Quedas domésticas em idosos: uma revisão da literatura



LENIR TEREZA ROSÁRIO FARIAS

CRISTIANE GOMES DA COSTA 

 

 

 

QUEDAS DOMÉSTICAS EM IDOSOS: uma revisão da literatura

 

Independência funcional como conceito de saúde do idoso

 

A própria senescência causa declínio da capacidade funcional, se tornando mais evidente a partir dos 75 anos. Há dificuldade no desempenho de certos gestos e atividades da vida cotidiana ou mesmo a impossibilidade de desempenhá-las (DIOGO, 2000).

A incapacidade funcional define-se pela presença de dificuldade ou mesmo pela impossibilidade no desempenho de determinadas atividades básicas da vida cotidiana (SANTOS et al., 2007). A capacidade funcional surge como conceito em saúde devido à necessidade de ações preventivas, assistenciais e de reabilitação em saúde (MONTEIRO; FARO, 2007). A perda da capacidade funcional é um dos principais problemas que afeta o idoso, levando a diminuição de suas habilidades físicas e mentais, necessárias para a realização de suas atividades como realizar cuidados pessoais, atividades instrumentais de vida diária, que requerem tarefas mais complexas do cotidiano (SILVA et al., 2007).

Entende-se como incapacidade funcional as alterações para realização das atividades básicas da vida diária (ABVD) e atividades instrumentais da vida diária (AIVD). Devem ser entendidas como conseqüências evitáveis durante o envelhecimento. A presença de incapacidade é onerosa para o indivíduo, a família, o sistema de saúde e para a sociedade (BRASIL, 2007; MONTEIRO; FARO, 2006).

As ABVDs estão relacionadas com as atividades como tomar banho, vestir-se, usar o banheiro, transferir-se da cama para a cadeira, alimentar-se com a própria mão, deitar/levantar, caminhar em superfície plana, pentear os cabelos, cortar as unhas dos pés, escovar os dentes (BRASIL, 2007; COSTA et al., 2006).

As AIVDs estão relacionadas com atividades como tomar remédio na hora certa, subir escadas, caminhar fora de casa, cuidar das próprias finanças, fazer compras, sair de casa sozinho e usar transporte coletivo, preparar as próprias refeições, usar o telefone, realizar pequenas tarefas e reparos domésticos (BRASIL, 2007; COSTA et al., 2006).

A independência funcional é avaliada por meio de 10 tarefas: alimentação, banho, vestuário, higiene pessoal, eliminações intestinais, eliminações vesicais, uso do vaso sanitário, passagem cadeira-cama, deambulação e uso de escadas (MINOSSO et al., 2010).

É considerado um idoso independente aquele capaz de realizar sem dificuldades e sem ajuda todas as atividades de vida diária. São considerados idosos com potencial para desenvolver fragilidade aqueles que mesmo sendo independestes apresentam alguma dificuldade para realizar as atividades, precisam de atenção específica de profissionais de saúde e devem ser acompanhados com maior freqüência (BRASIL, 2007).

No entanto, idosos que se encontram acamados, hospitalizados recentemente por qualquer razão, que apresentem doenças causadoras de incapacidades funcionais como acidente vascular encefálico (AVE), síndromes demenciais e doenças neurodegenerativas, etilismo, neoplasia terminal, amputações de membros, vivenciando situações de violência doméstica, estes devem ser considerados idosos frágil ou em situação de fragilidade (BRASIL, 2007).

É necessário conhecer a condição do idoso, avaliar os recursos locais para facilitar o cuidado domiciliar. De acordo com a condição funcional da pessoa idosa serão estabelecidas ações de atenção primária, de prevenção (quer seja primária, secundária e terciária), reabilitação para recuperação da autonomia funcional, prevenção do declínio funcional e recuperação da saúde (BRASIL, 2007; MONTEIRO; FARO, 2006). 

A avaliação funcional do idoso faz parte do cuidado de enfermagem, com ênfase na pessoa e nos sistemas de apoio que ela pode contar (DIOGO, 2000). Monteiro (2007) acrescenta que é uma ferramenta para estabelecer diagnósticos, evolução, prognósticos, necessidades especiais de cuidados, quantificar o cuidado a ser prestado e melhorar o nível de qualidade de vida. A assistência domiciliar aos idosos com comprometimento funcional demanda programas de orientação, informação e apoio de profissionais capacitados em saúde do idoso, e depende principalmente do suporte informal e familiar (SILVA et al., 2007).

