AS MULHERES NA AMAZÔNIA IMPERIAL: RASTREANDO A PRESENÇA DAS MULHERES (1808-1889).



RESUMO: O presente artigo, tendo como tema central as mulheres na Amazônia Imperial, visa rastrear a presença destas através das abordagens historiográficas em artigos, textos analisados e discutidos na disciplina de Amazônia Imperial no curso de Licenciatura Plena em História do Uninorte, onde a partir dessas analises procuraremos visualizar como as mulheres foram inseridas nesse contexto histórico, mostrando suas participações ou representações dentro da sociedade amazônica, pois apesar de subsumidas na História são presença marcante no processo histórico desse período.

Palavras Chaves: Amazônia Imperial, abordagens historiográficas, movimentos sociais, papeis sociais das mulheres.



INTRODUÇÃO

Trabalhando na dimensão da História Social, onde Hebe Castro conceitua como:"(...) forma de abordagem que prioriza a experiência humana e os processos de diferenciação e individuação dos componentes e identidades coletivos sociais na explicação histórica."3
No domínio da História das Mulheres trabalhamos com referencial metodológico de Rachel de Soeith que caracteriza o objeto de estudo desse tipo de domínio como: "(...) as mulheres são alçadas à condição de objeto e sujeito da História." 4 Em que buscamos mostrar as mulheres não com uma identidade única na Amazônia Imperial e, sim como mulheres de múltiplas identidades.
Numa abordagem que utilizaremos o método do paradigma indiciário, onde José D? Assunção Barros diz: "para empreender uma análise intensiva de suas fontes, o historiador deve estar atento a tudo, sobretudo aos pequenos detalhes (...)." 5 Pois, em nossa análise de textos faremos uso desse método para buscarmos o rastro das mulheres na Amazônia Imperial, compreendendo suas múltiplas identidades e analisando as estratégias com as quais estas usaram para se relacionar com o social, assim como, identificar os seus papeis sociais.
Nessas abordagens historiográficas faremos análises de textos que falam sobre a Amazônia Imperial, onde buscaremos entender como as mulheres foram inseridas dentro da sociedade, assim
como, foram representadas.


CONTEXTO HISTÓRICO

É mister ao leitor para seu melhor entendimento analisarmos o contexto histórico do período de 1808 a 1889 no Brasil e na Amazônia.
Em 1808, com a chegada da Família Real no Brasil, devido à invasão Francesa em Portugal a corte é implantada no Brasil, quebrando com isso o pacto colonial, onde a Inglaterra será uma das grandes beneficiárias, pois ganha por parte de Portugal isenção de impostos.
Em 1815 com a derrota de Napoleão e a elevação do Brasil à Reino Unido de Portugal e Algarves, o Rio de Janeiro já era sede da monarquia Lusa em 1817, o descontentamento das elites regionais faz com que ocorra a insurreição pernambucana de caráter separatista.
Em 1820 com a Revolução do Porto D. João VI retorna à Portugal e deixa como regente seu filho Pedro. Essa Revolução levou as províncias portuguesas à ideias liberais, que possibilitaram a eleição de juntas governativas, onde muitas províncias brasileiras aderiram uma tendência de aproximação com essas ideias, como foi o caso do Grão-Pará.
D. Pedro resolve ficar no Brasil, após as elites de Portugal exigirem seu retorno imediato, e com isso, através do entrelaçamento com as elites de Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, pode em 22 de Setembro de 1822, proclamar a Independência do Brasil, esta porém que não foi conseguida sem muitas lutas já que muitas províncias não aderiram a Independência como foi o caso do Grão-Pará, que só depois de muitas lutas violentas em Novembro de 1823 adere a Independência.
As crises do algodão e do açúcar agravaram a situação de D. Pedro I, pois começa um clima de guerra civil, o que faz com que o Imperador abdique do trono, contudo este não foi o único motivo que levou-o a abdicar do trono brasileiro, o outro foi a não aceitação de abdicação ao trono português após à morte de D. João VI, em que faz em favor de sua filha D. Maria III, em que D. Miguel irmão de Pedro I, não aceitou colocando Portugal numa crise de sucessão dinástica. A primeira abdicação foi uma forma de estabilizar o Império brasileiro, pois deixa seu filho Pedro de Alcântara como Imperador com apenas quatro anos de idade, contudo até atingir a maioridade, o império seria governado por regentes, que começou sendo trino, depois uno.
Os descontentamentos continuaram e um novo clima de independências locais como no caso dos seguintes movimentos: Cabanagem, Farroupilha, Sabinada e Balaiada, desestabiliza o governo Regencial.6
Em 1840 com o golpe da maioridade D. Pedro II, assume o trono brasileiro e com isso centraliza o poder em suas mãos e reprime esses movimentos com maior intensidade.
Várias serão as crises durante o segundo reinado, a Guerra do Paraguai, começa o processo de declínio desse Império, pois os militares começam a estar descontentes com a Monarquia dando inicio a questão Militar, em seguida a briga com a Igreja, já que o Estado a controlava pelo sistema de Padroado, e com o processo de Romanização a Igreja quer mais autonomia, além da abolição da escravidão negra, que faz com que a Monarquia passe não ter apoio dos grandes latifundiários, e com isso culmine o 15 de Novembro de 1889, com a Proclamação da República.
Esse foi um breve contexto histórico para entendermos como o Brasil e Amazônia estavam durante esse período em que nos propomos visualizar os papeis sociais das mulheres na Amazônia Imperial.


