Gisele Budchen Como Modelo De Identidade



Gisele Bundchen como Modelo de Identidade

Uma visão sob a ótica da Indústria Cultural, permeada pelos Estudos Culturais

Andréia Pereira Silva

Graice Rose Silva dos Santos

Sandra Mello de Azeredo

Alunas do 5º período do Curso de Comunicação Social/Habilitação Publicidade e Propaganda do Centro Universitário São Camilo – ES

Orientação: Professora Mônica Resende

Resumo:

O objetivo deste trabalho é analisar o processo de identificação da personalidade feminina usando como referência de modelo de identidade, um ícone da moda atual, a "Top" Gisele Bundchen como um elemento da "Indústria Cultural" e sob a ótica dos Estudos Culturais.

Introdução:

De 03 a 08 de junho de 2007, no rio de Janeiro, aconteceu mais uma edição do Fashion Rio, evento de moda brasileira em que são lançadas as novas tendências do próximo verão. As grifes mais famosas do país marcam presença mostrando suas coleções e, vestindo seus "modelitos", as modelos mais charmosas e bonitas (algumas de renome internacional) desfilam em passarelas montadas artísticamente e cheias de glamour, nos lugares mais nobres da cidade: Marina da Glória, arquivo Nacional, Forte de Copacabana, Cine Odeon e nos nobres salões do Copacabana Palace.

Desfilando, seus corpos sarados e suas belas curvas, 'Tops" como Raica, Fernanda Tavares, Adriana Lima, entre outras, dando brilho ao evento. De volta, as passarelas carioca, a presença mais esperada do evento, a Über Model (uma modelo que está acima da moda) Gisele Bundchen.

Gisele completa 10 anos (apenas) de carreira e, toda vez que entra na passarela com seus olhos brilhantes, sua boca sensual, carismática, extrovertida, natural, faz com que todos os olhares se voltem para ela: fotógrafos, publicitários, estilistas, nós pobres mortais. Todos se curvam diante do seu charme.

Gisele é um fenômeno. Seu charme, sua beleza, carisma, sua presença transmite confiança e sua imagem passa credibilidade, vende muito tudo o que anuncia. Já desfilou para as melhores marcas do mundo e recebe cachês milionários para entrar apenas três vezes na passarela.

Amada e invejada, Gisele tornou-se exemplo para milhares de jovens brasileiras que tentam a sorte em concursos de modelos em busca de fama, fortuna e glamour. Nunca a procura pela profissão de modelo foi tão grande e as principais agências de modelo do país ficaram lotadas de meninas que desejam realizar o sonho de morar em Nova York e conhecer o mundo inteiro sem custo nenhum, aparecer nas capas das melhores revistas, ganhar milhões de dólares e ser cobiçada por todos os homens, admirada por mulheres do mundo inteiro.

Gisele tornou-se uma referência feminina, e a partir daí, faremos um estudo da influência da moda na formação de personalidades femininas, num processo de identificação através de modelos de identidade e imitação de ícones.

O fenômeno Gisele Bündchen

Gisele Bundchen nasceu em Horizontina no Rio Grande do Sul numa família de 06 filhas mulheres (ela tem uma irmã gêmea). Em 1993, aos 13 anos e 1,70 de altura, por insistência de sua mãe, se inscreveu num concurso de manequim para corrigir a postura. Jogando vôlei foi descoberta por um olheiro e aos 16 anos foi para Nova York e não parou mais. De origem humilde e modesta, Gisele diz que embora possa comprar o que quiser não é apegada a coisas de valor material, pois cresceu usando as roupas que passavam de irmã para irmã e foi ensinada a dividir. Na escola ganhou o apelido de Olívia Palito e já foi dispensada de alguns trabalhos no início da sua carreira por ter um nariz um pouco grande. Já desfilou para as melhores marcas do mundo e em entrevista para revista Vogue Brasil, declarou que já chegou a trabalhar 5 meses seguidos sem um único dia de descanso. Ela foi uma das responsáveis pelo fim da magreza que as modelos do inicio da década de 90, encabeçadas por Kate Moss, exibiam nas passarelas. Já admitiu comer de tudo e não se alimenta só de folhas e bolachas de água e sal.

