Obama e o nobel da paz



Barack Obama é o ganhador do Prêmio Nobel da Paz deste ano, pela sua atuação destacada na diplomacia internacional e por seus esforços pela cooperação dos povos. Todavia, sua reputação e a esperança que ele representa (não só para os norte-americanos, mas para todo o planeta) não escondem a surpresa da escolha. Mas quem diria! O Comandante Fidel, até ele, considerou a outorga “uma medida positiva”. Tão polido quanto Fidel, mas já com outra perspectiva, o Dalai-Lama cumprimentou Obama dizendo que espera que ele lute pela liberdade no mundo. Lech Walensa, uma das figuras mais importantes da política na Europa nos anos 80, se restringiu a dizer que a escolha de Obama fora “precipitada”. Note-se que as três respostas dão um tom de aceitação, mas pouco convincente. Não se ouviu até agora, ao menos das celebridades, um sonoro “sim, foi merecido”. Realmente, se considerarmos alguns dos antigos ganhadores, como Nelson Mandela, Madre Tereza, o próprio Dalai Lama, o Bispo Desmond Tutu, podemos dizer que a atuação concreta de Obama até agora foi, na melhor das hipóteses, curta e modesta para lhe garantir o merecimento do prêmio acima de quaisquer suspeitas.

Isso, contudo, não é novidade. A escolha dos ganhadores do Prêmio Nobel em suas respectivas categorias raramente encontra uma aceitação total, mas como as contribuições científicas normalmente são pouco conhecidas e difundidas, o foco principal está sempre no Nobel da Paz. Basta lembrar da polêmica gerada pela outorga do prêmio a Yasser Arafat, em 1994, quando o Comitê tomou o cuidado de dividir a honraria com Yitzhak Rabin e Shimon Peres (afinal, não é difícil imaginar que laurear apenas um dos lados rivais poderia deflagrar um novo conflito entre Israel e Palestina). Neste ano, felizmente, Obama não precisará dividir o prêmio nem com Hugo Chávez, nem com Mahmud Ahmadinejad; o diploma, o glamour e o milhão de dólares que acompanham o prêmio são só dele.

A significação que há por detrás dessa escolha é algo acerca do qual só nos resta conjecturar; mas uma coisa é certa: seria de uma superficialidade extrema considerar que um prêmio como o Nobel é dado apenas porque uma figura é “popular”, ou pelo cargo que ocupa. Não é o caso. Sabemos, entretanto, que após o silêncio, o som é ouvido com mais nitidez e com mais atenção: por isso, após os desmandos e descaminhos da administração Bush, muito se espera de Obama que, como político hábil que é, soube tirar proveito desse status quo e assumiu, desde sua campanha, a imagem de um pop star. Todavia, o risco dessa empreitada quase messiânica da administração Obama é o recrudescimento da esperança perante a realidade dos desafios externos (representados pelo papel sui generis que os Estados Unidos desempenham na política mundial) e internos (impostos pela crise econômica que só evidenciou desequilíbrios sérios existentes na macroeconomia americana desde longa data), que exigirão mais que uma boa imagem e um bom discurso para sua solução.

Tudo isso indica o que há de implícito na escolha de seu nome para o prêmio: Obama ganhou o Nobel não pelo que fez, mas pelo que se espera que faça. A Fundação Nobel, como poucas vezes desde sua origem, deixa de considerar apenas o passado e volta os olhos para o futuro e, ao adotar essa postura, passa a gerar ainda mais expectativas sobre a figura de Obama, além de se arriscar a mais um erro histórico. Assim, para Obama, o poder se transforma em dever: há que se substituir, portanto, o “yes, we can”, por “yes, we must”. E isso me faz lembrar com clareza uma frase de um amigo com quem tive o prazer de trabalhar: “o preço de uma condecoração não merecida é a obrigação de ostentá-la”. Que Barack Obama se faça merecedor do prêmio. É o que o mundo aguarda desesperadamente.

 

Jacintho Del Vecchio Junior é Capitão da Polícia Militar, Mestre e Doutorando em Filosofia pela USP. E-mail: [email protected]

Originalmente publicado em 18/10/2009, no Jornal de Jundiaí


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