Fixação Do Número De Vereadores Nos Municípios Brasileiros



O assunto tratado neste trabalho diz respeito a controvérsias acirradas nos meios jurídico e político sobre os critérios de fixação do número de Vereadores nos Municípios brasileiros, bem como quem possui a competência para a sua fixação. Analisaremos os pontos mais discutidos, abordando e esclarecendo dúvidas sobre o tema.

 

            A proposta de emenda à Constituição (PEC) nº 333/2004 de autoria do Deputado Federal Pompeu de Mattos (PDT-RS), que aumentava em cerca de 7,5 mil o número de Vereadores em todo o País, mas, ao mesmo tempo, reduzia os gastos com as Câmaras Municipais, foi engavetada no Senado. Diante da pressão dos Vereadores para aumentar os gastos com as Câmaras e sem consenso dos partidos aliados e de oposição em torno da proposta, os Senadores decidiram deixar a proposta de emenda tramitar normalmente, sem votá-la a tempo de valer para as eleições municipais de 5 de outubro do ano 2008. Os então Vereadores diziam que seria impossível sobreviver com essa emenda e queriam que o Senado aumentasse os gastos. Na época, o limite do repasse das Prefeituras para as Câmaras variava de 5% a 8% da receita do Município, de acordo com o tamanho da população. Esses tetos, com a aprovação do texto original da PEC, cairiam para 2% a 4,75%. Uma redução, portanto, de mais de 50% do repasse das Prefeituras às Câmaras Municipais.

 

            A decisão do Senado de não votar em regime de urgência a proposta de emenda constitucional foi tomada em reunião de líderes partidários. Não houve consenso em torno da proposta do Senador Efraim Moraes do Partido DEMOCRATAS (PB) de desmembrar a proposta: uma trataria do aumento do número de cadeiras de Vereadores e outra abordaria o aumento de gastos das Câmaras Municipais.

 

            Para que tivesse validade para as eleições de outubro de 2008, a PEC dos Vereadores, como era conhecida a proposta, teria de ser votada e aprovada em dois turnos, nas duas Casas do Congresso, até trinta de junho de 2008, de acordo com a Consulta 1421/2007 ao TSE, que disciplinou a data-limite para promulgação de emenda constitucional alterando o número de Vereadores”, na qual ficara decidido, “por unanimidade (dos membros do Tribunal Superior Eleitoral), que a regra constitucional (a prevalecer no pleito de 2008) deveria entrar em vigor até o final de junho de 2008, quando terminaria o prazo para realização das convenções partidárias que aprovariam os nomes dos candidatos ao pleito”.

 

            Embora haja quem diga que a norma acima citada (Consulta 1421/2007), teria ido de encontro ao art. 16 da Constituição, há de se entender que tal ato normativo só teria eficácia para um caso específico, qual seja, “regra constitucional alterando o número de Vereadores no pleito de 2008”. Por conseguinte, não se caracterizaria como ato normativo inconstitucional. Ademais, essa espécie normativa não está sujeita ao princípio da anualidade, previsto no art. 16 da Constituição Federal, disposição que, conforme apontou o Ministério Público, diz respeito apenas a modificações eleitorais feitas por lei. O art. 16 da Constituição Federal preceitua que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.

 

            Por essa ótica, entendemos que da mesma forma que em diversos dispositivos legais o legislador constituinte referiu-se à lei como sinônimo de espécie normativa primária (aquelas espécies normativas do art. 59 da Constituição), o art. 16 pretende assegurar a segurança jurídica, nos pleitos eleitorais, permitindo que as regras do jogo democrático sejam conhecidas antecipadamente por todos aqueles que dele participam, sejam eleitores ou candidatos.

           

            Em 2004 o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinara a redução do número de cadeiras de Vereadores em todo o País. Na época, o Congresso resolveu regulamentar a questão com uma emenda constitucional. A proposta de emenda (já referida acima) ficou, no entanto, parada até meados de 2007, quando foi votada em primeiro turno no plenário da Câmara. E só voltou a ser o centro das atenções em 2008, com a votação em segundo turno (27/5/2008), às vésperas das eleições municipais. A proposta de emenda à Constituição, que precisava ser votada em dois turnos no plenário do Senado, poderia trazer uma economia de cerca de R$ 1,2 bilhão para as Prefeituras. Ao mesmo tempo, o número de Vereadores deveria passar de 51.748 para 59.791

 

            A PEC dos Vereadores (333/2004) foi votada na Câmara Federal, em segundo turno, no dia 27 de maio de 2008, depois de ficar parada desde 2007, à espera de apreciação. Em seguida, com a decisão do Senado de não analisar a proposta de emenda em regime de urgência, a proposta só voltou à baila em 2009, sendo aprovada pelo Congresso, com algumas alterações, em 23 de setembro de 2009, se transformando na Emenda Constitucional nº 58, de 23 de setembro de 2009.

