O velho e o novo (2)



O VELHO E O NOVO

O mundo é cheio de premissas falsas. Uma das mais atuais diz o seguinte: você tem que ser inovador para ser competitivo, para vencer na vida. Nada contra a inovação: containers, jornais diários, fundos de investimentos, celulares, ipads – foram invenções que transformaram recursos de baixa em alta produtividade. A velocidade das transformações também é digna de nota: o tempo foi encurtando do jornal para o rádio, deste para a TV, dela para a internet, desta para as demais mídias digitais e sabe-se lá o que vem por aí, dos modismos às adoções menos efêmeras.

O novo fascina, mas não necessariamente é melhor. Uma coleção infinita de posts na internet não pode ser melhor do que a leitura cuidadosa de bons livros, enquanto os posts forem sintéticos ou simplistas – superficiais na essência. Os filósofos contemporâneos não são mais sábios do que os gregos. Pelo contrário, aprendem com eles para desenvolver pensamentos atualizados, não raro para apenas repeti-los.

Mas a busca pelo novo prevalece em função da competitividade. É preciso se destacar como melhor do que alguém ou alguma coisa. Fama e mercado estão presentes em todas as preocupações desse imenso picadeiro em que se transformou a sociedade do espetáculo, sobretudo para os mais jovens. O novo tem estética própria e predileção entre eles, que competem por um lugar ao sol. Então, que se desmereça tudo que é mais antigo, metade da competição já está vencida. Velho passou a ser o grande estereótipo dos últimos anos.

Nas palavras de Monique Augras, em “A formação da opinião pública”, a primeira característica do estereótipo é a esquematização; as qualidades do objeto são reduzidas a uma só... Engloba muitos indivíduos diferentes num conceito só... É persistente, não é raro que permaneça por várias gerações. Vale dizer que identificação, projeção e rejeição são mecanismos básicos para interpretação do relacionamento social. Lembremos, a propósito, alguns estereótipos tão pejorativos quanto “velho”: preto, judeu, comunista, puta. Pensemos as consequências dessas simplificações.

E, então, voltemos à falsa premissa do início deste texto: competitividade. Sua prática pressupõe vencedores e vencidos. Sua constância está amparada até mesmo no esporte onde, teoricamente, a busca pela vitória desenvolve melhor os indivíduos. Confundem necessidade de vitória com superação individual ou coletiva. A competitividade está amparada também em Darwin, cujas observações o levaram a acreditar que a vida se aprimora através da sobrevivência dos mais aptos.

Bullshit. A vida se desenvolve e se aprimora pelo princípio da cooperação em redes (conforme a obra de Fritjof Capra). Mas, se você não acredita em biologia, observe as mídias sociais. É a comunicação boca a boca potencializada pela tecnologia. Ali, a palavra de ordem é compartilhar, entre outras possibilidades do espetáculo. O individualismo é um negócio que pode colher resultados de curto prazo, mas alguém sempre sai perdendo com a competição. Por outro lado, a geração de conhecimento é potencializada pela cooperação, que só constrói. Ninguém perde em um ambiente cooperativo. E as redes são mais eficientes quando somam conhecimentos novos e antigos. Não foi assim que se organizaram as sociedades tribais? De onde vieram os Conselhos das grandes corporações?

 Entretanto, na cabeça dos jovens que se pretendem de vanguarda (felizmente não são todos), só o novo interessa. O velho é ultrapassado, é ruim, não encanta. De uma penada só, eles desconhecem Aristóteles, Voltaire, Spinoza, Bergson, Tolstoi, Machado de Assis, todos os grandes pensadores e literatos, todos as suas visões da humanidade. Seu mundo é de aparências, nada pode ser profundo, porque o profundo leva tempo. Seu mundo é rápido, multitarefas, superficial. Eles têm as tecnologias a seu favor: é fácil fazer pesquisa hoje em dia, saber de tudo um pouco na internet. Difícil é compreender a razão das coisas, passar da informação ao conhecimento, deste à sabedoria, dela à virtude. A experiência e o tempo de aprendizado dos mais velhos podem ajudar.

Não se descarta uma agenda de mesa só porque existe uma mais nova, eletrônica. A de mesa pode ser mais prática para muitas pessoas. Não se joga fora um porta-retratos só porque o celular ou o ipad podem armazenar fotos descartáveis. Não se pode prescindir de escritores, artistas, dirigentes empresariais, conselheiros, médicos, professores ou engenheiros só porque já passaram dos 60 anos. Se os novos que ridicularizam os velhos tivessem esse poder, talvez o fizessem. E só teriam a perder.

Vale lembrar a Carta aos Anciãos, do Papa João Paulo II, quando ele afirma que os mais velhos ajudam a contemplar os acontecimentos terrenos com mais sabedoria, porque as vicissitudes os tornaram mais experientes e amadurecidos. Eles são guardiões da memória coletiva e, por isso, intérpretes privilegiados daquele conjunto de ideais e valores humanos que mantêm e guiam a convivência social.


Autor: Marcelo Diniz


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