Sistema acusatório X Art. 156, I, do CPP



1. INTRODUÇÃO

 

                     Quando ocorre uma infração penal, surge a pretensão punitiva do Estado, que consiste no direito – dever de aplicação da sanção prevista ao autor em virtude da conduta reprovável pelo Direito Penal.

 

                    A sanção penal deve ser aplicada após um processo que possibilite a concretização do poder estatal de punir da forma mais eficaz, sempre considerando os direitos fundamentais que garantem a preservação da dignidade do indivíduo.

 

 

2. DESENVOLVIMENTO

 

                     Na história do direito, pode-se citar a existência de três Sistemas Processuais, sendo eles:

 

                     Sistema Inquisitórioà sistema em que há extrema concentração de poderes nas mãos do julgador (juiz inquisidor), sem separação das funções de acusar, defender e julgar. Não havendo, portanto, a observância do contraditório e da ampla defesa;

                     Sistema Acusatórioà sistema em que há separação das funções de acusar, defender e julgar, prevalecendo o princípio da imparcialidade do juiz, assegurando às partes igualdade de condições e observância do contraditório e da ampla defesa, tendo o Ministério Público como titular da ação;

 

                    Sistema Mistoà sistema em que combina os elementos do sistema inquisitório e sistema acusatório.

 

                    Atualmente, apesar do sistema acusatório não se encontrar previsto expressamente na Constituição da República Federativa do Brasil, percebe-se que a Carta Magna implicitamente consagra este sistema, sendo reconhecido em vários de seus dispositivos, como por exemplo:

 

 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados  em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com meios e recursos a ele inerentes;

 

Art. 129 São funções institucionais do Ministério Público:

I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei.

 

                    Logo, nota-se claramente que a ordem constitucional se preocupou em:  garantir a igualdade entre os litigantes; o contraditório e ampla defesa ao acusado; afastar o órgão jurisdicional da persecutio criminis; assegurar a titularidade da ação penal ao Ministério Público; preservar a imparcialidade do juiz e separar a função do juiz da função acusatória. Assim, não há dúvidas a respeito da consagração do sistema acusatório em nosso ordenamento Jurídico.

 

                    Contudo, é inegável a persistência da influência do sistema inquisitivo na nossa legislação ordinária. Prova disso é a nova redação do art. 156, I, do Código de Processo Penal, dada pela Lei 11.719, de 20/06/2008, estabelecendo que:

 

Art.156. Aprova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida. (Destaque nosso)

 

                     A nova redação do artigo supracitado trouxe diversas polêmicas na doutrina brasileira, sendo que muitos doutrinadores consideram tal dispositivo inconstitucional, uma vez que suscita o juiz inquisidor.

             Porém, Ada Pellegrine Grinover[1], uma das autoras da Lei 11.719/08, entende que a atuação do magistrado na produção de provas não compromete a sua imparcialidade, tendo em vista que este não poderia adivinhar o resultado da prova que eventualmente mandou produzir.

             Andrey Borges de Mendonça[2], por sua vez, entende que em relação às provas antecipadas durante o curso do processo, não há dúvidas de que a nova lei andou bem, pois o juiz tem interesse em buscar a verdade real, até mesmo porque já havia no art. 225 do CPP a previsão de que o juiz poderia determinar, de ofício, a produção antecipada da prova testemunhal. Entretanto, acredita ser claramente inconstitucional a autorização conferida ao juiz para determinar, de ofício, a produção antecipada de provas antes do início da ação penal.

                     O doutrinador retromencionado afirma que, se o magistrado atuar quando ainda não há sequer ação penal instaurada, este estará violando a sua inércia, atuando como um verdadeiro juiz inquisidor.  

 

                    Nesse diapasão, importar ressaltar que o STF, na ADIn 1.570, declarou inconstitucional o art. 3º da Lei 9.034/1995, que permitia ao magistrado a realização de investigações pessoais.

 

 

 

3. CONCLUSÃO

 

                    Ante o exposto, considerando que a atual ordem constitucional consagra o sistema acusatório na realização da pretensão punitiva do Estado, separando a função jurisdicional da função acusatória, esta exclusiva do Ministério Público, pactuo da mesma opinião do renomado doutrinador Andrey Borges de Mendonça, no sentido de que o magistrado não poder determinar de ofício a realização de prova antecipada antes do início do processo, sob pena de violação ao sistema acusatório, aos princípios da inércia e imparcialidade do juiz e, consequentemente, ao princípio do devido processo legal, vislumbrando, portanto, a inconstitucionalidade parcial do art. 156, I.

 

 

 

 

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

Constituição da República Federativa do Brasil/88

GRINOVER, Ada Pellegrine. A Iniciativa Instrutória do Juiz no Processo Penal Acusatório. Artigo publicado na Revista da Ordem dos Advogados do Brasil, nº 68, jan/jun 1999.

MENDONÇA, Andrey Borges de. Nova Reforma do Código de Processo Penal. São Paulo: Método, 2008, p. 161/165.

 


[1]  A Iniciativa Instrutória do Juiz no Processo Penal Acusatório. Artigo publicado na Revista da Ordem dos Advogados do Brasil, nº 68, jan/jun 1999.

 

[2] Andrey Borges de Mendonça. Nova Reforma do Código de Processo Penal. São Paulo: Método, 2008, p. 161/165.

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Autor: Patrícia Pinheiro De Melo


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