A Liberdade De Informação Em Face Do Direito à Privacidade



INTRODUÇÃO

O significante progresso mundial influenciou as técnicas de comunicação representando para a sociedade em geral uma grande vitória e ao mesmo tempo um desafio, uma vez que se vive a era da globalização, onde a difusão de conhecimentos e noticias circula entre os povos e países, em uma velocidade inacreditável.

Através da integralização social fomentada pelos avanços tecnológicos, o presente tema enseja bastante discussão, estando de um lado a liberdade de imprensa e o direito de informação e do outro, o direito à vida privada e o dever de respeitas a intimidade, a honra e a imagem do ser humano.

Faz-se mister destacar o importante papel exercido pela imprensa como órgão formador da consciência de um povo, expositor de valores culturais e sociais, estimulando produções artísticas, literárias e econômicas, difundindo ideais e notícias e até mesmo denunciando e motivando mudanças políticas alimentada pela atuação da mídia.

A imprensa precisa ser forte, independente, imparcial, e, principalmente, livre, para que cumpra a sua missão de informar, sendo um direito previsto na Constituição Federal e de relevante valor social.

Contudo, é pertinente acrescentar que as informações e notícias, veiculadas pelos meios sociais de comunicação, devem ser analisadas mediante uma pré-investigação própria, onde levará em consideração a ética, para que não se cometa injustiças e ofensas por fatos distorcidos ou pela não pertinência da sua publicação.

Sem a liberdade de imprensa não se pode falar em Democracia, pois todos os cidadãos têm o direito de informar e de serem informados dos acontecimentos que os rodeiam para que sintam inseridos no meio em que vivem. Entretanto, essa liberdade não pode ferir os direitos intrínsecos da personalidade dos indivíduos, os quais são constitucionalmente previstos.

O assunto se torna delicado pela necessidade de se ajustar direitos de igual índole constitucional, demonstrando a importância de um juízo de ponderação para a aplicação paritária de ambos.

Cabe mencionar que o homem participa como objeto principal dessa problemática, estando presente de um lado como personagem da notícia ou de outro, como receptor da informação.

Não há como se negar a importância dos direitos emanados da personalidade, ditos como essenciais ao homem por lhes serem intrínsecos, bem como o direito de informar e a liberdade de manifestação do pensamento, o que gera um entrechoque sem posição única por parte dos doutrinadores e da própria jurisprudência.

Finalmente, faz-se uma abordagem da forma como os Tribunais vem aplicando, ou seja, seus entendimentos nos casos de colisão de tais direitos. Restando claro que são questões controvertidas que ensejam muita discussão e entendimentos dos mais variados.

1. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

1.1 – Direitos fundamentais e o Estado Democrático de Direito

O Estado Democrático de Direito atual, caracteriza-se pela participação do povo na formação jurídica e estrutural do Estado, bem como pelo respeito às leis de um modo geral e aos indivíduos que compõem o sistema democrático.

A Constituição de 1988 em seu artigo 1º estabelece, verbis;

"A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos":

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. "[1]

Pode-se entender Democracia como sendo:

"Governo do povo, sistema em cada cidadão participa do governo; democratismo. A política ou a doutrina democrática. A influencia do povo no governo de um Estado. O povo, as classes populares" [2], ou ainda com a celebre frase conhecida de todos nos "governos do povo, pelo povo e para o povo".

Já para José Afonso da Silva Democracia é um conceito puramente histórico "Não sendo por si um valor-fim, mas meio e instrumento de realização de valores essenciais de convivência humana, que se traduzem basicamente nos direitos fundamentais do homem, compreende-se que a historicidade destes a envolva na mesma medida, enriquecendo-lhe o conteúdo a cada etapa do envolver social, mantido sempre o principio básico de que ela revela um regime político em que o poder repousa na vontade do povo. [3]

Destaste, democracia são frutos de conquista popular dada à necessidade de um povo e ao momento histórico por eles vivido, decorrente das mutações sofridas por cada sociedade e como valores fundamentais a democracia traz os princípios da igualdade e da liberdade, indispensáveis à concretização dos direitos fundamentais.

Nesse contexto, podemos concluir que o regime democrático é uma garantia à eficácia dos direitos humanos, e é na democracia que o ser humano encontra possibilidades da realização pessoal, pois quanto mais estabilizado for o regime democrático, mas o homem avança na sua conquista de liberdade, já que está é uma conquista constante.

O artigo 1º da Constituição Federal, já mencionado anteriormente, erigiu a dignidade da pessoa humana como fundamento constitucional e o art. 4º inciso II estabelece a prevalência dos direitos humanos, corroborando com o artigo 5º que determina em seu caput, verbis: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade..." [4]

Assegura-se assim a validade e o gozo dos direitos fundamentais dentro do território nacional, sendo titulares desses direitos os brasileiros e estrangeiros, as pessoas físicas e jurídicas, e nesse ponto é importante observar-mos que apesar de não restar claro no texto da lei, são assegurados todos os direitos ao estrangeiro em transito no território brasileiro.

1.2 - Gerações de direitos

A doutrina classifica os direitos fundamentais em gerações, alguns doutrinadores as dividem em grupos de três gerações, outros em quatro, existem até os mais arrojados que já falam em quinta geração. Vamos aqui abordar uma classificação mais comum que é a quadripartite, assim classificadas:

Direitos Humanos de primeira geração: são os direitos e garantias individuais e políticos clássicos, traduzem o valor de liberdade, tem como momentos históricos marcantes, Magna Carta de 1215, assinada pelo rei "João Sem Terra", juntamente com a Revolução Americana datada de 1776 e a Revolução Francesa em 1789.

Direitos humanos de segunda geração: são os direitos sociais econômicos e culturais surgidos no inicio do século XX é marcado pela primeira Grande Guerra, e fixa os chamados direitos sociais, tem seu marco no Tratado de Versalhes em 1919, correspondendo ao direito à igualdade;

Direitos humanos de terceira geração: são também chamados de solidariedade ou fraternidade, relacionam-se a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, qualidade de vida, autodeterminação dos povos o ser humano é inserido na coletividade e passa a ter direitos de solidariedade;

Direitos humanos de quarta geração: estes destacam os direitos do avanço da engenharia genética, engloba direito à democracia, ao pluralismo dentre outros.

O Min. Celso de Mello no julgamento do Mandado de Segurança 22.164 sintetiza de forma brilhante tal classificação.

"Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) — que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais — realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) — que se identifica com as liberdades positivas, reais ou concretas — acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, nota de uma essencial inexauribilidade." (MS 22.164, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 30-10-95, DJ de 17-11-95) [5]

A subdivisão em gerações pode em um primeiro momento dar a idéia de que um grupo de gerações de sobrepõe ao outro, no entanto, essa divisão feita primeiramente por Norberto Bobbio, serve para distinguir o momento histórico em que foram tutelados os direitos correspondeste às gerações, implicando em dizer que os direitos individuais está em constante redefinição e recriação, o que pode ensejar o surgimento de novas gerações.

1.3Características dos direitos fundamentais:

Adotaremos a classificação feita por José Afonso da Silva por entender ser a mais completa, onde reconhece os seguintes caracteres: [6]

1-Historicidade. Entende-se sejam mutantes como a evolução histórica;

2-Inalienabilidade. São intransferíveis, inegociáveis, não podem ser repassados para outra pessoa, conforme também preconiza o artigo 11 do Código Civil Brasileiro; [7]

3-Imprescritibilidade. Em relação aos direitos fundamentais não se verifica requisitos que importem na sua prescrição, podem ser defendidos a qualquer tempo, em juízo ou fora dele, não havendo, portanto, restrições temporais a eles, importante aqui lembrarmos que os direitos da personalidade se estendem também aos mortos, ou seja, não cessa com a morte, uma vez que seus herdeiros podem postular sua defesa no caso de ultraje.

4-Irrenunciabilidade. Não se renuncia direitos fundamentais, pode-se deixar de exercê-los, mas não se admite a renuncia, o seu titular não pode deles dispor, salvo algumas exceções.

Os direitos e garantias fundamentais em regra têm eficácia e aplicabilidade imediata, sendo que alguns necessitam de regulamentação infraconstitucional, como é o caso do inciso XXXII, do art. 5 da Carta Magna, onde a regulamentação se deu pela promulgação do CDC – Código de Defesa do Consumidor.

1.4Eficácia dos direitos fundamentais

A instituição dos direitos e garantias constitucionais veio regular a relação vertical entre o Estado e o cidadão, coibir abusos decorrentes dessa relação, sem, contudo desconstituir a subordinação deste em relação àquele, mas importante aqui frisarmos que o exercício desses direitos não se deve somente entre Estado/indivíduo, mas também, no âmbito horizontal, ou seja, indivíduo/indivíduo. O respeito mútuo entre semelhantes decorrente do próprio processo democrático.

Os direitos assim criados, destinados a defender a igualdade do indivíduo perante os Governos, mas, precipuamente, a liberdade individual contra ataques de terceiros, são conhecidos como direitos civis

É o que se deduz de recente julgado do Supremo Tribunal Federal, verbis:

"Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. Os princípios constitucionais como limites à autonomia privada das associações. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais." (RE 201.819, Rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 11-10-05, DJ de 27-10-06) [8]

Num primeiro momento a criação dos direitos fundamentais destinava-se a proteger o indivíduo contra eventuais ações por parte do Estado, verificando-se posteriormente a eficácia também nas relações horizontais, ou seja, a imposição se um dever geral de respeito aos direitos fundamentais, inclusive entre os particulares.

Dentre os direitos elencados no rol exemplificativo do artigo 5º da Magna Carta, teceremos breve relato e correlação no exercício de dois importantes desses direitos fundamentais, o direito à informação em face do direito à privacidade, mais especificamente a privacidade de pessoas de notoriedade pública.

1.5Hierarquia entre os direitos fundamentais

Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, como também não existe qualquer relação de hierarquia entre a aplicação dos direitos fundamentais, mesmo porque todos interagem entre si, de nada servindo um sem a existência dos outros. O que se busca, e será sempre uma busca constante é proteção e garantia ao homem, com o objetivo de alcançar uma sociedade mais justa, igualitária e menos desumana.