É figura constante na mídia, ora por suas novas campanhas, ora por seus supostos cachês exorbitantes ou por causa da sua vida pessoal. Nomes como o do ator Rodrigo Santoro, o jogador italiano Francesco Coco, o jogador de pólo Ricardo Mansur estiveram ligados ao seu na lista de namorados, sendo o mais famoso deles e com maior duração o do ator Leonardo Di Caprio, um namoro que durou 06 anos. Na cerimônia da entrega do Oscar de 2004 brilhou mais do que a própria estatueta ao acompanhá-lo à premiação. O romance chegou ao fim e logo em seguida surgiram rumores que ela estaria namorando o surfista Kelly Slater. Algumas fotos, poucas declarações, mas nunca esteve envolvida em nenhum escândalo que pudesse colocar sua carreira em risco. Gisele é uma trabalhadora incansável, requisitadíssima, ela participa dos principais eventos do eixo da alta-costura mundial. Estilistas e marcas famosas marcaram presença nas passarelas através de suas medidas perfeitas – 89 cm de busto, 57 cm de cintura, 89 cm de quadril - , seus lindos olhos azuis, seus cabelos dourados, tudo bem estruturado dentro de seus 51kg e 1,80 de altura. Entre eles, estão nomes como Christian Dior, Dolce & Gabbana, Marc Jacobs e Michael Kors.

Identificação

As meninas, quando pequenas, costumam ter uma atitude com movimentos, gestos e expressões, cópias do comportamento da mãe, que provavelmente não ensinou as filhas a se portarem dessa forma. Não é pretensão das mães ensinarem as filhas determinadas respostas, como também, as meninas não desejavam aprende-las. O que ocorre, nesse caso, é um processo mais sutil, a identificação, que pode ser considerada como um impulso ou motivo assimilado para ser como outro indivíduo. A criança se identifica com um herói, pensa, comporta-se e sente como se as particularidades deste fossem as suas próprias, ou então, se identifica com um dos pais e tenta repetir em sua vida os ideais, atitudes e comportamentos desse progenitor. A pessoa ou grupo que a criança se identifica são denominados de modelo.

A identificação principia no começo da vida num processo que se estende por toda existência e, conforme a criança amadurece, continua a identificar-se com os pais desenvolvendo outras características deles. A partir do momento que seu mundo social aumenta, a criança encontra novos modelos de identificação entre seus colegas, professores, heróis de TV, astros do rock e do cinema, e busca copiar seu comportamento, suas características e seus ideais. Por fim, segundo Paul H. Mussen (1975):

"a personalidade do indivíduo estará baseada numa longa série de identificações; terá incorporado algumas das características dos pais, mas terá também adotado o comportamento e as idéias, atitudes e valores de muitas outras pessoas."

"o laço mútuo existente entre os membros de um grupo é da natureza de uma identificação emocional e, pode-se suspeitar que esta qualidade comum reside no laço com o líder." (Freud, 1922)

Nesse processo de identificação, também ocorre à empatia, que é a capacidade de nos identificarmos espiritualmente com outras pessoas, por em prática os mesmos sentimentos que essas pessoas experimentam ou viver mentalmente situações que desejaríamos experimentar. O sentimento da empatia se manifesta no comportamento externo e, acontece, quando uma pessoa vivencia uma situação que despertaria em nós, caso estivéssemos no lugar dela, um sentimento apropriado para aquela situação, identificando-nos com a pessoa. Segundo Freud (1922), um caminho por via da imitação conduz da identificação à empatia, isto é, a compreensão do mecanismo pelo qual ficamos capacitados para assumir qualquer atitude em relação à vida mental."

Como vimos, a identificação é um processo através do qual o indivíduo incorpora a sua personalidade valores que, quando revelados, tendem a se confundir com um processo muito parecido ao da imitação. Mas, cabe destacar que enquanto a identificação é permanente, uma vez que os valores se incorporam à personalidade, a imitação é uma espécie de cópia superficial e passageira do comportamento modelo.

Corpo e Mistificação

De acordo com Jurandir Freire Costa, o ser humano recorre ao corpo como critério de identidade e o individualismo narcísico e hedonista elege o corpo e as sensações como os depositários dos valores pessoais (Costa, J.F. 2004). O ser humano, a partir do aperfeiçoamento das técnicas científicas, acredita poder controlar o envelhecimento, o desgaste biológico, reprimir a morte e aumentar a longevidade, sendo essa cultura, a base pela qual se sustenta que a felicidade e o conhecimento são adquiridos, principalmente através do âmbito do consumo, perfilando a esta lógica, investimentos massivos na produção da imagem corporal feminina. O corpo resume-se na linguagem do consumo como o mais belo, valioso e reluzente de todos os objetos.