Nesse contexto, o objetivo da avaliação funcional é detectar situações de risco, áreas de disfunção ou necessidade, monitorar o declínio funcional do idoso, estabelecer um plano de cuidados adequado às demandas assistenciais, identificar a necessidade de utilização de serviços especializados e, o mais importante, estabelecer um plano de cuidados individualizado ao idoso (DIOGO,2000; MONTEIRO; FARO, 2007).

A reabilitação da capacidade funcional envolverá um trabalho multiprofissional de médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, nutricionistas, fonoaudiólogos, psicólogos e assistentes sociais (MURTA, 2008).

  

 Critérios de avaliação de enfermagem da saúde do idoso (LUECHENOTTE, 2002)           

A avaliação de saúde pode se feita em diversos ambientes como hospitais, residência, escritório, clinica, centro terapêutico diurno e asilo.

O ambiente deve ser o mais tranqüilo possível, adaptado para permitir a troca de informações entre o cliente idoso e o enfermeiro, de modo a transmitir atenção e confiança. Devem ser considerados o espaço e a mobilidade no ambiente, os níveis mínimos de ruídos e distração (televisores, rádios, intercomunicadores ou sala próxima a outras que proporcionam atividades visíveis ou audíveis, a temperatura do ambiente (conforto, corrente de ar e temperatura), a iluminação, as superfícies, a posição do cliente, a proximidade do local da avaliação a banheiros, acesso a bebedouros.

  

 Cuidados de enfermagem

 A atuação do enfermeiro junto ao idoso deve ser centrada na educação para a saúde e no cuidar, tendo como base o conhecimento do processo de envelhecimento e na recuperação máxima possível da capacidade funcional (DIOGO, 2000).

Segundo Moreira et al. (2007), algumas variáveis contribuem para a frequência de quedas entre idosos e podem ser diagnosticados pela enfermagem no primeiro contato com este cliente. Os casos de quedas devem ser cuidadosamente avaliados, é importante saber sobre a seqüência dos fatos que antecederam a queda, descobrir e conhecer a causa, ainda se possível obter um relatório da pessoa que testemunhou a queda.

Moreira et al. (2007) relata que num estudo realizado em 2004 em um ambulatório de atenção ao idoso na universidade do estado do Rio de Janeiro (UERJ), através da ocorrência de quedas em idosos sem história de quedas, foi possível identificar os principais diagnósticos de enfermagem: perda de equilíbrio, pressão arterial (PA) elevada, visão alterada, audição alterada, dores osteoarticulares, marcha alterada, fraqueza, incontinência urinária e hipotensão postural.

A detecção precoce e o tratamento de limitações funcionais são atribuições dos profissionais e técnicos de saúde, por isso devem orientar os cuidadores para estes possam ser aliados através de observação de novas limitações e auxiliarem no tratamento prescrito (MURTA, 2008).

O cuidado é a essência da enfermagem e permeia todos os esforços para ajudar o homem a recuperar-se de uma doença ou prevenir que ela se instale (ROCHA; MARZIALE, 1998).

O cuidar para a enfermagem é compreendido de modo holístico, personalizado, o qual além de colaborar com a cura, promover a saúde e auxiliar o homem a se desenvolver com satisfação (ROCHA; MARZIALE, 1998).

Aquele que presta cuidados ao idoso, chamado cuidador, pode ou não ter vínculo familiar. Existem, ainda, dois tipos de cuidadores: o formal e o informal (Brasil, 1999 apud Nakatan, et al., 2003). O cuidador formal é um profissional preparado em uma instituição de ensino para prestar cuidados no domicílio, segundo as necessidades específicas do cliente (REJANE; CARLETTE,1996 apud NAKATAN et al., 2003).

O cuidador informal, no entanto, é um membro da família ou da comunidade, que presta cuidado de forma parcial ou integral aos idosos com déficit de autocuidado. Tal indivíduo deve ser alfabetizado e possuir noções básicas sobre o cuidado do idoso e compreensão mínima do processo de envelhecimento humano. São indivíduos que terão a função de auxiliar e ou realizar a atenção adequada às pessoas idosas que apresentam limitações para as atividades básicas e instrumentais da vida diária, estimulando a independência e respeitando a autonomia destas (BRASIL, 1999 apud NAKATAN et al., 2003).

