Rio+20 ou Rio-20



Rio+20 ou Rio-20

 

A vida é assim: esquenta e esfria; aperta e dói, afrouxa e sossega e depois desinquieta. O que ela requer da gente é coragem.

Guimarães Rosa

 

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que ocorreu na cidade do Rio de Janeiro de13 a22 de junho de 2012 recebeu a alcunha de Rio+20. O principal objetivo da Rio+20 foi renovar e reafirmar a participação dos líderes dos países com relação ao desenvolvimento sustentável no planeta. Foi uma segunda etapa da Cúpula da Terra (ECO-92) que ocorreu há 20 anos na cidade do Rio de Janeiro e produziu resultados excepcionais.

 

Desde então, há um certo senso comum que as robustas conferências da ONU sobre meio ambiente produzem resultados inócuos. A Rio+20 parece não fugir à regra e deixa uma sensação de retrocesso, batizá-la de Rio-20 não seria de todo inusitado. Os países mais ricos, via de regra, fazem prevalecer suas vontades, recheadas de conservadorismo e resistência ferrenha a mudanças bruscas.

 

A Rio+20 foi a maior conferência já realizada pela ONU, com mais de 45 mil participantes e delegações de 193 países. Havia mais de quatro mil pessoas da imprensa e cerca de 10 mil pessoas de ONGs e major groups, o termo oficial da ONU para identificar grupos da sociedade civil que participam de suas reuniões, como jovens, mulheres, agricultores, tribos indígenas, comunidade científica e empresários.

 

Apesar da grandeza de números, na esfera política houve pouca representatividade, haja vista ter havido somente 79 chefes de Estado presentes. Desse montante, apenas 20% eram de países ricos, um claro reflexo da crise financeira a esvaziar a conferência.

 

O seu maior ganho pode ter sido a decisiva mobilização da opinião pública internacional à causa da sustentabilidade. Em um mundo globalizado e democrático, os governantes sempre tenderão a seguir a vontade da maioria da sociedade.

 

Firmou-se 705 compromissos voluntários entre governos, ONGs e empresas tendo sido destinados 513 bilhões de dólares em investimentos, a maior parte de bancos de desenvolvimento. No total foram 50 acordos que envolvem governos, 72 entre o Sistema ONU e ONGs, 226 entre empresas e a indústria, 243 entre universidades e escolas de todo mundo. As empresas farão relatórios contábeis mais específicos para computar o capital natural em seus balanços.

 

Houve também um avanço com o instrumento internacional relativo à Convenção da ONU sobre os Direitos do Mar, com objetivos que visam o uso sustentável da biodiversidade e conservação oceânica.

 

A criação do fundo de US$ 30 bilhões para a recuperação ambiental de países pobres não se efetivou no presente cenário de crise, mas o princípio ficou em aberto, mantendo-se viva a cobrança às nações desenvolvidas de contrapartidas em face de toda a  devastação que promoveram nos séculos 19 e 20 para enriquecer. Também não se formalizaram medidas práticas para o desenvolvimento sustentável, mas se reiterou o compromisso de novas metas a partir de 2015, quando expiram os Objetivos do Milênio.

 

Em termos de resultados concretos, as deliberações da cúpula da ONU novamente foram pífias. As expectativas para os resultados oficiais não eram otimistas, por conta dos poucos avanços durante o processo preparatório e do momento de crises profundas, especialmente no Hemisfério Norte. Aliou-se a esse quadro negativo a tímida e conservadora postura da liderança brasileira, mais preocupada em aprovar um documento final, desistindo cedo demais de buscar desafios mais ousados. Talvez tenha faltado coragem e visão de futuro aos anfitriões.

 

Os próprios termos da problemática dificilmente são matéria consensual, mesmo entre profissionais e ativistas. De qualquer forma há que se ter cuidado com conclusões precipitadas, visto que somente a história vai dimensionar corretamente os resultados de um evento tão grandioso.