O excelentíssimo Ministro Celso de Melo, expressa com clareza como deve ser a delimitação dos direitos fundamentais, nesse sentido, verbis:

"O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas — e considerado o substrato ético que as informa — permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros." (MS 23.452, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 16-9-99, DJ de 12-5-00) [9]

Os direitos fundamentais gozam da mesma proteção constitucional, é de se concluir que estão no mesmo patamar de valor jurídico, somente no balanceamento dos valores envolvidos no caso concreto se terá uma aplicação justa.

2. DIREITO DA PERSONALIDADE

Muito se diverge na terminologia utilizada para designar os direitos inerentes a pessoa humana, Adriano de Cupis, Orlando Gomes e Carlos Alberto Bittar, preferem chamá-los de "direitos da personalidade".

O termo privacidade quando relacionado ao direito de informação será usado por ser mais genérico, amplo e estreitamente interligado.

O texto constitucional consagrou o direito à intimidade, à vida privada, a imagem, e tomando-se como um todo, temos a privacidade. Utiliza-se essa expressão "direito à privacidade" de modo a comportar toda e qualquer forma de manifestação da intimidade, da vida privada e, até mesmo, da personalidade da pessoa humana.

Pelo direito à privacidade, apenas ao titular compete a escolha de divulgar ou não seu conjunto de dados individuais, e, no caso de divulgação, decidir quando, como, onde e a quem. Os dados em questão são todos aqueles que decorram da vida familiar, doméstica ou particular do cidadão, envolvendo fatos, atos, hábitos, pensamentos, segredos atitudes e planos de vida. [10]

O direito à privacidade engloba, portanto, todos os direitos inerentes a sua esfera íntima, ao que ele julga parte do seu ser.

2.1 Evolução dos direitos da personalidade

Muito se fala sobre a origem dos direitos à personalidade, entretanto duas versões ganharam mais destaque junto aos doutrinadores, a primeira que o surgimento se deu na Grécia e a segunda que teve sua origem com a actio injuriarum em Roma. Há ainda os que defendem que na Idade Média o homem já teria consciência de sua própria personalidade.

Mas o certo é que com a evolução dos direitos fundamentais aperfeiçoou a idéia do homem como sujeito de direitos, direitos esses que se dava como prolongamento natural do indivíduo onde poderiam dispor livremente de tais direitos.

A idéia de irrenunciabilidade surgiu com o Iluminismo nos séculos XVIII e XIX, para Gilberto Haddad Jabur:

" o reconhecimento da importância do homem, centro de irradiação de direitos e preocupação protetiva, despertou mais tarde com a consolidação do cristianismo. Foi ele responsável pela construção de fortes alicerces morais, sobre os quais se edificam os direitos que derivam da individualidade, da própria personalidade humana." [11]

Com base nisso a evolução dos direitos da personalidade vem no ritmo da evolução social, no nosso direito, a atual Constituição consagrou em seu texto inúmeros direitos, em 2002 com a promulgação do Novo Código Civil, veio ratificar ainda mais os direitos da pessoa com a inclusão na Parte Geral de um capítulo destinados somente a ele.

Paulo Mota Pinto, festeja o Código Civil por ter abordado tais direitos já que o Código anterior omitira-se nesse ponto:

"Se a proteção da personalidade humana é a missão primeira e mais importante de todo o jurista – arrancando de uma concepção do Direito que tem o personalismo ético como seu epicentro – e se a dignidade da pessoa humana se encontrar escrita logo no "pórtico" de nossas Constituições, como fundamento de ambos os Estados, a introdução de um conjunto de normas sobre os direitos de personalidade é, sem dúvida, de saudar". [12]

2.2 Conceito

As diferenças não residem somente no campo da terminologia, mas também no que diz respeito aos conceitos, há os positivistas e os naturalistas.

Dentre os positivistas está Adriano de Cupis, que para ele os direitos da personalidade são compostos por direitos que constituem um minimum necessário e indispensável que compõe a personalidade "cuja ausência torna a personalidade uma suscetibilidade irrealizável, sem valor concreto: todos os outros direitos subjetivos perderiam o interesse para o indivíduo e a pessoa não existiria como tal". [13]

Tomando-se por base essas medidas, os direitos da personalidade ficariam restritos aos direitos juridicamente reconhecidos pelo Estado, como todo positivista só seriam direitos os albergados pela lei escrita, positivada.

Já os naturalistas citados a seguir, crêem que os direitos da personalidade são extensões do próprio homem, dentre os doutrinadores que seguem essa corrente está Carlos Alberto Bittar, onde leciona:

"Os direitos da personalidade constituem direitos inatos - cabendo ao Estado apenas reconhecê-los e sancioná-los em um ou outro plano do direito positivo – em nível constitucional ou em nível de legislação ordinária -, e dotando-os de proteção própria, conforme o tipo de relacionamento a que se volte, a saber: contra o arbítrio do poder público ou as incursões de particulares". [14]

José Afonso da Silva, que prefere a terminologia de "direito à privacidade", o conceitua como "Conjunto de informações acerca do individuo que ele pode decidir manter sob seu exclusivo controle, ou comunicar, decidindo a quem, quando, onde e em que condições, sem a isso poder ser legalmente sujeito."[15]

Maria Helena Diniz citando Godoffredo da Silva Telles preceitua:

"A personalidade consiste no conjunto de caracteres próprios da pessoa. A personalidade não é um direito, de modo que seria errôneo afirmar que o ser humano tem direito a personalidade. A personalidade é que apóia os direitos e deveres que dela irradiam, é objeto de direito, e o primeiro bem da pessoa, que lhe pertence como primeira utilidade, para que ela possa ser o que é, para sobreviver e se adaptar as condições do ambiente em que se encontra, servindo-lhe de critério para aferir, adquirir e ordenar outros bens." [16]

Rubens Limongi Franca, citado por Rui Stoco o definiu do seguinte modo: "Direitos da personalidade dizem-se as faculdades jurídicas cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim as suas emanações e prolongamentos"[17]

O autor arremata, afirmando quanto aos direitos da personalidade que "são de natureza privada todos os que dizem respeito aos aspectos privados da personalidade, inclusive aquele que, segundo outras perspectivas, se possam considerar também como de natureza pública ou social" [18]

Uma coisa precisamos deixar claro, o direito é anterior ao Estado, a positivação do direito foi instituída em função do homem, nesse contexto não pode hoje, o Estado querer reduzir o direito à norma positivada, sabemos que a lei constitui sua mais importante forma de expressão, mas não a única, em complemento à lei temos o costume, a jurisprudência, analogias e outras fontes mais.

2.3 Classificação dos direitos da personalidade

Como pode ser notado após breve explanação, quão complexo é o estudo acerca dos direitos da personalidade, destarte, necessário se faz restringir àqueles mais ligados ao direito à informação, objeto especifico do presente trabalho.

Não há uma classificação unânime, por assim dizer, nem tão pouco definitiva, pela própria historicidade e evolução dos direito, iremos dispô-la de forma exemplificativa, até porque a própria Constituição assegura inúmeros outros direitos no decorrer de todo o seu texto, não sendo, portanto, em numerus clausus os direitos elencados no artigo 5º da Carta Magna.

Pedro Frederico Caldas foi bastante feliz ao comentar a impossibilidade da taxatividade dos direitos da personalidade:

"As classificações dos direito de personalidade são inúmeras; umas mais, outras menos, criativas e técnicas; todas passíveis de críticas. Na verdade, o universo dos direitos da personalidade está em expansão, tornando-se tão mais complexo, rico e variado quanto mais seja evoluída e democrática a sociedade que o reconhece o fomenta. Não se trata de direitos já cristalizados, exaustivamente estudados, como, e.g., os direitos reais. Os estudos científicos dessa rica seara são recentes; a doutrina tateia; a jurisprudência vacila; as incertezas são muitas. Um especialista de grande mérito jurídico como De Cupis não ousa uma classificação definitiva; um monumento jurídico como Pontes de Miranda, de notável espírito científico, faz o estudo do direito geral e dos direitos especiais de personalidade sem esboçar uma grande classificação, embora exponha o assunto com grande rigor e coerência científica." [19]

2.3.1 Direito à intimidade

O direito à intimidade caracteriza-se como uma das expressões dos direitos da personalidade, ou seja, os direitos da personalidade é gênero enquanto aquele é espécie.

Segundo René Ariel Dotti, a intimidade é a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais.[20]

É o próprio direito de estar só.

Mas este está só, refere-se a momentos, pois o homem não vive só, necessita da companhia de seus semelhantes para encontrar razão de existir e desenvolver aspectos de sua personalidade. Mas como nem só de relações em sociedade vive o homem, pois prescinde de momentos reservados ao seu íntimo, onde possa refletir sobre sua própria vida e existência.

Celso Bastos leciona,

"intimidade consiste na faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos na sua vida privada e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial do ser humano". [21]

Atualmente é imperioso levarmos em consideração a evolução tecnológica e o crescente poder de informação dos meios de comunicação, a velocidade com que o homem desenvolve novas formas de adentrar na intimidade do outro, tem-se com isso a progressiva redução da privacidade, tornando-se assim desafio quase impossível para todos os operadores de direito que primam em defender a intimidade do cidadão.

Oportunas, portanto, as palavras de J.J. Calmon de Passos:

"A família dos nossos dias, fragilizada pelo poder da mídia, pela pressão da sobrevivência econômica de seus sobreviventes, pela massificação da convivência, descaracteriza-se em sua privacidade, faz-se cada vez mais vulnerável ao "público", em sua dimensão social e em sua dimensão estatal. Consequentemente, a privacidade recua também, fazendo-se individual, personalíssima, quase. A privacidade é hoje o reduto último da resistência do indivíduo às forças que operam no sentido do seu aniquilamento – econômicas, políticas, culturais." [22]

André Ramos Tavares faz ainda uma subdivisão do direito à intimidade em: inviolabilidade do domicilio, sigilo das comunicações e o segredo profissional. Pois segundo o autor "a intimidade é tudo quanto diga respeito única e exclusivamente à pessoa em si mesma, a seu modo de ser e de agir". [23]

Importante aqui frisar que a Constituição Federal de 1988 menciona tais direitos em incisos apartados, talvez apenas para dar maior ênfase.

