Aplicação da lei penal



APLICAÇÃO DA LEI PENAL

 

Arnaldo Alegria[1]

 

A busca científica, baseada em critérios concretos, tem por escopo trazer uma reflexão valorativa, acertada e abnegada de paradigmas do uso prático da lei penal, olvidando o atroz direito penal do autor. Acompanhando a evolução e reestruturação da parte geral do Decreto-lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940, através dos dispositivos inseridos pela lei Ordinária 7.209 de 11 de julho de 1984 e objetivando travar conhecimento referente à eficácia da lei penal, através da exclusão de penas que geravam incertezas no sistema legal nos crimes de pequena ou média ofensa social, não haverá incertezas, de que o Estado, utiliza as leis penais vigentes, como verdadeiros instrumentos sistemáticos e normativos de controle social, punindo com sanções de particular gravidade, ou com medidas de segurança, os desvios de conduta de maior agressividade aos bens jurídicos tutelados ou de maior relevância à sociedade.

 

1 INTRODUÇÃO

 

A benéfica reflexão que a pesquisa desdobra deveras a compreensão da reforma da Parte Geral do Código Penal Brasileiro, pois todas as partes do texto penal devem estar sempre adaptadas à evolução da sociedade e seus títulos encarregados em atender os anseios de justiça social, precipitando os fatos que ela julga lesivos.

Partindo dessa premissa o trabalho acolhe inicialmente o entendimento formal e objetivo do conjunto de normas que cuidam do crime, das sanções, e do controle social pelo Estado; posteriormente, recepciona o princípio constitucional da Legalidade onde a garantia fundamental é petreamente imutável e não denomina crime o fato não tipificado em lei, portanto, não haverá sanção pela não cominação legal; em seguida, baseando-se neste princípio, surgirá a necessidade de conhecer os princípios, da adequação social, da insignificância, da alteridade e da ofencividade; também o estudo buscará a interpretação da eficácia universal e permanente da lei penal e seus conflitos temporais e territoriais.

A pesquisa demonstra as três teorias do tempo do crime, as particularidades contidas na lei penal que podem favorecer ou não o tempo de cumprimento da pena ao autor do delito. Investigando as disposições finais do primeiro título da parte geral do Código Penal, emergiu o entendimento ajustado da contagem de prazo, início e fim do cumprimento das penas, bem como, a compreensão da legislação penal especial, pois as infrações penais estão também descritas em normas extravagantes, sendo neste caso, se coincidir a lei especial com a norma positivada no Código Penal, e ambas tratar da mesma matéria ou mesmo fato, este conflito será solucionado pelo princípio da especialidade.

 

2 LEI PENAL E SUA APLICABILIDADE PARA O CONTROLE SOCIAL

 

A convivência social harmoniosa prescreve para sua existência, normas disciplinadoras denominadas de “direito positivo” e estas regras são impostas pelo Estado a toda sociedade, para ser obedecida de forma objetiva, caso contrário, a força estatal, utilizando o Direito Penal e o devido processo legal, aplicará a sanção cominada ao autor do fato tipificado. (MIRABETE, 1994, p 21).

Partindo desta ideia, a doutrina conceitua o Direito Penal como um ramo do direito público, possuidor do conjunto objetivo e valorativo de normas jurídicas estabelecidas unicamente pelo Estado para prevenir e reprimir o crime, através das penas e medidas de segurança, bem como, a objetividade serve de barreira e regula os limites da subjetividade do poder punitivo estatal. Desta forma, o Direito Penal é um ramo do direito público destinado à proteção subsidiária e fragmentária dos bens jurídicos relevantes e subordina-se ao Estado Democrático de Direito, que através das normas e princípios jurídicos impedem o arbítrio de punir, ao contrário do inconstitucional direito penal do autor, onde o estado subjetivamente punia não o fato, mas sim seu agente, levando em conta sua periculosidade, tornando-o antiético, ilimitado e não objetivo. (PAGLIUCA, 2009, p. 35).

O controle social formal descrito na lei penal é sectário do devido processo legal, isto impede que a sociedade, informalmente, faça sua própria justiça, evitando que a vítima ou outra pessoa castigue o infrator, possibilitando que o Estado aplique a forma e o teor da norma em vigor e suas sanções, permeando ao acusado de autoria da conduta ilícita, a ampla defesa, o contraditório e outros recursos. (GOMES, 2003, p 13).

