O senhor solitário.



Tinha um homem em minha rua que todos chamavam de o senhor solitário. O senhor solitário era um senhor alto magro que morava em uma casinha afastada da vizinhança e sempre mantinha uma cara fechada. Apelidamos assim porque ele sempre aparecia sozinho em todos os lugares, mercado, padaria, não possuía gato ou cachorro, muito menos um papagaio, nunca escutaram sequer a sua voz.

O senhor solitário, me chamava à atenção por alguma coisa, e nas férias seguintes descobri o motivo.

Brincando na rua, sem querer deixei a minha bola cair na casa mal assombrada, todos diziam que o senhor solitário participara da guerra e que mantinha todas as granadas e medalhas que achava nos campos de batalha, mas eu não poderia perder a minha bola, tinha ganhando ela em um jogo dos Yankes e significava muito para mim.

Respirei fundo, contei todos os passos até aquela casa e fui andando em sua direção, por um minuto pensei:

- O que irei de falar?

- Por favor, devolva a minha bola, sem me mostrar umas de suas granadas, sem me apontar uma arma?

Bom, teria de falar alguma coisa.

E quando me vi, estava lá, batendo a porta do senhor solitário. Um minuto que parecia uma eternidade.

Mas o que eu escutei foi à voz tremula de um senhor me mandando entrar, como se precisasse de alguém dentro daquela casa para que ela parecesse mais viva, uma voz que demonstrava uma fraqueza, quase um grito de socorro.

Ao entrar me deparei com varias fotos, era como se desse para saber uma história, só pela ordem que elas estavam.Então percebi aos 12 anos de idade, que o senhor solitário não era um homem que não gostava de ninguém. Além de descobrir que o senhor solitário não tinha perdido as cordas vocais na guerra, ele tinha gostado de alguém em sua vida, a foto de uma mulher se repetia por varias vezes, só ela, outras com ele, mas demonstrava um amor, um carinho.

Deu-me uma vontade de perguntar ao senhor solitário quem era aquela mulher, pois a sala era praticamente só dela, ou de suas fotos.
Que mulher é essa nas fotos? Sei que pode parecer intromissão, mas para um garoto de 12 anos, isso não parecia um problema.

Não esperava uma resposta, mas ela veio.

- Um garoto de 12 anos não deve saber o que é amor, e um velho às vezes se esquece dele. Mas se você quer saber irei contar.

Durante a guerra, conheci-a, dona do sorriso mais largo e expressivo que eu já vi, ela não precisava falar mais nada, pois naquele momento, ela dominaria a minha vida para sempre, teria o meu coração em suas mãos.

Engraçado que quando ele contava, sua voz se tornava doce, e esses olhos monitoravam um brilho com um pouco de água que me fizeram ter vontade de encher os meus com a mesma água.

O senhor solitário continuou a falar, os meus sentimentos estavam certos, eu vivi com ela durante 50 anos, e dava tudo para ver aquele sorriso mais uma vez, mas me orgulho de ter passado a minha vida inteira tentando de tudo para vê-lo nela.

Qual era o nome dela?

Nesse momento percebi, porque o senhor solitário era solitário.

Ele me perguntou quem me deixou entrar e se irritou.

Peguei a minha bola e fui embora, mas retornei todo o dia lá, por dois anos, nunca consegui saber o nome do senhor solitário ou de sua amada. Só ouvi muitas histórias, mesmo ele nunca lembrando quem eu era, meu nome ou onde morava, ele me ensinou como amarrar uma corda, como tratar uma mulher, como amá-la intensamente te faria alguém melhor.

Depois que ele morreu, comprei aquela casa, e agora a sala está repleta de fotos da minha mulher e eu me sento todos os dias na cadeira tentando seguir o que ele me ensinou. Que algumas memórias nunca são esquecidas, pois as fotos perdem a cor, mas nunca se apagam.





Autor: Roberta Teixeira De Melo


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