"Após um milênio de puritanismo, em especial na Idade Média, quando a influência da Igreja era grande e toda e qualquer preocupação com o corpo era proibida, há uma redescoberta do corpo simbolizando a libertação física e sexual ubíqua na publicidade, na moda e na cultura das massas, numa obsessão pela juventude, elegância, virilidade/feminilidade, cuidados, etc. Uma conexão com o mito do prazer testemunhando que o corpo se torna objeto de salvação." (Baudrillard, 2005, 136)

Na sociedade contemporânea, o culto ao corpo torna-se uma das características mais marcantes, crescendo amiúde o número de cirurgias estéticas, lipoaspirações, aplicações de botox, etc. as academias estão cada vez mais cheias de mulheres de todas as idades, numa constante valorização da aparência jovem e bela, do corpo esbelto, tornando o corpo objeto de consumo, onde substanciosos investimentos produzem nas pessoas, uma incessante busca da imagem ideal.

Nas relações de gênero (termo usado para teorizar a questão da diferença sexual), essa cobrança das mulheres reproduz a submissão, controle e manipulação a que são impostas, mantendo-as assim, afastadas dos reais problemas sociais e culturais do seu tempo.

Socialmente construídas, as diferenças de gênero, estão muitas vezes a serviço de interesses e necessidades sociais (Strey, 1998), onde desde pequenos espera-se que as meninas e os meninos sejam cada um de uma forma distinta. A socialização feminina é feita à partir de um corpo frágil, passivo, desprovido de força, sendo a beleza física fundamental. O contrário dá-se com os homens, estimulando-se a força, agressividade, virilidade. Essa construção social acontece ao longo da história, inserindo-se a modelagem dos corpos pelas normas, representações culturais e simbólicas próprias de cada sociedade, onde o corpo forma um vínculo de interação entre o indivíduo e o grupo, a natureza e a cultura, a coerção e a liberdade.

Tanto Détrez (2003) como Mauss (1974) falam do corpo: que em toda sociedade, em qualquer tempo e lugar, desenvolve eficientes métodos e sucessivamente tradicionais de trabalhar o corpo do ser humano, devido suas necessidades resultantes do corpo social. No seio das sociedades o corpo sempre foi alvo de manipulações físicas e simbólicas, desde a educação dos sentidos até as técnicas simbólicas, onde cada sociedade peculiar produz sobre o mesmo, várias ações funcionais baseadas em ciências corporais: postura, tendências alimentícias, higiene, nas práticas sexuais e técnicas esportivas, etc.

Assim, de acordo com Heilborn (1997), o corpo além de entidade natural é também uma dimensão produzida pelos efeitos da cultura, ou seja, o corpo se torna o objeto através do qual expressamos e demonstramos os modelos de identidade com o qual nos identificamos. Assim, o corpo não fala por si próprio, se ele anuncia algo é aquilo que a própria cultura o autoriza a falar, como uma vitrine de nosso tempo, um meio de comunicação que através de símbolos ligados à linguagem, gestos, roupas, instituições as quais pertencemos permite nossa comunicação com o outro.

Entender os sentidos construídos para o corpo na atualidade, requer uma caminhada, mesmo que breve pela história, com objetivo o de desvelar peculiaridades que foram incorporadas ao mesmo. O corpo era valorizado pela sua capacidade atlética, sua saúde e fertilidade. Em Esparta, atividades corporais recebiam um lugar de destaque na educação de jovens, que buscavam um corpo saudável e fértil. Nas demais cidades Gregas, a atividade corporal encontrava-se em torno dos Jogos Olímpicos. Hoje, vive-se a revolução do corpo, valores relativos à beleza, saúde, higiene, lazer, alimentação, atividades físicas têm reorientado um conjunto de comportamentos na sociedade, imprimindo um novo estilo de vida, mais livre, narcísico e hedonista do corpo. Novas formas de pensar o corpo têm sido reinventadas constantemente, num processo que vem alterando significativamente a relação que os indivíduos têm com seu corpo. O corpo virou objeto de consumo e totalmente fragmentado, o culto ao corpo ganha uma dimensão social inédita, cercado de enormes investimentos. O corpo em forma mostra-se como um sucesso pessoal, ao qual, homens e mulheres podem aspirar. Hoje se vive na era da magreza, dos regimes, da lipoaspiração, dos implantes de próteses de silicone, botox, das academias, da construção de corpos, ou seja, da metamorfose dos corpos.

Moda: uma carteira de identidade

A moda estabelece a identidade social do indivíduo para si e para os outros. O conflito entre o eu individual e o eu social busca o equilíbrio através dessa forma de comunicação. A moda é uma forma de expressão. Podemos dizer que, a maneira de se vestir - não só desta era pós-moderna como em todo o decorrer da história da humanidade - é uma carteira de identidade.