A interpretação da lei penal consiste na extração do seu real significado, assim, exprimindo com clareza os fatos sociais danosos, perigosos e relevantes, deixando outros ramos do direito meditar sobre fatos insignificantes ou que não atinja direitos de outrem, buscando desta forma a adequação social, pela vontade da lei e seus preceitos, não dos desejos de seus autores. (CAPEZ, 2011, p.52).

A lei penal deve ser clara e possuidora de sentido amplo, descrevendo precisamente a infração ou a conduta ilícita, justamente por impor uma sanção abstrata a um fato punível, de sentido estrito e cominado com a sanção; caso contrário, ela criará grande insegurança jurídica. A lei é caracterizada pela imperatividade, impessoalidade, generalidade (respeitadas as exceções) e é exclusiva, por atingir fatos anuídos.

 

2.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Todos os ramos das ciências jurídicas convergem para um relacionamento com o Direito Constitucional onde estão definidos os direitos individuais, políticos e sociais. A constituição determina que o Estado e seus afins devam resolver conflitos entre os direitos individuais e sociais, portanto, diante da superioridade hierárquica da lei Maior, no artigo 5º, XXXIX está instituído o principio da legalidade, que instruirá o processo penal garantindo direitos, e vinculado a esse artigo, está o princípio da anterioridade da lei penal. No inciso XL, do mesmo artigo constitucional, está o princípio da irretroatividade como regra e amasiado da exceção de que a retroatividade se justifica somente para beneficiar o réu. (MIRABETE, 1994, P 28).

Ao falar em garantia de direitos, o Direito Penal é drástico no controle social e ameaça garantias constitucionais, mas a própria Constituição e a lei penal, direta ou indiretamente, contêm preceitos razoáveis que ajustam estas intimidações anunciadas pelo princípio da legalidade e da reserva legal, mas estes, não são os únicos que proporcionalmente equilibram o Estado na função de punir, também limitam a força estatal a intervenção mínima, o princípio da ofencividade, da culpabilidade, da proteção de bens jurídicos, da materialização do fato, da responsabilidade pessoal e outros. (GOMES, 2003, p 21 e 35).

Do ponto de vista de Luiz Flavio Gomes, e Fernando Capez, diferente de outros doutrinadores, como Heleno Claudio Fragoso e Alberto Silva Franco, o principio da legalidade é um gênero monopolizador que abarca inconfundivelmente a reserva legal e a anterioridade da lei penal, sendo assim, a legalidade criminal significa que não há crime sem lei, e incrustado nela, está a anterioridade constitucional do artigo 5º, II que, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”; cumpre-nos assinalar que a norma incriminadora deve estar textualizada, com sua pena cominada, fazendo parte da reserva legal,  possibilitando a tipificação do fato posterior a ela, portanto, a legalidade reveste a reserva legal, sendo que, a lei penal é a única possuidora de matéria incriminadora e só tem eficácia depois de aprovada pelo parlamento, ter seguido os tramites até a publicação oficial. (CAPEZ, 2011, p 57.)

A elaboração intelectual do parágrafo anterior, somado à afirmação da Carta Magna de 1988, em seu artigo 5º, inciso XXXIX e a sustentação do Código Penal, este asseverou por meio da sua ciência criminal, dimensionando como principio da legalidade criminal, a declaração de que, “não há crime sem lei anterior que o defina”, e na mesma proporção científica, sustentou o princípio da legalidade penal, no texto da segunda parte do inciso, que não há pena sem prévia cominação legal. (GOMES, 2003, p 127 a 129).

Outras duas dimensões do princípio da legalidade, asseverados pela ciência criminal são, as conformidades jurisdicionais ou processuais, onde ninguém pode ser privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; e outra, o princípio da legalidade execucional, pois, “a jurisdição penal dos juízes ou tribunais de justiça ordinária, em todo o território nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta lei e do Código de Processo Penal”, tais princípios são indispensáveis à segurança jurídica. (BRASIL, 1984).

O Inciso XL do artigo 5º Constitucional trata que, “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar do réu”, portanto fazendo remissão, o Código Penal trouxe no bojo do artigo 2º, que “ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória” e definiu em seu parágrafo único “a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”, deixando claro assim o princípio da irretroatividade como regra e a retroatividade como exceção no privilégio ao beneficiar o réu. (BRASIL, 1988).