 

            Antes da vigência da EC 58/2009, o art. 29, IV da Constituição Federal, que, determinando os limites máximos e mínimos de Vereadores que devem ter as Câmaras de Vereadores dos Municípios brasileiros, criou três faixas de classificação: "Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

 

            (...)

 

            IV – número de Vereadores proporcional à população do Município, observados os seguintes limites:

            a) mínimo de nove e máximo de vinte e um nos Municípios de até um milhão de habitantes;

            b) mínimo de trinta e três e máximo de quarenta e um nos Municípios de mais de um milhão e menos de cinco milhões de habitantes;

            c) mínimo de quarenta e dois e máximo de cinqüenta e cinco nos Municípios de mais de cinco milhões de habitantes".

 

            (...)

 

            Com a adoção da Emenda Constitucional nº 58, de 23 de setembro de 2009 houve considerável modificação na fixação do número de Vereadores nos Municípios brasileiros. As alterações referem-se aos artigos 29, IV e 29-A e seus incisos, todos da Constituição Federal. O artigo 29, IV reporta a fixação do número de Vereadores e o artigo 29-A trata dos gastos das Câmaras Municipais.

 

            Com a aprovação da emenda o número de vagas para Vereadores aumentou em 7.709, segundo cálculo feito pela Folha com base nas regras da PEC e em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre a população brasileira, referentes ao dia primeiro de julho de 2009. Hoje, o limite do repasse das Prefeituras para as Câmaras varia de 5% a 8% da receita do Município, de acordo com o tamanho da população. Esses tetos, com a promulgação da EC 58, caem para 3,5% a 7% (art. 29-A CF). Uma redução, portanto, de mais de 20% do repasse das Prefeituras às Câmaras Municipais.

 

            O artigo 16 da Constituição Federal dispõe que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.  Em razão disso, o artigo 3º, I, da EC 58/2009 se tornou alvo de ação direta de inconstitucionalidade (ADI), a qual foi promovida pelo Procurador-Geral da República e deferida monocraticamente, em caráter liminar, em 2/10/2009, pelo Supremo Tribunal Federal (Relatora – Ministra Cármen Lúcia) e referendada pelo plenário da Corte Suprema em 11/11/2009, com eficácia ex tunc, nos termos do voto da Relatora, vencido o Senhor Ministro Eros Grau. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, em representação do Tribunal no exterior, a Senhora Ministra Ellen Gracie e, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Falaram, pelo Ministério Público Federal, a Dra. Deborah Macedo Duprat de Brito Pereira, Vice-Procuradora-Geral da República; pelo requerente, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB (ADI 4.310), o Dr. Oswaldo Pinheiro Ribeiro Júnior; pelo requerido, Congresso Nacional, o Dr. Luiz Fernando Bandeira de Mello, Advogado-Geral do Senado; pelos amici curiae, Partido Trabalhista Cristão – PTC, Partido Comunista do Brasil – PCdoB, Associação Brasileira de Câmaras Municipais – ABRACAM e Partido Humanista da Solidariedade – PHS, respectivamente, o Dr. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, o Dr. Paulo Machado Guimarães, o Dr. Rogério Avelar e o Dr. Clóvis Corrêa.

 

            Na lição do professor Alexandre Moraes, temos que “o objeto das ações diretas de inconstitucionalidade genérica, além das espécies normativas previstas no artigo 59 da Constituição Federal, engloba a possibilidade de controle de todos os atos revestidos de indiscutível conteúdo normativo”.  E ainda segue o ilustre doutrinador mencionando que “dessa forma, é absolutamente possível ao Supremo Tribunal Federal analisar a constitucionalidade ou não de uma emenda constitucional, de forma a verificar se o legislador-reformador respeitou os parâmetros fixados no art. 60 da Constituição Federal para alteração constitucional”.

