O Segredo Da Vida



 

Certa vez, um jovem muito inteligente, curioso e criativo quis desvendar o mistério da morte. Para isso, passava dias, meses e anos tentando penetrar nesse insondável mistério. Mistério porque é algo da vida humana que esconde em si o indizível, por mais que já se saiba algo sobre ele. E, assim, o jovem não se cansava de buscar uma resposta para tal enigma. Então, resolveu, como os cientistas fazem para garantir a objetividade das leis empíricas, empreender alguns passos em sua pesquisa. Seu primeiro encontro foi com um sacerdote.

- Senhor Padre, diga-me o que é a morte? - perguntou-lhe o jovem.

- Meu filho - disse-lhe o padre pensativo - a morte nada mais é do que um sono que nos possibilita passar deste mundo ao outro. Um lugar que não podemos descrever, mas podemos sentir, porque lá é tudo felicidade, alegria, harmonia e paz. Lugar de plena comunhão com o Bem-Supremo. Lugar para o qual todos nós devemos ir, mas veja: somente aqueles que professam a fé e fazem a vontade do Deus Todo-Poderoso podem dele desfrutar!

- Não estou entendendo - retrucou o jovem.

– Muito bem, muito bem, a coisa não é tão fácil de entender, tentou o padre acalmar aquele jovem tão obstinado em desvendar o mistério da morte. Olhe, continuou o cura, você não tem nada que se preocupar com a morte, pois o importante é viver a cada minuto de sua existência, como se fosse sempre o primeiro minuto, pois nunca ninguém veio lá do outro mundo comunicar como é lá. O próprio Jesus Cristo não quis que seus discípulos se preocupassem com isso, não. Ele simplesmente disse: “vou preparar uma casa para vocês junto do meu Pai, depois virei buscá-los”. Contudo, olhe, a morte é uma passagem deste mundo a um outro mundo, um estado de vida.

E assim o padre começou a fazer explicações teológicas, mas incompreensíveis, que em nada ajudavam o jovem a se convencer do enigma da morte.

- Bom padre - disse o jovem - devo ir porque preciso pensar nas suas palavras.

E assim partiu. Caminhava de olhos fixos para no horizonte, sempre pensando em se aproximar do seu fim: encontrar uma resposta para sua angústia existencial. Lá em frente, encontrou um cientista, era um físico.

- Senhor cientista, tire-me uma dúvida: o que significa a morte? – Perguntou-lhe.

- Bem, esta pergunta não deveria ser feita a mim como cientista, pois estou voltado para a observação de fatos reais que, no meu laboratório, são verificados, analisados minuciosamente, cujas verdades são declaradas por meios de leis irrefutáveis. Essa questão metafísica é coisa dos filósofos e teólogos que não têm o que fazer; são os celibatários que vivem no mundo das abstrações, esquecendo que somos homens sujeitos às contingências da Terra e nada mais. Não somos nada mais do que somos: corpos limitados por um tempo efémero, o qual devemos desfrutar o máximo possível, pois depois este pobre corpo se definha, levando-nos ao seu fim, à morte, tornando-se pó. Não existe um além para onde possamos ir após a morte. Este negócio de dizer que a vida continua após a morte é coisa de religião e disso não me preocupo.

O jovem ouvindo o discurso ficou admirado pelo descaso que o cientista tinha para com outros aspectos importantes da vida, sobretudo sobre saber para onde o homem deveria ir após a morte!

Continuou o seu caminho. Olhava a natureza, sentia a sua pequenez diante da imensidade do universo; sorria admirando-se dos pássaros que uníssonos cantavam naquela manhã. Andava na leveza da vida, tentando descobrir seu segredo, refletindo sobre sua existência no mundo dos homens de negócio que vivem somente para si, para o lucro, para os prazeres da vida. De repente, encontrou um Babalorixá que fazia um despacho numa encruzilhada para Exu.

- Diga-me - perguntou o jovem - o que é a morte?