RASTREANDO A PRESENÇA DAS MULHERES NA AMAZÔNIA (1808-1889).

Começamos a nossa abordagem historiográfica com o artigo de Patrícia de Melo Sampaio (Desigualdades Étnicas e Legislação Colonial Pará, c. 1798?1820).7 Onde Sampaio tenta demonstrar que a legislação indigenista de 1798 apesar de oferecer certas liberdades aos indígenas foi um grande empecilho em relação às ascensões sociais do período, em que os habitantes indígenas e mestiços deveriam propor estratégias ora de acomodação, ora de resistências em face às leis segregadoras e preconceituosas impostas aos indígenas e mestiços.
Com isso, Sampaio, visa mostrar um índio ou mestiço não como vítima do sistema, mas como um agente que propunha uma certa resistência ao conteúdo das leis e, com isso, fazendo acordo e alianças com os poderes da colonização para beneficiar-se.
A historiadora trabalha com fontes primárias como as legislações indigenistas de 1798 à 1820, encontrados no Arquivo Público do Estado Pará (APEP), além de relatórios e correspondências de representantes da Província na Amazônia Imperial.
As suas fontes secundárias são inúmeras obras bibliográficas como as de autores: Mario Almeida, Rita Almeida, Antônio Amaral, João Azevedo, Heloísa Belito, Ciro Cardoso, Manuela Cunha, Nádia Farage, Alexandre Ferreira, Colin Maclachlan, Carlos Moreira Neto, Beatriz Perone-Moisés, Francisco Sampaio, Francisco Jorge dos Santos, Barbara Sammer, André Souza, Karen Spalding, Ermano Stradelli e José Veríssimo, onde esses autores falam da Amazônia Imperial e da situação dos indígenas na região.
Sampaio trabalha na dimensão da História Social, no domínio das classes populares e movimentos sociais, em que aborda suas fontes com o método da micro-história e do paradigma indiciário.
No rastrear das mulheres em sua obra encontramos um indício em que a autora nos mostra como nesse processo de acomodações e resistências de índio e mestiços as mulheres vão ter participação importante na maneira de conseguir cargos no sistema colonial:"Um outro exemplo do emprego dessas táticas é o pedido do Principal de Nogueira, Vicente Almeida, ao governador do Rio Negro, solicitando o emprego de Cabo de Canoa para o marido de sua sobrinha (...)".8
Com o exposto acima, suponhamos, que esse emprego de Cabo de Canoa só foi conseguido, pois a moça era sobrinha do Principal, este ameaçava, não cumprir as tarefas de sua competência, no caso os descimentos que remeteriam madeira, onde o Governador do Rio Negro acaba cedendo ao pedido.
Outro indicio da participação das mulheres é encontrado na fuga dos índios da Vila de Soure, em 1759, onde tais fugas aconteceram pois as autoridades dos homens aos serviços de fortarias sem deixar fazer roças que possibilitariam o sustento das mulheres e dos filhos.

