

Sugere o autor,
Pedir permissão para despir e tocar valoriza o paciente, como ser único e peculiar, e que seu corpo está sob seu domínio. Para eles essa atitude e o respeito conferem dignidade, contudo outros alegam desconsideração por suas preferências para obter privacidade por parte de alguns profissionais em certas ocasiões. (PUPULIM; SAWADA, 2010, p.39).
Podemos afirmar que a privacidade é uma necessidade, um direito de todo ser humano, sendo indispensável para configuração de sua dignidade. Devemos considerar a privacidade de forma ampla no que diz respeito à proteção da intimidade do paciente, facilitando assim o processo de trabalho e aumentando a interação com a equipe de enfermagem, o que ao mesmo tempo possibilita o atendimento humanizado.
De acordo com Santos et al (2010, p. 879) assim como homem e ser social, o paciente precisa sentir que nós como profissionais o consideramos, como ser integral e, ao mesmo tempo singular, em suas necessidades, ou seja, compreendendo que cada paciente é diferente do outro ou produto do cotidiano social específico.
Nesta perspectiva, não podemos ignorar os valores que o paciente atribui à vivência da internação, representados através das ações da equipe de enfermagem, sendo assim, os fatores da sua experiência positiva ou negativa.
Lembramos que no Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, no capítulo - IV Dos Deveres, diz:

- Art. 26º - Prestar adequadas informações ao cliente e família a respeito da assistência de Enfermagem, possíveis benefícios, riscos e conseqüências que possam ocorrer.
- Art. 27º - Respeitar e reconhecer o direito do cliente de decidir sobre sua pessoa, seu tratamento e seu bem-estar.
- Art. 28º - Respeitar o natural pudor, a privacidade e a intimidade do cliente.

Diante do transcrito nos artigos acima, voltamos a afirmar da necessidade do bom preparo e formação acadêmica do Enfermeiro para um atendimento de qualidade sendo específico, personalizado e humanizado.
Deste modo, o processo de cuidar para ser eficiente necessita da confiança, da aceitação do paciente caracterizado pela efetiva troca de informações, saberes, tendo por base o compromisso ético e moral.
Conforme Morais et al (2009, p. 324) a humanização do cuidado em saúde perpassa pelo respeito à individualidade da pessoa, ao mesmo tempo em que suscita uma percepção holística deste ser, o que influencia diretamente no processo de recuperação do paciente.
Os procedimentos da enfermagem devem ser individualizados conforme a necessidade de cada um, caracterizando assim, o atendimento personalizado, portanto, o paciente jovem recebe e vê este procedimento, realmente como necessário e único no seu tratamento; já o paciente idoso, quase sempre demonstra constrangimento e precaução, chegando mesmo a omitir sintomas importantes no quadro clínico.
Para Morais et al (2009, p. 324) o cuidado de enfermagem deve ser de forma humana e holística sob a luz de uma abordagem integrada, valorizando os aspectos emocionais e seu comportamento durante a internação, sua interação com a enfermagem e a forma de aceitação da sua patologia.
Lembrando que o próprio conceito de saúde proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) nos remete à visão holística, portanto, a assistência de enfermagem deve ser integral, não sendo focalizada na patologia apresentada. Desta forma, os fatores secundários devem ser considerados, uma vez que servirão de identificação dos possíveis fatores agravantes ou desencadeantes do problema.
O estado emocional e psíquico interfere sistematicamente nas reações humanas, como também na forma de somatização, neste contexto, qualquer forma de invasão do seu espaço ou mesmo da sua privacidade terá reflexo direto em seu estado biopsicossocial e consequentemente no seu tratamento.
A enfermagem deve estabelecer com o paciente uma relação de respeito ao próximo, para isso, é fundamental colocar-se no lugar do outro, respeitando seus valores morais e bloqueios emocionais procurando transmitir-lhe confiança e segurança como profissional de saúde.
Principalmente quando o cuidado envolve a necessidade da nudez, sendo normalmente percebida como uma forma de violação ou mesmo uma agressão. O que para a enfermagem é considerado um ato corriqueiro da sua rotina.
O autor cita,
[...] culturalmente e no núcleo familiar, aprende-se que expor o corpo não é apropriado, relacionando-se implicitamente a nudez com sensualidade e sexualidade, comuns aos indivíduos, mas, de certa forma, reprimidas, de acordo com os padrões de comportamento vigentes na sociedade. (PUPULIM, SAWADA, 2002, p. 434).

