Análise entre as gramáticas normativa, descritiva e reflexiva. que gramática cabe a escola ensinar?



ANÁLISE ENTRE AS GRAMÁTICAS NORMATIVA, DESCRITIVA E REFLEXIVA. QUE GRAMÁTICA CABE A ESCOLA ENSINAR?[1]

 

Kamila M. de A. Fontenele[2].

 

RESUMO: Este artigo se deteve a uma analise feita a partir do estudo das Gramáticas Normativa, Descritiva e Reflexiva. Procurando mostrar as diferenças e o objeto de estudo que cada uma apresenta. Seguindo essa abordagem é apresentada a forma de ensino de Gramática nas escolas brasileiras. Depois, é feito uma discussão diante da contribuição que dão a Linguística e os PCN a esse tipo de ensino. Teve-se por base teórica os estudiosos Maria Elena Neves, Luís Carlos Travaglia, a fim de desenvolver uma tese convincente a partir desse estudo. 

 

Palavras – chave: Gramática. Objeto de estudo. Ensino. Linguística. PCN.

 

INTRODUÇÃO

 

          O papel da Escola e do Professor é contribuir para o desenvolvimento de uma aprendizagem satisfatória dentro da sala de aula. As Gramáticas Normativa, Descritiva e Reflexiva promovem ao aluno conhecimento, habilidades linguísticas que precisam ser avaliadas todos os dias. Mas cabe ao professor de Língua Portuguesa apresentar as diferenças, vantagens, desvantagens que cada uma tem.

          Travaglia é professor titular de Língua Portuguesa, Doutor em Ciências Linguísticas e seu foco de estudo é a Linguística. Sua pesquisa contribui significativamente para o ensino de Gramática nas aulas de Português do ensino fundamental e médio. Todo Professor deve conhecer esse referencial teórico para aplicar em sala de aula.

          O presente trabalho pretende analisar esses três tipos de Gramática, ressaltando seus pontos positivos ou negativos para um bom trabalho em sala de aula. Está dividido em dois sub-temas: o primeiro tem-se uma diferença entre as Gramáticas e seu objeto de estudo. O segundo é voltado para o ensino de Gramática nas escolas brasileiras e sua relação com a Linguística e com os PCNS.

 

A DIFERENÇA ENTRE AS GRAMÁTICAS NORMATIVA, DESCRITIVA, REFLEXIVA E SEU OBJETO DE ESTUDO.

          Quando se fala em gramática, logo vem a mente aquele conceito bem antigo de gramática tradicional, ou seja, um conjunto de normas, regras para um bom funcionamento da língua, para falar e escrever corretamente. Essa definição é bem restrita diante dos fenômenos que cercam a língua.

          A Gramática Normativa ou Prescritiva estabelece normas a serem seguidas. Está ligada ao “certo e errado”, a uma forma que não reflete o código linguístico, afinal é uma lei a ser obedecida. Conforme Travaglia (2001, p.30):

 

A gramática normativa, que é aquela que estuda apenas os fatos da língua padrão, da norma culta de uma língua, norma que se tornou oficial. Baseia-se em geral, mais nos fatos da língua escrita e da pouca importância a variedade oral da norma culta, que é vista, conscientemente, ou não, como idêntica a escrita. Ao lado da descrição da norma ou variedade culta da língua ( análise de estruturas, uma classificação de formas morfológicas e lexicais), a gramatica normativa apresenta e dita normas de bem falar e escrever, normas para a correta utilização oral e escrita do idioma, prescreve o que se deve e o que não se deve usar na língua. Essa gramática considera apenas uma variedade da língua como válida, como sendo a língua verdadeira.

 

          Então, esse tipo de gramática é o que mais os alunos veem nas escolas, aquela forma tradicional de estudar o conteúdo. Não aceita nenhuma variedade que a língua apresenta. Impõe regras a serem obedecidas, por exemplo: o verbo tem que concordar em gênero e número com o sujeito “Os homens trabalham”. Caso alguém desobedeça a esse segmento e fale “Os homi trabaia”, será visto como uma pessoa ignorante, que fala errado, não segue a concordância adequada. A gramática tradicional não se preocupa com a interação e nem com a variação que ocorre na língua, trabalha apenas com o fator homogêneo.