Processos sociais na alta modernidade fazem proliferar situações, experiências, estímulos, ilimitados e em ritmo acelerado, fazendo os sujeitos transitarem entre demandas e desejos diversos, impossibilitando-os de constituírem-se como "sujeito unificado", tais processos também estimulam o declínio das antigas identidades e o surgimento de novas identidades que fragmentam o sujeito moderno, tornando-o mutante e gestor de "identidades próteses".

A subjetividade moderna é capaz de comportar uma pluralidade de identidades, porque se encontra imersa em práticas sociais descontínuas, que são constantemente reformuladas, instituindo processos de identificação - sejam de caráter social, político, religioso, cultural, sexual, entre outros - que sustentam  uma verdadeira  "política da diferença". A moda, em especial a do vestuário, cada vez mais associada às formas do corpo e ao jeito de ser, exprime e compõe identidades. O corpo sempre foi marcado por pinturas, vestes e ornamentos, cheios de significados que pertencem a culturas especificas, trata-se, pois, de um corpo social. Ele representa matéria, fantasia, arte e discurso, associado à indumentária, demarca papéis e lugares sociais como sacerdotes, chefes, guerreiros, homens, mulheres, patricinhas, mauricinhos, gangs, tribos, artistas... Compõe o sujeito social em suas várias identidades. O vestir envolve gestos, comportamentos, escolhas, fabricação sobre o corpo para a montagem de personagens sociais coletivos ou individuais, um modo pelo qual é possível exercer comunicação, exprimindo noções, qualidades, posições, significados.

A moda não é composta apenas das criações de grandes estilistas ou centros que definem as tendências que todos vão adotar, pois também vem das ruas, onde jovens ou populações expressam ideais e conceitos, que inclusive podem inspirar os estilistas, formando uma verdadeira via de mão dupla. As tendências desfiladas nas passarelas resultam de intensas e extensas pesquisas de comportamento, e podem não ser aceitas.

O historiador inglês, Ted Polhemus, criou o conceito de "supermercado de estilos", que tenta dar conta da existência de uma multiplicidade de estilos que permite as pessoas a montar e desmontar visuais com vários estilos estéticos, ideológicos, artísticos, com peças luxuosas ou populares, compondo visuais singulares. A vida social nos impõe essa variedade de formas de ser e de viver.

A roupa é componente das identidades que construímos para  buscar estar mais próximo do que queremos ser ou do que queremos parecer ser. Segundo autores como Baudrillard (1995) e Lasch (1986) essa busca se situa numa sociedade intensamente narcisista e individualista. Simmel (2005) em seu estudo sobre a psicologia da moda aponta duas necessidades contraditórias no homem, a necessidade de integração que o faz buscar ser igual aos outros, e a necessidade de singularidade que o faz buscar sua particularidade com o todo social, embora imerso numa realidade massificante, gera impulsos de mudança, que a lógica social logo absorve como fez com a moda hippie, punk, hip hop, glubber, entre outras. Assim, a moda se apresenta como um campo de encontro do individuo e do social, da singularidade e da massificação. A variabilidade e semelhanças que os estilos estéticos permitem não elimina a existência de distinções que as marcas - etiquetas - mantêm, de forma subliminar, mesmo que sua primazia no cenário imediato da sociedade tenha sido ocupada pela aparência colorida e divertida dos modismos tribais estilizados.

A moda emerge poderosa, com toda a complexidade de objeto epistemológico dos mais instigantes. O psicanalista, Airton Embacher, com grande experiência e atuação na área de moda, transformou seu mestrado em Psicologia Social num livro, "Moda e Identidade: A construção de um estilo próprio", o tema trabalha com um grande paradoxo: sendo, por princípio, genérica e impessoal, a ponto de negar a individualidade do sujeito e ao mesmo tempo, a moda só tem e faz sentido à medida que permite a expressão dessa mesma individualidade. Segundo Embacher, a grande realização humana na conquista da identidade pessoal é conseguir adequar os papéis sociais, que é obrigada a desempenhar, à capacidade de pautar essa identidade pelo seu desejo.

A moda e a personalidade

Nas sociedades pré-modernas o indivíduo nascia e morria como membro de um mesmo clã, de uma mesma tribo ou grupo, e a identidade não era uma questão problemática sujeita a discussão. Na modernidade, identidade passa a ser múltipla, móvel, pessoal, reflexiva e sujeita à mudanças e inovações. Mas, apesar disso, certos teóricos da identidade pessoal caracterizam-na por um reconhecimento mútuo, também sendo substanciais e fixas tendo origem num conjunto de papéis e normas.