Os cuidados com a pessoa idosa devem visar o estímulo da independência funcional e da autonomia, o máximo possível, junto aos seus familiares e à comunidade, respeitando sempre suas limitações (SILVA et al., 2007). O idoso deve ser assistido de maneira individualizada, levando em consideração suas limitações físicas, psíquicas e ambientais, de maneira que possa adaptar à sua situação (DIOGO, 2000).

Muitos cuidados prestados a estes pacientes podem ser realizados no domicílio, indo ao encontro a custos e acelerar sua recuperação num ambiente familiar. O lar exerce sobre o idoso um papel importante na manutenção da sua própria identidade, podendo favorecer sua autonomia e independência, proporcionando-lhe melhorias para sua recuperação e qualidade de vida (SMELTZER et al., 1998 apud NAKATAN et al., 2003).

A equipe de saúde precisa estar sempre atenta à pessoa idosa, ao seu bem-estar, à sua rotina funcional e à sua inserção familiar e social, para atuar nos fatores que alteram o equilíbrio, entre o indivíduo e o ambiente, compreendendo a saúde do idoso, em seu sentido mais abrangente (DIOGO et al., 2000).

O reconhecimento de que os idosos não somente podem, mas também desejam receber novas informações relacionadas ao cuidado com a sua saúde, permitem à enfermeira gerontóloga assisti-los identificando as prioridades. Estas informações servem como base para a construção de um programa educativo. A capacidade do idoso para o autocuidado deve ser estimulada ao máximo, pois encoraja a sua independência e autonomia, e promove também o senso de auto-estima (DIOGO et al., 2000).

A Implementação do Programa Educativo, na qual foi identificar os fatores de risco para quedas presentes no meio ambiente e decorrentes do envelhecimento, identificar alguns recursos para a prevenção das quedas; identificar as alterações visuais presentes no envelhecimento; conhecer os cuidados necessários para a saúde ocular e a boa visão (DIOGO et al., 2000).

Moreira et al. (2007) ressalta a importância de trabalhar as questões relativas a quedas e os fatores correlacionados, pois podem ser minimizados e trabalhados. No entanto ações podem ser desenvolvidas até mesmo em salas de espera ou durante a consulta para trabalhar este tema e realizar atividades de prevenção.

Cuidados de enfermagem para reduzir a probabilidade de quedas em idosos, de acordo com o apanhado bibliográfico (ROCHA; MARZIALE, 1998; DIOGO et al., 2000; BRASIL, 2006; BRASIL, 2007; TIRADO, 2009; FERRÃO 2009; MINOSSO et al.,2010):

É preciso a manutenção de um ambiente seguro, onde degraus de escadas devem ser delimitados com cores contrastantes no e início e no fim; deve haver iluminação adequada no local; pisos foscos, livres de ondulações e ser antiderrapante, devem ser mantidos secos.

Orientar o idoso sobre os riscos de queda e suas conseqüências. Esta informação poderá fazer a diferença entre cair ou não e, muitas vezes, entre a instalação ou não de uma capacidade. Revisão da medicação, elevação da cabeceira da cama, orientação de movimentos de membros inferiores (MMII) antes de se levantar;

Avaliação geriátrica global, com medidas corretivas adequadas enfocando:

  • função cognitiva;
  • estado psicológico (humor);
  • capacidade de viver só e executar as atividades de vida diária;

Racionalização da prescrição e correção de doses e de combinações inadequadas.

Redução da ingestão de bebidas alcoólicas.

Avaliação anual: oftalmológica, da audição e da cavidade oral.

Avaliação rotineira da visão e dos pés: os sapatos não devem ter saltos para não prejudicar o equilíbrio, devem ter o tamanho correto e sola antiderrapante, devendo evitar os chinelos. A roupa também deve ser confortável e permitir a execução dos movimentos, tendo cuidado com roupa muito comprida, pois o idoso pode tropeçar nela (FERRÃO, 2009).

Avaliação com nutricionista para correção dos distúrbios da nutrição.

Fisioterapia e exercícios físicos (inclusive em idosos frágeis) visando: melhora do equilíbrio e da marcha; fortalecimento da musculatura proximal dos membros inferiores; melhora da amplitude articular; alongamento e aumento da flexibilidade muscular; atividades específicas para pacientes em cadeiras de rodas; identificação dos pacientes que caem com freqüência, encorajando a superar o medo de nova queda através de um programa regular de exercícios. Idosos que se mantêm em atividade, minimizam as chances de cair e aumentam a densidade óssea evitando as fraturas.