– Ah, meu caro amigo, respondeu aquele Babalorixá, a morte é o encontro com as outras almas que já partiram desse vale de lágrimas, mundo das trevas, da maldade; elas vivem no mundo das luzes, mas nos comunicamos com elas, porque foram nossos antepassados. Há uma estreita comunhão entre nós e eles. Elas trazem-nos respostas do além; informam-nos como anda o outro mundo e nos comunicam como devemos nos preservar do mal que ronda as nossas vidas!

O jovem se despediu daquele sacerdote sem muitas preocupações. Mas tinha uma esperança: encontrar alguém que pudesse aliviar sua angústia e curiosidade!

Não se cansando de suas dúvidas, e ao longo de um dia, ao fim da tarde, encontrou um velhinho sentado em baixo de uma árvore, olhando para ela, admirado, espantado e perplexo por tudo que via. Imóvel, estava absorvido no seu mundo, sem que nada em volta trouxesse-lhe perturbações; o silêncio deixava-lhe mais próximo de algo que somente ele podia experimentar. Era como se estivesse próximo ao longínquo, ao finito entrando no infinito.

O jovem se aproximou, fitando-o demoradamente os olhos.

- Meu senhor, o que o senhor está a olhar tão silenciosamente? – Indagou-lhe.

- Deveras, estou aqui há dias, meses e anos, tentando compreender o segredo da vida! – respondeu-lhe o velhinho.

- Mas como? Por que o senhor, ao invés de compreender o segredo da vida, não tenta desvendar o mistério da morte? – Questionou o jovem impressionado e estuperfato diante daquela sábia resposta do velhinho!

O velho homem, serenamente, permaneceu a olhar a árvore.

- Olhe, meu jovem querido – retomou o diálogo com voz mansa e delicada – o que nos importa é compreender o segredo da vida a desvendar o mistério da morte! Veja esta árvore, como ela está viva pela sua forma de se apresentar para todos nós: suas raízes, seu caule, seus galhos, suas folhas e seus frutos embelezam esse ambiente em que nos encontramos, proporcionando-nos uma sombra agradável, e uma terra mãe que devolve energia positiva através de sua umidade! A seiva que corre em suas entranhas faz com que ela resista às intempéries dos maus tempos e à violência dos homens. Ela me dá mais prazer para desfrutar daquilo que já sei: viver a vida. Como é bonito vê-la a dançar! Por meio das suas folhas a balançar, podemos sentir sua alegria de viver. Veja, como o vento tivesse a soprar suaves músicas, em uníssonas melodias, ela parece se transportar deste espaço a um outro que não conhecemos, mas que sentimos quando somos envolvidos por ele. O segredo da vida no tempo cronológico dos homens não faz sentido, porque todos se esquecem de viver e estão preocupados somente com a morte; vivem aterrorizados e por medo medo da morte, por isso, têm que produzir e lucar, antes dela alcançá-los. Dessa forma, querem desvendar o mistério da morte para, tecnicamente, elaborar meios para prolongar as suas vidas e ganhar mais dinheiro para desfrutar dos bens materiais. Este é o mundo da cosmética, das plásticas, do embelezamento externo. Porém, o segredo da vida quando impera sobre a morte leva o homem a transcender seus limites, seus interesses, seu egoísmo, e a encontrar um outro espaço no qual a vida se torna um prolongamento deste mundo em que vivemos. Assim, daqui debaixo desta árvore, ao respirar a pureza do ar e ao contemplar tal verde relva, sinto-me, vez por outra, transportar para esse outro mundo que já vislumbro no horizonte de minha existência!.

O jovem estava satisfeito e feliz com aquele tão simples e fundo diálogo, porque descobriu que no segredo da vida está implícito o mistério da morte, e que somente penetra no mistério da morte quem já descobriu e experimentou o segredo de viver.

Moral da história: se as pessoas vivessem mais preocupadas em descobrir o segredo de viver bem, através dos vários momentos que o tempo lhes proporciona, não morreriam jamais, pois estariam sempre embevecidas de vida, mais do que do horror da morte.

 

Teresina - PI, 31 de julho de 2000.


Autor: Antonio Leandro


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