(...) cerca de 40 indivíduos entre homens, mulheres e filhos ausentaram-se na noite anterior. (...) na Vila de Pinhel, a fuga do índio Romualdo já durava dois anos. Quando foi preso, 1762, seus parentes (a mulher e seu cunhado Principal) 'se meteram nos matos' com mais 40 pessoas e ainda deixaram na vila, insolentemente, uma figura de madeira de um soldado com armas e arcabuz no ombro (...)9


Entendemos que no texto analisado apesar de poucos os indícios da presença das mulheres conseguimos encontrá-las, visualizando alguns de seus papeis sociais, ora como a mulher que possui influência para conseguir cargos ao marido, assim como forma de resistência mais explicita como nas fugas, onde estas vão ter papel primordial, já que com a prisão do marido o seu cunhado Principal mobiliza a fuga da vila de Soure.
Em Amazônia: Paraíso dos Naturalistas, Hideraldo Lima da Costa10 analisa como os viajantes naturalistas enxergaram a Amazônia nos séculos XVIII e XIX. Onde trabalha para a construção do conhecimento através de uma relação interdisciplinar entre a História e a Antropologia, estando na dimensão da História Cultural, com isso, procuramos compreender o contexto e a representação do imaginário da Amazônia acerca da visão de mundo dos viajantes naturalistas que estiveram na região.
O autor lança mão em suas análises de fontes primárias como os escritos dos viajantes destacando os de La Condamine, Robert Ave-Lallemant, Luiz e Elisabeht Agassiz, Spix e Martius, Alfred Wallace, Henry Bates e Alexandre Rodrigues. Em que a partir dessas leituras visa compreender a visão dos naturalistas acerca da Amazônia, visão esta muitas vezes cheia de preconceitos por estarem estes impregnados por seu valores históricos, socais e culturais.
As suas fontes secundárias trabalha com os seguintes autores: José Carlos Barreiro, Marshall Berman, Hugo Cardoso, Manoel Carneiro Cunha, José Ribamar Bessa Freire, Francisco Hardman, Sérgio Buarque de Holanda, Laura de Melo e Souza, Tzventon Todorov, João Pacheco de Oliveira Filho, Hélene Minguet, Carlos Moreira Neto, Eric Hobsbawn, Michel Foucault, Sérgio Cardoso e entre outros.
Analisando La Condamine, Alexandre Rodrigues, o casal Agassiz, Henri Bates, Alfred Wallace e entre outros viajantes que estiveram na Amazônia durante os Séculos XVIII e XIX, pode-se visualizar como há a da permanência questão colonizador/conquistador em relação ao conquistado/colonizado, onde apesar das visões do século XVIII serem movidas pelo racionalismo, em que se tentava a desconstrução ou verificação dos mitos, além da medição da geografia da terra e no, século XIX, visão de mundo presa as questões da modernidade, como Darwinismo Social, desenvolvimento da sociedade burguesa, o principal tema em questão será a justificação do atraso da região da Amazônia se dará pelo processo de miscigenação existente, pois este trazia a degeneração dos habitantes.
A tese principal é a preservação da memória, onde o imaginário da Amazônia é construído a luz da ciência, porém a mentalidade permanece com a Europa sendo superior a Amazônia.11 Encontramos os indícios do feminino através das representações dos viajantes principalmente nos fragmentos deixados por La Condamine e o casal Agassiz.
La Condamine em sua viajem pela Amazônia volta a falar da existência das Amazonas, por meio dos relatos dos habitantes:

(...) no decorrer de nossa navegação, interrogamos por toda a parte os indígenas de diversas nações, perguntando-lhes com bastante cuidado se tinha algum conhecimento daquelas mulheres belicosas de Orellana pretendia ter encontrado ou combatido e se era verdade que elas viviam afastadas do comércio dos homens, não obedecendo, não os recebendo, si sem só uma vez por ano (...). O que parece mais verossímil do que todo o resto é que com o tempo elas tenham perdido o costume, que por terem sido subjugadas por outra nação, quer por enfadadas por sua solidão, as filhas tenham finalmente esquecido a aversão das mães aos homens. Assim, mesmo que hoje não tenha encontrado vestígios dessa republica de mulheres, isso não seria suficiente para afirmar que ela nunca existiu.12