A nudez é vista como uma situação constrangedora, principalmente quando se trata de um desrespeito ao pudor, sentimento este exacerbado quando se trata do paciente idoso. O pudor é uma questão de educação e formação individual de cada pessoa, o que nos leva a conceber cada ser humano de corpo e alma. As culturas e formações existem e são diferenciadas em cada geração, preservando-se acima de tudo, os usos e costumes.
De acordo com, Pupulim e Sawada (2010, p. 41) sendo necessário tocar o paciente, o profissional deve estar atento ao valor pessoal que permeia a interação, ao temor, idade, sexo, classe social, respeitando as diferenças a fim de uma abordagem tranquila e um resultado eficaz.
Para uma maior interação com o paciente, o enfermeiro tem a seu favor a comunicação terapêutica, um fator de conquista e empatia. A comunicação estabelecendo um relacionamento terapêutico, porque implica na troca de informações, de sentimentos e pensamentos, como também na educação continuada garantindo a participação do paciente e sua adesão no tratamento.

Considerações finais
Ao longo dos tempos surgiram novas técnicas, rotinas e protocolos com o intuito de contribuir para o aprimoramento dos cuidados. Em contrapartida, a modernidade, a rotina estressante e o acúmulo de atribuições resultaram em relações humanas distantes.
O Programa de Humanização foi introduzido na saúde como uma estratégia a fim de resgatar o lado humano das relações no processo saúde-doença, garantindo ao ser cuidado um tratamento digno e com respeito.
Cabe a enfermagem proporcionar segurança e confiança ao paciente, principalmente nas questões relacionadas à privacidade e o devido respeito ao corpo do outro. Lembrando que a nudez é um fator constrangedor que envolve o pudor, sendo responsabilidade da equipe de enfermagem evitar ao máximo o constrangimento do paciente como também, danos emocionais.
Deste modo, a enfermagem deve estabelecer uma relação de confiança com o paciente através da comunicação terapêutica, seja esta comunicação verbal ou não verbal, tendo como objetivo a efetividade da interação entre a equipe de enfermagem e o paciente, fator essencial ao cuidado.

Referências
COFEN. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução 311. 2007, Código de ética dos profissionais de enfermagem. Rio de Janeiro. RJ. Disponível em: . Acesso em 24 de mar. 2011.
MORAIS, G.S.N.; COSTA, S.F.G.; FONTES, W.D.; CARNEIRO A.D. Comunicação como instrumento básico no cuidar humanizado em enfermagem ao paciente hospitalizado. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, 22, (3): p. 323-327, dez, 2009.
PUPULIM J.S.L.; SAWADA N.O. O cuidado de enfermagem e a invasão da privacidade do doente: uma questão ético-moral. Revista Latino-americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, 10, (3) : 433-438, mar, 2002.
____________. Reflexões acerca da comunicação enfermeiro-paciente relacionada à invasão da privacidade. In: Simpósio Brasileiro de Comunicação em Enfermagem, 8º, 2002, São Paulo, Anais on line: São Paulo, 2002.
____________. Privacidade física referente à exposição e manipulação corporal: percepção de pacientes hospitalizados. Texto Contexto de Enfermagem, Florianópolis, 19, (1): 36-44, jan-mar, 2010.
SANTOS, R.M.; et al. A enfermeira e a nudez do paciente. Revista Brasileira de Enfermagem, (REBEn), Brasília, 63, (6) : 877-886, jul, 2010.

Autor: Valéria Almeida Vieira


Artigos Relacionados


O Profissional De Enfermagem E O Relacionamento Com A Família Do Paciente Terminal

Bioética: Aspectos éticos Relacionados à Assistência De Enfermagem Ao Idoso

SistematizaÇÃo Da AssistÊncia De Enfermagem Em Psiquiatria

Analisar O Nível De Conhecimento Do Profissional De Enfermagem Relacionado A Educação Em Saúde Na Prevenção Das Complicações Dos Pacientes Diabéticos

Diagnósticos E Intervenções De Enfermagem Para Pacientes Com A Doença De Creutzfeldt-jakob.

Assistência De Enfermagem Ao Paciente Grave Na Emergência Com Icc, Dpoc, Fa E Insuficiência Respiratória

Assistência De Enfermagem Ao Cliente Vítima De Trauma Raquimedular: Um Estudo Bibliográfico