Isenção, Imunidade E Nâo-incidência



Isenção, Imunidade eNão-incidência

Conceituação e Distinções

Primeira Parte

Em brevíssimas considerações, nas linhas seguintes, queremos compartilhar alguns singelos pensamentos, em duas partes, sobre ‘isenção’, ‘imunidade’, ‘não-incidência’ e a questão da tributação ou não, da literatura técnico-científica ou artístico-cultural sob forma de ‘e-books’.

Parece acertado, nesta primeira parte, iniciar trançando algumas distinções básicas entre isenção, imunidade e não-incidência.

Nos ocorre à lembrança, o antigo, incrivelmente didático e, paradoxalmente, atual exemplo concebido pelo sempre Mestre Dr. Ruy Barbosa Nogueira in Curso de Direito Tributário 15ª Edição pág. 168, onde, demonstrava, o jurista, através de um círculo, a representação do campo de ‘incidência tributária’ e, dentro deste círculo ou campo de incidência, indica em um quadrante ou fração, a hipótese ou possibilidade de ‘isenção’. Já, externamente ao círculo, demonstrava a alocação das hipóteses denão-incidência e de ‘imunidade’, tributárias, no seguinte esquema:

NÃO-INCIDÊNCIA

INCIDÊNCIA

ISENÇÃO



IMUNIDADE

Pela representação supra, fica claro entender que a isenção está contida no campo de incidência tributária, e, em assim, estaria sob o ponto de vista da mera subsunção in abstractum da norma tributária, sujeita a natural formação do crédito tributário ou tributação. Todavia, mesmo sob o campo de incidência tributária, a isenção poderia ser qualificada como leciona Nogueira, como “...exclusão do crédito tributário...” ou ainda, a ‘...dispensa do pagamento.”

O que é diferente e não se confunde com imunidade, a qual, no preciso dizer de Amilcar Falcão, apud Nogueira, a imunidade, seria:

uma forma qualificada ou especial de não-incidência, por supressão, na Constituição, da competência impositiva ou do poder de tributar, quando se configuram certos pressupostos, situações ou circunstâncias previstas pelo Estatuto Supremo. ... A imunidade é, assim, uma forma de não-incidência pela supressão da competência impositiva para tributar certos fatos, situações ou pessoas, por disposição constitucional.” [1]

Outros importantes esclarecimentos são os que concernem sobre incidência e não-incidência.

De forma bem sintética podemos dizer que:

Incidência: É a ocorrência in concretum de situação previamente prevista, tipificada ou descrita in abstractum em lei, ou seja, a verificação do fato gerador do tributo.

Não-incidência: É justa e exatamente, o contrário, ou seja, são todas as hipóteses que não as previstas, tipificadas ou descritas in abstractum em lei, e, por isso, ficam fora do campo de incidência tributária, ou seja, é a não-ocorrência de fato gerador, porque, ou não há lei, ou se há, então a lei não prevê a hipótese de incidência específica e precisa (lacuna) para o evento verificado.

Sempre com o devido respeito aos entendimentos divergentes, assinalamos que não raras vezes temos nos deparando com inúmeras pretensões de cunho declaratório que visam o reconhecimento da ‘inexistência de relação jurídica’em matéria tributária. É claro que são compreensíveis o objetivo e o raciocínio construídos nestas demandas, principalmente, quando se visa, na verdade, é demonstrar as hipóteses de isenção e imunidade, e, especialmente, de não-incidência, na maioria das vezes, o que poderia nos remeter ao entendimento -o qual acreditamos ser equivocado - de que, nestes casos, poderia, supostamente, não haver ‘relação jurídica’ com o fisco, em virtudeda previsãoin abstrato ou permissivo instrumental destapossibilidade de pretensão latu sensu (vide CPC art. 4º, I).