2.3.1.1 Inviolabilidade de domicilio

Em seu art. 5º inciso XI, da Carta Magna, está escrito "a casa é asilo inviolável do indivíduo". [24]

Nesse sentido o domicilio é local onde a pessoa pode exercer livremente sua privacidade, na certeza de que não será incomodado por estranhos, onde poderá relaciona-se com seus familiares e desfrutar da sua intimidade sexual. Sendo, portanto inviolável, salvo as previsões previstas no próprio inciso, (flagrante delito, desastre, para prestar socorro e durante o dia, por determinação judicial).

Assim acentua-se que o termo "casa" tem significado em parte diverso daquele que lhe confere a linguagem comum, ou até mesmo o Direito Privado. Para fins constitucionais, conforme o entendimento do Supremo Tribunal Federal considera-se domicílio todo local delimitado que seja ocupado por alguém com exclusividade (não aberto ao público), a qualquer título. Entende-se que a relação estabelecida entre a pessoa e o espaço que ocupa implica uma expressão da própria personalidade, que há de ser resguardada em função da vida privada da pessoa. [25]

Restando claro, portanto, que a proteção outorgada pela Constituição Federal não tem como escopo que a casa ou domicilio sirva de escudo para a prática de atos ilícitos no seu interior.

2.3.1.2 Sigilo das comunicações

O sigilo das comunicações que está estabelecido no inciso XII do art. 5º da Constituição Federal, estatui que, "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas..."

O referido inciso visa assegurar a proteção das informações pessoais, de dados sigilosos, conversas ou contatos, ou seja, impedir que terceiros munidos pela curiosidade ou mesmo o desejo de prejudicar, tomem ciência de tais informações, tirando assim o direito que só cabe ao emissor de escolher os destinatários desejados.

O sigilo das comunicações aqui descrito de maneira geral consiste no sigilo das correspondências, das comunicações telefônicas, e sigilo de dados.

E como já mencionado anteriormente que não há direito absoluto, no caso do inciso em testilha, a própria Constituição expressa duas limitações do direito ao sigilo das comunicações. A primeira esta na parte final do próprio inciso "para fins de investigação criminal ou instrução processual penal e para a defesa do Estado e da democracia quando decretado Estado de Defesa ou Estado de Sítio (artigos 136 e 137, CF)".

Apesar de a Constituição fazer ressalva na parte final do inciso XII somente quanto a possibilidade de quebra de sigilo das comunicações telefônicas, com a edição da Lei 9.296/96, em seu art. 1º parágrafo único [26], passou-se a admitir a quebra do sigilo de qualquer das modalidades citadas no inciso XII do art. 5º.

Esse é também o entendimento Lenio Luiz Streck, citado por André Ramos Tavares, "para quem a interceptação pode dizer respeito a qualquer espécie de comunicação, ainda que pela via informática. Para o autor, a Constituição autoriza a interceptação, sempre, do que já se chamou de "informes de tráfego". [27]

2.3.1.3 Segredo profissional

Esta diretamente ligado ao campo profissional, configura como princípios a serem seguidos, impedindo que profissionais divulguem informações obtidas no âmbito do trabalho como também deverá zelar para que terceiros não as obtenha de formas não autorizadas.

2.3.2 Vida privada

Os conceitos de vida privada e de intimidade se confundem restando tarefas difíceis apartar-los, pois entendemos que a vida privada engloba a intimidade, ou seja, tem um campo de abrangência maior, ficando relacionado a ela direito que visa a proteção de toda a sua esfera íntima, social e profissional, direito de evitar que o público sem autorização tenha acesso de tais informações.

Na visão de Alexandre de Moraes no que se refere à vida privada, "os direitos à intimidade e a própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo instransponível por intromissões ilícitas externas". [28]

E mais, o autor ressalta ainda que constitucionalmente os conceitos de intimidade e vida privada estão interligados, mas doutrinariamente citando Manoel Gonçalves Ferreira Filho, faz uma conceituação de vida privada mais ampla, que o conceito destinado à intimidade.

Para ele, intimidade "relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto vida privada envolve todos os demais relacionamentos humanos, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo etc." [29]

Numa visão mais simples, a vida privada seria o oposto da vida pública. Todavia, alçada à categoria dos direitos da personalidade e tutelada pela Constituição Federal.

Todos nós durante nossas vidas, transitamos entre a esfera privada e a esfera pública, a doutrina costuma mencionar a teoria das esferas e círculos concêntricos da vida privada, criada por autores alemães, e citada aqui por Pedro Frederico Caldas, verbis:

"A teoria dos círculos concêntricos fecharia o sistema ao estabelecer a existência de três círculos, sendo que o exterior, de maior diâmetro, abarcaria o direito à privacidade, a que os alemães chamam de privatsphare (sem sentido restrito) ou ainda intimsphare correspondente à privatezza dos italianos e à sphere of privacy dos americanos. O segundo circulo corresponderia à esfera de confiança, crédito ou fidúcia, a que os juristas alemães denominaram vertrauenssphare, e, finalmente, o terceiro e último, o circulo do segredo (geheimsphare ou vertraulichkeitsphare), correspondente à riservatezza dos italianos e à sphere of privacy dos americanos, círculo onde ficaria agasalhada a reserva, o sigilo ou a vida íntima no seu sentido restrito." [30]

Teoria essa também aceita no Brasil, onde tem como escopo delimitar as distâncias entre a vida pública e a vida privada das pessoas, e com base nessa teoria, estabeleceu-se quatro indicadores, que seria o termômetro a indicar a violação dos direitos em comento, que seriam:

1 – intrusion, que seria a intromissão (fisicamente ou não) "na solidão de outrem de uma maneira altamente ofensiva";

2 – public disclosure of private facts, que consiste na "publicação de um fato da vida privada a respeito do qual não há interesse público que justifique sua divulgação";

3 – false light, consiste na criação de uma imagem falsa a respeito de alguém, 'publicando uma altamente ofensiva e falsa impressão de outrem';

4 – appropriation, que "consiste no uso do nome ou imagem de outrem sem a devida autorização". [31]

Analisando tais indicadores veremos que os direitos da personalidade entrelaçam-se entre si, revelando, pois uma das dificuldades dos operadores do direito em diferenciá-los, para no campo material saber qual o direito da personalidade atingido.

2.3.3 Imagem

O termo imagem é tão utilizado que parece difícil apresentar uma definição simples e que abarque todas as possibilidades de empregá-lo.

Primeiramente esclareceremos a origem do termo imagem. Vem do latim imago e significa representação visual de um objeto. E dentre as várias definicões encontradas nos nossos dicionários de língua portuguesa, encontraremos algumas que se coadumam com o sentido do presente trabalho.

Na primeira delas, tem-se a definição de imagem como "representação visível de um ser ou objeto por meios artísticos ou técnicos", na segunda, "conceito de que uma pessoa goza junto a outras" [32]

No conceito doutrinário escrito por Carlos Alberto Bittar, temos:"Consiste no direito que a pessoa tem sobre a sua forma plástica e respectivos componentes distintivos (rosto, olhos, perfil, busto) que a individualizam no seio da coletividade." [33]

Ou seja, é a representação da pessoa que a vincula diretamente com o meio externo, sendo um conjunto das características dos direitos da personalidade.

A imagem, portanto, estaria envolvida num processo de representação, e seria um segundo objeto de uma imagem inicial que ela representaria, relacionando esses conceitos com o ser humano, a imagem é nossa representação, ou seja, aquilo que somos e aquilo que os outros pensam que nós somos, e como aspectos da personalidade humana também recebe proteção constitucional.

O uso da imagem é uma das exceções à indisponibilidade dos direitos da personalidade, pois permite ao seu titular a título oneroso ou não, fazer uso de sua imagem, onde deverá, de preferência, firmar com o interessado, contrato de licença ou de concessão de uso, caso seja para veiculação em meios de comunicação, onde constarão explicitamente todos os ajustes decorrentes do acordo de vontade das partes contratantes, como bem preceitua a Lei 6.533, de 24 de maio de 1978 em seu art. 14, lei que regulamenta as profissões de artistas e técnicos em espetáculos diversos.

Pois caso não feitas todas essas observações, constitui ato ilícito não só o uso sem autorização como também o uso que extrapola os limites contratados.

Nesse sentido ocorrem a maioria das decisões nos Tribunais Superiores:

A utilização da imagem do cidadão, com fins econômicos, sem a sua devida autorização, constitui locupletamento indevido, ensejando a devida indenização, seja qual for o meio utilizado para tal. [34]

Não é necessária a demonstração do prejuízo. Tratando-se de direito à imagem, "a obrigação de reparar decorre do próprio uso indevido do direito personalíssimo" [35]

Nesse sentido são as palavras de De Cupis citado por José Afonso da Silva, verbis;

"A inviolabilidade da imagem a pessoa consiste na tutela do aspecto físico, reflete também personalidade moral do indivíduo -, satisfaz uma exigência espiritual de isolamento, uma necessidade eminentemente moral." [36]

E analisando o comentário de José Afonso havemos de concluir que não se trata de imagem como conceito, mas de imagem como figura, retrato, representação gráfica, plástica ou fotográfica da pessoa. [37]

2.3.4 Honra

A honra é o conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom nome, a reputação, na definição de José Afonso da Silva, é direito fundamental da pessoa resguardar essas qualidades. [38]

Na definição encontrada no pequeno dicionário da língua portuguesa, temos: "consideração e homenagem à virtude, ao talento, à coragem, às boas ações ou às qualidades de alguém" e, ainda, como "sentimento de dignidade própria que leva o individuo a procurar merecer e manter a consideração geral, pundonor, brio". [39] Portanto trata-se de bem material inviolável que traduz o sentimento de dignidade própria.

Além de assegurado constitucionalmente, o direito à honra está previsto no Código Civil como também no Código Penal.

Na esfera cível (art. 20 Código Civil) a honra encontra salvaguarda, através da tutela preventiva, que tenta evitar o dano antes que eles ocorram, e também como de tutela repressiva ou indenizatória, quando o dano já ocorreu, como pode se aferir no texto do citado artigo, verbis:

"Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais."

No Código Penal, inserido na parte especial, no título dos crimes contra a pessoa, o direito à honra está descrito em três figuras: calúnia (art. 138), difamação (art. 139) e injúria (art. 140).