La Condamine apesar de criar argumentos ficcionais, pode ao menos nos dá base de como as mulheres estavam presentes na Amazônia, tentando identificar um papel ativo das mulheres e seu relacionamento com os homens na sociedade amazônica.
O casal Agassiz em uma de suas conclusões acerca da mestiçagem refere-se a uma criada sua mestiça, onde daí podemos supor como era física e intelectualmente as mulheres amazônicas, e alegam a conclusão: "(...) Alexandrina, a julgar pela sua aparência, deve ter nas veias uma mistura de sangue de índio e sangue de negro. Ela promete muito e parece reunir a inteligência do índio a adaptação maior do negro."13
Entendemos que essa descrição da mestiça pelo casal Agassiz é uma mostra de como a partir da visão de mundo destes a mestiça será representada como um estereótipo da população amazônica que é tida como degradada, porém a apresenta como uma mulher inteligente e de fácil adaptação.
Em seu artigo, Hideraldo Costa através dos viajantes mostra a representação feminina como guerreiras (La Condamine), degradada, mas apesar de tudo inteligente e de fácil adaptação (Casal Agassiz).
Em "O fim do Grão-Pará e o Nascimento do Brasil: Movimentos sociais, levantes e deserções no alvorecer do Novo Império", Magda Ricci,14 trabalha com a História Social, no domínio dos movimentos sociais, na abordagem do paradigma indiciário, onde quer mostra que as relações sociais na Amazônia são feitas por vários grupos étnicos e que possibilitam a Amazônia um mosaico cultural, pois as relações eram de negros, índios portugueses, ingleses, mestiços, brasileiros das colônias do Estado do Brasil e entre outros.
Visualizando as relações políticas mostram que se dava de um imbricamento de relações onde se estabelecia constantemente através de choques entre governantes, como foi o caso do movimento cabano, ocorrido no Estado do Grão- Pará.
Acerca do distanciamento da região a respeito do império brasileiro, a autora minimiza, pois acredita que com as extensas relações sociais do grão para com as províncias do Brasil fez com que a Amazônia pudesse está próxima do Brasil por fatores, como das relações econômicas, pois o comércio era intenso, tanto no sertão amazônico, como com as províncias como Goiás, Mato Grosso e Ceará alem de outras províncias, assim como com a metrópole Lisboa.
Um outro fator de aproximação da Amazônia com o Estado do Brasil foram as questões de rebeliões provinciais que a partir de 1817, fez com que muitos revoltosas fossem mandados para a Amazônia.
A autora enfatiza que apesar de todos esses fatores o que vai fazer a região inserir-se de uma maneira efetiva ao território brasileiro e a questão econômica relacionada à economia gomífera.
Em suma, o que Ricci pretende fazer é desmistificar o distanciamento da Amazônia em relação ao Império brasileiro, mostrando que as relações sociais, econômicas e políticas eram elas que as aproximava os dois locais.
Na questão relacionada as mulheres a autora visualiza como estas se articularam com relação da distância geográfica para rever as questões de herança, como é o caso da senhora Genoveva Rita.

(...) Pode-se perceber também histórias de vida nas quais os residentes no Pará eram famílias de imigrantes de outras capitanias. E o caso do guarda da alfândega de Belém, Manoel Rodrigues e de sua mulher Genoveva Rita que fizeram procuração em Belém em 1808 para o recebimento de uma herança de uma avó José Cardoso Colares, falecido na Capitania de Penedo(...)15


O outro fragmento em que encontramos a mulher participando de questões relacionadas aos movimentos sociais, Ricci mostra que por causa de um ornamento que usava no pescoço uma senhora rica do Grão-Pará causou grande polêmica, pois o vermelho, a cor do ornamento representou no movimento cabanagem clara provocação aos brasileiros, pois era a cor do regime português, na figura da monarquia, tendo como símbolo João VI e Pedro I, assim como seus partidários.
(...) a dileta senhora trazia ao pescoço um petulante laço encarnado. Para o soldado o laço fazia parte de um rol de muitos outros que encontrava pendurados cotidianamente nos pescoços de muitos opositores de Lobo Souza. Já D. Brites Maria Ledo alega que era apenas "um ornamento". Seja como for, por ali reinavam as rugas cada vez mais detalhadas, que extravasam as fronteiras do mundo livre, indo até o universo da escravaria.16