          A Gramática Tradicional dedica-se exclusivamente a língua escrita e passa a deixar de lado a língua falada. Então, detém as normas de bom uso, a variedade culta, padrão. Despreza a oralidade e outras variedades da língua. Por isso, surgem os preconceitos linguísticos. Segundo Travaglia (2001, p.228):

 

Os critérios de qualidade de que se vale a gramática normativa são muitas vezes, problemático e com frequência nada tem a ver com a realidade da língua em si e em sua variação. A variedade que é considerada culta é normalmente a das classes sociais de prestigio econômico, político, cultural, etc., não considerando, portanto, a capacidade de qualquer variedade da língua de cumprir uma função comunicacional.

 

          É necessário que em sala de aula o professor de Língua Portuguesa aprimore-se dos recursos da Gramática Normativa porque mesmo tendo suas desvantagens apresenta também as vantagens. Pois a partir de seu uso o aluno consegue dominar normas, escrever e se expressar melhor. É preciso que o professor não se detenha apenas na GT, mas também em outros tipos de Gramática, bem como: a Descritiva e a Reflexiva, para assim desenvolver um resultado satisfatório enfocando a variação e mudança, com isso excluir os mitos que tem na língua.

          Já a Gramática Descritiva é um estudo da língua sob um olhar mais crítico, incluindo vários elementos. Faz uma descrição da estrutura e do funcionamento da língua, de sua forma e função. Tem a preocupação em descrever, explicar as línguas como elas são faladas. De acordo com Travaglia (2001, p.32):

 

A Gramática Descritiva é a que descreve e registra para uma determinada variedade da língua em um dado momento de sua existência (portanto numa abordagem sincrônica) as unidades e categorias linguísticas existentes, os tipos de construção possíveis e a função desses elementos, o modo e as condições de usos dos mesmos. Portanto a gramática descritiva trabalha com qualquer variedade da língua e não apenas com a variedade culta e dá preferência para a forma oral desta variedade. Podemos, então, ter gramática descritiva de qualquer variedade da língua.

 

          Através dessa afirmação pode-se perceber que a Gramática Descritiva descreve as regras de como uma língua é realmente falada. Então, trabalha com outras variedades, como a informal. Não tem o objetivo de apontar erros, mas de identificar todas as formas de expressão existentes. Diante da seguinte frase: “Os cachorro são dele, viu”, a gramática descritiva procura explicar os usos da língua, e que não há línguas uniformes. Neste caso essas formas não seriam erros, mas variedades da forma oral.

          A Gramática Reflexiva seria um trabalho de reflexão diante do que o aluno já domina. E também um trabalho de recursos linguísticos que ainda não domina. O objeto de estudo dessa gramatica é levar o aluno a aprendizagem de novas habilidades linguísticas, daí promover um ensino produtivo. Aqui se estuda gramatica a partir de exemplos que facilitem o entendimento dos elementos da língua em atividade em sala de aula. Conforme Travaglia (2001, p.33):

 

A gramática reflexiva é a gramática em explicitação. Esse conceito se refere mais ao processo do que aos resultados; representa as atividades de observação e reflexão sobre a língua que buscam detectar, levantar suas unidades, regras e princípios, ou seja, a constituição e funcionamento da língua. Parte, pois, das evidencias linguísticas para tentar dizer como é a gramática implícita do falante, que é a gramática da língua.

 

          Então, esse trabalho com a Gramática Reflexiva é mais voltado para a inovação do ensino pela uma mudança da metodologia. Pois, constroem-se atividades que o levem a redescobrir fatos já estabelecidos pelos linguistas. Diante disso, o livro apresenta um titulo de como se faz o plural. É exposto o modelo, no qual os alunos observam que há frases no singular “O animal racional” e depois o plural “Os animais racionais”. Através da observação os alunos logo reconhecem que palavra terminada em AL, troca-se o “L” por “IS”. Isso é um exemplo simples para formação do plural que é feito a partir de uma análise simples que ajuda o aluno a utilizar a língua com mais facilidade.