Da mesma forma se observa a proteção da honra só que de forma mais especifica, quando se tratar no exercício das atividades de imprensa, a Lei 5.250/67 estabelece em seus artigos 20 a 22, serem crimes, praticados pelos meios de comunicação, a calúnia, tipificada como a imputação falsa de fato definido como crime, admitindo a prova da verdade; a difamação, definida como a imputação de fato ofensivo à reputação, que não admite prova da verdade a não ser contra funcionário público, no exercício da função, ou se o ofendido permite a prova; e a injúria, prevista como a ofensa à dignidade e decoro.

Do exposto acima podemos observar que o direito à honra, apesar de guardar todas as características dos direitos da personalidade, como a incomunicabilidade, a irrenunciabilidade e a indisponibilidade, como todos os outros direito já expostos não é ilimitado. Contra ele pode incidir, por exemplo, o animus jocandi próprio das apresentações humorísticas e que não ofendem a pessoa conquanto fiquem nos limites da comicidade apenas.

Ressaltando que a proteção aqui elencada abrangem as pessoas vivas, os mortos, bem como as pessoas jurídicas, embora até pouco tempo houvesse muita discussão doutrinária e jurisprudencial sobre o seu cabimento. O dano, no caso, é à honra objetiva da pessoa jurídica, posto inexistir, para ela, a honra subjetiva. E para pacificar tal entendimento foi editado a Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, em 08 de novembro de 1999, in verbis, "a pessoa jurídica pode sofrer dano moral."

3. LIBERDADES

Liberdade de expressão, liberdade de manifestação do pensamento, liberdade de comunicação ou liberdade de informação, qualquer que seja a terminologia utilizada, a Constituição visou assegurar a todos, o direito de dirigir-se as outros, verbalmente ou por escrito, pública ou sigilosamente expressar o que desejar, desde que respeitados os limites impostos pela lei.

É sabido que o homem é um ser social, e necessita manifestar sua forma de pensar, bem como suas idéias. Pimenta Bueno citado por José Afonso da Silva, acrescenta:

"A liberdade é sempre uma e a mesma, mas como ela pode ser considerada em diferentes relações, por isso costuma-se dividi-la ou classificá-la como liberdade do pensamento e sua comunicação, de consciência ou religião, locomoção, viagem ou imigração, e trabalho ou indústria, de contratar e de associação." [40]

Montesquieu já dizia que "a liberdade política não consiste em fazer o que se quer. Num Estado, isto é, numa sociedade onde há leis, a liberdade não pode consistir senão em poder fazer o que se deve querer, e a não ser constrangido a fazer o que não se deve querer", e acrescente-se "o direito de fazer tudo o que as leis permitem". [41]

José Afonso da Silva, comentando o conceito lançado por Montesquieu, ressalta que tal definição, é perigosa já que não deixa claro que as leis as quais se refere, devem tratar-se de leis aprovadas pelo povo, e mais, que a conceituação mais aceitável é a adotada na Declaração de 1789. Para José Afonso a lei só poderia proibir ações desde que fossem nocivas a sociedade. [42]

3.1 – Liberdade de pensamento

A liberdade de manifestação do pensamento constitui um dos aspectos externos da liberdade de opinião.

A Constituição Federal estabelece no art. 5, inciso IV e art. 220, verbis:

"é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato",

"a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição

[...]

"É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística."

E sobre o assunto, José Afonso da Silva comenta que "liberdade de pensamento em si mesmo, enquanto o homem não manifesta exteriormente, enquanto o não comunica, esta fora de todo o poder social, até então é do domínio somente do próprio homem, de sua inteligência e de Deus." [43]

Alexandre de Moraes se posicionado acerca do tema, ressalta que a Constituição também cuidou de estabelecer os limites, que devem ser impostos tanto para a liberdade de expressão do pensamento como para direito à informação, e estão traçados no inciso X, do mesmo Diploma Legal, que trata da inviolabilidade à vida privada, à intimidade, a honra e a imagem, vedando a lesão a esses bens. [44]

A manifestação do pensamento geralmente atinge situações jurídicas de outras pessoas a que corre o direito, também fundamental individual, de resposta proporcional ao agravo. O art. 5º, V, da Constituição Federal, o consigna nos seguintes termos: é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo além da indenização por dano material, moral ou à imagem. O direito de resposta configura-se uma garantia de eficácia do direito à privacidade, garantia que se estende também pela violação, quando do exercício de outras liberdades, mas sempre relacionado à personalidade. [45]

3.2 – Liberdade de expressão

A liberdade de expressão tem sido repetidamente afirmada nos foros internacionais: Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948); Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966); Convenção Interamericana de Direitos Humanos (1969); Declaração de Chapultepec (1994); a Declaração de Princípios sobre a Liberdade de Expressão (2000), etc.

O nobre doutrinador André Ramos Tavares comentando o termo "liberdade de expressão" ressalta, in verbis:

"Há na doutrina brasileira uma patente imprecisão acerca do real significado e abrangência da locução liberdade de expressão. Parcela desta responsabilidade, porém, pode muito bem ser atribuída ao legislador constituinte, que, de maneira consciente ou não, pulverizou manifestações diversas, consagrando em momentos distntos facetas de uma mesma e possível liberdade de expressão." [46]

Acompanhando essa mesma tese dentre outros está Vidal Serrano, ao afirmar que o direito de expressão volta-se "para a exteriorização de sensações, tais como a música, a pintura, a manifestação teatral, a fotografia etc." [47]

E completa,

"que por intermédio dela [expressão] o indivíduo exterioriza suas sensações, seus sentimentos ou sua criatividade, independentemente da formulação de convicções, juízo de valor ou conceito." [48]

Contudo apesar de se afirmar que a liberdade de expressão é inerente ao próprio homem, não foi sempre que tal direito pôde ser exercido, a sua plena conquista é recente, datada de 1776, impulsionada pela Revolução do Estado de Virgínia, cujos idealistas inseriram na Magna Carta o direito à manifestação do pensamento e de opinião, também se incluindo a liberdade de imprensa. [49]

A "liberdade de expressão ou liberdade de comunicação" envolve todas as formas de expressar de que o homem dispõe, seja por meio do jornalismo, rádio, televisão, artes, relações públicas ou qualquer outra forma de exteriorizar o pensamento.

Em termos constitucionais, a liberdade de comunicação ou de expressão refere-se a um conjunto de direitos, formas e procedimentos que possibilitam a ampla divulgação do pensamento e da informação, aí incluída a organização dos meios de comunicação, sujeito ao regramento jurídico vigente.

Para Sampaio Dória, citado por Judicael Sudário de Pinho, essa liberdade constitui

"(...) não apenas a faculdade de pensar livremente, o que seria fenômeno puramente individual, mas o "direito de manifestar em público o que se pensa, ou sinta, seja sobre o que for". É a liberdade de opinar, de criticar, de discutir, de propagar crenças, de publicar ou pregar opiniões". [50]

José Afonso da Silva enumera alguns princípios decorrentes da liberdade de expressão:

a)observado o disposto na Constituição, não sofrerão qualquer restrição, qualquer que seja o processo ou veículo por que se exprimam;

b)nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística;

c)é vedada toda e qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística;

d)a publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade;

e)a exploração de serviços de radiodifusão ou imagens depende de concessão do Poder Executivo, sob a fiscalização do Congresso Nacional, a que cabe apreciar o ato, no praz do art. 64, §§ 2º e 4º; e

f)os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio. [51]

Em síntese, depreende-se que a liberdade de expressão é direito genérico que finda por abarcar um sem-número de formas e direitos conexos e que não pode ser restringido a um singelo externar sensações ou intuições, é a própria essência do homem como ser pensante, característica fundamental que o diferencia e muitos dos demais.

3.3 – Liberdade de imprensa

A importância da imprensa começou a ser sentida a partir de quando se percebeu a sua enorme influencia na formação da opinião pública, chagando-se mesmo a afirmar, em face do seu imenso poder, que, em boa verdade, não existiria uma verdadeira opinião pública, mas apenas a "opinião publicada" tal o poder de influenciar posições e opiniões.

Segundo René Ariel Dotti, "foi Balzac quem primeiro designou a imprensa como o 'quarto poder do Estado', expressão que traduz fielmente a importância dos órgãos de informação no contexto da sociedade moderna." [52]

Nas palavras de Edílson Pereira de Farias ao comentar os aspectos da liberdade de informação vale ressaltar a seguinte passagem:

"No âmbito da proteção constitucional ao direito fundamental à informação estão compreendidos tanto os atos de comunicar quanto os de receber livremente informações pluralistas e corretas. Com isso, visa-se a proteger não só o emissor, mas também o receptor do processo da comunicação. No aspecto passivo dessa relação da comunicação, destaca-se o direito do público de ser adequadamente informado, tema que Rui Barbosa já chamava a atenção sobre o mesmo em sua célebre conferencia intitulada 'a imprensa e o dever da verdade' e que, atualmente, invocando-se a defesa dos interesses sociais e indisponíveis, desemboca na tese de que o direito positivo brasileiro tutela 'o direito difuso à notícia verdadeira'."[53]

A Constituição Federal, em seu art. 220, §2, como demonstrado anteriormente repudia a censura como uma das formas de coroar a democracia.

Mas apesar de a Constituição repelir de forma veemente a censura prévia, isso não significa que a liberdade de imprensa é absoluta, não encontrando restrições ou barreiras, nos outros direitos fundamentais, pois há a viabilidade de propositura de ações visando à responsabilização por danos decorrentes de noticias difamantes, injuriosas que possam causar danos materiais ou à imagem.

Para o exercício adequado da liberdade de imprensa, o emissor não pode ultrapassar os limites fixados na própria Constituição, em especial o respeito aos direitos da personalidade. Contudo não se admite a censura prévia. Apenas adverte-se que todas as liberdades devem ser condicionadas em respeito à lei, sob pena de se configurar violação.

Freitas Nobre comentando a Lei de Imprensa e citado por Judicael Sudário de Pinho, verbis;

"A liberdade ilimitada, distanciada do interesse social e do bem comum, não é conciliável no mundo contemporâneo, porque se o pensamento é inviolável e livre, a sua exteriorização deve ser limitada pelo interesse coletivo, condicionando seu exercício ao destino do patrimônio moral da sociedade, do Estado e dos próprios indivíduos." [54]

O abuso decorrente do mau uso ou uso exarcebado da liberdade de imprensa além dos limites preestabelecidos pelo ordenamento jurídico é que gera o dano e consequentemente o dever de indenizar.