Observamos e supomos que esta mulher por ser rica, esse episodio deve ter sido aceito o seu argumento de que o vermelho era apenas um ornamento, porém outros menos abastados não tiveram a mesma sorte: "(...) Havia a poucos dias, o mulato Manuel, escravo de Maria Tereza Pia, fora preso porque 'entoava versos com audácia de não ser castigado(...)'"17
Nesse fragmento nos é mostrado como que na Amazônia Imperial havia muitas mulheres que eram grandes senhoras de escravos.
Já no lado da escravidão o autor mostra o caso do senhor Marcelino Rodrigues que visava da alforria a sua escrava Idivirges, onde nesse momento conturbado, em pleno decorrer do movimento cabanagem, visa dar a escrava em seu entender um autêntico documento de sua liberdade como é o caso da homologação de seu testamento em cartório, já que muitos negros conseguiram a liberdade através do movimento cabano.
Analisando "As mulheres na cabanagem: Presença feminina no Pará insurreto", Eliane Ramos Ferreira,18 nos mostrar a presença feminina na cabanagem, buscando compreender como as mulheres participaram desse movimento e quais seus papeis sociais.
Ferreira enfatiza que as mulheres dentro desse movimento primeiro participaram na retaguarda, agindo como informantes, e também, alimentando os maridos com a produção de farinha.
No segundo momento a participação feminina e descoberta através de indícios encontrados em documentos pesquisados, onde mostram as mulheres no campo de batalha, em que serão presas trinta mulheres entre o exercito dos cabanos, e em um outro documento aparece uma mulher ferida em combate.
No terceiro momento as mulheres aparecem na articulação judiciária, pedindo pensões, o não recrutamento dos filhos arrimos de família nos exércitos legalistas e etc.
No quarto momento como abrigando os cabanos em suas casas e guardando armas e outros utensílios usados no combate.
No quinto momento como articuladora de fuga de um dos lideres do movimento, já que esta era viúva de um militar legalista, e pagaria uma boa fortuna em dinheiro, ouro e prata a quem lhe facilitasse a fuga.
A autora trabalha na dimensão trabalha na dimensão da História Social, com dimensão na História das mulheres, fazendo suas analises a luz teórica de Michelle Perrot, Edward Thompson e Georges Rude, abordando suas fontes através do paradigma indiciário.
Em "Nasci nas matas, nunca tive senhor" Eurípedes Nunes19 mostra que apesar de pequena a quantidade de negros na região amazônica, a sua mão de obra teve bastante importância na Amazônia Imperial.
Analisando os mocambos os mocambos do Baixo Amazonas, através de fontes escritas e orais, o autor visa reconstruir como foram às formas de resistência encontradas pelos negros para atingir a liberdade onde as comunidades quilombolas e os mocambos eram esse lugares.
Esses mocambos são visualizados como uma rede de negócios comerciais na região Amazônica, chegando os mocambeiros a manter contatos com os indígenas e negros do Suriname e Guianas.
Ao visualizar o sistema de organização social eram os quilombolas movidos pela fé católica, em um sistema social que tinha na autoridade dos chefes sua principal liderança, e na família sua estrutura.
Os negros da Amazônia ao contrário do que diz alguns documentos, não fugiam porque eram iludidos pela ganância, mas sim pelo fato de serem maltratados pelos seus senhores.
Em suma a tese principal da autora era que nos mocambos os negros se sentiam senhores de si e livres, pois lá podiam viver de acordo com seus sistemas de tradição cultural, religioso hibrido, onde a grande questão é ser livre.
O historiador Eurípedes Funes, trabalha na dimensão da História Social, analisando Edward Thompson, no domínio da História vista de baixo com a abordagem das fontes através do paradigma indiciário e da História oral.
Rastreando as frentes em que as mulheres tiveram dentro do contexto acima analisado, conseguimos alguns indícios que nos possibilitaram visualizar seus campos de atuação.
Funes falando sobre a primeira forma de adaptação do negro no Baixo Amazonas, mostra que a família foi essa primeira forma.