Passamos a escolher, criar e recriar a nossa identidade de acordo com a nossa possibilidade de vida, influenciados pelo outro que se torna constituinte de nossa identidade e, buscamos obter reconhecimento para assumir essa nossa identidade adquirida.

As teorias de identidade se confrontam com as de intimidade do indivíduo moderno. Nunca estamos convictos de que fizemos a escolha certa, em se tratando da nossa "verdadeira" identidade, por isso, a ansiedade irá constituir a experiência do "eu" moderno de que a identidade poderá mudar e modificar, afinal, modernidade significa um processo de inovação, renovação e novidade. A identidade na modernidade também foi ligada à individualidade, ao desenvolvimento de um "eu" único e particular do que antes era do grupo, da tribo e do coletivo. Na sociedade de consumo e de predomínio da mídia, surgida depois da segunda Guerra Mundial, a identidade tem sido cada vez mais vinculada ao modo de ser, à produção de uma imagem, à aparência pessoal. É como se cada um tivesse de ter um jeito, um estilo e uma imagem particular para ter identidade, embora, paradoxalmente, muitos modelos de estilo e aparência provinham da cultura de consumo, portanto, na sociedade de consumo, a criação da individualidade passa por grande mediação.

Para os teóricos pós-modernos, como a Escola de Frankfurt que rejeita a noção existencialista e racionalista de identidade, afirmando que é um mito e uma ilusão, devido à cultura de individualismo estar-se fragmentando e desaparecendo, pelo fato dos processos sociais que nivelam as individualidades na sociedade racionalizada, burocratizada, consumista e dominada pela mídia.

A Teoria Crítica é baseada na indústria cultural, termo surgido no texto "Dialética do Iluminismo" (Adorno e Horckeimer), entre 1942 e 1947. Analisa a sociedade americana nos anos 30 e 40, através de filmes (cinema), rádio e seminários (jornais e revistas) que constituem um sistema, que em que cada setor se harmoniza entre si e todos se harmonizam reciprocamente. Esse sistema condiciona de forma total o tipo e a função do processo de consumo e sua qualidade, bem como a autonomia do consumidor impondo os gostos do público e as suas necessidades através de estereótipos e baixa qualidade. Fornecem modelos de identidade e enaltecem a ordem social vigente. Nesse contexto, fazemos uma análise do fenômeno Gisele Bundchen que é mitificada como modelo de beleza ideal , transformada emmodelo de identidade, que através da mídia, divulga-se como um padrão, que a mulher para ser bela, desejada e obter sucesso na vida e na profissão, precisa equiparar-se a ela: Gisele Bundchen.

"Em última análise, a mulher não pode racionalmente confiar no fogo do seu olhar, nem na doçura da sua pele: tais características, que lhe são próprias, não lhe conferem qualquer certeza." (Bredin, La Nef)

"...também a sedução e o narcisismo são previamente revezados por modelos industrialmente produzidos pelos "mass média" e transformados pelos signos "referenciáveis"....Cada qual encontra a própria personalidade no cumprimento de tais modelos." (Baudrillard, p. 97)

Segundo Baudrillard, a beleza torna-se para a mulher o imperativo absoluto e religioso, constituindo a qualidade fundamental e imperativa de todas as que cuidam do rosto e da linha como sua alma, revelando-se como símbolo de eleição ao nível do corpo, como também, o êxito no plano dos negócios. A beleza se constitui num imperativo absoluto pelo simples fato de ser uma forma do capital e, seguindo nessa lógica, a ética da beleza que também é a da moda, pode definir-se como a redução de todos os valores concretos e dos "valores de uso" do grupo (energético, gestual e sexual) ao único "valor de troca" funcional que, em seu devaneio expressa a idéia de corpo glorioso e reluzente, à idéia do desejo e do prazer – negando-os e esquecendo-os categoricamente na sua realidade para se esgotar na troca de símbolos. Diz-se, então, que a imposição da beleza é uma das características da imposição funcional, valendo tanto para os objetos como para as mulheres, sendo que estas se tornaram estetas similares do designer ou do estilista da empresa.

Hoje, o objeto de desejo no mercado é o corpo da jovem, uma valorização suprema do formato com prejuízo ao conteúdo, onde o fútil e o vazio imperam, num processo que se concretiza, basicamente, pela apresentação da imagem, disseminados pelos meios de comunicação de massa, que têm distinto papel, pois adquirem destacado espaço neste processo de interação, por serem os principais difusores de imagens.