Do ponto de vista legal, na ocorrência do abuso do direito de informar a própria Lei de Imprensa já prevê sanções de natureza penal e civil, no seu art. 1º estatuiu expressamente "É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um nos termo da lei, pelos abusos que cometer." Em igual sentido a previsão do art. 12: "Aqueles que, através dos meios de informação e divulgação, praticarem abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e informação ficarão sujeitos às penas desta Lei e responderão pelos prejuízos que causarem" [55]

Nesse contexto Serrano Neves, citado por Judicael Sudário de Pinho, relacionou de forma bastante didática algumas restrições à liberdade de informação, onde destaca os seguintes aspectos:

a) ratione reipublicae – óbice opostos ao princípio relacionado com ameaça ao princípio do núcleo intangível (cláusula pétrea), previsto no art. 5º, § 2º, da Constituição Federal;

b) ratione gentium – restrição ligada ao bom relacionamento entre as nações, envolvendo o próprio direito internacional (público ou privado);

c) ratione personae- a liberdade de imprensa não pode violar os direitos da personalidade; (grifei)

d) ratione materiae – diz respeito com a potencialidade de penetração da matéria divulgada, vale dizer, a proibição da imprensa marron; (grifei) [56]

e) ratione auctoris – é dever do jornalismo manifestar os fatos com inteira veracidade, sem deturpação dos fatos;

f) ratione lectoris – destaca o interesse do Estado na educação do povo, em especial da juventude, em nome da ética social, em sede de moralidade pública." [57]

Com base nessas restrições, conclui-se que a atividade jornalística abrange além do direito de informar, deveres que abarca uma série de condicionamentos a serem seguidos e adequadamente postos, observando sempre uma seleção de notícias que atendam ao interesse do público e que de alguma forma não extrapole os limites impostos constitucionalmente a privacidade alheia.

3.4 – Direito à informação

Direito assegurado constitucionalmente, como os demais já expostos, o direito de ser informado, em um primeiro momento foi considerado como um direito individual, decorrente da liberdade de manifestação de pensamento e expressão do pensamento, porém, na atualidade tal concepção foi desenvolvida, mudando-se para uma concepção de direito coletivo, em virtude do interesse social comum, correspondendo, na realidade, a um direito coletivo à informação. [58]

A liberdade de informação se preenche de aspectos individuais e coletivos, pois inclui tanto o direito de informar e exteriorizar a opinião, como também de ser informado, direito que todos os cidadãos têm, fato marcante e decorrente da democracia instituída no País.

José Afonso da Silva designa a palavra informação como "o conjunto de condições e modalidades de difusão para o público (ou colocada à disposição do público) sob formas apropriadas, de notícias ou elementos de conhecimentos, idéias ou opiniões." [59]

Citando Albino Greco, acrescenta "informação" se entende "como o conhecimento de fatos, de acontecimentos, de situações de interesse geral e particular que implica, do ponto de vista jurídico, duas direções: a do direito de informar e a do direito de ser informado." O mesmo é dizer que a liberdade de informação compreende a liberdade de informar e a liberdade de ser informado. A primeira coincide com a liberdade de manifestação do pensamento pela palavra, por escrito ou por qualquer outro meio de difusão; a segunda indica o interesse sempre crescente da coletividade para que tanto os indivíduos como a comunidade esteja informada para o exercício consciente das liberdades públicas. [60]

O direito de ser informado é uma das bases da democracia, a população tem o direito de ser informada porque é através desse direito que se pode ter ciência das realidades circundantes, ainda mais na atualidade globalizada, que, sem informação, o indivíduo se torna alheio aos acontecimentos, não tendo como desenvolver a sua personalidade e sua cidadania.

A liberdade de informação decorre da liberdade de imprensa e por meio desta se assegura a transmissão das informações pelos meios de comunicação social, e sendo um direito subjetivo, no qual resulta da capacidade de veicular ou transmitir informações, sem qualquer forma de censura por parte do Estado.

Em relação ao direito da liberdade de informação José Afonso da Silva leciona, verbis:

"O direito de informar, como aspecto da liberdade de imprensa, revela-se um direito individual, mas já contaminado de sentido coletivo, em virtude das transformações dos meios de comunicação, de sorte que a caracterização mais moderna do direito de comunicação, que especialmente se concretiza pelos meios de comunicação social ou de massa, envolve a transmutação do antigo direito de imprensa e de manifestação do pensamento, por esses direitos, em direitos de feição coletiva."[61]

O ilustre doutrinador assevera ainda que, "a liberdade de informação não é simplesmente a liberdade do dono da empresa jornalística ou do jornalista. A liberdade destes é reflexa no sentido de que ela só existe e se justifica na medida do direito dos indivíduos a uma informação correta e imparcial." [62] Destarte o crucial é ser informado, obter informações, logicamente sem que lhes tenham alterado a verdade ou simplesmente lhe esvaziado o conteúdo desviando o seu sentido original.

Contudo deve a imprensa primar pela objetividade e transparência, preocupando-se com a observância dos princípios democráticos, fornecendo informações corretas e imparciais, fiscalizando a atuação dos setores públicos e privados, sempre observando os limites constitucionais e legais do direito-dever e informar.

4. PERSONALIDADE DE PESSOAS DE NOTORIEDADE PÚBLICA

4.1 – Em razão da função e da profissão

Há pessoas que em razão da profissão que exercem, e como exemplos podemos citar os atores, cantores, celebridades do mundo da moda etc.., atraem naturalmente os holofotes para si, pois, fatos do seu cotidiano que normalmente passaria desapercebidos se relacionados a pessoas 'ditas normais' quando ligados a elas chega a ser um acontecimento, principalmente se esses fatos versarem sobre sua intimidade, convertem-se em grandes notícias, dando causa a uma série de publicações nos mais variados meios de comunicações, fomentando a curiosidade de uma gama da sociedade consumidora e que de certa forma alimenta tais publicações.

Pela profissão que exercem precisando estar sempre em evidencia, acabam assim, expondo sua vida privada e intimidade à voracidade da mídia, de certa forma, abrem mão de quase tudo o que diz respeito à esfera privada, porquanto se utilizam disso como uma forma de marketing pessoal para promover sua própria imagem.

E outras pessoas pela função pública que exercem como os políticos.

Em razão disso essas pessoas têm sua privacidade mitigada, os políticos por serem pessoas públicas, cuja função é gerir a coisa pública representando a vontade social, tem assim sua esfera de direitos da personalidade reduzida, em virtude da necessidade de fiscalização popular que é de interesse coletivo, mas, ressalte-se, essa possibilidade de diminuição de tais direitos não é plenamente ausente. [63]

Só para explicitar o quão pode ser agressiva a atuação da imprensa citaremos o caso da Princesa Diana, que no mês de agosto último completou dez anos do seu falecimento, em decorrência de acidente automobilístico quando tentava escapar do assédio de fotógrafos que a perseguiam, conhecidos como "paparazzi" [64], jornalistas ávidos por conseguir uma foto da princesa ao lado do atual namorado Dodi Al-Fayed, para que pudessem estampar nas capas de revistas, fatos relacionados às celebridades.

Tais jornalistas invadiram a privacidade do casal uma vez que, mesmo sendo celebridades ao demonstrar a recusa em serem fotografados deveria ter seu direito de privacidade preservado, uma vez que mesmo as pessoas famosas, por sua imagem e posição social, tem direito de estarem sós, podem gozar de paz sem o importuno da curiosidade ou da indiscrição alheia, evitando serem molestados.

O inciso X, do art. 5º da Constituição da República, que trata especificamente da violação dos direitos da personalidade, não faz distinção de raça, cor, profissão ou meio de vida.

E segundo o insigne mestre Celso Ribeiro Bastos [65], comentando o referido inciso, assevera que o mencionado inciso "oferece guarida ao direito à reserva da intimidade assim como ao da vida privada. Consiste na faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos na sua vida privada e familiar, assim como impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área de manifestação existencial do ser humano."

E continua:

"Há que se fazer referência àquelas situações em que o indivíduo se encontra em restaurante, casas noturnas, bôites, hotéis, motéis, em que o público e o particular se entrelaçam de uma maneira quase que inextrincável. É lógico que os lugares citados são públicos na medida em que são de acesso livre a todos. Portanto, quem os freqüenta está a priori abrindo mão do seu direito de privacidade. Isto não quer dizer, contudo que esteja querendo chamar para si os holofotes da publicidade."

Destarte, acreditamos que o comportamento mais afoito, ou indiscriminado por parte da imprensa, fere o direito à intimidade e a imagem, ao entrevistarem, fotografar, ou mesmo importunar essas pessoas nestes locais sem a sua concordância, levando-as ao ar através da televisão, do rádio, da imprensa escrita, ou qualquer meio de comunicação. É um direito, pois que lhes assiste de as pessoas freqüentarem certos lugares com os riscos normais de serem vistas e reconhecidas por aqueles que os freqüentam. Não gera, portanto, direito aos que trabalham com os meios de comunicação o fato dessas pessoas lá se encontrarem para se tornar involuntariamente objeto de publicidade.

Nesse sentido são as palavras de André Ramos Tavares, verbis:

"Quando qualquer dos meios de comunicação escora-se na imagem das pessoas, ou em fatos pessoais, apenas para exploração comercial, com o intuito claro de formar audiência à custa da privacidade de astros, de personalidades públicas, de pessoas de renome, claro está que se fere o direito à imagem e, pois, à privacidade, remetendo seus autores à responsabilidade pela indenização dos danos materiais, morais. No caso de se propagarem injúrias públicas, há, ainda, o direito à resposta." [66]

É certo que os meios de comunicação e imprensa de um modo geral exercem papel fundamental na sociedade democrática atual, por vezes subvencionado a formação da opinião pública, mas também, tornando transparente o exercício do poder e dos atos praticados por agentes públicos, desse modo, abrindo-se a oportunidade de coibir abusos.

O sistema de informação praticamente esta presente em todas as partes, e pode exercer poderoso incentivo para que pessoas públicas situadas em posições estratégicas do poder e celebridades de modo geral, cientes da repercussão de seus atos, alvos preferenciais da atenção dos veículos de comunicação, não incorram em desvios graves de comportamento, ou mesmo em atitudes dúbias, passíveis de censura ou recriminação.