 

            A Emenda nº 58 modificou o inciso IV do art. 29 e o art. 29-A da Constituição Federal. No julgamento do RE 197.917 conjugado com as resoluções 21.702/2004 e 21.803/2004 do TSE, o Supremo Tribunal Federal havia fixado a compreensão de que o artigo 29, inciso IV, da Constituição Federal, exige que o número de Vereadores seja proporcional à população dos Municípios, observados os limites mínimos e máximos fixados pelas alíneas a, b e c do mesmo inciso. Pelo novo texto, o número de Vereadores indicado no inciso IV do art. 29 representa apenas um limite máximo, desvinculado, em termos proporcionais, da população do Município. Por sua vez, o art. 3º, I, da EC nº 58, aqui questionado, trata da eficácia das novas regras e as faz retroagirem ao pleito de 2008.

 

            Dessa forma, consoante o inciso IV do art. 29 da CF/88, com a nova redação dada pela EC nº 58/2009, a composição das Câmaras Municipais brasileiras, observa os seguintes limites máximos:

 

Nº de hab. Município.........................................Nº de Vereadores    

 

Até 15.000 habitantes...........................................9 (nove)

De mais de 15.000 até 30.000..........................................11 (onze)

De mais de 30.000 até 50.000............................ 13 (treze)

De mais de 50.000 até 80.000.............................15 (quinze)

De mais de 80.000 até 120.000...........................17 (dezessete)

De mais de 120.000 até 160.000.........................19 (dezenove)

De mais de 160.000 até 300.000.........................21 (vinte e um)   

De mais de 300.000 até 450.000.........................23 (vinte e três)

De mais de 450.000 até 600.000.........................25 (vinte e cinco)

De mais 600.000 até 750.000..............................27 (vinte e sete)

De mais de 750.000 até 900.000.........................29 (vinte e nove)

De mais de 900.000 até 1.050.000......................31 (trinta e um)

De mais 1.050.000 até 1.200.000........................33 (trinta e três)

De mais de 1.200.000 até 1.350.000...................35 (trinta e cinco)

De mais de 1.350.000 até 1.500.000...................37 (trinta e sete)

De mais de 1.500.000 até 1.800.000...................39 (trinta e nove)

De mais de 1.800.000 até 2.400.000....................41 (quarenta e um)

De mais de 2.400.000 até 3.000.000....................43 (quarenta e três)

De mais de 3.000.000 até 4.000.000....................44 (quarenta e cinco)

De mais de 4.000.000 até 5.000.000....................47 (quarenta e sete)

De mais de 5.000.000 até 6.000.000....................49 (quarenta e nove)

De mais de 6.000.000 até 7.000.000....................51 (cinquenta e um)

De mais de 7.000.000 até 8.000.000....................53 (cinquenta e três)

De mais de 8.000.000...........................................55 (cinquenta e cinco)

 

            No entanto, o art. 3º da EC 58/2009 (que não faz parte do corpo da Constituição), em seu inciso I, faz retroagirem os seus efeitos ao pleito eleitoral de 2008, com o seguinte teor:

 

            “Art. 3º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua promulgação, produzindo efeitos:

 

I - o disposto no art. 1º, a partir do processo eleitoral de 2008; e...”

 

(…)

 

            A questão é que esse dispositivo já nasceu eivado de inconstitucionalidade, visto estar em confronto com o art. 16 da Constituição, o qual preceitua que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.

 

            No entanto, logo quando a EC/58 foi promulgada em 23/09/2009 em alguns Municípios a Justiça Eleitoral diplomou os suplentes de Vereadores que perfaziam o total de parlamentares de tais Municípios de acordo com a sua população e observadas as novas regras da EC 58. O Município de Bela Vista em Goiás foi o primeiro a beneficiar suplentes de Vereadores, quando a Justiça Eleitoral diplomou os Vereadores Luiz Pontes Neto (PR) e André Luiz (PT), que foram logo em seguida empossados pelo presidente da Câmara de Vereadores local.