É um bombardeio midiático de valores e padrões de beleza, ancorados em personalidades como modelos de referência, transformados, mitificados e trocados de tempos em tempos. Dando suporte a esse processo, a moda vem compor como forma de expressão, ditando tendências que refletem e estabelecem a identidade social do indivíduo. Referência no contexto da moda podemos dizer que, Gisele Bundchen é um produto da indústria cultural disseminada pela mídia.

Uma carreira de sucesso, sendo uma das modelos mais requisitadas e mais bem pagas do mundo, costuma estar sempre na mídia por suas campanhas, por seus cachês exorbitantes ou por causa de sua vida pessoal. Na cerimônia do Oscar/2004, ao acompanhar à premiação, à época seu namorado Leonardo Di Caprio, brilhou mais do que a estatueta.

Meninas cada vez mais jovens com idades entre 12 e 13 anos, se inscrevem em busca desse sonho, concorrendo a prêmios, em média, de US$ 100 mil e garantindo visibilidade na imprensa.

Para alcançar o objetivo de se tornar "top model", ou apenas buscando preencher os padrões de beleza impostos pela mídia, à mulher se deixa levar ao consumo desenfreado de práticas corporais cada vez mais sofisticadas e agressivas, como implantes de silicone, cirurgias plásticas, lifiting, lipoaspiração, tornando-se ela própria um objeto de consumo.

"É evidente (basta apenas lançar um olhar sobre as outras culturas) que beleza e magreza não possuem qualquer afinidade natural. A gordura e a obesidade também foram belas noutros lugares e noutros tempos. Mas, esta beleza imperativa, universal e democrática, inscrita como direito e dever dos todos no frontão da sociedade de consumo, manifesta-se indissociável da magreza. A beleza não pode ser gorda ou magra, pesada ou esbelta como poderia ser numa definição tradicional fundada na harmonia das formas. Só pode ser magra e esbelta, em conformidade com a atual definição da lógica combinatória de signos, regulada pela mesma economia algébrica que a funcionalidade dos objetos ou a elegância de um diagrama. Será de preferência magra e descarnada no perfil dos modelos e manequins, que se revelam ao mesmo tempo como a negação da carne e exaltação da moda." (Baudrillar, 2005. p.149/150)

A figura da balança torna-se uma obsessão, e o objetivo em se alcançar estatura e peso dentro dos parâmetros considerados normais para cada faixa etária, passa a dar lugar a uma fixação em manter um único peso, medidas que não podem ultrapassar um único centímetro. É preciso ser magra, atender ao conceito de corpo referenciado na ideologia de nossa época, fruto das políticas de corpo, fortemente caracterizadas pela lipofobia, ou seja, a obsessão pela magreza e a rejeição maníaca à gordura. Esse comportamento é cada vez mais precoce, em meninas de sete, oito anos, sugestionadas por imagens divulgadas de formas diversas, como por exemplo, as bonecas-manequim, a Barbie e a Susi, inspiradas em famosas modelas, entre elas Gisele Bundchen. Nesse sentido, Brougére (2000) alerta para a noção de que a boneca, mais do que uma representação da realidade, refletiria uma imagem social da realidade. O mundo que cerca as bonecas trata mais de significar do que representar a realidade, ou seja, a boneca-manequim refletiria sobre tudo, a imagem de infância ideal para nossa sociedade. Assim, três aspectos devem ser considerados: a autonomia corporal, a preocupação em não engordar e uma tendência a deturpação da imagem corporal.

Essa preocupação com o corpo, a prática de regimes alimentares, a partir de idades tão precoces podem vir a se tornar, de acordo com o desenvolvimento, formativo de sua representação acerca do corpo, riscos de uma patologia cada vez mais freqüente entre as jovens: a anorexia, considerando isso, como um sinal de nosso tempo sem que a exacerbação da cultura corporal adulta burguesa, que vem ampliando seu domínio, desde meados do século passado, difundindo-se como senso comum entre diferentes faixas etárias, classes sociais, etnias e cultura.