Justificamos nosso entendimento de que o termo ‘inexistência de relação jurídica’, não seria o melhor aplicado, tendo em vista a vigência da concepção Contratualista, pois, o fisco nada mais é do que um dos muitos órgãos do Estado, o qual foi constituído, está e é sobre todos nós cidadãos e/ou contribuintes (pessoas físicas ou jurídicas). Sob esta ótica, a relação jurídica existe e sempre existirá enquanto houver Estado. Logo, imprecisa e incorreta a pretensão de ver declarada a inexistência desta relação jurídica, sob o enfoque tributário. Vez que, nesta lógica, declarar suposta a inexistência de relação jurídica entre o contribuinte e o fisco, significaria negar a própria existência e vigência do Estado, o que - mesmo com sua inescusável, ampla e dioturnamentenoticiada ineficácia,inoperância ou descasoe, até, inúmerasvezes já denunciada, falência - atualmente, ainda é impossível.

É que o termo 'relação jurídica' é bem mais amplo e implica em uma abordagem muito mais complexa, e não se adstringe ou circunscreve-se a mera possibilidade de exigir ou não um tributo.

Isto significa dizer, que mesmo o Estado não podendo exigir tributação em determinada situação, seja por impedimento ou limitação Constitucional originário (imunidade) ou, por força infraconstitucional (isenção), ou ainda, simplesmente, por ausência normativa (não-incidência), mesmo assim, não perde - o Estado - o seu status de regulador, nem mesmo o seu poder-dever erga ominis para com os seus tutelados: cidadãos e/ou contribuintes (pessoas físicas ou jurídicas). Ou seja, fica mantida, segue a relação jurídica entre o Estado e seus tutelados.

De modo que, mais uma vez, com o registro do devido respeito, e, pelas razões supra, entendemos que a expressão ‘inexistência de relação jurídica’ dos tutelados para com o Estado, estaria equivocada e de indevido uso; devendo ao nosso sentir, por uma questão técnica ser utilizada, em substituição, expressão do tipo: Ação declaratória de hipóteses de: isenção ou imunidade ou de não-incidência em matéria tributária.

Então, valendo-nos do esquema inicial do professor Nogueira e, desde já rogando a mais alta vênia para fazermos ‘nossa pequena adaptação’, com vistas a demonstrarmos tudo o até aqui articulado, propomos o seguinte quadro:

CAMPO DE ABRANGÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA ESTATAL E SEUS TUTELADOS

INCIDÊNCIA Normativa

ISENÇÃO

Normativa

NÃO-INCIDÊNCIA – Ausência de Normas ou de Hipóteses

IMUNIDADE

Constitucional

Normativ

Desta forma, cremos, ter demonstrado didática juridicamente que, mesmo havendo o reconhecimento seja administrativo ou judicial de situação seja de incidência, seja de isenção, imunidade ou de não-incidência, em qualquer hipótese, a relação jurídica entre o contribuinte e o Estado fica mantida, não deixa de existir. Logo, não seria juridicamente apropriada terminologia 'inexistência de relação jurídica', porque esta, salvo melhor juízo, em qualquer hipótese, resta incólume.

Isenção, Imunidade enão-incidência

(E-books)

Segunda Parte

Pretendendo discutir o interessante questionamento nos apresentado, transcrevemos a pergunta lançada:

A imunidade tributária consagrada no art 150, VI, d, da CF/88 alcançaria o chamado "livro eletrônico" (em CD-Rooms, disquetes etc.) ?

Antes de enfrentarmos a questão proposta, trazemos a redação do referido artigo 150,VI da CRFB/88, in verbis:

Artigo 150: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:


VI - instituir impostos sobre:


d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

Pela leitura do Dispositivo Constitucional, resta claro algumas constatações. Vejamos:

Primeira, que há clara e explícita vedação a instituição de impostos pelo Estado em todas as suas esferas.

Segunda, que esta vedação se aplica, inequivocamente a: Livros, jornais, periódicos e, inclusive ao papel destinado a sua impressão.