Por tudo já exposto, temos que o direito à intimidade de pessoas de notoriedade pública, sofre certa limitação, o que não implica dizer o seu total desaparecimento, conserva-se, pois uma parcela da sua intimidade, onde só poderão ter acesso aos que forem permitidos, dessa forma, deve-se garantir também a essas pessoas a garantia constitucional prevista aos direitos da personalidade.

5. ESTUDO DE CASOS E ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL

Colisão entre direitos fundamentais, consiste na diversidade de interesse sobre direitos fundamentais de diferentes titulares alusivos ao mesmo objeto, de tal sorte que o exercício de uns venha a contrastar com o de outros. Assim, é possível que, diante de duas regras ou de dois princípios constitucionais, configure-se um conflito diante do qual o interprete sinta-se em dúvida sobre qual delas, ou qual deles, deva prevalecer diante de um caso concreto. É dizer: "no exercício de direitos fundamentais, é freqüente o choque entre os mesmos ou o confronto desses direitos com outros bens jurídicos constitucionalmente tutelados." [67]

Tomando-se por base esse conceito, pode-se afirmar que a colisão de um dos direitos da personalidade com a liberdade de comunicação significa que as opiniões e fatos relacionados com o âmbito de proteção constitucional desse direito não podem ser divulgados ao público indiscriminadamente.

No ordenamento jurídico quando há normas incompatíveis entre si, busca-se a validade de uma delas, para isso utiliza-se o critério da hierarquia, da cronologia ou da especialidade. No conflito entre o critério hierárquico e o critério cronológico, prevalece o hierárquico. No conflito entre o critério de especialidade e o critério cronológico, prevalece o critério de especialidade. No conflito entre o critério da hierarquia e o critério de especialidade, que são os dois chamados critérios fortes. [68]

Mas quando nenhum dos três critérios de solução das antinomias é aplicável ao caso concreto, quando no caso há duas normas que são contemporâneas, paritárias e gerais? A solução deverá, pois, utiliza-se de outros critérios para solução do conflito.

Importante aqui conceituarmos o que é antinomia jurídica, conceito dado por Tércio Sampaio Ferraz Júnior:

"a oposição que ocorre entre duas normas contraditórias, num mesmo âmbito normativo que colocam o sujeito numa posição insustentável pela ausência ou inconsistência de critérios aptos a permitir-lhe uma saída nos quadros de um ordenamento jurídico."[69]

Judicael Sudário de Pinho ressalta que o conceito de antinomia jurídica não se confunde com o de colisão de direitos. Este último conceito é mais amplo, tendo em vista que envolve o conflito entre direitos fundamentais que muitas vezes têm conteúdo aberto e variável, ou seja, quando o exercício de um direito fundamental por parte de um titular colide com o exercício fundamental por parte de outro titular. [70]

Corroborando com o seu entendimento Edilsom Pereira de Farias acrescenta, verbis:

"A 'colisão de princípios', ao revés do conflito de regras, tem lugar na dimensão da validez, acontece dentro do ordenamento jurídico (...), vale dizer: não se resolve a colisão entre dois princípios suprimindo um em favor do outro. A colisão será solucionada levando-se em conta o peso ou a importância relativa de cada princípio, a fim de se escolher qual deles no caso concreto prevalecerá ou sofrerá menos constrição do que o outro." [71]

Nossos Tribunais atentos à contínua invasão da privacidade humana, tem procurado desestimular sua prática, com base em pesquisas realizadas nos sites de alguns Tribunais Pátrios, colacionei alguns julgados para servir de base e ao mesmo tempo expor o entendimento atualmente aplicado pelos nossos magistrados.

Caso n° 1:

EMENTA: CIVIL. APELAÇÃO. DANO MORAL. LIBERDADE DE IMPRENSA. MATÉRIA PUBLICADA EM JORNAL. ABUSO E EXCESSO VERIFICADOS. INDENIZAÇÃO DEVIDA. A liberdade de imprensa e informação está constitucionalmente garantida, mas não pode colidir com os direitos fundamentais. Havendo publicação excessiva em jornal de matéria que denigre a imagem do político, principalmente quando não afeita à sua atividade e que acarreta desprestígio junto ao seu eleitorado e pares, resta caracterizado o dano moral. Apelação conhecida e não provida. [72]

Nesse primeiro caso tem-se a divulgação por parte de jornal impresso da localidade, a fatos relacionados a um vereador da municipalidade, fatos esses ligados ao seu debilitado estado de saúde aduzindo ser decorrente de alcoolismo, donde se transcreve alguns trechos das publicações extraída da sentença:

"Parece que janeiro é mesmo o mês da saúde, até mesmo para os políticos. Para alguns, por força das circunstâncias; para outros, por gosto mesmo. Veja o caso do capitão Erley Santos (PL) que, por mais que a família negue, está sofrendo as conseqüências do consumo excessivo de bebida alcoólica. Graças a Deus, ele está se recuperando, mas acredita-se que nunca mais poderá tomar uma cerveja sequer ..."

"(...) A pancreatite que acometeu o vereador fez com ele chegasse ao HM, na noite do dia 31, já em estado de coma, provocado pela ingestão excessiva de álcool (...)."

Ressaltando que o referido jornal publicou em menos de quinze dias mais de oito matérias relacionadas exclusivamente sobre o alcoolismo do Edil, em sua brilhante decisão a Exma. Sra. Desembargadora se pronunciou nos seguintes termos:

"Tivesse a apelante a intenção de somente noticiar a internação do apelado, não teria se referido ao suposto motivo de alcoolismo que, caso de fato ocorrido, é decorrência de fraqueza humana e de interesse exclusivo do apelado e sua família, a intimidade e a vidaprivada deles, não sendo, pois, de interesse, como alega a apelante, até porque o fato, repita-se, caso ocorrido, não retira o mandato do apelado nem afeta seu eleitorado."

Nesse caso, portanto, prevaleceu a privacidade em detrimento do direito de informar, visto que embora a pessoa noticiada seja ocupante de cargo público, no caso vereador, o seu problema com o alcoolismo está relacionado diretamente com a sua intimidade, sua vida privada, as informações com as quais os noticiários deveriam ocupar-se, devem ser ao que interessem à sociedade, ou seja, que digam respeito ao cargo ao qual foi eleito.

Caso n° 2:

EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. IMPRENSA. MATÉRIA JORNALÍSTICA. FIGURA PÚBLICA (POLÍTICO). REPORTAGE QUE NÃO TRANSBORDA DOS LIMITES CONSTITUCIONAIS DA LIBERDADE DE IMPRENSA INEXISTÊNCIA DE OFENSA À HONRA, INTIMIDADE, PRIVACIDADE OU IMAGEM DO AUTOR. PROVIMENTO DA APELAÇÃO. [73]

No segundo caso tem-se um Deputado Estadual, que se insurge contra matéria publicada na revista "Carta Capital", ligando o seu nome ao de Paulo César Farias, e envolvimento de favorecimento em contratos de licitações, quando da sua gestão como presidente da CEHAB - Companhia Estadual de Habitação e Obras, em primeiro grau a empresa Ré fora condenada ao pagamento de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), com o fundamento de que a Ré não comprovou a veracidade dos fatos narrados, não satisfeitos ambos interpuseram apelação.

No julgamento da apelação o Tribunal julgou inteiramente improcedente os pedidos na inicial, com os argumentos de que:

"Com efeito, a matéria publicada na revista Carta Capital dá conta do relacionamento ou das vinculações do autor com diversas pessoas integrantes do cenário político nacional que estiveram envolvidas em episódios considerados suspeitos e que foram destaques na imprensa. Mas m nenhum momento a matéria aponta o autor como envolvidos nesses episódios, em crimes, condutas anti-éticas ou irregularidades......

Na veiculação de notícias ou matérias jornalísticas, quando se tratar de figuras públicas ou que ocupam (ou ocuparam) cargos públicos não se pode exigir da imprensa o mesmo rigor ou cuidado que se exige quando se trata da vida particular das pessoas em geral.

[...]

E é fundamental, na sociedade moderna, incentivar o chamado jornalismo investigativo, que tantas vezes fornece à população e às autoridades informações sobre assuntos de interesse público"

Nesse caso o que veio a prevalecer foi o direito coletivo à informação, por tratar-se de pessoa pública eleita diretamente pelo povo, são esses os mais interessados em saber das atividades supostamente ilícitas em que o parlamentar estaria envolvido no exercício da função para a qual foi eleito, principalmente quando relacionado ao erário público.

E para que a democracia seja exercida é necessário um jornalismo independente das amarras do poder dominante, onde poderá publicar sem medo de retaliações noticias de interesse público, mesmo que vá de encontro aos interesses de uma minoria.

3º Caso:

A modelo Daniella Cicarelli Lemos e seu então namorado Renato Alfiero Malzoni Filho, em viagem de férias à Espanha em agosto de 2006, mas precisamente na praia de Tarifa, foram filmados por paparazzo ao trocarem caricias íntima, e posteriormente, sem autorização do casal, o réu YOUTUBE INC, divulgou em seu site o referido vídeo. Dois dos veículos de comunicação da internet brasileira também foram demandados, IG – INTERNET GROUP DO BRASIL LTDA e ORGANIZAÇÕES GLOBO DE COMUNICAÇÃO, estes divulgaram fotos e links para o vídeo. Os autores pleitearam em ação inibitória a cessação imediata da exibição do vídeo e das fotos sob pena de multa diária. [74]

O juízo de primeira instância denegou o pedido de tutela antecipada o que levou à interposição do agravo de instrumento n.º 472.738, que foi deferida pelo Desembargador Ênio Santarelli Zuliani com o fundamento de que, verbis:

"As liberdades que a apresentadora e seu namorado tomaram quando namoravam na praia não justifica a exposição indiscriminada e sem autorização de suas imagens na internet."

E segue:

"A intenção de quem filmou foi expor a intimidade do casal e cabe à justiça resguardar a vida íntima e a imagem das pessoas, que é um direito constitucional."

Ao julgar o mérito o MM. Juiz da 23° Vara Cível da Capital fez alusão ao julgado do Resp. n° 595.600 SC[75], com a seguinte ementa:

"DIREITO À IMAGEM IMPRENSA. TOPLESS. FOTOGRAFIA OBTIDA EM LOCAL PÚBLICO. DIVULGAÇÃO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. A partir do momento que uma jovem, por sua vontade livre e consciente, desnuda os seios em local público, expõe-se ela à apreciação das pessoas que ali se fazem presentes, de tal sorte que jornal de circulação estadual e tido como idôneo lhe fotografa, apenas registra um fato que ocorreu numa praia, ampliando a divulgação de uma imagem que se fez aberta aos olhos do público..."