Muitos planteis menores eram compostos de membros de família escrava. São poucos inventários em que não aparecem juntos mães e filhos, sendo comum encontra senhores possuindo duas e até três gerações de uma mesma família em suas propriedades (...) o casar significava ganhar mais controle sobre o espaço de moradia. Ela constituía o lugar de autoridade independia, em grande parte da presença do senhor. 20


Essa citação mostra o papel importante da mulher, pois a partir do casamento negros tinham mais autonomia, e que a família era esse espaço.
No Baixo Amazonas o autor mostra a presença de senhoras de escravos negros, e entre elas a temida Meia Macambira que é resgatada da seguinte maneira:"Maria Margarida Pereira Macambira (...) é personificada como o símbolo da maldade, fazendo parte do imaginário dos remanescentes (...)."21
Eurípedes Funes salienta mais sobre o papel social dessa senhora de escravos:

A imagem dessa senhora, violenta e sem duvida de forte personalidade, está associada aos momentos mais significativos da história desses mocambeiros, como se depreende das falas dos narradores, que quando se lhes pergunta de quem eram escravos seus antepassados, respondem rapidamente: 'de Maria Macambira, uma mulher malvada'(...)22


Analisando os feitos quilombolas, o autor através dos relatos mostra que geralmente nestes aconteciam o aumento da demografia dos mocambos pois,"(...) as moças e mulheres jovens passavam nove meses incomodadas." Uma nova família estava surgindo ou sendo aumentada."23
Nas fugas a presença feminina se mostra uma constante, pois as famílias eram a base do sistema escravista, assim como a organização social dos Mocambos.

(...) eram frequentes as fugas de famílias de escravos, como por exemplo Honorato, escravo de Mathias Afonso, que, na noite de 4 de Janeiro de 1876, fugiu do sitio da Costa do Amazonas, levou uma montaria da parte de cinqüentas arrobas e foi acompanhado da mulher, Domingas, uma tapuia que costuma mudar de nome, e dói s filhinhos (...)24


Com isso, entendemos que as mulheres nessas resistências por parte das fugas que tinham que fazer também, já que constituíam as famílias poderiam sofrer retaliações por parte de seus senhores se ficassem nas terras dos mesmos.
Ainda nesse sistema de organização dos mocambos, Funes mostra a mulher como uma das principais na hierarquia dos quilombos onde no relatório sobre a prisão dos quilombolas do Inferno, Cipotema, e Coxange no Rio Curuá."(...) na relação dos mocambeiros presos aparecem: João Caxange, cabeça do mocambo;Sebastião, cabeça e reformador do Mocambo; Manoel, Vigário do Mocambo; Ana Joaquina, rainha do Mocambo; Silvestre, Ouvidor; Cartano; sacristão.(...)"25
Visualizando as frentes da participação feminina nos mocambos fala Ada negra Maria dos Anjos, onde está é orientada a fazer uma petição contra Frederico Rhossard.

(...)Espancaram barbaramente o mocambeiro Severino, marido de Maria dos Anjos, que orientada por terceiros, fez uma petição contra Frederico Rhossard. Ela e seus companheiros estavam indo pra capital afim de obterem do presidente uma licença para todos irem morar no lugar denominado Cúria.26