O princípio de que a lei não pode retroagir, exceto para beneficiar o acusado, limita-se às normas de cunho penal, neste caso, as normas exclusivas de caráter processual, que não se relacionam com o direito estatal de punir, não estão sujeitas ao princípio da retroatividade, mesmo que venham beneficiar o acusado no processo, “pouco importando se o crime foi cometido antes ou após sua entrada em vigor ou se a inovação é ou não mais benéfica”, importa que ela tenha incidência imediata, atinge o processo penal em andamento, podendo aleatoriamente agravar ou não a situação do acusado. (CAPEZ, 2011, p.67).

Assegurar o debate de que a aplicação da lei penal é justa, outros princípios constitucionais são referenciados, a exemplo, “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, ou seja, o processo irá determinar a culpabilidade do agente, ”a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, todos podem procurar o judiciário para a proteção de direitos, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a eles inerentes”.

 

2.2 EFICÁCIA, RELACIONADA AO TEMPO E AO ESPAÇO DA LEI PENAL

 

A lei Penal, assim como outras leis do nosso ordenamento jurídico, para ter vigência precisa ser aprovada pelo Congresso, promulgada, sancionada pelo Presidente e publicada sem vícios pela imprensa oficial, vale lembrar, que ao abster-se em seu texto a data para o início de sua vigência, segue-se a regra do artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil, onde determina que a lei vigore após o “vocátio legis” de 45 dias, abrangendo assim, a partir da entrada em vigor, todos os fatos regidos em seus termos, até sua revogação, em regra, por nova norma. (GOMES, 2003, p 128).

A Lei complementar 107 de 2001 determina para as leis mais complexas, que:

§1º A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral.

§2º As leis que estabeleçam período de vacância deverão utilizar a cláusula ‘esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicação oficial’ .

 

As Leis que fazem sentir indiretamente sua ação ou de pequena repercussão não possuem “vocatio legis”, sua vigência será indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, assim ficou definido pela Lei complementar 95/98, sendo assim, a lei pequenez “entra em vigor na data de sua publicação”. (CAPEZ, 2011, p 73).

Os princípios gerais do direito Penal surgem do direito natural e do direito explicito ou implícito constitucional, portanto, respeitando algumas exceções, deve-se aplicar a lei penal, observando sua formalidade, vigência e princípios, evitando assim os conflitos de tempo e lugar, pois, é inegável que a lei a partir de sua entrada em vigor, até o final de sua vigência, relacione-se com os fatos nela tipificados, exceto os desvios desta regra, que produzem efeitos aos fatos anteriores ou posteriores a ela. Em virtude disso, as hipóteses de conflito de norma penal no tempo, a lei não retroagirá para prejudicar e sim para beneficiar o agente do fato ilícito.

Existem quatro suposições onde ocorrem conflitos de leis penais, a primeira é o “abolitio criminis” onde a nova lei suprime normas incriminadoras da anterior, desprestigiando fatos antes tipificados como crime; a segunda, “novatio legis incriminadora”, onde a nova lei passa a considerar fatos que antes não eram ilícitos; a terceira, “novatio in lejus”, quando a nova lei agrava o regime penal anterior; e por último, o “novatio legis in melliuns”, quando a nova lei beneficia o regime anterior, favorecendo o apenado. (CAPEZ, 2011, p 74 a 78)

Uma das exceções, esta prevista no artigo 3º do Código Penal, onde “a lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência”, em iguais razões, o princípio da retroatividade benigna, neste caso, não é aplicado e sim a letra da lei, obviamente, as leis excepcionais são promulgadas para vigorar em situações sociais anormais e vigoram até o restabelecimento da normalidade, e as leis temporárias possuem tempo de vigência determinado no próprio texto.

“A circunstância de ter sido o fato praticado durante o prazo fixado pelo legislador (temporária) ou durante a situação de emergência (excepcional) é elemento temporal do próprio fato típico”, ou seja, mesmo revogada pelo fim do prazo constante do texto ou pelo retorno da normalidade, ela utiliza o conceito da “ultratividade”, pois continua sendo aplicada aos fatos praticados durante sua vigência. (PAGLIUCA, 2009, p. 49).

