ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA: A QUEM É GARANTIDO ESSE DIREITO
Amanda Teixeira Tavares¹
Heloine Pereira dos Santos¹
RESUMO
Este artigo objetiva explicar os atuais critérios adotados na concessão do beneficio da Assistência Judiciária Gratuita e sua aplicabilidade prática. Evidencia também, projeto de lei que pretende alterar a lei 1060/50, utilizando-se de novo método para garantir o benefício devido às grandes controvérsias existentes na Legislação, Doutrina e Jurisprudência sobre a efetividade de tal garantia Constitucional. Incumbe ainda, esclarecer quanto à diferença de nomenclatura entre Assistência Jurídica, Assistência Judiciária Gratuita e Justiça Gratuita, abordando seus significados. O intuito deste artigo é abordar os efeitos causados pelos critérios atuais e as possíveis mudanças que ocorrerão, caso aprovado o Projeto de Lei 118/11. Este instrumento foi elaborado com base no Direito Positivo, pesquisa jurisprudencial e doutrinária, com o objetivo de aferir na prática a efetividade do Instituto da Assistência Judiciária Gratuita e, se esta é facultada aos que dela realmente necessitam.
Palavras chave: Assistência Judiciária Gratuita . Concessão . Critérios . Aplicabilidade.
Introdução
A Assistência Jurídica é garantia constitucional definida no artigo 5º, inciso LXXIV da Carta Maior, "O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (BRASIL, 2010)
Sendo assim, é dever do Estado prestar Assistência Jurídica à todos que dela necessitarem.
Como meio de efetivação dessa garantia, temos a Assistência Judiciária Gratuita, que permite que pessoas desprovidas de recursos, gozem dos mesmos benefícios que as pessoas que possuem condições de arcar com os custos de um processo. Para disciplinar o acesso à Justiça através da Assistência Judiciária Gratuita, existe legislação própria, qual seja, a lei 1060/50, que inclusive pode vir a ser alterada pelo Projeto de Lei 118/11, do Deputado Hugo
Orientadora: Prof. Ms. Iglesias Fernanda A. Rabelo
Leal do PSC-RJ; que passará a definir novo critério na concessão do benefício.
Devido a inúmeras discussões sobre a insuficiência de critérios exigidos para o beneficio, fazem-se necessárias, alterações na legislação específica, para que gozem deste, somente aqueles que sejam realmente legitimados para tal; haja vista não se exigir habitualmente, provas da insuficiência de recursos.
Os atuais critérios exigidos estão definidos no art. 4º da Lei 1060/50, onde esta prescreve bastar a simples declaração do procurador da parte que pleiteia a Assistência, na Petição Inicial ou Contestação.
Desta feita, muitas pessoas vêm se beneficiando ilegalmente do Instituto; pois se concedida pelo juiz e não impugnada pela parte contrária, aquele que se beneficia da Assistência Judiciária injustamente, continuará na ilegalidade, devido à deficiência existente nos critérios utilizados pelo Instituto.
Quais são os efeitos causados pelos atuais critérios adotados na concessão da Assistência Judiciária Gratuita e da Justiça Gratuita, e o que irá mudar caso aprovado o PL 118/11?
Tal benefício vem sendo facultado com base em critérios insuficientes, a partir dos quais não se faz possível aferir a verdadeira condição financeira de quem o pleiteia. Como exemplo, tem-se que atualmente na Comarca de Ponte Nova, MG, de acordo com o setor de distribuição do Fórum, 92% das ações que são distribuídas diariamente pleiteiam Assistência Judiciária ou Justiça Gratuita.
Para o desenvolvimento desse estudo, serão abordados os seguintes temas:
2.1 ? A garantia constitucional de acesso à Justiça;
2.2 ? Da diferença entre Assistência Judiciária Gratuita e Justiça Gratuita;
2.3 ? Da disciplina infraconstitucional da assistência judiciária;
2.4 ? Da concessão aos que dela necessitam;
2.5 ? Dos critérios adotados e do Projeto de Lei 118/11;
2.6 ? Revisão bibliográfica.
