Tribunal de contas estadual e o julgamento das contas do prefeito ordenador de despesas



1. Introdução

Polêmica questão que tem despertado especial atenção dos juristas brasileiros concerne ao caso do Prefeito Municipal ordenador de despesas. Doutrina e jurisprudência digladiam no intento de solucionar a dúvida acerca do órgão competente para o julgamento do Prefeito, quando este acumula a função de ordenador de despesa.

A Constituição Federal de 1988, respeitando a dualidade do regime de contas públicas, atribuiu ao Poder Legislativo, auxiliado pelo Tribunal de Contas, o julgamento político das contas dos Chefes do Poder Executivo municipal. No mesmo passo, determinou que as contas dos demais administradores e responsáveis por haveres públicos (entre os quais figura o ordenador de despesa), seriam julgadas pelo Tribunal de Contas.

Em grande parte dos municípios brasileiros, no entanto, o Prefeito Municipal acumula a função de ordenador de despesas, fato que provoca grande confusão no que tange ao órgão responsável pelo julgamento de suas contas. Realmente, ao avocar a função de ordenador de despesa, o Prefeito gere duas modalidades de contas: as de governo, inerentes a seu cargo político e as de gestão, outorgadas ao ordenador de despesas.

Ora, é sabido que a Câmara de Vereadores deve julgar as contas de governo do Prefeito, mas deve o mesmo órgão político julgar as contas de gestão do Prefeito? Ou, ao contrário, deveria ser a Corte de Contas a instituição competente para o julgamento das contas de gestão relativas aos atos de ordenamento de despesas desempenhados pelo Prefeito?

Para deslinde da controvérsia, faz-se indispensável não olvidar o fato de que o Tribunal de Contas tem essência oriunda da estruturação do Estado Democrático de Direito, possuindo insofismável relevância à fiscalização técnica das contas dos agentes públicos. Com efeito, a Corte de Contas é o órgão responsável por garantir à sociedade a transparência e o exame das contas públicas, além de deter o poder sancionatório em face dos agentes públicos que não atuam em consonância com os fundamentos insculpidos na Constituição Federal. Por outro lado, a Câmara Municipal é órgão eminentemente político e, justamente por não deter competência para o exame técnico das contas de governo do Chefe do Executivo, é obrigatoriamente auxiliado pelo Tribunal de Contas.

Assim, há posição no sentido de apenas a Câmara de Vereadores ter a competência para o julgamento das contas do Prefeito, mesmo sendo ordenador de despesa. Ou seja, as contas deveriam ser julgadas de acordo com a autoridade que as conduz e não de acordo com a essência do que se contabiliza. E há os que entendem que quando Prefeito acumula a função de ordenador de despesa, maneja duas classes de contas, de sorte que devem ser julgadas duplamente: as contas de governo, julgadas pela Câmara, com emissão de parecer prévio do Tribunal de Contas e as de gestão julgadas exclusivamente pelo Tribunal de Contas.

A divergência jurisprudencial e doutrinária é nítida e revela um problema de fundo ainda mais funesto: a Corte de Contas, instituição democrática nascida como fruto de tanto labor da democracia, hoje tem sua força e autonomia encurtadas, de sorte a favorecer maus administradores públicos em detrimento dos devastadores prejuízos ao Estado e à sociedade. Pois é certo que a dúvida acerca da competência do Tribunal de Contas para o exame de contas de gestão (determinada pela Constituição Federal de 1988) é prova inequívoca da incipiente compreensão acerca dos fundamentos que norteiam o controle externo e das consequências danosas desta oscilação doutrinária e jurisprudencial.

 Neste mister, o presente estudo visa a despertar o leitor para premente necessidade de reflexão acerca dos pilares da fiscalização pública, o papel desempenhado pelo Tribunal de Contas e as consequências devastadoras de eventual afastamento da competência do Tribunal de Contas para o julgamento das contas dos Prefeitos ordenadores de despesas.

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