Outra causa relevante para a aplicação da lei penal é a temporariedade da norma penal em Branco, por ser incompleta, necessita de outra com sentido amplo, com descrição exata da conduta delituosa, ou com sentido estrito, quando necessita de complemento diferente, ou seja, quando a conduta não mais esta tipificada para sua aplicação. Exemplo, uma substancia entorpecente extraída da lista estabelecida pelo ministério da saúde, neste caso, deixou de ser crime. (CAPEZ, 2011, p 50).

Na analise do âmbito do tempo do crime, é importante para a lei penal conhecer e cravar o momento em que ocorre o crime, “identificando se o agente era ou não imputável; se determinada lei estava ou não em vigência naquela data, o tempo de início de contagem prescricional etc.” Vale lembrar que nos crimes considerados permanentes onde “a conduta de execução se considera alongada no tempo, como por exemplo, o sequestro, deve-se atentar que o tempo do crime será o estabelecido enquanto durar tal conduta”, então a aplicação da lei penal, “mesmo no caso da mais severa, será aquela vigorando ao tempo da cessação da ação ou omissão” do agente. (PAGLIUCA, 2009, p 50).

Interpretando os dizeres do parágrafo anterior, o artigo 4º do Código Penal determina que “considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado” para determinar qual era a lei vigente na data do crime. Exemplo, um menor é apreendido pela tentativa de um homicídio, no entanto, sua vítima morre dias após esse completar a maioridade.  (BRASIL, 1988).

 Surgiram três teorias sobre o assunto, a ‘teoria da atividade’ que define o local da conduta criminosa como sendo local do crime, a ‘teoria do resultado’ que considera o local da consumação do crime para a aplicação da lei penal e a ‘teoria mista ou ubiquidade que considera o local da conduta e o local da consumação; teoria esta, que foi adotado pelo legislador penal pátrio. (MIRABETE, 1994, p 76).

Além do conflito temporal, existe o conflito do local, podendo um crime violar o interesse de impor a pena de dois ou mais países, pois, pode ser praticado num país e consumado em outro, talvez o princípio da territorialidade adotado pelo Código Penal, respeitando as exceções, seja pouco mais complexo, tendo em vista envolver a soberania de um país que tem suas próprias leis, mas em regra geral, independentemente da nacionalidade do autor ou da vítima, é aplicada a lei penal pátria.

Luis Flávio Gomes, denomina o conjunto de regras que disciplina a lei penal no espaço como sendo Direito Penal Internacional do público interno, requerendo que não se deve confundir com o Direito Internacional Penal, este, integra o Direito internacional, e atribui relevância para confirmar, qual âmbito territorial para a aplicação da lei brasileira. (2003, p 213).

Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.

§ 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

§ 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. (BRASIL,1999).

 

O Código Penal, e em seu artigo 6º, considera “praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”; obviamente, o legislador lembrou-se da hipótese da tentativa, quando empregou o termo textual, “deveria produzir-se o resultado”, portanto, se o crime foi praticado fora do território nacional, mas o impedimento da consumação se deu no Brasil, aplicar-se-á a lei penal brasileira, caso o crime ocorra fora e o impedimento também, não se aplica a lei nacional, “ainda que a intenção do agente fosse obter resultado no território nacional”, mas, o legislador, foi infeliz quando não se lembrou de referenciar no artigo 6º, como o fez no artigo 4º, pois, não fez referência da possibilidade “que a ação ocorra fora do território e que o agente não pretenda que o resultado se produza no país, mas neste, ocorra parte do resultado” e como a lei penal não é análoga, ou seja, ela referiu-se a “parte” da ação ou omissão, e não à “parte” do resultado, “e esta não pode ser confundida com ‘todo’ o resultado, o dispositivo não abrangeria essa hipótese”, mas de acordo com o interesse nacional, caso ocorra o resultado parcial no Brasil, será aplicada a lei penal nacional. (MIRABETE, 1994, p 76).

No caso de um crime ser praticado em território nacional e o resultado for produzido no estrangeiro, aplica-se a teoria da ubiquidade, sendo o foro competente tanto o lugar da ação ou omissão quanto o local em que se produziu ou deveria produzir o resultado. (CAPEZ, 2011, p 123).

Como exceções da regra do princípio da territorialidade adotadas no artigo 5º, anteriormente citado, manifestam-se no artigo 7º do CP, hipóteses especiais de extraterritorialidade, onde se aplica os princípios da defesa, da nacionalidade, da justiça universal e da representação. Há dois casos de extraterritorialidade; a primeira, incondicionada, que não depende de requisitos, e a segunda, condicionada à ocasião de subordinação, a condições ou pressupostos legais evidenciados. (DELMANTO, 2010, p 99).