Na questão da governança global para a sustentabilidade, tema foco da Conferência, pouco se avançou. O Conselho Econômico e Social deve ser fortalecido e se mantém como o órgão responsável por coordenar os esforços da ONU para implantar a Agenda 21 e os Objetivos do Milênio.

Cabe ressaltar a grande importância da divulgação de um documento pela Universidade das Nações Unidas relativo à criação do Índice de Riqueza Inclusiva (Inclusive Wealth Report – IWR). Trata-se da medição de evolução de um país em relação aos seus recursos naturais e suas perdas e ganhos, uma nova forma de medir a economia e talvez juntar-se ao PIB e IDH. Aqui abre-se a perspectiva do desenvolvimento de indicadores que meçam o real valor da natureza, passo fundamental para aplicação de políticas globais de proteção ambiental.

O documento final da Conferência, denominado “O Futuro que Queremos”, foi adotado pelos chefes de Estado, apresenta várias intenções e joga para os próximos anos a definição de medidas práticas para garantir a proteção ambiental. A crise econômica mundial de 2008 e seus rescaldos, principalmente nos Estados Unidos e na Europa, prejudicou as negociações e a tomada de decisões mais pragmáticas.

 

Os governos reconhecem a crise econômica e sua profundidade, no entanto, não se mostraram corajosos nas decisões que poderiam atacar esta situação. A diplomacia brasileira conseguiu manter em aberto os princípios mais importantes para a futura viabilização dessas metas, a começar pelo fortalecimento do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente). que passará a ter recursos orçamentários próprios e deixa de depender somente de doações.

O Pnuma, com seus 53 membros, será fortalecido, com a garantia de orçamento próprio e participação de todos os Estados membros da ONU. A novidade é o Fórum Político de Alto Nível que será estabelecido para avançar na agenda do desenvolvimento sustentável, dando orientações e coordenando as ações dos diversos órgãos da ONU. O Fórum também vai promover a troca de experiências de sucesso e reforçar a interface de decisões políticas com a ciência e será o órgão substituto da atual Comissão para o Desenvolvimento Sustentável, que na prática pouco tem feito.

Infelizmente não se conseguiu atribuir ao Pnuma o status de agência da ONU, com poderes para formular regras e exigir seu cumprimento, a exemplo do que ocorre com a Organização Mundial do comércio (OMC), com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), e com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e alimentação (FAO).

É uma tarefa hercúlea conseguir que 193 mandatários que representam 6,7 bilhões de pessoas, concordem unanimemente com mudanças nos modos de produção, nos estilos de vida e nas expectativas de desenvolvimento econômico para as próximas décadas. E acordar objetivos corajosos demandam recursos ambiciosos; uns sem outros são inócuos. 

O mundo está mais multipolarizado, o número de atores relevantes modifica-seem curtos horizontes. Nãoé mais possível que uma pequena minoria de países decidam por si o destino da humanidade. O mundo tornou-se claramente mais plano, aberto e democrático. O posicionamento de muitos países em desenvolvimento está sendo levado em conta, o que torna mais complexas as decisões de temas globais.

 

Os impasses, principalmente entre os interesses dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, estão frustrando de há muito medidas de desenvolvimento sustentável no planeta.  Os países ricos desenvolveram-se sem as regras e limites que atualmente oneram os países em desenvolvimento e sem incorrer n internalização dos custos que essas restrições implicam.

 

A história irá julgar os resultados dessa conferência, se avançou ou retrocedeuem relação à ECO-92.Entreas muitas idas e vindas das inúmeras e intermináveis reuniões paralelas não surgiu nenhum graal panglossiano.  Entre o estupor e a epifania, faltou na realidade coragem e líderes visionários que encarnassem o espírito empreendedor de mudar o que está cômodo para os bem-aventurados. Há que se convir, um osso duro de roer.


Autor: Rodnei Vecchia


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