Desenvolvimento
2.1 ? Da garantia constitucional de acesso á justiça
O Princípio do Devido Processo Legal, princípio Constitucional estabelecido no artigo 5º, LIV da Constituição Federal, estabelece que todo indivíduo terá direito ao devido processo legal, ou seja, ninguém será privado de sua liberdade sem que antes passe por procedimento estabelecido em lei.
Em decorrência do Princípio do Devido Processo Legal, surgem tantos outros do Direito Constitucional, os quais são considerados espécies, como por exemplo, o Princípio do Acesso à Justiça, que têm previsão constitucional no art. 5º, LXXIV da Constituição Federal e, prescreve que o Estado prestará Assistência Jurídica Integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Nesse sentido, leciona DINAMARCO (2009) "A assistência judiciária é instituto destinado a favorecer o ingresso em juízo, sem o qual não é possível o acesso à justiça, a pessoas desprovidas de recursos financeiros suficientes á defesa judicial de direitos e interesses".
Entretanto, para maior efetivação do princípio, era preciso um Instituto que garantisse realmente aos "necessitados", aqueles que não possuam qualquer tipo de condição de arcarem com as custas de um processo, um meio de inseri-las nesse contexto; dar a elas meios de demandar e de serem demandadas em juízo, sem que para isso prejudicassem o seu sustento e o de seus familiares.
2.2 - Da diferença entre Assistência Judiciária Gratuita e Justiça Gratuita
Santos entende que:
Os benefícios compreendidos pela Assistência Judiciária são de duas ordens: a) Concessão de advogado; b) isenção de antecipação do pagamento de despesas processuais. Desses benefícios gozará o assistido para todos os atos do processo até decisão final da causa, e sua execução. [...] I ? das taxas judiciárias e dos selos; II ? dos emolumentos e custas devido aos juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários dos atos oficiais; III ? das despesas com as publicações indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais; IV ? das indenizações devida às testemunhas que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o poder público federal, no Distrito Federal e nos Territórios, ou contra o poder público estadual, nos Estados; V ? dos honorários de advogados e peritos. (SANTOS, 1989, p. 313)
Sendo assim, temos que a Assistência Judiciária Gratuita é muito mais ampla que a Justiça Gratuita, sendo que esta, como preleciona LIPPMAMN (1999), inclui "somente a isenção das despesas inerentes a demanda e é instituto de direito processual". Mamed (2011; 223) esclarece que "a Assistência Judiciária inclui a Justiça Gratuita, mas não se resume a ela".
Entre todos estes benefícios, tem-se que a parte terá direito à um defensor, seja este público ou particular.
Assim sendo, surgem as Defensorias Públicas, com intuito de fazer prevalecer o Princípio da Isonomia, colocando assim os necessitados em paridade com aqueles financeiramente privilegiados.
2.3 Da disciplina infraconstitucional da assistência judiciária
Desta forma, tem-se que a legislação infraconstitucional, fala da prestação da Assistência Judiciária aos necessitados; já a Constituição fala de tal prestação àqueles que comprovarem a insuficiência de recursos para arcarem com as custas de um processo. A legislação que rege a Assistência Judiciária Gratuita é anterior à Constituição de 1988. Contudo, o entendimento vigente, é o pertinente a esta legislação infraconstitucional, ou seja, será deferida a Assistência aos necessitados, diferentemente do que prescreve a Constituição onde se exige comprovação da insuficiência de recursos. Sendo assim, caberá ao adversário impugnar a Assistência Judiciária da outra parte.