Independe de requisitos, a extraterritorialidade, arrogando o princípio da proteção ou defesa, “ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro os crimes contra a vida ou a liberdade do Presidente da República”, praticados “contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público” e também, incondicionado, em desfavor “a administração pública, por quem está a seu serviço” e atribuindo o princípio da justiça universal, sujeitam-se irrestritamente, à lei Penal Nacional, os crimes cometidos com intenção de exterminar a etnia de um povo ou destruir um grupo religioso pátrio, crimes estes, conhecido por genocídio.

Será condicionalmente aplicada a lei Penal Brasileira, pelo principio da nacionalidade passiva, ao autor do fato delituoso, cometido fora do território nacional, ainda que absolvido ou até mesmo condenado em outro país, onde cometeu crime contra brasileiro. Se autor for brasileiro, emprega-se o princípio da nacionalidade ativa, assim que o agente de livre-arbítrio ou extraditado entrar em território nacional, ou ainda, por requisição do Ministro da Justiça. Em realidade, a pena cumprida no estrangeiro deverá ser homologada no Brasil.(PAGLIUCA, 2009, p 52).

O princípio da extraterritorialidade subordina-se ainda, a condição de estar o crime incluído entre aqueles, pelos quais, a lei brasileira autoriza a extradição, também, crimes em que o agente não tenha sido absolvido no estrangeiro, não ter cumprido a pena, não ter sido o agente perdoado e não estar extinta a sua punibilidade, em conformidade com a lei mais favorável. A extraterritorialidade condicionada esta instituída, “nos princípios da justiça universal, que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir”, a exemplo, a convenção de Viena, onde foi tratado o combate ao tráfico de entorpecentes. (DELMANTO, 2010, p 100).

Como regra fundamental, ninguém poderá ser punido duas vezes. “A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”, ou seja, se houve condenação no estrangeiro, superior à condenação que poderia ter ocorrido no Brasil, e lá, o agente satisfez a pena, nada mais merece cumprir; entretanto, se o agente cumpriu pena inferior a qual seria atribuída no Brasil, há mero desconto na sanção, o restante deverá ser cumprido no território nacional. (PAGLIUCA, 2009, p 53).

 

Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II - sujeitá-lo a medida de segurança. Parágrafo único - A homologação depende:  a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça. (BRASIL, 1999).

 

Em verdade, a lei nacional faz suposições para que a lei penal estrangeira produza os mesmos efeitos, ela determina por meio de homologação, feita pelo Superior Tribunal de Justiça, para ter a mesma eficácia da nacional.

 

2.3 CONTAGEM DO PRAZO DA LEI PENAL E A LEGISLAÇÃO ESPECIAL

 

As disposições finais do título da aplicação da lei Penal disciplina a contagem do prazo, de peculiar importância nas possibilidades da duração da pena, do livramento condicional, do sursis, da decadência e da prescrição, sendo que, “o dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum”. (BRASIL, 1999).

Não importa a que horas do dia o prazo começou a correr; observa-se o dia todo para efeito de contagem de prazo, assim, se a pena começou a ser executada  ás 23h55min, os cinco minutos são contados como um dia inteiro. Obviamente, não importa se o prazo começou em domingo ou feriado, computando-se um ou outro como primeiro dia. (CAPEZ, 2011, p 13l)

O prazo de cumprimento da pena, de sua decadência ou prescrição pertence ao direito Penal, já o prazo recursal faz parte do direito processual, no entanto, apenas se computa o dia do começo no primeiro caso, sendo improrrogável. (GOMES, 2003, p 272).  

Não há para a contagem dos prazos de natureza penal, um calendário especial, portanto é utilizado o calendário comum (gregoriano), isto é, há meses com trinta e um dias, outros com trinta dias e, ainda outro com vinte e oito dias ou vinte e nove, se o ano for bissexto, assim pode ocorrer do ano ter trezentos e sessenta e cinco ou trezentos e sessenta e seis dias. (PAGLIUCA, 2009, p 54).

