A Corrosão Silenciosa Do Plano De Negócios



A Corrosão Silenciosa do Plano de Negócios

Diversos órgãos de controle da economia medem os vários índices inflacionários, tecendo constantes tendências. Apesar disso, e a despeito dos rumos previstos, uma inflação estabelecida de fato, silenciosa, insistente, resistente e que ninguém consegue ver, segue corroendo o planejamento nosso de cada dia...

Sem qualquer pretensão de lançar palpites na seara econômica, não podemos, porém, deixar de perceber certas conseqüências advindas do fenômeno inflacionário que, normalmente, não figuram nas manchetes dos noticiários.

São tantos os índices que quase acabamos nos perdendo no universo das siglas e das diferentes amplitudes e cenários que refletem. Tudo é muito técnico e entender desse mundo exige conhecimento e dedicação.

Recentemente, enquanto trabalhava na estruturação de um plano de negócios que possui um perfil intensamente sensível a variações de custos e índices de preços, deparei-me com algumas percepções que contrariavam as tendências anunciadas pelo governo que, naquele momento, apontavam para a queda da inflação.

Normalmente os índices medem os preços por classes de produtos, sendo que, por exemplo, na de alimentos figuram aqueles que compõem a cesta-básica definida pelo governo, assim como outros índices medem os preços do agronegócio, das commodities, dos preços e componentes do mercado de combustíveis, da construção civil, do vestuário, e por aí vai...

Imaginemos que, em dado momento, o preço do trigo no mercado tenha subido 10%. Isso normalmente significaria que a cadeia de alimentos que tem o trigo como elemento básico de produção seria uma grande candidata a ter o aumento desse custo repassado para os seus produtos – massas, pães, bolos, biscoitos, etc.

Não podemos esquecer que a inflação é a maior preocupação institucionalizada do país, assim como uma gripe causa aflitivo temor a um convalescente de tuberculose.

Seguindo nesse raciocínio, consideremos que, por alguma razão, os preços desse grão no mercado mundial tenham recuado em semelhante nível (10%) no mês subseqüente. Por certo, nesse momento, os índices de medição acusarão esse recuo e, por certo, espelharão tendências de queda nos preços desse segmento, tornando-se manchete em todos os meios de comunicação, sossegando o consumidor.

Eis aí um exemplo que todos conhecemos e que, ao contrário do que os noticiários econômicos anunciam, percebemos, tecnicamente, que os preços de certos produtos não retrocedem aos patamares anteriores, apesar do custo do elemento básico e do indicador inflacionário medido pelo governo terem baixado.
 
Sabemos que os preços do trigo no mercado internacional têm variado imensamente nos últimos tempos, assim como o da grande maioria dos gêneros alimentícios, e que, apesar dos altos e baixos e do aparente retrocesso aos patamares anteriores, os preços de seus derivados não seguem a mesma curva.

Será que esquecemos que pagávamos cerca de 10 centavos de Real por um pãozinho francês (média anterior à mudança que rege agora o produto – mudando de preço por unidade para preço por peso) e que agora, fazendo as devidas conversões (na mesma média), o produto comprado no mesmo mercado ou padaria subiu para algo entre 35 e 40 centavos de Real pelo mesmo santo pãozinho?!

Esquecemos também que, além desse produto representar item básico na alimentação da família brasileira, ele também serve de elemento básico aos vários segmentos de negócios associados à alimentação: restaurantes, padarias, lanchonetes, supermercados, etc.?

Por conseguinte, podemos concluir que, apesar dos números, curvas, índices e os outros tantos indicadores inflacionários apontarem para uma tendência de queda, a grande maioria dos produtos derivados dos itens básicos referenciais em medição, sejam eles quais forem, absorvem os aumentos, jamais retrocedendo aos níveis anteriores.

Em outras palavras, os subprodutos aumentam – no caso do trigo: massas, pães, bolos, biscoitos, pizzas, lanches, etc. – e não voltam a baixar de preço apenas porque os índices que medem esse grão apontam para queda!

E o que isso tem a ver com o meu negócio? Ora – tomando ainda no exemplo do trigo – o item de custo alimentação não consta no plano de contas das nossas empresas? Algumas das variantes desse elemento-chave de custo são: despesas de vale refeição, despesas de refeições com clientes, despesas de refeições durante viagens de negócios, etc.

Portanto, a preocupação não deve ser apenas com as altas e baixas dos índices – pelo contrário! A preocupação tem que estar voltada ao nível de absorção de aumento que os derivados dos produtos básicos medidos apresentam e quais são as suas tendências de aumentos futuros!
 
Esse assunto confere uma incrível importância estratégica ao planejamento de negócios que, infelizmente, passa despercebida na grande maioria dos planos. Acaba virando apenas alvo de reclamações contra a política econômica do país, como todo mundo faz, sem que isso, efetivamente, possa resolver o problema de caixa da empresa, o qual sofre o impacto direto e silencioso dessa ameaça.

A esse exemplo, quantos outros índices, ou, quantas outras classes de produtos medidos não se transformam em elementos de custos, através de seus derivados, incidentes nos nossos planejamentos – minérios, alimentos, matérias primas, petróleo, álcool, etc.?

Quando o preço do minério de ferro dispara no mercado internacional, por exemplo, basta observar o que acontece com os seus derivados – aços planos, fundidos, ligas, vergalhões para construção, chapas de aço, aços especiais... Quando os preços disparam, a corrida às exportações é intensa, gerando quebras de abastecimento ao mercado interno e fazendo disparar o ágio sobre os produtos derivados, o que encarece ainda mais todo o processo. Uma loucura!

O fato é que todo esse processo alimenta uma inflação disfarçada que, infelizmente, já se institucionalizou neste nosso modelo Brasil.

Planejar o negócio é uma ciência exata, que exige visão, estratégia, experiência operacional, gestão de talentos e, informação – sim, informação! Há que se pesquisar profundamente e refletir muito sobre os dados do mercado e do cenário específico do negócio, para que se possa determinar amplitudes, mensurar impactos e prevenir armadilhas. A lista das falências está repleta daqueles que menosprezaram a seriedade e a importância do planejar e que, agora, amargam os efeitos degradantes do arrependimento.


Roberto A. Trinconi
CEO
EdgerSense Consulting
The Business Management Intelligence Company

 
Autor: Roberto A. Trinconi


Artigos Relacionados


A (falta) Da Prática Da Filosofia No Cotidiano

Se Eu Pudesse...

Diacronização!

Amor MatemÁtico

O Brilho Do Sol

Senti Uma Dor No CoraÇÃo

Visão Que Conecte