A Via Chilena



A Via Chilena

 

Na década de 1970, quando o Brasil mergulhava pelo mais profundo na sua ditadura militar, surgiam noticias de que Salvador Allende, após três vezes não sucedidas, conseguira chegar à presidência da República Chilena com uma proposta socialista. Subiu ao poder uma coligação de esquerda, a Unidade Popular, formada por comunistas e socialistas. Eleito com apenas 34% dos votos, faltava-lhe apenas confirmação do Congresso, uma vez que não havia obtido mais da metade do percentual.

Sentia-se o medo disseminado pela imprensa internacional e das forças conservadoras locais, como aponta Emir Sader: “Socialismo na América Latina? Em pleno ano de 1970? Quando a ditadura militar brasileira se consolidava e emergia como modelo político e de crescimento econômico para seus vizinhos?” Além do Brasil, Argentina e Bolívia também se encontravam em governos militares e Cuba estava isolada. Enfim, a notícia de um socialista eleito não soava muito bem naquele momento, sobretudo, para a Casa Branca.

Nesse sentido, o processo revolucionário afetou poderosos interesses estrangeiros e nacionais, em que a alçada de um governo socialista chileno vinha a alterar o equilíbrio regional, sendo uma possibilidade de “contágio ideológico” no Cone Sul. O governo da Unidade Popular atacou diretamente esses interesses num conjunto de medidas revolucionárias. Em pouco tempo, nacionalizou as riquezas básicas, principalmente as representadas pelo cobre, expropriou empresas monopólicas e a oligarquia latifundiária, incorporou massas ao trabalho e ao consumo, redistribuindo riquezas e ampliando o mercado interno.

Além disso, estendeu os direitos democráticos e libertários colocando o Chile no quadro das nações “não alinhadas”, defendendo a luta contra a dependência estrangeira. A política econômica de Allende propunha substituir a área de propriedade social de predomínio capitalista por relações socialistas de produção, com o propósito de destruir as bases de sustentação do imperialismo e da burguesia nacional.

A princípio, com a intervenção estatal, a inflação declinou e os salários subiram. As reformas de Salvador Allende provocaram reações. Em 1972, o preço do cobre caiu e a crise cresceu acelerando a inflação. Os grupos conservadores começaram a contestar diretamente o governo. Enfim, em 11 de setembro de 1973, o governo é abatido, como apontam Belarmino Elqueta e Alejandro Chelén, “embora inicialmente legítimo caiu na ilegitimidade flagrante, na preparação de um clima adequado para o golpe, pelos partidos opositores, pela maioria no Congresso Nacional, pela Corte Suprema, pela Procuradoria Geral da República e pela Ordem dos Advogados”.

Nessa data, numa ação militar de invasão ao Palácio de La Moneda, a sede do governo, Salvador Allende morre, por assassinato ou por suicídio. Formou-se então, uma junta militar liderada pelo general Augusto Pinochet, que iniciou um processo de terror durante anos com a prisão e a tortura de milhares de pessoas. O golpe finalizou o processo de mudanças revolucionárias que havia se iniciado em 1970 e inaugurou a contra-revolução. A classe dominante transformou o Estado num aparato totalitário e ditatorial restaurando o sistema capitalista pelo sangue e pelo fogo.

Após 15 anos de terror, em 1988, a oposição se une para derrotar o governo de Pinochet por plebiscito. No ano seguinte, Patrício Aylwin é eleito presidente, contudo Augusto permanece como comandante do exército por vários anos e como senador, também, até que, em 1998, é preso em Londres, por seus crimes cometidos frente ao governo chileno. Em 3 de dezembro de 2006, sofre um ataque cardíaco e falece aos 91 anos.

Por conta da ditadura implantada em 1973, o Chile perdera seu prestígio conquistado no governo da Unidade Popular na valorização dos direitos humanos, da paz e da democracia. A trágica experiência interessa a todos países latinos, uma vez que também sofreram por sucessivos regimes militares. As ditaduras latino-americanas cumpriram seu objetivo imediato de fazer as maiorias recuarem e derrubar os ímpetos revolucionários. Mesmo com os fins sucessivos dos regimes, a crise da dívida e o fim da Guerra Fria trouxeram outro paradoxo: os latinos estão deixados a si próprios, deslocados e dependentes de outras economias, principalmente, a estadounidense.

 

 

Referências Bibliográficas

ELQUETA, Belarmino; CHELÉN, Alejandro. Breve História de meio século no Chile. IN: América Latina: história de meio século, organizado por Pablo Gonzáles Casanova. Tradução de Marcos Bagno e Ricardo Gonçalves. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998.

SADER, Emir. Chile (1818-1990) – da independência à redemocratização. São Paulo, Brasiliense, 1991.


Autor: Rodrigo Janoni Carvalho


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