Terapia ocupacional promovendo condições seguras no domicílio (local de maior parte das quedas em idosos), identificando “estresses ambientais” modificáveis, orientando, informando e instrumentalizando o idoso para o seu autocuidado e também os familiares e/ou cuidadores.

Denunciar suspeita de maus-tratos.

Correção de fatores de risco ambientais (por exemplo: instalação de barra de apoio no banheiro e colocação de piso antiderrapante).

Medidas gerais de promoção de saúde:

  • prevenção e tratamento da osteoporose: cálcio,      vitamina D;
  • imunização contra pneumonia e gripe;
  • orientação para evitar atividades de maior risco      (descer escadas por exemplo) em idosos frágeis desacompanhados.
  • Orientar que evite ingesta hídrica antes de dormir. Acender luz ao ir ao banheiro durante a noite ou deixar luz noturna acesa.

  

Adaptar o ambiente para reduzir o risco e as conseqüências das quedas 

Ao contrário do que se pensou no passado, os acidentes não devem ser atribuídos a atos divinos, nem encarados como inevitáveis, é necessário conhecer os seus aspectos e pensar em prevenção, desta forma não esperar que a queda aconteça (FERRÃO, 2009).

Para o idoso se mover com independência e segurança dentro de sua casa, será necessário um ambiente adaptado às suas necessidade, de modo a prevenir acidentes e torná-la mais segura (TIRADO, 2009).

Segundo Ferrão (2009) e Tirado (2009), baseado na lista para prevenir acidentes em casa do National Center for Injury Prevention and Control of the Centers for Disease Control and Prevention, é possível adotar medidas para adaptar o ambiente de modo a torná-lo mais seguro.

Para Fréz (2003), é necessário medidas preventivas primárias e secundárias, sendo que as primárias consistem em realizar atividades físicas, cuidar da alimentação, avaliar os riscos domésticos e revisar periodicamente os medicamentos. Já a prevenção secundária é voltada para as pessoas que já sofreram uma primeira queda, sendo que os fatores que contribuem para o risco de quedas foram identificados.

Devido às alterações de mobilidade, muitas vezes os idosos têm alterações nos movimentos, o que lhes dificulta a realização das atividades diárias normais, podendo conduzir às quedas (FERRÃO, 2009).

Móveis devem estar distribuídos na residência para aumentar os espaços livres e a circulação, mesas podem ter as quinas protegidas com pontas plásticas e devem ter os tampos fixos (TIRADO, 2009).

Os carpetes devem também ter base antiderrapante e se estiverem enrolados ou rasgados, o melhor é retirá-los. Recomenda-se retirar os tapetes do chão caso não tenham dupla face ou superfície antiderrapante, de forma a não escorregar ou tropeçar neles (Figura 6) (FERRÃO, 2009).

Segundo Araújo et al. (2008), a iluminação deve ser de boa qualidade, de fácil manutenção e substituição de lâmpadas, distribuída na quantidade e localização adequada, na intensidade suficiente para realizar as tarefas conforme os ambientes residenciais.

A iluminação não deve ter sombras nem reflexos, e constante em todos os cômodos, para evitar o aumento da confusão ao entardecer. Os interruptores de luz devem ser distribuídos por vários lugares no mesmo cômodo, visando aumentar e facilitar a utilização pelo idoso. Durante a noite, deve ser mantida uma luz acesa para orientação do idoso, caso queira, por exemplo, ir ao banheiro (FERRÃO, 2009; TIRADO, 2009). Nesse contexto, Araújo et al. (2008) ressalta a importância da residência ser planejada para utilizar iluminação natural durante o dia,  para evitar a iluminação artificial.

Nos quartos verificar se a luz mais próxima da cama é de difícil alcance, é recomendável que o interruptor esteja perto da cama e que seja de fácil acesso, de preferência que tenham teclas grandes em textura e cores contrastantes, sendo um próximo à porta, do lado da fechadura e um outro próximo ao local da cama. Se o caminho até o banheiro é escuro, é recomendado utilizar uma luz de presença durante a noite. Existem luzes de presença no mercado que se ligam automaticamente após escurecer, ou utilizar interruptores reluzentes ou iluminados para facilitar a sua visualização durante a noite (ARAÚJO, 2008; FERRÃO, 2009).


Autor: Cristiane Gomes Da Costa


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