Impugnação esta, que poderá ser feita pelo prazo de até 05 (cinco) anos, caso ao beneficiário sobrevenha condições financeiras as quais não possuía no momento do deferimento do beneficio, podendo assim, a partir daí, arcar com os custos de um processo; o que se ajusta com o entendimento da Jurisprudência dominante:
Relator: Des.(a) TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO
Data do Julgamento: 08/07/2010
Data da Publicação: 23/09/2010
Ementa: IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA - POBREZA LEGAL - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE - ÔNUS DA PROVA. Mostrando-se satisfatório para a obtenção do direito à gratuidade de justiça o requerimento do benefício, com a afirmação de pobreza no sentido legal, apresenta-se como ônus do impugnante a comprovação da possibilidade do postulante arcar com as despesas e os honorários advocatícios, o que não ocorreu na hipótese em testilha. (TJMG, 8ª Câmara Cível, Apelação Cível nº 1.0024.09.576051-8/001).
Além do mais, para se pleitear o benefício, o artigo 4º (caput) da Lei 1060/50, dispõe que basta a simples declaração do procurador da parte na petição, declarando que não dispõe de recursos para arcar com as custas do processo em prejuízo de seu sustento e de sua família, o que também se amolda aos julgados desta corte mineira.
Relator: Des. FERNANDO BOTELHO
Data do Julgamento: 10/02/2011
Data da Publicação: 13/04/2011
Ementa: IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUÇÃO DE VERACIDADE. DESCONTITUIÇÃO A CARGO DO IMPUGNANTE. ÔNUS DA PROVA. I - Consoante entendimento jurisprudencial, a simples afirmação da necessidade da justiça gratuita, nos termos do art. 4º da Lei nº. 1.060/50, é suficiente para o deferimento do benefício da assistência judiciária. II - Goza a declaração de miserabilidade da parte requerente presunção relativa de veracidade, que só pode ser desconstituída por prova robusta e cabal em sentido contrário, a cargo da outra parte, a teor do disposto no art. 333, inciso I, do CPC. (TJMG, 8ª Câmara Cível, Apelação Cível nº 1.0024.09.654616-3/001)
Todavia, o termo "dispor de recursos", não está relacionado a bens pertencentes do litigante, mas sim a liquidez; "recurso" está ligado à dinheiro. Como leciona DINAMARCO (2009), o melhor seria utilizar a expressão "insuficiência financeira". Neste sentido, são também os julgados de nosso tribunal.
Relator: Des.(a) MARCOS LINCOLN
Data do Julgamento: 16/03/2011
Data da Publicação: 23/03/2011
Ementa: "IMPUGNAÇÃO AO PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. PRESENÇA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DEFERIMENTO. Para a concessão do benefício da justiça gratuita (art. 5º, LXXIV da CF/88), basta a simples afirmação de carência, nos termos do art. 4º da Lei nº 1.060/50. Devido à evolução jurisprudencial, bem como à interpretação sistemática das leis, foi dispensada a comprovação documental da situação econômica daquele que pleiteia os benefícios da justiça gratuita, sendo irrelevante o fato de a parte possuir renda mensal e imóveis ou ser assistida por advogado particular, porque é a sua situação econômica que precisa ser analisada, ou seja, se as despesas prejudicarão sua manutenção ou de sua família." (TJMG, 11ª Câmara Cível, Apelação Cível nº 1.0045.10.002022-6/001)
2.4 - Da concessão aos que dela necessitam
O Instituto da Assistência Judiciária se apresenta como um Instituto de grande valor; um grande avanço não só em termos processuais, mas em termos sociais pois, dá-se o Direito ao necessitado de demandar e ser demandado, mesmo sem condições quaisquer de arcar com um processo.
Assim, aquele que se sentir lesionado em seus direitos, poderá litigar e ser defendido com os mesmos benefícios de outros, em nível de igualdade.
Entretanto, o problema todo se aloja quando pessoas não legitimadas, gozam da permissão, agindo de má-fé, se enriquecendo ilicitamente e causando prejuízos aos cofres públicos.