 

            Tal circunstância conduziu os Procuradores Regionais Eleitorais de São Paulo, Goiás, Ceará e Espírito Santo a emitir recomendação a todos os promotores de justiça eleitorais dos respectivos Estados a impugnarem a diplomação e posse de Vereadores fundada na norma questionada, segundo notícia divulgada no sítio do Ministério Público Federal.  Nele também consta informação de ajuizamento de ação civil pública em 29.9.2009, contra a diplomação de dois Vereadores no Município de Bela Vista, no Estado de Goiás, bem como de deferimento de liminar em ação cautelar ajuizada pela promotoria eleitoral no Município de Icó/CE, impedindo a posse de cinco novos Vereadores com fundamento na Emenda Constitucional nº 58/2009.

 

            Diante de tanta polêmica, o Procurador-Geral da República propôs a AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADIN), com pedido de medida cautelar, em impugnação ao art. 3º, I, da Emenda Constitucional 58, de 23 de setembro de 2009, que faz retroagirem os efeitos da alteração ao processo eleitoral de 2008. A ADI nº 4307-DF – Rel. Min. Cármen Lúcia foi deferida em caráter liminar e também pelo plenário do STF, como já foi acima comentado.

 

            A controvérsia jurídica instaurada com a promulgação de tal Emenda Constitucional possibilitou interpretação de suas normas no sentido de estar autorizada posse imediata de candidatos que não teriam obtido votos suficientes para assumir cargo de Vereador disputado segundo as regras vigentes nas eleições de 2008, o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro Carlos Britto, em 28.9.2009, a encaminhar ofício aos Presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais, informando-lhes que, “em 2007 o TSE respondeu à Consulta 1421/07 e disciplinou a data-limite para promulgação de emenda constitucional alterando o número de Vereadores”, na qual ficara decidido, “por unanimidade (dos membros do Tribunal Superior Eleitoral), que a regra constitucional (a prevalecer no pleito de 2008) deveria entrar em vigor até o final de junho de 2008, quando terminou o prazo para realização das convenções partidárias que aprovam os nomes dos candidatos ao pleito”.

 

            Para as eleições de parlamentares municipais, é adotado no Brasil o Sistema Proporcional, que depende do quociente eleitoral e do quociente partidário. Portanto, não poderia prosperar a eficácia do inciso I do art. da EC 58/2009, visto comprometer Vereadores que foram eleitos em 2008, pois haveria possibilidades, consoante o sistema proporcional, de partidos ou coligação de partidos já com Vereadores diplomados e empossados, não atingirem o quociente eleitoral, e, portanto, não ter direito a vagas nas Câmaras Municipais. Sem qualquer justificativa, a alteração constitucional promove imensa interferência em eleições já encerradas, pondo todos os Municípios do país a refazer os cálculos dos quocientes eleitorais e partidários (arts. 106 e 107 do Código Eleitoral), com nova distribuição de cadeiras, a depender dos números obtidos, que podem, inclusive, trazer à concorrência partidos que não obtiveram lugares anteriormente (art. 109 do Código Eleitoral).

 

            Não existe dúvida quanto ao âmbito material das normas alteradas. Revolvem o processo eleitoral, eis que, pela mudança do número de cadeiras nas Câmaras Municipais, interferem nos quocientes eleitorais e partidários. À revelia dos resultados homologados pela Justiça Eleitoral, não só o rol dos eleitos e dos suplentes, mas também a participação e o peso dos partidos será absolutamente modificado pelas regras que, em vista da norma de regência temporal, deverão retroagir e incidir sobre fatos do passado. A partir da diplomação de candidatos que, pelas regras vigentes ao tempo da eleição, não foram realmente eleitos, existe severo risco de degradação do próprio art. 1º, parágrafo único, como do art. 14, ambos da Constituição.

 

            É de se anotar que a expressão de que se vale o constituinte reformador ao final da norma temporal do inciso I do art. 3º da Emenda Constitucional nº 58/2009, a saber, que as novas regras relativas ao número de Vereadores valem “a partir do processo eleitoral de 2008”, não parecem permitir que se conforme a regra com a Constituição.

 

            De resto, não se há deixar de notar que a utilização da expressão utilizada pelo constituinte reformador é, para dizer o mínimo, curiosa, pois “a partir de” – em português - significa momento definidor de algo para valer para o futuro. No texto normativo em pauta, se tem a “partir de” como referência ao passado. O “a partir de” daquele texto significa “desde”, remetendo-se a fatos e períodos passados. Melhor dizendo, seria correto o dispositivo expressado: “Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua promulgação, produzindo efeitos: o disposto no art. 1º, desde o processo eleitoral de 2008; e ...”. Ou ainda: “Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua promulgação, produzindo efeitos: o disposto no art. 1º, retroativos ao processo eleitoral de 2008; e ...”