Transcrevo a seguir algumas passagens do seu voto, conforme segue:

"A imagem das pessoas constitui uma forma do direito à intimidade. Quem quer preservar sua honra e sua intimidade não expõe os seios não expõe os seios para deleite da multidão. Se a embargada resolveu mostrar sua intimidade às pessoas deve ter maturidade suficiente para suportar as conseqüências de seus atos e não atribuir à imprensa a responsabilidade pelo ocorrido."

"Mas a partir do momento em que a embargada não teve objeção alguma de que pessoas pudessem observar sua intimidade, não pode ela, vir à Justiça alegar que sua honra foi violada pelo fato de o Diário Catarinense ter publicado uma foto obtida naquele momento numa praia lotada e em pleno feriado."

Ao fundamentar sua decisão o MM. Juiz argüiu que em situação similar vivenciada por pessoas não famosa a justiça declinou pela inocorrência do ato ilícito. E no caso que se discute há ainda uma peculiaridade em desfavor da co-autora que é pessoa famosa conhecidíssima mundo afora, fato que por si só já denota que não passaria despercebida em situações corriqueiras o que dirá com a conduta a qual foi mostrada no vídeo.

Portanto os autores ao decidirem realizar carícias íntimas em local público aos olhos de todos que ali se encontravam, abriu mão de parte do direito à privacidade que lhes é garantido constitucionalmente, o que deve ser visto no caso que se analisa, é se há ou não o dever de abstenção na divulgação de imagens, quando esta é exibida pela própria pessoa em local público.

Pontes de Miranda com bastante precisão faz referencia a exposição de fatos íntimos,

"Todos tem o direito de manter-se em reserva, de velar a sua intimidade, de não deixar que se lhes devasse a vida privada, de fechar o seu lar à curiosidade pública; todavia, esse direito sofre limitações. a) Se A tomou parte em acontecimentos que se passaram na sua intimidade, ou outrem foi o agente, havendo interesse de maior relevância na revelação dessa intimidade, até certo ponto, ou b) se A mesmo consentiu em que se desvelasse essa intimidade, o seu direito não existe. Não existe, porque todo direito é efeito de fato jurídico; todo fato jurídico supõe suporte fático. No suporte fático está o elemento intimidade; se A consentiu que se lhe devassasse a vida privada, a intimidade deixou de existir: o consentimento atuou como pré-excludente. Se A praticou crime, em lugar íntimo, pré-excluiu a entrada desse lugar, como íntimo, no suporte fático, que, indo ao mundo jurídico, produziria o direito, a pretensão ou a ação de defesa da intimidade." [76]

Quanto em tópico anterior nos referimos às limitações impostas ao direito à privacidade, um dos âmbitos dessa limitação reside no fato de que, se o direito à privacidade é uma proteção contra a invasão do Estado e da sociedade na esfera íntima do indivíduo, por outro lado, não pode protegê-lo quando ele sai de sua intimidade e atua na sociedade, deixando que esta tenha conhecimento de fatos que teoricamente deveriam ser próprios da sua intimidade.

Neste sentido, o escólio do Professor Alexandre de Moraes:

"Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5º da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para o afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito" .[77]

Acrescido a tudo isso, há ainda o interesse público que é de fundamental importância quando da colisão entre os direitos da personalidade e o direito a comunicação. Estando presente e/ou em joga o interesse público, ele deverá prevalecer sobre os direitos da personalidade.

Destarte, conclui-se, que a princípio certas divulgações sobre fatos que são considerados de foro íntimo e pessoal de pessoas públicas, por força do interesse público passam a não ser considerados abusos da imprensa pela condição ou cargo que o próprio agente desempenha.

Diante dos casos expostos, observa-se que na ocorrência do conflito entre os direitos fundamentais, o interprete vem utilizando-se do princípio da concordância prática ou da harmonização de forma a coordenar e combinar os bens jurídicos em conflito, fazendo ajustes em cada um para uma finalidade maior, por meio da ponderação de interesses é que se irá valorar qual bem jurídico deverá prevalecer, e tal ponderação só é possível diante do caso concreto, já que as hipóteses de ocorrência podem ser semelhantes, mas com característica e contextos próprios, o que as torna diferentes umas das outras, portanto exigindo uma análise diferente para cada caso.

É o que se pode concluir das palavras de Luís Roberto Barroso, extraído do texto "BREVES APONTAMENTOS SOBRE A PONDERAÇÃO COMO TÉCNICA DE DECISÃO EM CONFLITOS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS", verbis:

"É possível falar de uma ponderação em abstrato e de uma ponderação em concreto. A ponderação em abstrato é a desenvolvida pela dogmática jurídica considerando a metodologia própria do direito e os conflitos já identificados pela experiência. A ponderação em abstrato procura formular modelos de solução pré-fabricados (parâmetros gerais e particulares) que deverão ser empregados pelo aplicados nos casos que se mostrem semelhantes. Caso os modelos propostos pela ponderação em abstrato não sejam inteiramente adequados às particularidades do caso concreto, o intérprete deverá proceder a uma nova ponderação – a ponderação em concreto – agora tendo em conta os elementos específicos da situação real. A utilidade da distinção consiste especialmente em fomentar, na doutrina, o estudo e a formulação de parâmetros que possam servir de norte ao aplicador, reduzindo a subjetividade do processo ponderativo."[78]

É certo que a ponderação aqui relatada pode ser vista com certa subjetividade, onde alguns doutrinadores discutem se pode ser estabelecido parâmetros de controle para a apreciação de processos que envolvem tais matérias.

O que não se pode olvidar é que, ao invocar tais direitos se busque um refúgio ou ser usado como escudo protetivo para a pratica de atividades ilícitas, nem como argumento para afastar ou diminuir a responsabilidade civil ou penal.

CONCLUSÃO

Os direitos individuais obtiveram um reconhecimento importante a partir principalmente de momentos históricos como a Magna Carta de 1215, juntamente com a Revolução Americana datada de 1776 e a Revolução Francesa em 1789, e mais recentemente a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, sendo considerado passos importantes na busca de se resguardar os direitos individuais, a liberdade do cidadão e, sobretudo a valoração da pessoa humana.

Esses fatos proporcionaram certa segurança e possibilitou a inserção em leis positivadas, como foi o caso das constituições brasileiras, onde a nossa Lei Maior atualmente traz em seu preâmbulo princípios que visam a proteção do indivíduo "assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias"

A Constituição Federal estabelece também no inciso III do art. 1º como um dos fundamentos da própria Constituição " a dignidade da pessoa humana."

Decorrido todo esse tempo vemos que ainda temos muito que lutar para a aplicação eficaz desses direitos já conquistados. A busca pela afirmação de tais direitos deve ser constante visto que os valores sociais são mutantes como a própria sociedade e o direito devem procurar acompanhá-los.

No presente trabalho procuramos primeiramente fazer uma análise acerca do direito da personalidade, seguida pelo direito à informação, e os constantes conflitos quando do mau uso de um em relação ao outro.

Os direitos da personalidade qualificam-se como direito extrapatrimoniais, de caráter personalíssimo, por proteger o interesse que tem a pessoa de opor-se à divulgação dessa imagem, em circunstâncias concernentes à sua vida privada, direito esse resguardado constitucionalmente.

De igual amparo constitucional, está o direito à informação, que tem o seu alicerce na liberdade de expressão e de pensamento, que se subdivide em direito de informar e ser informado.

Esclareça-se, nesta oportunidade, que muito embora a matéria esteja distintamente separada nos incisos IX e X, do art. 5º, da Lei Maior, podem encontrar-se intimamente ligadas.

Justifica-se esta ressalva pelo fato de que o direito de informação é decorrência da responsabilidade de quem comunica ou publica fatos ocorridos ou opinião sobre determinado assunto, desde, é claro, que não atinja a intimidade de outrem.

Outrossim, há que se pensar em que hipóteses o exercício de liberdade de informação pode ferir outros direitos, não menos importantes, constitucionalmente assegurados.

Com isso, o direito de informação deve ser compatível com o legítimo uso de informações ou dados divulgados, devendo ser observadas as normas de respeito à privacidade, principalmente, à imagem, documentos, dados pessoais, para não incorrer na reparação dos danos causados pela violação desses direitos.

O direito à imagem que constitui um dos diretos da personalidade é talvez o mais violado pela imprensa e meios de comunicação. Quase que diariamente a imprensa nas suas mais variadas formas, exibe imagens de pessoas sem a devida autorização e muitas das vezes imputando-lhes condutas tipificadas como delituosas, quando por vezes são meros suspeitos, ferindo assim o princípio legal da presunção de inocência.

Quando na verdade o verdadeiro papel da imprensa é informar, divulgar o fato, sem, no entanto tecer comentários sobre autoria dos mesmos, já que isso é restrito à policia judiciária a quem assiste a função de investigar.

Não estou aqui a defender a censura prévia, nem tão pouco o cerceamento do direito de informação e livre expressão do pensamento, visto que são institutos totalmente incompatíveis com o Estado Democrático de Direito em que vivemos, mas apenas alertar que deveria se exigir com maior rigor a responsabilização daqueles que labutam com a nobre e honrosa profissão de informar a sociedade, para que antes de veicular noticias averiguar sua licitude e também se sua divulgação não estará ferindo direito da personalidade de outrem.

No nosso entendimento, não basta somente, que seja verídica a informação prestada, ou que seja revelada a sua fonte, os meios de comunicação devem ficar em constante vigilância para controlar a matéria que divulgam, tomando todas as cautelas necessárias para assegurar que a divulgação de fatos e informações em seus veículos de comunicação não violem a esfera de direitos fundamentais de nenhuma pessoa envolvida.

A imprensa tem o dever de manter a população informada sobre os acontecimentos que possam ser de interesse social, todavia, essas informações dadas, não podem ser ilimitadas, sem qualquer tipo de contenção principalmente quando se referem aos fatos relacionados à vida íntima das pessoas, devendo-se preservar o direito que constitucionalmente lhes é assegurado.