          Outro tipo de trabalho com Gramática Reflexiva é desenvolver competência comunicativa. De acordo com Travaglia (2001, p.150) “[...] a gramática reflexiva é constituída por atividades que focalizam essencialmente os efeitos de sentido que os elementos linguísticos podem produzir na interlocução [...]”. Partindo desse princípio seria uma reflexão voltada para a semântica e a pragmática. É uma análise das possibilidades e não possibilidades que um enunciado ou uma língua pode gerar. Preocupa-se mais com a forma de atuar usando a língua.

          Diante desses três tipos de Gramática pode-se perceber que servem como um forte instrumento de apoio em sala de aula. Para promover uma aprendizagem satisfatória e produtiva, o professor deve incorporar no seu trabalho tanto a Gramática Normativa, quanto a Descritiva e a Reflexiva. Assim os alunos poderão perceber a diferença e a contribuição que cada uma apresenta ao ensino de língua.

 

O ENSINO DE GRAMÁTICA NAS ESCOLAS BRASILEIRAS E SUA RELAÇÃO COM A LINGUÍSTICA E OS PCN.

          A Educação Brasileira é alvo de várias críticas, pois o ensino não é muito produtivo e isso faz com que o brasileiro tenha uma educação de baixo índice, sem qualidade. Muitos dos professores de Língua Portuguesa ainda não reconhecem a contribuição que tem a linguística e os PCNS diante do ensino de Gramática.

          O ensino de Gramática tem um foco de interesse extremamente restrito. Apresenta uma doutrina muito tradicional a cerca de conceitos, decoreba, análise sintática de frases descontextualizadas. Afinal, para a maioria de indivíduos escolarizados funciona como uma espécie de representação padrão da língua. Mas, é preciso mudar essa concepção que se tem de Gramática, pois se deve estudá-la fazendo uma análise, reflexão, indo pelo uso linguístico. De acordo com Neves (2003, p.128):

 

Não é necessária muita argumentação para que se assegure nisso. Insisto que ensinar eficientemente a língua e, portanto, a gramática é, acima de tudo, propiciar e conduzir a reflexão sobre o funcionamento da linguagem, e de uma maneira, afinal, obvia: indo pelo uso linguístico, para chegar aos resultados de sentido. Afinal, as pessoas falam, exercem a faculdade da linguagem, usam a língua para produzir sentido, e, desse modo, estudar Gramática é, exatamente, por sob exame o exercício da linguagem, o uso da língua, afinal, a fala.

 

          Por isso, na escola, desde o ensino fundamental deve-se trabalhar o ensino de Gramática, excluir certos mitos baseados nos preconceitos que tem a língua. Então, é preciso privilegiar não somente a escrita, mas também a fala. Partindo dessa perspectiva o ideal é que se ensine gramática sob um ponto de vista reflexivo que todo ser humano seja capaz de produzir e interagir por meios de textos falados e escritos. No ensino médio necessita trabalhar habilidades de leitura e escrita, reflexão sistemática de língua e linguagem.

          Dentro de uma sala de aula, o professor precisa relacionar a Gramática Normativa, a Descritiva e a Reflexiva. Apresentando suas vantagens e desvantagens para promover uma boa aprendizagem. Mais o que acontece é que esses profissionais se baseiam apenas no ensino prescritivo (gramática normativa) “certo e errado” que passa a interferir as habilidades linguísticas. Para Travaglia ( 2001, p.101):

 

O ensino de gramática em nossas escolas tem sido primordialmente prescritivo, apegando-se a regras de gramática normativa que, como vimos, são estabelecidas de acordo com a tradição literária clássica, da qual é tirada a maioria dos exemplos. Tais, regras e exemplos são repetidos anos a fio como formas “corretas” e “boas” a serem imitadas na expressão do pensamento.