 

            No presente caso, existem inúmeras relações jurídicas que são alcançadas pelas novas regras, mas não há justificativa plausível que fundamente o efeito imediato a fatos passados. A transição para um novo regime jurídico eleitoral de tamanha dimensão, a interferir não só no resultado das eleições, mas também no direito dos eleitos e na participação dos partidos políticos deve ocorrer sem sobressaltos, o que implica dizer que suas regras não podem retroagir. E aqui, ao contrário das preocupações que emergiram no RE 597.994 com a potencial quebra da jurisprudência da Corte, por se tangenciar no tema do direito adquirido a regime jurídico, vale a lembrança de que não é propriamente a alteração do estatuto legal que interessa, mas a sua retroação a fatos jurídicos consolidados no passado.

 

            O que se tem então, além da violação apontada acima, é a patente ofensa a atos jurídicos perfeitos, regidos todos por normas previamente conhecidas, que agora são substituídas, após terem sido integradas à regência dos fatos jurídicos em curso. São essas as razões que nos levam a entender que o artigo 3º, I da EC 58 surge com patente violação dos arts. 1º, parágrafo único; 5º, XXXVI e LIV; 14; 16; e 60, § 4º, II e IV, da Constituição da República.

 

            Vale ressaltar que, com o deferimento da ADI 4307-DF pelo Supremo Tribunal Federal Pleno, ficou definitivamente decidido que a Emenda constitucional 58, de 23 de setembro de 2009, só terá eficácia nas eleições municipais de 2012, porquanto, nas eleições de 2010, não haverá pleito para Vereadores.

            .

            Traçadas essas considerações, cabe-nos examinar, em seqüência lógica, a questão da autonomia para fixar o número de Vereadores de nossas Câmaras Municipais. Quanto à competência para fixar o número de Vereadores, dúvida não há que pertence ao Município, desde que respeitadas as balizas constitucionais. Esse é o entendimento, inclusive, do Supremo Tribunal Federal, como se pode comprovar no julgamento do AGRRCL 488-TO de relatoria do Ministro Carlos Velloso (DJ, de 6.12.96).

            Naquela oportunidade ficou assentado que a competência para a fixação do número de Vereadores é do próprio Município, desde que observados os limites estabelecidos no art. 29, IV da Constituição da República.

            

            Mesmo assim, em havendo insatisfação por parte de quem se sinta prejudicado, a providência não nos parece ser declarar inconstitucional as referidas resoluções do TSE, através do controle concentrado de constitucionalidade, por ser este instrumento inadequado para impugnar ato regulamentador, como é o caso das citadas resoluções. Eram essas as considerações que tinha a fazer, lembrando que o objetivo aqui perseguido, deixe-se claro, não é o de provocar a reação de setores da sociedade supostamente prejudicados, mas, ao contrário, ao despertar a sociedade para o debate em torno dessas questões, contribuir para o crescimento do verdadeiro pacto social, superando uma hermenêutica individualista, destituída de amparo constitucional.

 

 

DADOS BIBLIOGRÁFICOS

           

 

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. 24ª ed. São Paulo: Atlas, 2005.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental na Reclamação nº 488-TO, de 20/6/1996.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal – Pleno – ADIN nº 4.307/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 197.917-8, de 6/6/2002.

BRASIL, Tribunal Superior Eleitoral. Resolução nº 21.702, de 2/4/2004.

BRASIL, Tribunal Superior Eleitoral. Resolução nº 21.803, de 8/6/2004.

Diário da Justiça, Brasília, DF, 12/4/2004.

Diário da Justiça, Brasília, DF, 17/6/2004.

Diário da Justiça, Brasília, DF, 6/12/96.

Diário da Justiça, Brasília, DF, 7/5/2004.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: Atlas 2009. 

 

           

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Autor: João Lopes de A. Neto


Artigos Relacionados


Ontem O Amor Chorou...

Igualdade Exata

Theo De Carvalho - Segundo AniversÁrio

Camaleão

Gata Mineira

Literatura Contemporânea - O Caminho Abstrato

Avis Rara