Isso é fácil de observar, quando temos, por exemplo, que, na comarca de Ponte Nova/MG, segundo o setor de distribuição do fórum, em 92% das ações que são distribuídas diariamente, os litigantes pleiteiam o benefício da Assistência Judiciária Gratuita ou Justiça Gratuita.
Ora, diante de tal apuração, faz-se mister frisar ainda mais a importância de critérios específicos para a concessão da gratuidade da justiça.
2.5 - Dos critérios adotados e do Projeto de Lei 118/11
Os critérios existentes, quais sejam, afirmação da insuficiência de recursos em petição e possibilidade de impugnação da parte adversária, não são suficientes para se aferir a verdadeira condição financeira do litigante. Assim sendo, seria necessário a implementação de novos critérios, que abordassem a real situação econômico-financeira da parte.
Como exemplo, já existe um Projeto de Lei, em tramitação, de autoria do Deputado Hugo Leal (PSC-RJ), que alterará o art. 4º da Lei 1060/50, acrescentando parágrafo único, o qual dispõe que a comprovação de renda mensal inferior a dois salários mínimos, poderá substituir a declaração exigida no "caput".
Em justificativa da elaboração do projeto, o Deputado Hugo Leal assevera que:
"o projeto preserva a essência do amplo acesso à justiça há que ser facilitado a todo cidadão, assegurando, a quem se afirma ao ter condições de suportar as despesas processuais sem reflexos negativos à própria manutenção e/ou sustento da família, a prerrogativa constitucional. Também, para melhor aplicação da Lei, estabelece critério objetivo de renda pessoal de até dois salários para concessão da assistência".
Tal projeto, caso aprovado, acrescentará e muito na efetivação da garantia constitucional do acesso à justiça. Contribuindo para que gozem do benefício, àqueles que realmente deles necessitem.
Portanto, torna-se cada vez mais indispensável a "prova" da devida insuficiência de recursos nos autos, pois, a cada dia torna-se maior o número de pessoas que pleiteiam o benefício e que gozam dele ilegalmente.
Entretanto, a postura dos magistrados quanto ao instituto em tela está mudando, principalmente quanto às exigências e comprovação financeira, já que a legislação atual não estabelece limite de valor. São inúmeros os julgados com indeferimento de Assistência Judiciária ou Justiça Gratuita, devido a não comprovação da insuficiência de recursos, porém nem todos adotam a mesma postura.
Assim, tem-se que o Instituto da Assistência Judiciária Gratuita foi um grande avanço constitucional, processual e social; pois, propiciou na prática o exercício de uma Garantia Constitucional decorrente de um Princípio fundamental: "Acesso à Justiça".
Conclusão
Espera-se, que depois da elaboração do Projeto de Lei 118/11, outros projetos surjam com a intenção de modificar os critérios embasadores da outorga da Assistência Judiciária Gratuita.
Apesar da tentativa do Estado de concretizar a garantia Constitucional da prestação da Assistência Jurídica, ainda há muito que se modificar, não só na parte legislativa, como também na sua interpretação.
Já que os critérios não são suficientes para abranger somente aqueles em situação de miserabilidade, anseia-se que os magistrados busquem a melhor interpretação da norma e da prova, para deferirem o benefício "a quem dele necessita".
2.6 ? Revisão Bibliográfica
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 2010.
BRASIL, Lei Nº 1.060 de 05 de fevereiro de 1950. Disponível em http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 14 de maio de 2011.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2009.
LIPPMAMN, Ernesto. Os Direitos fundamentais da Constituição de 1988. São Paulo: LTR, 1999.
MAMED, Gladston. A advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2011.
SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 12.ed. São Paulo: Saraiva, 1989.
TJMG, Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Disponível em: http://www.tjmg.jus.com.br. Acesso em: 14 de maio de 2011.
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¹ Acadêmicas do Curso de Direito da Faculdade Dinâmica Vale do Piranga ? FADIP
Autor: Heloine Pereira Dos Santos
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