Os prazos possuem características materiais e procedimentais, na peculiaridade material a contagem é levada em consideração o dia inicial como termo, excluindo-se o termo final do vencimento, não há prorrogação quando coincide o vencimento em um sábado, domingo ou feriado; o que não ocorre na peculiaridade procedimental, onde não se leva em consideração o dia do começo, comutando-se o dia final, assim, se coincidentemente o vencimento ocorrer em um dos dias citados, prorroga-se até o dia útil seguinte, ou seja, em matéria de processo ou procedimento, quando mais longo for o prazo, melhor para o réu, ao passo que, do contrário, em materialidade o réu encontra o benefício em não haver prorrogação do prazo.

Nas penas privativas de liberdade e restritivas de direitos, por mais minucioso que tenha sido o juiz, o artigo 11 do CP despreza as horas ou minutos, ou seja, somente são observados os anos, meses e dias e nas penas pecuniárias, por mais que sejam habituais, os centavos são desprezados no cálculo do valor do dia-multa. (BRASIL, 1999).

Ainda que, fundamentalmente os ilícitos penais estejam retratados no Código Penal, consideram-se outros de elevada relevância, aqueles definidos em leis especiais, embora a letra do artigo 12 do CP determine a aplicação das regras gerais aos fatos incriminados pela legislação penal especial, será dado maior valor ao princípio da especialidade, quando a lei extraordinária possuir regra própria; a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente, e caso essas surjam afastadas de regras próprias, restará a aplicação das regras previstas no artigo citado.  

Em virtude do princípio da especialidade, “se a lei especial dispõe de modo diverso” ao Código Penal, vale a lei especial, no entanto, a exemplo das leis especiais que são aplicadas as regras gerais do CP por ausência de modo particular, são lembradas, a lei de abuso de autoridade, a lei de falências e dos crimes de imprensa; e no tocante a regra geral do perdão judicial (art. 121, § 5º) é aplicada aos crimes de transito. (GOMES, 2003, p 281).

 

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Em linhas gerais, a licitude do comportamento social está atrelada a obediência das regras de conduta humana, portanto, a desobediência destas regras ocasiona a ilicitude, e ainda, se infringidas as regras que tutelem os bens jurídicos de maior importância social ou que os lesione gravemente, o Estado, por meio do Direito Penal e suas sanções, aplicará a lei para restabelecer o equilíbrio social. 

Vale lembrar que, acompanhando a evolução social, as regras valorativas da lei penal, reestruturadas em 1984, utilizadas pelo Estado para punir seus infratores e também, empregadas para impor limites na subjetividade punitiva estatal, aniquilou o atroz direito penal do autor, trazendo maior eficácia e confiabilidade na sociedade organizada.

Por todo o exposto, conclui-se que o Estado é a fonte material do direito penal e este deve acompanhar a evolução social a fim de evitar o caos, pois, a sociedade muda seus conceitos de moralidade, religiosidade e ética, alterando seus costumes, havendo assim, necessidade de criar ou excluir leis, abrandar ou agravar sanções penais.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais n.ºs 1/92 a 57/20086 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão n.ºs 1 a 6/94 – 31 ED - Brasília: Câmara dos deputados, Edições Câmara,2009.

 

BRASIL. Código Penal / Organização dos textos, nota remissivas e índices por Juarez de Oliveira. - 29. Ed., São Paulo: Saraiva, 1999. (Legislação brasileira) "Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, atualizado e acompanhado de Legislação Complementar, também atualizada, de dispositivos da Constituição Federal de 1988, de súmulas e índices... "

 

BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Publicado no DOU em 13 de julho de 1984. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ acesso em 03 01 2012.

 

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, parte geral. São Paulo, Saraiva 2011.

 

DELMANTO, Celso. [et al] Código Penal Comentado, acompanhado de comentários, jurisprudência, súmulas em matéria penal e legislação complementar. 8ª Ed rev., atual.  ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

 

GOMES, Luiz Flávio. Direito Penal, Parte Geral, introdução, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

 

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 8 ed. São Paulo: Atlas, 1994.

 

PAGLIUCA, José Carlos Gobbis. Direito Penal, Parte Geral. 5ª Ed. São Paulo: Rideel, 2009.

 

 

 

 


[1]Aluno Universitário – Curso de Bacharelado em Direito

Faculdade Estácio de Sá – Ourinhos – FAESO

Orientador: Professor Hilário Vetore Neto.

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Autor: Arnaldo Alegria


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