Um giro ontológico entre conceitos e sujeitos



Um giro ontológico entre conceitos e sujeitos

 

Parece-me, tendo examinado as projeções futuristas de moralidade, que o mal necessário – a certa perspectiva – tem-se revelado semelhante ao bem necessário, uma vez que aquele também é último na mesma escala gradativa de impulsiva satisfação. Isso é um absurdo!? A propósito, compreende-se assim pelo fato do bem e do mal gravitarem no mesmo universo de razão que os homens lhes têm atribuído.

            Quer vê!?

            Sejamos simples nos exemplos...

As novelas e filmes de “antigamente”, assim como dizia minha saudosa Avó, apresentavam-se dentro de um contexto prospectivo impulsionador de uma compreensão de mundo pautado na disputa entre o bem e o mal, entre o mocinho e o bandido, entre o “chapeuzinho vermelho e o lobo mal”, entre o pólo passivo e o ativo.

Evidentemente, passávamos, desde já, a saber o papel do vilão e “mocinho” nas primeiras cenas do filme ou nos primeiros capítulos do livro. O enredo era sempre baseado numa compreensão moral religiosa de bem e de mal.   

            Nas histórias folclóricas que a minha avó contava para mim e para os meus primos, os “vampiros e lobos” eram animais, “bichos” do mal. Pertenciam à mesma classe ideológica de fazer ou transmitir o mal. Nunca ouvi minha avó, ou quem fosse, se direcionar aos “lobos e vampiros” como personagens do bem. Havia sempre uma classificação já pré-moldada.       

Contudo, não é o que percebemos atualmente. Por exemplo, os filmes “a menina da capa vermelha” (projetista de uma nova concepção de Chapeuzinho Vermelho) e a série de maior sucesso no cinema, “Lua Nova” (projetista de uma nova compreensão de amor. Aquele amor sem limites entre o bem e o mal), apresentam os heróis, os mocinhos, os galãs como sujeitos de uma mesma classificação. Todos pertencentes a classe do “bem”.

            Dentro de uma compreensão clássica cinematográfica - logicamente moldada por uma moral religiosa - fazia-se construtivo apresentar um enredo tendo como rivais o bem e o mal. Cada um dentro da sua própria formalidade de conceituação.

            A sociedade, através de uma modificação dos sujeitos e objetos, atribui uma nova versão aos valores. É como se estivéssemos reeditando fatos e conceitos já impostos por antigas sociedades, não nos conformando com nada. Dessa forma, não há passado nem futuro certo. Tudo gravita na incerteza de um caos.

Alguns levantam a tese de que a sociedade retrocedeu tanto ao ponto de reivindicar o direito de dar novos conceitos aos objetos e sujeitos. Como já diz o Professor Lênio Streck, “no pensamento ocidental, há uma angústia particular que assombra o homem”.

Pois bem, compreende-se a existência de um giro ontológico-linguístico na sociedade. Ora o mal pode ser o bem; ora o bem poderá ser o mal. Dessa forma, nada tem sido apresentado como fixo, natural ou eterno, mas tendentes a relatividade, passiveis de incertezas.

E porque essa compreensão? Sabíamos, e isso era algo irrefutável, que o bem tinha sua posição de destaque no meio social. O bem era a recompensa eterna para aqueles de bom coração; já o mal era a recompensa dos injustos, desumanos.

Evidentemente que essa compreensão apresentava-se pelo fato de que o moralismo cristão deveria sempre imperar com bases firmes, sedimentadas na razão de Deus. Expliquemos melhor. A moral cristã foi baseada nas concepções: pura biológica (o homem nasceu para a mulher), filosófica-teológica (toda compreensão é divina), teleológica-espiritual (o homem veio com a finalidade de crescer espiritualmente, ser melhor) e ontológica-moralística (A moral concreta é a melhor justiça do homem).

Contudo, percebemos que essa compreensão foi perdida. Não há mais uma definição de pólos: ativo ou passivo, bem e mal, mocinho e bandido. Hoje, parece-me haver uma semelhança tão grande ao ponto de ter dificuldades para distingui-los. Bandido e mocinho apenas se separam pelo prenome, ou quem sabe pela alcunha, mas são elementos de uma mesma substância: o homem.

Os filmes, livros e telenovelas apresentam a rivalidade do mal com o mal. Uma sociedade caótica não apresenta o bem como o ideal de qualidade de vida e certeza própria da melhor moral, mas, evidentemente, a “lei selva” como fonte de uma nova moral, a moral do caos; ou, na verdade, a amoralidade do caos.

            As relações sociais ficaram conturbadas. Dificilmente percebemos a valorização suprema do amor, do romance e da afetuosidade, já que a celeridade das relações sociais impulsiona a percepção do relacionamento por contrato de adesão, fácil de ser descartado, desprezado.

            Cremos que o capitalismo atribuiu valor aos relacionamentos e as emoções, tornando o homem cada vez mais insensível e frigido ao calor humano e aos sentimentos. A projeção imediata das relações sociais transforma a sociedade – não me esvaziando da compreensão moral cristã que há em mim, confesso – numa selva desregrada de qualquer sustentação moral cristã pura (isenta de hermenêutica liberal). Há, na verdade, um anarquismo material de regras humanas.

            Uma pena! Distanciar o homem de qualquer referência moral cristã, ou simplesmente relativizar essa compreensão, não torna o homem melhor nem tampouco menos angustiado. Por certo, a sociedade mais uma vez sai perdendo com essa desconstrução teratológica da certeza específica do que ser o bem e do que ser o mal.

Em suma, com toda evidencia, o homem perder o seu ponto central de equilíbrio e de referência (família, religião, moral etc.). E assim, se a sociedade atualmente já está condenada ao estupefato caos, imagine anos à frente.

Reflitamos!!!


Autor: Diego Bruno De Souza Pires


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