E foi através desses fragmentos que na constituição e repressão dos quilombos que as mulheres vão estar inseridas.
Em "Na Rota dos Labirintos", Patrícia Maria de Melo Sampaio27, visa mostrar a comarca e a província do alto Amazonas em seus diferentes aspectos (administrativo, fisiográficos e demográficos). Trabalhamos na dimensão da História Econômica com interface com a História Social, abordando suas fontes através da História quantitativa busca desmistificar alguns pontos na construção da história da comarca e da província do alto Amazonas.
Utiliza-se de fontes primárias como relatórios de províncias e correspondências de governadores, assim como relatórios dos viajantes naturalistas.
As fontes primárias são bibliografias como: Pierre Villar, Ana Rooselvelt, Lourenço da Silva Araújo e Amazonas, Kátia Mattoso, Ciro Flamarion Santana Cardoso e entre outros.
Essa rota de labirintos que a autora visualiza podemos enumerar três armadilha as questão das fontes, pois são muito escassas, em que trabalho com dados proso estáticos através da história demográfica; a segunda armadilha é o de desmistificar a teoria que mostra que a Amazônia possuiu solos impróprios para agricultura; a terceira armadilha é a respeito da relação de gêneros alimentícios, onde a autora mostra que não havia essa escassez para os padrões alimentares dos habitantes da região, e essa carência dava-se mais por parte dos europeus não acostumados com a dieta alimentar.
Outros pontos de destaque do artigo são: as relações econômicas no Amazonas onde apesar da carência de circulação monetária regulava-se os produtos comercializados através da tributação dos gêneros alimentícios com base no valor do dinheiro, mostrando um mosaico de relações econômicas.
Em suma, vale destacar as temporalidades que a autora trabalha no artigo como a longa, a média e curta duração de tempo histórico.
No rastrear das mulheres, esse texto nos apresenta muitos indícios um dos quais é a questão de nos censos demográficos as mulheres aparecerem como fazendo parte da população inativa, assim como mostrando a soma da população de escravos negros, mulheres e homem haviam na mesma proporção. 28
Outro fator que encontramos nesse artigo mostrando os papéis das mulheres durante o período que a autora trabalha, vemos em uma nota de rodapé algumas profissões exercidas pelas mulheres:"(...) as costureiras correspondiam as maior contingente: eram 4.064 mulheres, incluindo-se 25% escravas e 75 estrangeiras livres. De acordo com a categoria do censo, este setor abrangia ainda os operários (...)".29
O último texto ao qual fazemos analise historiográfica e procuramos analisar a presença do feminino na Amazônia e a dissertação de mestrado de Elisângela Socorro Maciel Soares30, trabalhando na dimensão da História Social, no domínio da História das Religiões, busca compreender como se deu o processo de Romanização no Brasil fazendo uma análise comparativa de como se deu tal processo na Amazônia.
Em seu trabalho vai ressaltar a Romanização da Igreja tendo com principais vanguardistas do movimento os bispos reformadores Dom Afonso Torres, e principalmente D. Macedo da Costa, onde estes tinham a pretensão de estruturar uma Igreja no Brasil mais voltada aos assuntos da fé, querendo autonomia perante o Estado que pelo sistema de Padroado acabava controlando-a.
O interessante nessa análise é a compreensão das disputas do catolicismo frente as ideias liberais, maçônicas e protestantes. Mostrando a comarca eclesiásticas do Alto Amazonas visualiza a geografia da cidade, assim como, mostra a Igreja por meio, do clero moralizar buscando acabar com as manifestações de irmandades que agiam com um sincretismo religioso rígido demais.
Trabalhando com analises de documentos eclesiásticos das igrejas do Alto Amazonas, trata temas como a mão de obra empregada, a educação nos educandários, assim como da urbanização da cidade.
Em suma, em um trabalho de grande vigor Elisângela Soares nos possibilita uma visão geral e panorâmica do Alto Amazonas de 1892-1920 e, até mesmo, de outros acontecimentos como a questão religiosa na Amazônia durante o período de análise acima descrito.
Encontramos a participação feminina nesse texto na criação das irmandades que em sua maioria eram constituídas de mulheres, assim como, em uma comissão criada para a construção da igreja de Nossa Senhora dos Remédios, em que de acordo com J.B. Apud Soares: "A comissão era formada (...) as Excelentíssimas Senhoras D. Catharina Ferreira Lemos, Maria Geminiana de Souza, Helena de Barros Barbosa de Mello Pompeu, Ângela Pucú, Maria Lemos de Aguiar, Maria Braga Alves, Alcina Rosa Mavignier e Maria Lessa (...)"31
Na construção da imagem feminina nessa dissertação a autora enfatiza ainda a questão da Virgem Maria, como sendo o símbolo que a mulher católica deve tomar, além dessas mulheres terem fundamental importância durante a Romanização na Amazônia.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao fazermos essas abordagens historiográficas vimos várias maneiras de se construir a história através de teorias, métodos e técnicas, tentando identificar formas de analisar a Amazônia Imperial sob o ponto de vista de diversos ângulos historiográficos.
Tentamos visualizar as mulheres na Amazônia Imperial em vários períodos e em vários papeis sociais, onde encontramos as subalternas e a das elites, mostrando as várias faces do feminino entendendo que foram de grande importância na construção da história na Amazônia, pois apesar de subsumidas estas estão sempre presentes no processo cotidiano de viver e relacionar-se em sociedade.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SOARES. Elisângela S. Maciel. "Igreja de Manaus, porção da Igreja Universal": A diocese de Manaus Vivenciando a Romanização (1892-1926) Dissertação de Mestrado em História Social defendida na Universidade Federal do Amazonas. Manaus, 2008.

SOIHET, Rachel. História das Mulheres. In: CARDOSO, Ciro Flamarion, VAIFANS, Ronaldo (Orgs). Domínios da História: Ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro. Elsevier. 1997.
Autor: Daniel Rodrigues De Lima


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