 

          Em escolas tanto de nível fundamental quanto médio vê-se esse problema do ensino que passa a ser baseado na Gramática Tradicional. Essa questão é muita séria, pois acaba afetando boa parte dos alunos. É necessário que haja uma mudança por parte da metodologia. Ao invés de aulas monótonas, passa a ser sugeridas aulas com atividades de produção e compreensão de textos. Para promover um ensino eficiente da língua o professor deve se basear no ensino descritivo que tem o objetivo de mostrar como a linguagem funciona. E também no ensino produtivo que objetiva ensinar ao aluno novas habilidades linguísticas. Esses dois tipos de ensino são bem úteis para os alunos desenvolverem melhorias no ramo da linguagem.       

          A linguística é a ciência que estuda a linguagem, ou seja, estudam os diferentes tipos de linguagem, suas variações que ocorrem na fala. Essa ciência contribui para a exclusão dos preconceitos linguísticos. É de fundamental importância que os professores de Língua Portuguesa apliquem as concepções que tem a Linguística para trabalhar em sala de aula. Só assim, os alunos entenderiam que há diferentes maneiras de falar e se deve adequar sua fala em determinadas situações sociais. Para Neves (2000, p.62), “[...] ao linguista cabe apenas declarar guerra a atitude prescritivista, alheando-se da discussão e ignorando a necessidade que o usuário tem de orientação sobre os padrões linguísticos de eleição na sociedade”. Portanto, o linguista sempre é contra a respeito de idéias prescritivista. A ciência linguista oferece os conceitos de variação e mudança. Já a gramática tradicional tenta construir uma língua como entidade homogênea e estável.

          Os Parâmetros Curriculares nacionais (PCNS) são documentos registrados por lei que norteiam, guiam os professores para um sistema de ensino melhor. Defendem que o ensino não deve concentrar-se na gramática, mas também em leitura de textos. “A Gramática não é, pois, o ponto base do ensino, já que os “fatos gramaticais” presentes nos textos lidos jamais deveriam ser apresentados ‘a priore’, mas derivados das observações feitas pelo aluno”. (PCN, 1998, p.262). Então, o professor de Língua Portuguesa não deve utilizar a gramática como o único instrumento de ensino, mas como apenas uma referência. É preciso aplicar produção de texto que causem a reflexão entre os alunos.

          Não somente o professor, mas também o núcleo gestor deve trabalhar juntos com o objetivo de promover uma boa educação. A Linguística e os PCNS contribuem para um ensino produtivo de Gramática.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

           A análise feita expõe uma discussão em relação as Gramáticas Normativa, Descritiva e Reflexiva, incluindo seu objeto de estudo. Fazendo uma abordagem diante de qual Gramática deve ser trabalhada na sala de aula.

          O desenvolvimento dessa pesquisa contribui de forma significativa e prazerosa para uma reflexão crítica também um aprofundamento das Gramáticas em estudo. Discutindo suas vantagens e desvantagens diante de um ensino que promova interação entre os alunos. Cabe ressaltar os PCN e a Linguística que tem o objetivo de melhorar esse quadro de ensino entre as gramáticas.

          Espera-se que esse trabalho possa servir como fonte de pesquisa aos profissionais de Língua Portuguesa. Com isso, poderão perceber que o ensino de Gramática não é feito apenas pela Gramática Normativa, mas também deve ser baseado na Descritiva e Reflexiva. A questão da variação e mudança que ocorrem na língua precisa ser trabalhada com os alunos, só assim amenizará os preconceitos linguísticos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS          

1. NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática: conhecimento e ensino. In: Azevedo, José Carlos de. (org.). Língua Portuguesa em debate: conhecimento e ensino. Petrópolis: Vozes, 2000.p. (52-73).

2. NEVES, Maria Helena de. Que Gramática estudar na escola? São Paulo. Contexto. 2003.

3. PARAMETROS CURRICULARES NACIONAIS: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa/Secretária de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1998.

4. TRAVAGLIA, Luís Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática no 1° e 2° graus / 7. ed. - São Paulo: Cortez, 2001.

 

 

 


[1] Artigo elaborado como requisito necessário para aprovação da Disciplina Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa.

[2] Aluna do Curso de Letras, Língua Portuguesa da Universidade Estadual Vale do Acaraú.


Autor: Kamila Moreira De Albuquerque Fontenele


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