Terceira, percebe que a mens legis é a de democratizar, facilitar o acesso a todo o tipo de informação e cultura aos destinatários destes ‘livros’, ‘jornais’ e ‘periódicos’ os quais ao tempo da promulgação da Carta Política 1988, só eram concebidos, pelo menos aqui no Brasil,preponderantemente através do papel. De modo que a imunidade à ocasião outorgada, tinha como indiscutível escopo, a causa mais elevada ou ideário isonômico de inclusão sócio-cultural pela facilitação ao acesso à informação e à cultura latu sensu.

Todavia, poderemos, agora, ponderar ou perquirir, se, com o advento da internet e sua profusão, especialmente, quanto a nova possibilidade de ser disponibilizados livros em formato virtual, os ‘e-books’, ou ‘livros eletrônicos’, não mais através do papel, se tal ‘novidade’ ou ‘tecnologia’ poderia ter sido excluída do Texto Magno ou, pelo contrário, se estaria ou poderia, então, ser abarcada... Talvez de uma forma implícita ou ainda, por meio de uma necessária exegese ampliativa?

Nos parece ser o ‘marco zero’ e ponto fulcral, estabelecer, inicialmente, se o livro eletrônico ou e-book, disponibilizado pela net, por meio de CD’s, por e-mail, por disquetes, pen drive’s ou qualquer outro meio eletrônico, pode ser considerado juridicamente livro ou, pelo contrário, justamente por isso, por esta peculiaridade, deixaria de ser, juridicamente, livro.

Então: ‘E-books’ ou ‘livros eletrônicos’ são livros ou não?

Primeira Hipótese - Se o entendimento for o de que a natureza jurídica do ‘e-book’ ou dos ‘livros eletrônicos’ sejam ‘outra coisa’ que não livros, nesta hipótese teríamos uma situação bem curiosa. Observemos:

Admitindo, que o ‘e-book’ ou os ‘livros eletrônicos’ não sejam juridicamente ‘livros’ e sim ‘outra coisa', pelo princípio da legalidade, justamente por não serem, nesta hipótese, livros, poderiam, em tese ser passíveis de eventual incidência tributária.

Todavia, ainda nesta hipótese e, pelo mesmo princípio da estrita legalidade ou reserva legal, caso não haja previsão normativa expressa no sentido de ser passível de tributação ‘outra coisa’ e, conceituada esta ‘outra coisa’ como sendo ‘e-book’ ou ‘livros eletrônicos’, estaríamos, então não mais diante de imunidade ou de isenção, mas sim de não-incidência tributária, por ausência de previsão legal.

Segunda Hipótese – Por outro lado, se o entendimento for o de que a natureza jurídica do ‘e-book’ ou dos ‘livros eletrônicos’ sejam livros, tanto quanto os são os - que até agora conhecemos e utilizamos - de papel, vez que, entendemos, consoante preceitua CARAZZA:

É livro, pois, para fins de imunidade, qualquer objeto que transmita conhecimentos (idéias, informações, comentários, narrações reais ou fictícias etc.,), pouco importando se isto se faz por caracteres alfabéticos, por imagens, por sons, por signos Braille, por impulsos magnéticos.” [2]

Então, nesta hipótese, a solução é não outra senão a de que, tratar-se-ia de imunidade tributária, por força de previsão em Dispositivo Constitucional, ínsito artigo 150, VI ‘d’ da CFRB/88.

Esta última hipótese, a qual, aliás, nos filiamos, parece guardar maior coerência com a mens legis e amens legislatoris Constitucionais. De modo que, já em notas conclusivas, e pretendendo apresentar nossa posição pessoal sobre o questionamento lançado pelo tutor,entendemos, pelo supra alinhado, nos parece totalmente despicienda e imprópria uma construção exegética ampliativa, mas sim, mero cumprimento ao Texto Constitucional.

Referências Bibliograficas:

CARRAZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 3ª Edição. São Paulo:Revista dos Tribunais, 1991.

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 15º Edição, São Paulo:Saraiva, 1999.




Autor: Claiton Almeida Ramos


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