Para lá das determinações da moda, que são incontestáveis, Baudrillard afirma ser esta a pulsão que alimenta o irreprimível encarniçamento auto-destrutivo, irracional, em que a beleza e a elegância, visadas na origem, se reduziram à simples álibis para o exercício disciplinar quotidiano, obsessivo. Em sua teoria, Baudrillard diz que, por reviravolta completa, o corpo transforma-se em objeto ameaçador que é preciso vigiar, reduzir e mortificar para fins "estéticos", com os olhos fixos nos modelos emagrecidos e descarnados da Vogue (revista de moda internacional), onde é possível decifrar toda a agressividade inversa de uma sociedade da abundância em relação ao próprio triunfalismo do corpo e de toda recusa veemente dos próprios princípios, ou seja, a conjunção da beleza e da repressão no culto da linha – em que o corpo, na sua materialidade e sexualidade, já nada tem a ver, limitando-se a servir de suporte a duas lógicas inteiramente diferentes da lógica da satisfação: o imperativo da moda, princípio de organização social, e o imperativo de morte, princípio de organização psíquica. A mística da linha, a fascinação da magreza exercem grande influência unicamente porque são formas de violência e fonte de sacrifício para o corpo, ao mesmo tempo entorpecido na sua perfeição e violentamente vivificado como acontece nos ritos de imolação. Todas as contradições de semelhante sociedade se encontram compendiadas ao nível do corpo.

O corpo representado na mídia é um corpo musculoso, sarado, restrito a uma parcela muito pequena da sociedade, limitada principalmente pela condição financeira. Porém é esse corpo que serve de padrão, norma de beleza, modelo e sinônimo de saúde e higiene à grande maioria das mulheres e um campo em ampliação para os homens, numa crescente glorificação do corpo, sua exibição pública é cada vez maior, deixando transparecer o que antes era escondido e, aparentemente, mais controlado. Para Goldenberg & Ramos (2002), as regras da atual exposição dos corpos, parecem serem fundamentalmente estéticas, sendo que, para atingir a forma ideal e expor o corpo sem constrangimentos, é necessário investir na força de vontade e na autodisciplina, onde abrindo espaço para uma indústria do corpo; a matéria física precisa entrar numa linha de produção que incluí ginástica, musculação, regimes alimentares, tratamentos estéticos, tratamentos de saúde, consumo da moda e de bens. As indústrias da beleza, da saúde e do status têm no corpo seu maior consumidor e gera academias, estéticas, salões de beleza, spas, clínicas médicas, hospitais, estilistas, costureiros, boutiques,..O corpo está a serviço, portanto, da produção que o domina, utilizando-se da ilusão de faze-lo belo, saudável e forte.

Nessa metamorfose dos corpos, a moda tem função importante com infindáveis sugestões de como ser ou parecer, através de tribos, estilos, comportamentos, atitudes, e roupas. A simulação não está consubstanciada sobre a representação, onde o corpo construído é outra característica do tempo pós-moderno, talvez a mais utilizada, mas, sobre o simulacro, ou seja, sobre a aparência sem realidade. No simulacro o corpo se constrói diferentemente para cada situação, para cada vontade, capaz de criar uma pluralidade de sentidos para si mesmo.

Os recursos mais utilizados para construir o simulacro é a vestimenta, os adereços e a maquiagem. Esses recursos não são obras da pós-modernidade, mas nela foram aperfeiçoados e adquiriram o caráter de simulação na associação com outras técnicas, como a da cirurgia plástica, da lipoaspiração, dos tratamentos de beleza, da musculação. A aparência criada nesse processo, volta-se para o imaginário, construindo uma cadeia de sentidos que se adeqüam ao perfil atual. Nesse sentido, o corpo humano vestido, maquiado, cheio de adereços, tatuado, modificado recobre-se de um segundo significado, verdadeiramente uma representação do simulacro (Rosário, 2004).

Nesse contexto, podemos citar a modelo brasileira Ângela Bismarck como um simulacro de si mesma, como também a renúncia do símbolo original e a confirmação do sentido estético ocidental: cabelos lisos, loiros, olhos amendoados, linhas do rosto afiladas, corpo sarado, modelado. Tantas cirurgias plásticas fizeram com que o original ficasse perdido, distanciando-se cada vez mais do significado do primeiro, surgindo sempre um signo novo, capaz de transformar-se antes de se estabilizar. E assim, neste processo, a sociedade de consumo cria e recria mitos que são copiados numa sucessiva troca de identidades, de sucessivos modelos: Madona, Sandy, Britney Spears, Xuxa, Gisele Bundchen...

Conclusão

No último século foram várias as conquistas femininas, adquirindo espaço no mercado de trabalho, independência no lar, projeção na sociedade, quebrando antigos tabus e revolucionando os costumes. Mas, ainda assim, continuam suscetíveis à imposição social de um padrão beleza ideal que muitas vezes acarreta uma distorção da imagem corporal e transtornos alimentares.