O papel dos veículos de informação vai muito além do que somente manter a sociedade informada e atualizada exercem principalmente uma função de controle dos atos dos agentes públicos, devendo estar em constante vigilância.

Contudo observa-se que em muitos casos há uma abertura da privacidade de forma consentida pela própria pessoa, quando esta pratica atos que em tese deveria ficar sob a alcova, ou fatos que só deveriam interessar às pessoas que lhes são mais chegadas, no entanto muitas das vezes para tirar proveitos próprios fazem deles uma verdadeira apoteose.

Dessa forma, devido a grande relevância no contexto do Estado Social, na ocorrência de conflito decorrente do exercício dos direitos fundamentais o regramento não deve se dar à luz de métodos comumente utilizados, como se da no caso de conflito de normas, ou seja, pelo método hierárquico, a lei superior prevalece sobre a inferior, com relação ao cronológico, aplica-se a lei posterior em detrimento da anterior e ainda pelo método da especialização, a lei especifica tem prevalência sobre a lei geral.

Mas como explicitado alhures, os direitos conflitantes aqui mostrados, trata-se de direitos individuais constitucionais, ou seja, ambos estão expressos na mesma Lei, com a mesma hierarquia e mesma cronologia. Contanto que imperioso se faz recolher que a solução da lide só pode ocorrer submetendo-se casos concretos ao julgador, que irá interpretar as normas utilizando construções doutrinárias, princípios e regras constitucionais, mas somente diante do caso concreto, analisando suas peculiaridades poderá de forma adequada estabelecer a prevalência a ser dada.

Ocorre o abuso de direito quando, dentre as prerrogativas concedidas pelo ordenamento jurídico, o agente atua sem preocupar-se ou sem considerar as verdadeiras finalidades para as quais foram criados, ou seja, o bem estar social. E quando isso ocorre, causa dano a outrem, seja material, moral, ou mesmo penal. Praticado o ilícito, resta o dever de indenizar e o conseqüente direito a ser indenizado pelo agente infrator.

Os casos narrados foi apenas uma pequena amostra do entendimento que os Tribunais Pátrios vem aplicando, se concluindo que cada caso tem suas nuances e peculiaridades, e somente com a analise do caso in concreto poderá se determinar se certa situação expôs a privacidade do indivíduo, ou se há interesse público ou de ordem pública a justificar sua divulgação.

É indiferente o ramo do direito, se civil, penal ou constitucional, pois o objetivo é um só: o bem estar do indivíduo e o exercício dos direitos fundamentais devem ser conciliados com a necessidade de proteger-se o Estado Democrático de Direito.

O que não pode é banalizar a justiça utilizando-se de meios ardilosos para enriquecimento ilícito.

REFERÊNCIAS

Constituição Federal de 1988

MICHAELIS: pequeno dicionário da língua portuguesa. - São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998.

DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, ed. 27, Malheiros: São Paulo SP

Código Civil Brasileiro

TAVARES ,Andre Ramos. Curso de Direito Constitucional 5 ed. São Paulo –Saraiva 2007

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de pensamento e Direito à vida Privada: conflito entre direitos da personalidade. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2000.

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BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 5°. Edição atualizada.e aumentada por Eduardo C. B. Bittar. Rio de Janeiro, Forense Universitária.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002.

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BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1988-1989 p. 63

Lei 9.296/96 - Regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5° da Constituição Federal.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15 ed. – São Paulo: Atlas, 2004.

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PINHO, Judicael Sudário de. Temas de direito constitucional e o Supremo Tribunal Federal. São Paulo. Atlas, 2007. p. 385.

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PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983.

OUTRAS FONTES DE PESQUISA:

Home Page do Superior Tribunal Federal – www.stf.gov.br,

Home Page do Mundo Legal - www.mundolegal.com.br

Home Page do Wikipedia - pt.wikipedia.org/wiki

Home Page do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina – www.tj.sc.gov.br

Home Page do Tribunal de Justiça de São Paulo – www.tj.sp.gov.br,

Home Page do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro– www.tj.rj.gov.br

Home Page do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - www.tj.mg.gov.br

Home Page do Tribunal de Justiça do Estado do Ceara – www.tj.ce.gov.br



[1] Constituição Federal

[2] MICHAELIS: pequeno dicionário da língua portuguesa. - São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998.

[3] Da Silva, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, ed. 27, Malheiros: São Paulo SP p. 125/126

[4] Constituição Federal/1988

[5] http://www.stf.gov.br/legislacao/constituicao/pesquisa/artigoBd.asp

[6] P. 181

[7] Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

[8] http://www.stf.gov.br/legislacao/constituicao/pesquisa/artigoBd.asp

[9]http://www.stf.gov.br/legislacao/constituicao/pesquisa/artigoBd.asp

[10] Andre Ramos Tavares, Curso de Direito Constitucional 5 ed. São Paulo –Saraiva 2007 p. 587

[11] Gilberto Haddad Jabur. Liberdade de pensamento e Direito à vida Privada. São Paulo: Ed. RT, 2000, p. 34

[12] PINTO, Paulo Mota. Direito da personalidade no novo Código Civil português e no novo Código Civil brasileiro. Revista Jurídica, Porto Alegre: Notadez, n. 314, ano 51, p. 7-34, dez./2003.

[13] BITTAR, Carlos Alberto. Op. cit., p.6

[14] BITTAR, Carlos Alberto. Op. cit., P.7

[15] José Afonso da Silva p. 187

[16] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 138

[17] STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência – 7 edição revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 1.630

[18] STOCO, Rui. Idem , p.1.630

[19] CALDAS, Pedro Frederico. Vida Privada, liberdade de imprensa e dano moral. São Paulo: Editora Saraiva, 1997. p. 21

[20] René Ariel Dotti, Proteção da vida privada e Liberdade de Informação. São Paulo: Revista dos Tribunais 1980 p. 69

[21] Comentários à Constituição do Brasil v 2, p. 63.

[22] THEMIS REVISTA DA ESMEC Publicação Oficial da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará – ESMEC - http://www.tj.ce.gov.br/esmec/pdf/THEMIS-V4-N1.pdf

[23] Tavares, André Ramos. Curso de Direito Constitucional p. 588

[24] Constituição Federal.

[25] Andre Ramos Tavares. Curso Direito Constitucional p. 588

[26] Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.

Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.

[27] André Ramos Tavares p. 593

[28] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15 ed. – São Paulo: Atlas, 2004, p. 81

[29] IDEM p. 82

[30] CALDAS, Pedro Frederico. p. 54.

[31] CALDAS, Pedro Frederico. p. 55

[32] MICHAELIS: pequeno dicionário da língua portuguesa. - São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998.

[33] BITTAR, p. 34

[34] (REsp 86.109⁄BARROS MONTEIRO)

[35] (REsp 267.529⁄SÁLVIO).

[36] José Afonso da Silva. Comentários Contextual à Constituição p. 102

[37] Idem p. 102

[38] José Afonso da Silva p. 208

[39] MICAELIS

[40] José Afonso da Silva, p. 234

[41] José Afonso da Silva – Curso de Direito Constitucional Positivo p. 232

[42] IDEM

[43] José Afonso da Silva p. 244

[44] Alexandre de Moraes- Direito Constitucional p. 74

[45] José Afonso p 245

[46] André Ramos Tavares. P. 549

[47] Op. Cit. P. 549

[48] Op. Cita. André. P. 550

[49] POUND, Roscoe. Liberdade e garantias constitucionais. São Paulo: Ibrasa, 1976. p. 51

[50] PINHO, Judicael Sudário de. Temas de direito constitucional e o Supremo Tribunal Federal. São Paulo. Atlas, 2007. p. 385.

[51] José Afonso da Silva p. 243/244

[52] Op. Cit. Judicael Sudário p. 386

[53] FARIAS, Edílson Pereira de. Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1996. p. 133-134

[54] Op. Cita. P. 386

[55] Op. Cit. Judicael p. 389

[56]Imprensa marrom é a forma como podem ser chamados meios de comunicação considerados sensacionalistas e que busquem alta audiência e vendagem através da divulgação exagerada de crimes e diversos acontecimentos "apelativos". É o equivalente brasileiro do termo yellow journalism. http://pt.wikipedia.org/wiki/Imprensa_marrom

[57] Op. Cit. Judicael p. 388

[58] GODOY, p. 61

[59] José Afonso p. 245

[60] IDEM p. 245

[61] José Afonso da Silva p 247

[62] IDEM p. 247

[63] GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. P. 80-81

[64]Paparazzo (no plural paparazzi) é uma palavra da língua italiana utilizada para designar os repórteres que fotografam pessoas famosas sem autorização, expondo em público as atividades que eles fazem em seu cotidiano.http://pt.wikipedia.org/wiki/Paparazzi

[65] Celso Ribeiro Bastos. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1988-1989 p. 63

[66] André Ramos Tavares 554

[67] Cit. Judicael p. 389

[68] Judicael p. 391

[69] IDEM P. 393

[70] IDEM p. 393

[71] Cf. Op. cit. p. 96.

[72] TJMG Apelação cível n° 1.0105.03.107709-9/001 - Comarca de Governador Valadares-MG Apelante(s): EGUSA - Editora e Grafica Uniao S.A. - Apelado(a)(s): Erley Costa Santos - relatora: Exmª. Srª. Desª. Márcia de Paoli Balbino DOU-20/04/2006

[73] TJRJ- Apelação Cível- 2007.001.14235 – Apelantes: Eduardo Cosentino da Cunha e Carta Editorial LTDA - Apelados: os mesmos- Rel. Dês. André Gustavo Corrêa de Andrade - julgamento 12/06/2007

[74] Ação Inibitória n. 583.00.2006.204563-4 – TJSP, 23° Vara Cível de São Paulo – Autores: Daniella Cicarelli Lemos e Renato Aufiero Malzoni Filho – Réus: YOUTUBE INC, IG – INTERNET GROUP DO BRASIL LTDA e ORGANIZAÇÕES GLOBO DE COMUNICAÇÃO. Juiz Prolator – Gustavo Santini Teodoro – Data Julgamento: 18/06/2007.

[75] Resp. 595.600 – TJSC – Relator: César Asfor Rocha, julgado em 18/03/2004.

[76] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983, p. 125.

[77] P. 58

[78] http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Doutrina_Detalhar&did=19101, pesquisado em 10 de agosto de 2007.


Autor: Bartira Mousinho Lima


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