As mulheres, em especial as mais jovens, insatisfeitas com sua aparência, buscam modelos de identidade, que são copiados e imitados como forma de suprir suas necessidades pessoais, seus anseios de perfeição, objetivando ser aceita pelo grupo sendo parte dele e, ao mesmo tempo, ser vista também como uma referência de beleza, sedução e sucesso. O corpo humano, além de seu caráter biológico, é afetado pela religião, grupo familiar, classe, cultura e outras intervenções sociais, cumprindo assim uma função ideológica, isto é, a aparência funciona como garantia ou não da integridade de uma pessoa, em termos de grau de proximidade ou de afastamento em relação ao conjunto de atributos que caracterizam a imagem dos indivíduos em termos do espectro das tipificações. Os mitos são como heróis que fazem parte, simultaneamente, da vida comum e de um mundo distante. É esse duplo caráter que garante sua eficácia enquanto mitos, pois despertam, no indivíduo um processo de projeção-identificação, tornando-se modelos de vida.

Aliada fundamental na construção dos corpos, a mídia adquire um imenso poder de influência sobre os indivíduos, generaliza a paixão pela moda, expande o consumo de produtos de beleza e torna a aparência uma dimensão essencial da identidade para um maior número de mulheres e homens. As construções feitas para o corpo na mídia, permitem sempre que o corpo retome o seu sentido original, pois uma vez alcançado o prazer da construção se sentidos simulados, atingindo o imaginário e a fantasia, é possível retornar a outra situação, talvez a própria realidade. Nesse sentido, a ambigüidade torna-se peça chave nos significados do corpo. Utilizando-se desse recurso, Gisele Bündchen num dia tem cabelo liso, no outro crespo, numa semana aparece sensual, na outra comportada, num momento adolescente, em outro, mulher feita (Rosário, 2004).

A mídia, de acordo com Goldenberg & Ramos (2002), apresenta o corpo como um objeto a ser reconstruído, seja em seus contornos ou em seu gênero. Através de mecanismos de incorporação de estereótipos corporais, o corpo torna-se uma superfície virtual, um terreno onde são cultivadas as identidades sexuais e sociais. Saturado de estereótipos, ele aparece como um quadro inacabado e transforma-se em imagem do corpo, torna-se assim um objeto de autoplastia.

Atualmente os indivíduos, com corpos mutáveis, renováveis, em constantes metamorfoses, têm na imagem do corpo o processo criativo principal de tantas releituras de si mesmo, a reprodutividade em série. Dessa forma o corpo virou "o mais belo objeto de consumo", e a publicidade, que antes só chamava a atenção para um produto exaltando suas vantagens, hoje em dia serve, principalmente, para produzir o consumo como estilo de vida, procriando um produto próprio: o consumidor, perpetuamente intranqüilo e insatisfeito com a sua aparência.

Nesse contexto, as mulheres apesar de todas as conquistas alcançadas, com a grande revolução dos costumes, ainda deixa transparecer muitos desequilíbrios na tão almejada igualdade de poderes entre homens e mulheres. Um deles diz respeito à imagem do corpo da mulher, que ainda é permeada por discriminações, pois atrás da aparência de independência da mulher, esconde-se sua submissão, dependência e inferioridade, visto que ao corpo da mulher é imbutido a obrigação de estar sempre belo e jovem. A "libertação da mulher" numa sociedade escravista como a nossa resumiu-a à super-objetos, pois se pensam livres, mas aprisionadas numa exterioridade corporal que apenas esconde pobres meninas famintas de amor e dinheiro. Escravas aparentemente alforriadas numa grande senzala sem grades, vítimas da sociedade de consumo e de seus modelos de identidade.

Referencias Bibliográficas:

- BAUDRILLARD, Jean. A Sociedade de Consumo. Lisboa/Portugal: Edições 70, 2005.

- GOLDENBERG, Mirian. Nu e Vestido: dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2002.

- KELLNER, Douglas. A Cultura da Mídia. Bauru, SP: EDUSC, 2001.

- BROUGÉRE, Gilles. Brinquedo e Cultura. São Paulo: Cortez, 2000.

- Sites:- www.efdeports.com/revista digital. Corpos em Metamorfose: um breve olhar sobre os corpos na história. Buenos Aires – Ano 70 – nº 19. Dezembro, 2004.

- www.miniweb.com.br

- www.noticia.truenet.com.br

- www.adital.com.br

 


Autor: Graice Rose Silva dos Santos


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